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Ativistas promovem atos em defesa da democracia brasileira

Repo­dução: © Foto José Cruz/ Agên­cia Brasil

Participantes chamam a atenção para crise no Oriente Médio


Publicado em 23/03/2024 — 17:42 Por Luciano Nascimento — Repórter da Agência Brasil — São Luís

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Movi­men­tos soci­ais, estu­dantes, sindi­cal­is­tas e ativis­tas ocu­param as ruas de várias cidades do país neste sába­do (23) para realizar ato em defe­sa da democ­ra­cia, do dire­ito à memória e justiça e con­tra o golpis­mo.

As man­i­fes­tações ocor­reram fal­tan­do pouco mais de uma sem­ana do aniver­sário de 60 anos do golpe civ­il-mil­i­tar de 1964, no dia 31 de março. Hoje, os man­i­fes­tantes ressaltaram a importân­cia de não deixar cair no esquec­i­men­to os chama­dos anos de chum­bo, perío­do da ditadu­ra de 1964 a 1985.

Em São Luís, no Maran­hão, a man­i­fes­tação foi mar­ca­da para às 9h, na praça Deodoro, no cen­tro da cidade. Na sequên­cia, os par­tic­i­pantes realizaram uma assem­bleia pop­u­lar onde reforçaram a importân­cia de se punir os par­tic­i­pantes e orga­ni­zadores dos atos golpis­tas do 8 de janeiro de 2023. Eles criticaram ain­da a decisão do gov­er­no de não pro­mover ações sobre o perío­do da ditadu­ra.

“Esse ato sim­boliza a neces­si­dade, que é uma neces­si­dade con­tínua do não esquec­i­men­to, sobre­tu­do, do golpe de 64. Há uma deter­mi­nação ou uma ori­en­tação do atu­al coman­do políti­co do país, do próprio gov­er­no Lula, de não se faz­er um ato referi­do ao tema. Mas nós, enquan­to sociedade civ­il, não podemos nos dar ao luxo de não faz­er ato de memória, porque é a democ­ra­cia que vive­mos hoje é algo que cus­tou caro, mas cus­tou muito caro para os que efe­ti­va­mente lutaram para que nós hoje pos­samos usufruir o pouco que temos. Acho que esse ato ele cumpre essa tare­fa de comu­nicar, de diz­er que nós não podemos nos dar ao luxo de esque­cer o que vive­mos, para, inclu­sive, asse­gu­rar que ger­ações futuras ten­ham con­hec­i­men­to das razões do porquê esta­mos aqui hoje”, disse à Agên­cia Brasil, Dani­lo Sere­jo, lid­er­ança quilom­bo­la e inte­grante do Movi­men­to dos Atingi­dos pela Base de Alcân­tara (Mabe).

Para ele, bacharel em Dire­ito pela Uni­ver­si­dade Fed­er­al de Goiás (UFG) e mestre em Ciên­cia Políti­ca pela Uni­ver­si­dade Estad­ual do Maran­hão (UEMA), o ato tam­bém é um reca­do de que deve haver a respon­s­abi­liza­ção dos envolvi­dos nos atos golpis­tas de 8 de janeiro.

“Os atos de 8 de janeiro estão dire­ta­mente conec­ta­dos em razão da história mal resolvi­da que a sociedade brasileira e o Esta­do brasileiro têm com a ditadu­ra. Não ter resolvi­do isso da for­ma como se dev­e­ria ter sido resolvi­do, não ter punido os gen­erais, os mil­itares que atu­aram naque­le momen­to é o que dá sus­ten­tação à ten­ta­ti­va de golpes como essa do 8 de janeiro. Por isso que é muito ruim do pon­to de vista sim­bóli­co a ori­en­tação do gov­er­no brasileiro atu­al de não quer­er faz­er um ato em memória ao golpe de 64”, assi­nalou.

O vice-pres­i­dente da União Nacional dos Estu­dantes (UNE), no Maran­hão, e estu­dante do cur­so de História da Uni­ver­si­dade Fed­er­al do Maran­hão (UFMA), Clark Azú­ca, desta­cou que o gri­to de “ditadu­ra nun­ca mais” é a voz da sociedade em favor dos val­ores democráti­cos, con­tra qual­quer ten­ta­ti­va de retro­ces­so autoritário. Por isso, a neces­si­dade do dire­ito à memória.

“A gente está falan­do hoje, no ato, que é um ato sobre memória, justiça e ver­dade. E a gente pre­cisa lem­brar  que o esteio comum a tudo isso é a não elab­o­ração da memória públi­ca, tan­to para o golpe mil­i­tar que acon­te­ceu no Brasil, que não teve uma elab­o­ração da nos­sa memória enquan­to sociedade”, afir­mou Azú­ca.

“A gente não pode falar em nação sem pen­sar na memória da gente. A memória é con­sti­tu­ti­va, his­tori­ca­mente, do etos [cos­tumes] da gente. Então, a gente tem uma orga­ni­za­ção social em que, sim­ples­mente, se tor­na tabu falar sobre a ditadu­ra mil­i­tar, um proces­so tão traumáti­co para toda a sociedade, mas espe­cial­mente para o povo. A gente está real­mente com uma iden­ti­dade que é fal­tosa de uma parte con­sti­tu­ti­va da gente, como se fos­se uma lacu­na, um ele­fante bran­co do qual ninguém fala”, assi­nalou.

