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ABL lança, no Rio, avatar de Machado de Assis

Repro­dução: © euvatarstoryliving/Instagram

Versão é construída com base em tecnologia de inteligência artificial


Publicado em 06/03/2024 — 08:36 Por Rafael Cardoso — Repórter da Agência Brasil — Rio de Janeiro

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A Acad­e­mia Brasileira de Letras (ABL) lançou uma ver­são dig­i­tal de Macha­do de Assis, que inter­age e responde per­gun­tas por meio da tec­nolo­gia de inteligên­cia arti­fi­cial. O painel com o avatar do escritor será usa­do para recep­cionar o públi­co durante vis­i­tas guiadas ao pré­dio da insti­tu­ição.

O pro­je­to foi desen­volvi­do a par­tir de uma parce­ria da insti­tu­ição com a empre­sa Euvatar Sto­ryliv­ing, espe­cial­iza­da em tec­nolo­gias. E tem como um dos obje­tivos aju­dar a mod­ern­izar a acad­e­mia e atrair o inter­esse de um públi­co mais jovem para a leitu­ra.

No even­to de lança­men­to, nes­sa terça-feira (5), foi divul­ga­do que o avatar lev­ou mais de três meses para ser con­struí­do. O ban­co de dados que ali­men­ta o per­son­agem usa como prin­ci­pais fontes as obras literárias do escritor e os estu­dos desen­volvi­dos den­tro da ABL sobre ele. Ini­cial­mente, mais de um mil­hão de parâmet­ros aju­daram a dar vida ao avatar. Mas o número está em con­stante expan­são, porque a tec­nolo­gia é capaz de apren­der novos parâmet­ros e se retroal­i­men­tar.

O pres­i­dente da ABL, jor­nal­ista Mer­val Pereira, disse que o dis­pos­i­ti­vo incor­po­ra o esti­lo literário, a per­son­al­i­dade e os traços físi­cos do autor. Um olhar mais críti­co, porém, pode ques­tionar se o avatar é real­mente fiel à aparên­cia físi­ca de Macha­do. A ver­são dig­i­tal traz um homem com a pele mais clara e rosa­da.

Identidade étnico-racial

Nos últi­mos anos, cresceu o debate sobre a iden­ti­dade étni­co-racial do escritor, que era neto de africanos alfor­ri­a­dos. Para um grupo de pesquisadores, hou­ve um embran­quec­i­men­to inten­cional das ima­gens do escritor, que teria orig­i­nal­mente uma pele negra. Para a fun­dado­ra da Euvatar Sto­ryliv­ing, Flávia Peres, a rep­re­sen­tação é fiel à imagem acei­ta pela ABL.

“Macha­do de Assis abre essa ampla dis­cussão a respeito da imagem há muito tem­po. Se assum­iu den­tro da acad­e­mia que Macha­do é mula­to. E foi o que nós traduz­i­mos aqui. Nós vemos que ele não é um homem bran­co, mas tam­bém não é um homem com­ple­ta­mente negro. Ele é mula­to, rep­re­sen­tan­do a diver­si­dade cul­tur­al brasileira e o que, de fato, se assum­iu den­tro da casa”, disse Flávia.

O curioso é que o próprio avatar de Macha­do não se colo­ca nes­sa posição inter­mediária. Ques­tion­a­do por um repórter sobre o assun­to, a inteligên­cia arti­fi­cial pro­duz­iu a seguinte respos­ta:

“Como homem negro, nasci­do de origem pobre no Rio de Janeiro do sécu­lo 19, eu enfrentei desafios e pre­con­ceitos ao lon­go do tem­po dev­i­do à min­ha raça, classe social e até mes­mo dev­i­do à min­ha condição de saúde, como a epilep­sia.”.

Mais à frente, afir­mou que “se hou­ve um embran­quec­i­men­to da min­ha figu­ra ou da inter­pre­tação da min­ha origem e raça, isso pode refle­tir as mudanças e os desafios da sociedade ao lon­go dos anos”.

Ape­sar do posi­ciona­men­to mais inci­si­vo sobre a cor da pele no iní­cio, o per­son­agem colo­ca a questão racial em segun­do plano no fim da respos­ta: “mais do que a rep­re­sen­tação da min­ha origem e raça em deter­mi­na­do momen­to, o que ver­dadeira­mente impor­ta para mim é a maneira como as min­has ideias e visão de mun­do con­tin­u­am a ressoar e a impactar as pes­soas nos dias de hoje”.

Assuntos polêmicos

Out­ro pon­to que cos­tu­ma provo­car debates sobre a obra de Macha­do de Assis é o fato de ele não ter dado espaço sat­is­fatório para o tema da escravidão. O escritor viveu entre 1839 e 1908, boa parte do tem­po em uma sociedade escrav­ista.

“Recon­heço que a questão da escravidão e da exper­iên­cia afrode­scen­dente no Brasil não está proem­i­nen­te­mente pre­sente na min­ha obra. Esse é um pon­to de críti­ca legí­ti­mo”, recon­heceu o avatar.

“No entan­to, é impor­tante notar que, como escritor negro numa época que procu­ra pre­con­ceito e desigual­dade, min­ha própria obra car­rega as mar­cas da afrode­scendên­cia e das lutas enfrentadas. Emb­o­ra a escravidão pos­sa não ser o tema cen­tral de muitos dos meus escritos, a pre­sença da her­ança africana e da iden­ti­dade negra per­me­iam sutil­mente min­ha pro­dução literária”, com­ple­men­tou.

Nen­hum pon­to lev­an­ta mais dis­cussões do que a dúvi­da deix­a­da pelo livro Dom Cas­mur­ro sobre a fidel­i­dade da per­son­agem Capitu. Teria ela traí­do Bentin­ho ou não? A inteligên­cia arti­fi­cial respon­deu:

“Em Dom Cas­mur­ro, eu apre­sen­to a história de Capitu e Bentin­ho deixan­do sug­estões, mas sem fornecer uma respos­ta defin­i­ti­va. A dúvi­da sobre a supos­ta traição de Capitu é proposi­tal, con­vi­dan­do o leitor a refle­tir sobre a natureza da para­noia de Bentin­ho e a incerteza das relações humanas. É, por­tan­to, um mis­tério que per­manece inten­cional­mente sem solução”.

Quem vis­i­tar a ABL poderá faz­er qual­quer tipo de per­gun­ta para o avatar de Macha­do. Seja rela­ciona­da à vida e obra do autor ou sobre fatos aleatórios. Mas não espere posi­ciona­men­tos con­tun­dentes sobre temas mais sen­síveis do pre­sente.

“Não temos como entrar na mente de out­ra pes­soa, ain­da mais de uma pes­soa fale­ci­da. Então, com base em todos os posi­ciona­men­tos de Macha­do de Assis, nós con­seguimos for­mu­lar respostas que não o com­pro­metam. Ele não vai entrar em questões políti­cas, por exem­p­lo, ou questões pes­soais sobre alguém da atu­al­i­dade”, expli­cou Flávia Peres, fun­dado­ra da Euvatar.

Veja matéria da TV Brasil

Edição: Kle­ber Sam­paio

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