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Agência Brasil explica: o que é teto de gastos

Repro­dução: © José Cruz/Agência Brasil

Criado em 2016, mecanismo limita despesas por 20 anos


Pub­li­ca­do em 05/12/2022 — 08:06 Por Well­ton Máx­i­mo – Repórter da Agên­cia Brasil — Brasília

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No mês seguinte às eleições pres­i­den­ci­ais, uma expressão tem ocu­pa­do lugar cen­tral no debate públi­co. A fim de encon­trar espaço para man­ter em R$ 600 o val­or mín­i­mo do Bol­sa Família e recom­por a ver­ba de diver­sos pro­gra­mas no Orça­men­to de 2023, o gov­er­no eleito quer uma pro­pos­ta de emen­da à Con­sti­tu­ição (PEC) que per­mi­tiria extrap­o­lar o teto de gas­tos em até R$ 198 bil­hões nos próx­i­mos qua­tro anos.

A pro­pos­ta tem provo­ca­do tur­bulên­cias no mer­ca­do finan­ceiro nos últi­mos dias, porque parte dos investi­dores teme o descon­t­role dos gas­tos públi­cos. Isso ape­sar de a lim­i­tação de despe­sas ter sido diver­sas vezes estoura­da nos últi­mos anos. O gov­er­no terá dire­ito a gas­tar R$ 1,259 tril­hão neste ano e R$ 1,8 tril­hão no próx­i­mo. Afi­nal, o que é o teto de gas­tos?

Cri­a­do por emen­da con­sti­tu­cional no fim de 2016, o teto fed­er­al de gas­tos é uma das três regras fis­cais a que o gov­er­no tem de obe­de­cer. As out­ras são a meta de resul­ta­do primário (déficit ou superávit), fix­a­da na Lei de Dire­trizes Orça­men­tárias de cada ano, e a regra de ouro, insti­tuí­da pelo Arti­go 167 da Con­sti­tu­ição e que obri­ga o gov­er­no a pedir, em alguns casos, autor­iza­ção ao Con­gres­so para emi­tir títu­los da dívi­da públi­ca.

Con­sid­er­a­do uma das prin­ci­pais ânco­ras fis­cais do país, o teto de gas­tos tem como obje­ti­vo impedir o descon­t­role das con­tas públi­cas. A adoção desse mecan­is­mo gan­hou força após a crise na Gré­cia, no iní­cio da déca­da pas­sa­da.

No caso do Brasil, o teto esta­b­elece lim­ite de cresci­men­to dos gas­tos do gov­er­no fed­er­al em 20 anos, de 2017 a 2036. O total gas­to pela União em 2016 pas­sou a ser cor­rigi­do pela inflação ofi­cial, o Índice de Preços ao Con­sum­i­dor Amp­lo (IPCA), ano a ano, nos dez primeiros anos, de 2017 a 2026.

No fim de 2021, a fór­mu­la de cál­cu­lo sofreu uma mudança. Até o ano pas­sa­do, o teto era cor­rigi­do pelo IPCA acu­mu­la­do entre jul­ho de dois anos antes e jun­ho do ano ante­ri­or. Uma nova emen­da à Con­sti­tu­ição alter­ou o perío­do de cál­cu­lo e pas­sou a con­sid­er­ar o IPCA efe­ti­vo dos seis primeiros meses do ano e a esti­ma­ti­va ofi­cial do IPCA para os seis meses finais para cor­ri­gir o teto do ano seguinte.

Gatilhos

A emen­da con­sti­tu­cional que intro­duz­iu o teto de gas­tos esta­b­elece uma série de gatil­hos que podem ser aciona­dos caso os gas­tos fed­erais cresçam mais que a inflação. Em tese, ess­es gatil­hos seri­am aciona­dos em três está­gios.

O primeiro proibiria a ampli­ação de quadro de pes­soal e de rea­justes reais (aci­ma da inflação) para servi­dores e lim­i­taria as despe­sas dis­cricionárias (não obri­gatórias) e de custeio admin­is­tra­ti­vo à inflação. O segun­do proibiria rea­justes nom­i­nais a servi­dores e lim­i­taria os gas­tos dis­cricionários e de custeio admin­is­tra­ti­vo ao val­or nom­i­nal empen­hado (autor­iza­do) no ano ante­ri­or.

O ter­ceiro está­gio proibiria rea­justes do salário mín­i­mo aci­ma da inflação e cor­taria em 30% os gas­tos com via­gens, trans­fer­ên­cias e diárias a servi­dores públi­cos, man­ten­do as restrições do segun­do está­gio.

Ess­es gatil­hos seri­am dis­para­dos caso hou­vesse pre­visão no Orça­men­to Ger­al da União de que o teto seria des­cumpri­do. O prob­le­ma, no entan­to, é que o gov­er­no desco­briu que só pode­ria enviar um pro­je­to de lei orça­men­tária com despe­sas fora do teto caso os gas­tos dis­cricionários caíssem a zero, um cenário que jamais seria alcança­do porque invi­a­bi­lizaria o fun­ciona­men­to dos serviços públi­cos.

