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Sete anos e meio após tragédia, 4 famílias recebem casas em Mariana

Repro­dução: © Tânia Rêgo/Agência Brasil

Distrito foi arrasado com rompimento da Barragem de Bento Rodrigues


Pub­li­ca­do em 28/04/2023 — 07:02 Por Léo Rodrigues — Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro

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Pas­sa­dos quase sete anos e meio da tragé­dia em Mar­i­ana (MG), qua­tro famílias rece­ber­am as chaves de suas casas recon­struí­das. Elas dev­erão ser, nos próx­i­mos dias, os primeiros moradores viven­do na nova comu­nidade de Ben­to Rodrigues, anun­ciou André de Fre­itas, pres­i­dente da Fun­dação Ren­o­va, enti­dade que admin­is­tra o proces­so de reparação dos danos cau­sa­dos em decor­rên­cia do rompi­men­to da bar­ragem da min­er­ado­ra Samar­co.

“Nes­ta sem­ana, começamos o proces­so de entre­ga de chaves. É um mar­co para a reparação”, disse nes­sa quin­ta-feira (27), durante webinário de apre­sen­tação do relatório final do Painel do Rio Doce, uma con­sul­to­ria admin­istra­do pela União Inter­na­cional para a Con­ser­vação da Natureza (UICN) e for­ma­da por espe­cial­is­tas nacionais e inter­na­cionais. Con­tan­do com recur­sos doa­d­os pela Fun­dação Ren­o­va, eles realizaram estu­dos e elab­o­raram recomen­dações para o proces­so de reparação.

O rompi­men­to da bar­ragem ocor­reu em novem­bro de 2015, deixan­do 19 mor­tos e cau­san­do impacto a dezenas de cidades mineiras e capix­abas na Bacia do Rio Doce. Em Mar­i­ana, dois dis­tri­tos foram arrasa­dos: Ben­to Rodrigues e Para­catu. Um acor­do para reparação dos danos foi fir­ma­do em março de 2016 pelo gov­er­no fed­er­al, pelos gov­er­nos de Minas Gerais e do Espíri­to San­to, pela Samar­co e por suas acionistas Vale e BHP Bil­li­ton. A par­tir dele, foi cri­a­da a Fun­dação Ren­o­va, respon­sáv­el por gerir as medi­das pre­vis­tas, entre elas a recon­strução e o reassen­ta­men­to das comu­nidades.

A demo­ra na entre­ga das obras é um dos assun­tos rela­ciona­dos com a reparação que levaram o Min­istério Públi­co de Minas Gerais (MPMG) a recor­rer às esferas judi­ci­ais: está sendo cobra­da da Samar­co uma mul­ta de R$ 1 mil­hão por dia, con­ta­do a par­tir de 27 de fevereiro de 2021, últi­mo pra­zo fix­a­do pela Justiça para a entre­ga do reassen­ta­men­to. Críti­co da atu­ação da Fun­dação Ren­o­va, o MPMG tam­bém já pediu a extinção da enti­dade por enten­der que ela não tem a dev­i­da autono­mia frente às três min­er­ado­ras.

Con­forme mostrou a Agên­cia Brasil em novem­bro do ano pas­sa­do, o novo dis­tri­to de Ben­to Rodrigues pouco lem­bra a comu­nidade arrasa­da pela lama. Na platafor­ma Google Street View ain­da é pos­sív­el passear vir­tual­mente pelas ruas exis­tentes antes da tragé­dia: notam-se cas­in­has sim­ples de um pavi­men­to, hor­ta no quin­tal, gal­in­heiro no fun­do da casa, poucos muros e muito verde.

Novo distrito de Bento Rodrigues, Mariana, Minas Gerais.
Repro­dução: Novo dis­tri­to de Ben­to Rodrigues, Mar­i­ana, Minas Gerais. — Tânia Rêgo/Agência Brasil

Já o dis­tri­to que está toman­do for­ma con­ta com imóveis maiores e de padrão con­stru­ti­vo mais ele­va­do, cer­ca­dos por muros, alguns com chur­rasqueiras e pisci­nas, que dão ares de um con­domínio urbano e se dis­tan­ci­am da pais­agem de uma comu­nidade rur­al. “Não se garan­tiu a preser­vação do modo de vida das famílias. Era uma comu­nidade rur­al e ago­ra eles não terão nem água bru­ta para plan­tar suas hor­tas e para cri­ar pequenos ani­mais. Irão viv­er em um lotea­men­to urbano. Como é que o pes­soal vai se reati­var eco­nomi­ca­mente?”, ques­tiona Rodri­go Pires Vieira, coor­de­nador da Cári­tas em Mar­i­ana, enti­dade que pres­ta asses­so­ria téc­ni­ca aos atingi­dos.

