...
domingo ,13 outubro 2024
Home / Noticias / “Acesso à moradia é uma dimensão do direito à cidade”, diz urbanista

“Acesso à moradia é uma dimensão do direito à cidade”, diz urbanista

Repro­dução: © Tomaz Silva/Agência Brasil

Cuidar da habitação é atribuição de quem será eleito em 6 de outubro


Publicado em 19/09/2024 — 08:13 Por Bruno de Freitas Moura — Repórter da Agência Brasil — Rio de Janeiro

ouvir:

banner sua cidade seus direitos

 

No primeiro domin­go de out­ubro (6), mais de 155,9 mil­hões de eleitores vão às urnas em 5.569 cidades para escol­her prefeitos e vereadores. Os rep­re­sen­tantes eleitos, sejam eles para o Exec­u­ti­vo ou o Leg­isla­ti­vo munic­i­pal, têm impor­tantes e especí­fi­cas atribuições rela­cionadas ao dire­ito à mora­dia.

Para enten­der as respon­s­abil­i­dades de prefeituras e câmaras munic­i­pais rela­cionadas à questão da habitação, a Agên­cia Brasil con­ver­sou com a espe­cial­ista em urban­is­mo Paula Menezes Salles de Miran­da, pro­fes­so­ra no Depar­ta­men­to de Arquite­tu­ra e Urban­is­mo da Esco­la Supe­ri­or de Desen­ho Indus­tri­al (Esdi) da Uni­ver­si­dade do Esta­do do Rio de Janeiro (Uerj).

Rio de Janeiro (RJ) 17/09/2024 – A pesquisadora de urbanismo Paula Menezes Salles de Miranda fala sobre direito à habitação no contexto das Eleições Municipais de 2024. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Repro­dução: Pro­fes­so­ra Paula Menezes Salles de Miran­da é espe­cial­ista em urban­is­mo  — Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

Grad­u­a­da em arquite­tu­ra e urban­is­mo pela Uni­ver­si­dade Fed­er­al do Rio de Janeiro (UFRJ) com inter­câm­bio na École Nacional Supérieure d’Architecture de Ver­sailles, na França. Paula Miran­da é mestre em urban­is­mo pela UFRJ, na qual desen­volveu pesquisa sobre proces­sos de auto­gestão habita­cional no Rio de Janeiro.

A pro­fes­so­ra defende que os entes munic­i­pais sejam altivos na bus­ca pelo dire­ito à mora­dia da pop­u­lação, com olhar espe­cial aos gru­pos mais vul­ner­a­bi­liza­dos da sociedade.

Ela falou sobre a importân­cia da elab­o­ração de planos dire­tores (dire­triz de como a cidade deve ser ocu­pa­da – aprova­da pelos vereadores), a cri­ação e o desen­volvi­men­to de áreas espe­ci­ais de inter­esse social e sobre o com­bate à espec­u­lação imo­bil­iária – a práti­ca de com­prar imóveis e ter­renos com a expec­ta­ti­va prin­ci­pal de revendê-los com lucro, sem uso social.

Acom­pan­he os prin­ci­pais tre­chos da entre­vista:

Agên­cia Brasil: Qual a respon­s­abil­i­dade do poder munic­i­pal – prefeituras e câmaras de vereadores – em relação ao dire­ito à mora­dia. Quais ações ess­es entes devem pro­por, garan­tir e artic­u­lar?
Paula Menezes de Miran­da: O dire­ito à mora­dia é uma dimen­são do dire­ito à cidade e é essen­cial uma atu­ação do municí­pio para garan­tia desse dire­ito. Pre­cisamos enten­der que o dire­ito à mora­dia vai além do provi­men­to da habitação, inclui, den­tre out­ras, a qual­i­dade na condição de mora­dia, o aces­so ao sanea­men­to bási­co e a uma local­iza­ção de qual­i­dade com infraestru­tu­ra, disponi­bil­i­dade de empre­gos, serviços, espaços de laz­er e cul­tura.

A prefeitu­ra tem respon­s­abil­i­dades que cam­in­ham para a garan­tia desse dire­ito, como o desen­volvi­men­to e a apli­cação de leg­is­lação urbanís­ti­ca que pro­mo­va o aces­so à mora­dia ade­qua­da.