Para cor­ri­gir o prob­le­ma, a emen­da con­sti­tu­cional que resul­tou no novo mar­co fis­cal, em 2021, per­mi­tiu o envio de orça­men­tos fora do teto de gas­tos quan­do as despe­sas obri­gatórias sujeitas ao teto de gas­tos ultra­pas­sarem 95% das despe­sas totais. A restrição vale tan­to para o Exec­u­ti­vo quan­to para o Leg­isla­ti­vo, Judi­ciário e Min­istério Públi­co. Diver­sos econ­o­mis­tas, no entan­to, dizem que o lim­ite de 95% tam­bém é difí­cil de ser alcança­do e, antes da dis­cussão atu­al sobre o teto, sug­e­ri­am a redução para 85%.

Comparação

A maio­r­ia dos país­es que ado­ta o teto de gas­tos o faz por meio de leis ordinárias ou de planos pluri­an­u­ais, de no máx­i­mo três ou qua­tro anos. Além do Brasil, poucos país­es fixaram a ânco­ra fis­cal na Con­sti­tu­ição, como Dina­mar­ca, Cin­ga­pu­ra e Geór­gia.

Tam­bém difer­ente­mente de out­ros país­es, o teto de gas­tos no Brasil inclui os inves­ti­men­tos (obras públi­cas e com­pras de equipa­men­tos) e não tem válvu­la de escape em momen­tos de recessão ou de crise econômi­ca. No Peru, que ado­ta um teto de gas­tos des­de 1999, a despe­sa não era cor­rigi­da sim­ples­mente pela inflação, poden­do ter cresci­men­to real (aci­ma da inflação) de 2% nos primeiros anos e de 4% a par­tir de 2004.

O teto de gas­tos no país viz­in­ho tam­bém pode­ria ser des­cumpri­do quan­do o cresci­men­to econômi­co fos­se baixo e, em 2012, pas­sou a excluir inves­ti­men­tos, pro­gra­mas soci­ais e gas­tos com segu­rança públi­ca.

Furos

No sis­tema atu­al, o teto pode ser extrap­o­la­do em alguns casos: crédi­tos extra­ordinários (rela­ciona­dos a gas­tos emer­gen­ci­ais), cap­i­tal­iza­ção de estatais não depen­dentes do Tesouro (mecan­is­mo usa­do para san­ear prob­le­mas finan­ceiros ou preparar empre­sas para a pri­va­ti­za­ção), gas­tos da Justiça Eleitoral com eleições e trans­fer­ên­cias obri­gatórias da União para esta­dos e municí­pios.

Nos demais casos, é necessário mod­i­ficar a Con­sti­tu­ição. Ape­sar da atenção em torno da pro­pos­ta atu­al, o teto de gas­tos tem sido ultra­pas­sa­do nos últi­mos anos. Des­de a cri­ação do mecan­is­mo, o lim­ite foi fura­do pelo menos sete vezes, das quais cin­co por meio de emen­das con­sti­tu­cionais.

Em 2019, o gov­er­no pre­cisou aprovar uma emen­da con­sti­tu­cional para reti­rar R$ 46 bil­hões para que a União pudesse dis­tribuir, aos esta­dos e municí­pios, os recur­sos da nova cessão onerosa do petróleo na cama­da pre-sal. Como a trans­fer­ên­cia era vol­un­tária, não obri­gatória, foi necessário cos­tu­rar uma emen­da con­sti­tu­cional com o Con­gres­so. A cap­i­tal­iza­ção da estatal Emge­pron, lig­a­da à Mar­in­ha, para a con­strução de corve­tas (tipo de navio) cus­tou mais R$ 7,6 bil­hões.

Em 2020, o Orça­men­to de Guer­ra para enfrentar a pan­demia de covid-19 foi respon­sáv­el por excluir mais R$ 507,9 bil­hões, segun­do cál­cu­los do econ­o­mista Bráulio Borges, pesquisador do Insti­tu­to Brasileiro de Econo­mia da Fun­dação Getulio Var­gas (FGV-Ibre).

Em 2021, a emen­da con­sti­tu­cional do novo mar­co fis­cal per­mi­tiu um furo de mais R$ 44 bil­hões para finan­ciar o paga­men­to da segun­da roda­da do auxílio emer­gen­cial, que tin­ha sido ressus­ci­ta­do após a onda das vari­antes gama e delta do novo coro­n­avírus. Novos gas­tos com crédi­tos extra­ordinários para o enfrenta­men­to da pan­demia ele­varam para R$ 117,2 bil­hões o val­or excluí­do do teto no ano pas­sa­do.

Tam­bém no fim do ano pas­sa­do, a emen­da que mudou a fór­mu­la de cor­reção do teto liber­ou mais R$ 64,9 bil­hões e a emen­da que per­mi­tiu o parce­la­men­to de pre­catórios (dívi­das recon­heci­das pela Justiça) de grande val­or liber­ou mais R$ 43,56 bil­hões. O impacto para o Orça­men­to de 2022 está esti­ma­do em R$ 108,2 bil­hões.

Por fim, em jul­ho deste ano, a emen­da con­sti­tu­cional que ampliou o val­or mín­i­mo do Auxílio Brasil para R$ 600 e criou os auxílios Cam­in­honeiro e Taxista foi respon­sáv­el por reti­rar mais R$ 41,25 bil­hões do teto.

Edição: Graça Adju­to

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