Ben­to Rodrigues e Para­catu estão sendo recon­struí­dos em locais escol­hi­dos por meio de votação dos próprios moradores. Coube à Fun­dação Ren­o­va adquirir os ter­renos. No caso de Ben­to Rodrigues, o crono­gra­ma orig­i­nal das obras pre­via a entre­ga das casas em 2018. Mas foi somente em 2018 que a Fun­dação Ren­o­va aprovou o pro­je­to urbanís­ti­co jun­to aos atingi­dos, e os tra­bal­hos tiver­am iní­cio. Dessa for­ma, as esti­ma­ti­vas mudaram algu­mas vezes até que a enti­dade parou de divul­gar datas e o MPMG decid­iu judi­cializar a questão.

De acor­do com a Fun­dação Ren­o­va, 189 famílias devem ser reassen­tadas em Ben­to Rodrigues. Até o momen­to, 119 residên­cias foram con­cluí­das. Há casos judi­cial­iza­dos, por fal­ta de entendi­men­to entre os atingi­dos e a Fun­dação Ren­o­va. Em Para­catu, 72 famílias e 46 residên­cias estão prontas.

A Fun­dação Ren­o­va sus­ten­ta que o caráter par­tic­i­pa­ti­vo e o desen­volvi­men­to de pro­je­tos cus­tomiza­dos tor­nam o proces­so mais lento. Tam­bém apon­ta que a pan­demia de covid-19 cau­sou desacel­er­ação dos tra­bal­hos. “É muito tem­po. São mais de sete anos. Fazen­do uma autocríti­ca, a Fun­dação Ren­o­va, em alguns momen­tos, pode­ria ter feito mel­hor. Mas tam­bém deve­mos recon­hecer que o proces­so foi desen­hado de maneira que priv­i­le­giou out­ras questões e não a tem­po­ral”, disse André de Freiras.

A Comis­são de Atingi­dos de Ben­to Rodrigues e a Cári­tas avaliam que o proces­so par­tic­i­pa­ti­vo não jus­ti­fi­ca os atra­sos e afir­mam que ela é lim­i­ta­da, existin­do diver­sas fas­es do pro­je­to definidas exclu­si­va­mente pela Fun­dação Ren­o­va. “O primeiro pra­zo era 2018, o segun­do, 2019, e nós já esta­mos em 2023. E ago­ra que está entre­gan­do qua­tro chaves. Temos nesse proces­so muitas vio­lações de dire­itos”, diz Rodri­go.

Mudança

Os atingi­dos fiz­er­am em 2016 um pacto cole­ti­vo para que todos se mudassem jun­tos, ape­nas quan­do as obras estiverem 100% con­cluí­das. No entan­to, Môni­ca dos San­tos, inte­grante da Comis­são de Atingi­dos de Ben­to Rodrigues, crit­i­ca a inex­istên­cia de uma pre­visão sól­i­da para a entre­ga de todas as casas e con­sid­era que a Fun­dação Ren­o­va criou uma situ­ação onde não é mais pos­sív­el a manutenção do acor­do.

Novo distrito de Bento Rodrigues, Mariana, Minas Gerais.
Repro­dução: Novo dis­tri­to de Ben­to Rodrigues, Mar­i­ana, Minas Gerais. — Tânia Rêgo/Agência Brasil

“A pro­pa­gan­da que ela faz é gigan­tesca. E o tem­po que a gente está nes­sa espera é angus­tiante. Eu fico muito feliz pelas famílias que rece­ber­am a chave. E, ao mes­mo tem­po, é um momen­to de tris­teza pelas pes­soas que não pud­er­am se mudar. Ness­es quase oito anos, 52 pes­soas da comu­nidade fale­ce­r­am. E a gente fica com esse medo. Quem será o próx­i­mo? Será que eu vou con­seguir ver a con­clusão da min­ha casa? Será que eu vou ter o gostin­ho de mudar para min­ha casa? Então é muito com­pli­ca­do hoje falar em esper­ar para que todos se mudem”, diz ela.

No fim do ano pas­sa­do, a Fun­dação Ren­o­va anun­ciou que estaria pronta para realizar a mudança dos primeiros moradores em janeiro deste ano. Segun­do a enti­dade, os equipa­men­tos públi­cos já estavam con­cluí­dos. A últi­ma estru­tu­ra final­iza­da foi a Estação de Trata­men­to de Esgo­to. Até o iní­cio das aulas na esco­la, já havia pre­visão: fevereiro de 2023. A entre­ga das primeiras chaves ape­nas em abril é, para Môni­ca dos San­tos, mais um capí­tu­lo da lentidão dos tra­bal­hos. Ela con­ta que se sente retal­i­a­da por criticar a atu­ação da enti­dade.

“Essas primeiras famílias vão se mudar para um can­teiro de obras. Porque a Fun­dação Ren­o­va não tem a mes­ma trata­ti­va com todos, não dá isono­mia no trata­men­to. Até a pre­sente data, a min­ha família não tem o pro­je­to sequer final­iza­do. Não é porque eu não quis ter­mi­nar. E não há pre­visão. Ninguém sabe quan­do a Fun­dação Ren­o­va vai se sen­tar com as famílias que ain­da não têm pro­je­to ou ter­reno”.

Edição: Graça Adju­to

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