O desen­volvi­men­to de plano dire­tor que inclua mecan­is­mos que ampliem o aces­so à ter­ra urban­iza­da e aos serviços urbanos e de um Plano Munic­i­pal de Habitação que con­tem­ple pro­gra­mas volta­dos para a pop­u­lação de baixa ren­da, de diver­sas faixas salari­ais, que apre­sen­tam vul­ner­a­bil­i­dades, inclu­sive para a pop­u­lação em situ­ação de rua.

A par­tir do Plano Munic­i­pal de Habitação, deve-se pro­mover políti­cas públi­cas e pro­gra­mas habita­cionais volta­dos para a urban­iza­ção de fave­las, con­strução de con­jun­tos habita­cionais, aluguel social, ade­quação de edifí­cios públi­cos ociosos para habitação social, reg­u­lar­iza­ção fundiária e asses­so­ria téc­ni­ca para mel­ho­rias habita­cionais.

A prefeitu­ra tam­bém tem o papel de artic­u­lar com o gov­er­no do esta­do e o gov­er­no fed­er­al para real­iza­ção de pro­gra­mas habita­cionais estad­u­ais e munic­i­pais no municí­pio em questão. Além dis­so, é essen­cial pro­mover a par­tic­i­pação social da pop­u­lação nas decisões munic­i­pais.

Rio de Janeiro (RJ), 22/02/2023 - Complexo do Alemão, zona norte da cidade. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Repro­dução: Com­plexo do Alemão, zona norte da cidade do Rio de Janeiro — Tânia Rêgo/Agência Brasil

 

Agên­cia Brasil: O que planos dire­tores (o Estatu­to da Cidade obri­ga todos os municí­pios com mais de 20 mil habi­tantes a ter) devem levar em con­sid­er­ação para per­mi­tir a garan­tia do dire­ito à mora­dia?
Paula Menezes de Miran­da: Os planos dire­tores cam­in­ham para a garan­tia do dire­ito à mora­dia pre­ven­do a ampli­ação do aces­so à ter­ra urban­iza­da e aos serviços urbanos, e de uma gestão democráti­ca e par­tic­i­pa­ti­va.

Algu­mas ações e inves­ti­men­tos que podem con­tribuir para esse obje­ti­vo são: 1) definição de áreas de Espe­cial Inter­esse Social (Aeis); 2) pre­v­er algu­mas dire­trizes como: des­ti­nação ter­renos públi­cos e imóveis não uti­liza­dos ou subu­ti­liza­dos, situ­a­dos em áreas dotadas de infraestru­tu­ra para habitação de inter­esse social; imple­men­tação de pro­gra­ma de aluguel social; 3) cri­ar fun­do de habitação social para arrecadar recur­sos para esse fim; 4) é pos­sív­el cri­ar cota de sol­i­dariedade: empreendi­men­tos que exced­erem área com­putáv­el de con­strução dev­erão doar área con­struí­da para habitação social; 5) indi­cação para cri­ação de Plano Munic­i­pal de Habitação para atin­gir as dire­trizes pre­vis­tas no plano dire­tor.

Agên­cia Brasil: O que são e qual a importân­cia das Aeis, tam­bém con­heci­das como zonas espe­ci­ais de Inter­esse Social (Zeis)?
Paula Menezes de Miran­da: As Aeis/Zeis vão ser definidas no plano dire­tor de cada municí­pio, mas em ger­al são áreas demar­cadas na cidade onde estão local­izadas fave­las ou comu­nidades urbanas, na qual o municí­pio poderá ado­tar difer­entes exigên­cias urbanís­ti­cas e de infraestru­tu­ra, com o obje­ti­vo de via­bi­lizar soluções habita­cionais de inter­esse social, pro­je­tos urbanís­ti­cos e de infraestru­tu­ra, reg­u­lar­iza­ção fundiária, recu­per­ação ambi­en­tal, cri­ação de equipa­men­tos cul­tur­ais, soci­ais, de saúde e serviços locais.

A cri­ação destas áreas no plane­ja­men­to da cidade pode con­tribuir para asse­gu­rar a per­manên­cia dos moradores no local, difi­cul­tan­do a apro­pri­ação destas porções do ter­ritório por agentes de inter­ess­es de mer­ca­do.

Além dis­so, podem cam­in­har para a garan­tia de mora­dia digna para as pes­soas a par­tir da orga­ni­za­ção de dire­trizes para pro­mover mel­ho­rias no ter­ritório. Entre­tan­to, é impor­tante salien­tar que a cri­ação destas áreas, por si só, não garante mora­dia digna e segu­rança de per­manên­cia dos moradores, sendo necessária uma artic­u­lação com pro­gra­mas munic­i­pais de reg­u­lar­iza­ção fundiária, além de pro­gra­mas para exe­cução de mel­ho­rias urbanas, infraestru­turas, novas habitações e asses­so­ria téc­ni­ca para refor­mas de habitações exis­tentes.

Rio de Janeiro (RJ) 26/03/2024 – Grades de proteção na encosta do Morro do Andaraí, atendido pelo programa Favela Bairro, que completa 30 anos. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Repro­dução: Mor­ro do Andaraí, na zona norte da cap­i­tal flu­mi­nense — Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

 

Agên­cia Brasil: Como a reg­u­lar­iza­ção fundiária con­tribui para garan­tir o dire­ito à mora­dia?
Paula Menezes de Miran­da: A reg­u­lar­iza­ção fundiária, que é reg­u­la­men­ta­da pela Lei Fed­er­al 13.465/17, tem como obje­ti­vo inte­grar núcleos urbanos infor­mais ao con­tex­to legal das cidades. É fei­ta a par­tir de medi­das jurídi­cas, urbanís­ti­cas, ambi­en­tais e soci­ais e pode con­tribuir para o dire­ito à mora­dia a par­tir de alguns fatores.

A par­tir da reg­u­lar­iza­ção fundiária, o morador adquire a tit­u­lar­i­dade for­mal, amplian­do a segu­rança jurídi­ca de per­manên­cia no local. Além dis­so, pode ser um proces­so de mel­ho­ria de qual­i­dade de vida para a pop­u­lação da local­i­dade, por ser necessária a urban­iza­ção da área a par­tir de obras de infraestru­tu­ra, ofer­ec­i­men­to de mel­ho­rias nas condições de mora­dia, das questões ambi­en­tais e de serviços públi­cos.

É impor­tante que a reg­u­lar­iza­ção fundiária este­ja integra­da com políti­cas públi­cas que lim­item o avanço do mer­ca­do imo­bil­iário e aumen­to dos preços da área, para não ger­ar a expul­são dos moradores do local.

Agên­cia Brasil: Como os entes munic­i­pais devem se com­por­tar em relação à espec­u­lação imo­bil­iária?
Paula Menezes de Miran­da: O plane­ja­men­to urbano do municí­pio deve dire­cionar instru­men­tos que con­tribuam para frear a espec­u­lação imo­bil­iária, assim como a gestão públi­ca deve atu­ar na exe­cução destes instru­men­tos.

Um pon­to impor­tante é des­ti­nar ter­renos munic­i­pais para inter­ess­es públi­cos e/ou cole­tivos, prin­ci­pal­mente em lugares já com infraestru­turas. Infe­liz­mente, o que vemos em muitas cidades é a ven­da de ter­renos públi­cos para o setor pri­va­do, con­tribuin­do para a espec­u­lação imo­bil­iária.

As Zeis/ Aeis, se bem apli­cadas, podem rep­re­sen­tar um freio à pressão do mer­ca­do e à gen­tri­fi­cação [val­oriza­ção acen­tu­a­da de deter­mi­na­da área, que se reflete na saí­da de moradores anti­gos], pois difi­cul­tam os agentes pri­va­dos aces­sarem os ter­renos destas áreas.

O IPTU pro­gres­si­vo [aumen­to grada­ti­vo da alíquo­ta] no tem­po pode ser um instru­men­to que cam­in­ha nes­ta direção. O poder públi­co pode noti­ficar o pro­pri­etário para apre­sen­tar pro­je­to de edi­fi­cação no ter­reno ou de ocu­pação de con­strução ociosa. Não cumpri­da a obri­gação, pode ser cobra­do o IPTU pro­gres­si­vo até o cumpri­men­to.

Edição: Juliana Andrade

LOGO AG BRASIL

Você pode Gostar de:

Central de atendimento telefônico do INSS não funciona neste sábado

Feriado nacional suspende atendimento pelo canal 135 Agên­cia Brasil Pub­li­ca­do em 12/10/2024 — 08:33 Brasília …