Ditadura

Durante o regime autoritário — que durou mais de duas décadas — opos­i­tores foram persegui­dos, tor­tu­ra­dos e mor­tos, a exem­p­lo dos estu­dantes Hon­esti­no Guimarães, então pres­i­dente da UNE, e Edson Luís. Hou­ve cen­sura impos­ta à impren­sa, atingin­do tam­bém a cul­tura. Artis­tas tiver­am suas obras muti­ladas, muitos foram exi­la­dos.

“Um dos primeiros atos da ditadu­ra mil­i­tar foi incen­di­ar a sede da União Nacional dos Estu­dantes (UNE), porque sem­pre foi uma enti­dade que esta­va lutan­do, que nun­ca esteve fora da rua, que nun­ca deixou de estar falan­do. E os estu­dantes têm que estar pre­sentes nis­so, têm que estar pre­sentes na rua, deman­dan­do a nos­sa justiça, deman­dan­do políti­ca para a gente, para a nos­sa juven­tude, deman­dan­do que a gente pos­sa estar sendo rep­re­sen­ta­do. A gente pre­cisa lem­brar dos nos­sos már­tires, a gente pre­cisa lem­brar de Hon­esti­no Guimarães, a gente pre­cisa lem­brar de Edson Luís. Ess­es foram nomes de pes­soas que der­am a vida para que a gente pudesse estar aqui hoje. A gente não pode deixar isso esque­cer, a gente pre­cisa sem­pre deixar nos­sa memória viva”, defend­eu Azú­ca.

O estu­dante ressaltou, ain­da, que difer­ente­mente do final do regime mil­i­tar, onde hou­ve anis­tia dos crimes políti­cos cometi­dos por mil­itares, tem que haver a respon­s­abi­liza­ção dos orga­ni­zadores e par­tic­i­pantes dos atos golpis­tas de 8 de janeiro.

“A gente teve nos­sa sede [da UNE] incen­di­a­da na ditadu­ra mil­i­tar, nós fomos crim­i­nal­iza­dos, teve gente pre­sa e tor­tu­ra­da e isso não pode ser esque­ci­do, isso faz parte de quem somos, isso faz parte de quem somos enquan­to União Nacional de Estu­dantes, faz parte enquan­to juven­tude, isso faz parte da nos­sa história. Por isso que é tão impor­tante para a gente estar ness­es locais falan­do com a pop­u­lação, falan­do com os estu­dantes e levan­do jus­ta­mente para con­hec­i­men­to desse momen­to da nos­sa história, que não pode ser esque­ci­do. É até curioso pen­sar que tem gente que vol­ta a falar sobre a anis­tia e foi isso que não pos­si­bil­i­tou que a gente elab­o­rasse a nos­sa per­da, porque foi um pacto social de silên­cio em relação a todos os des­man­dos que acon­te­ce­r­am”, rela­tou.

“A gente está falan­do sobre a neces­si­dade de que a juven­tude, prin­ci­pal­mente, ten­ha aces­so a essa parte do nos­so pas­sa­do que afe­ta diari­a­mente a gente. A gente veio de um gov­er­no nos anos ante­ri­ores que eram fil­hos e fil­has dessa tru­culên­cia, dessa vio­lên­cia e dess­es absur­dos da ditadu­ra mil­i­tar. Isso voltou para a gente, foi a gente que sofreu ago­ra. Por mais que isso seja um sofri­men­to difer­ente, que ten­ha acon­te­ci­do em tem­pos difer­entes, mas uma coisa está rela­ciona­da a uma out­ra. A gente não pode deixar de rela­cionar isso. E a gente não pode deixar de elab­o­rar essa memória para que, jus­ta­mente, isso não se repi­ta”, final­i­zou Azú­ca.

São Paulo (SP), 23/03/2024 - Mobilização nacional de lutas pela democracia e contra anistia a golpistas, organizada pelas Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, Largo São Francisco. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Repro­dução: Mobi­liza­ção em defe­sa da democ­ra­cia e con­tra anis­tia a golpis­tas movi­men­tou São Paulo e out­ras cidades  Foto: Rove­na Rosa/Agência Brasil

Voz da juventude

A pro­fes­so­ra do Depar­ta­men­to de Soci­olo­gia e Antropolo­gia da Uni­ver­si­dade Fed­er­al do Maran­hão, Arleth Borges, disse que a par­tic­i­pação da juven­tude ness­es espaços é fun­da­men­tal para o impul­sion­a­men­to das lutas pop­u­lares no país.

“É muito sim­bóli­co, muito bom, que os estu­dantes este­jam aqui, porque isso é uma garan­tia de vida, de luta, tan­to no pre­sente quan­to no futuro, e a gente pre­cisa dis­so, porque os desafios colo­ca­dos são imen­sos, não são de ago­ra, [eles são] uma luta tenaz, demor­a­da”, argu­men­tou.

“Esta­mos numa con­jun­tu­ra muito desafi­ante e com­plexa. Mes­mo o pouco que a gente alcançou [após a ditadu­ra mil­i­tar] está sob risco e a gente tem que dar a cen­tral­i­dade da luta de defend­er a democ­ra­cia. Depois que ter­mi­nou a ditadu­ra, eles ficaram enver­gonhados, tiver­am um momen­to de um cer­to acan­hamen­to e, ago­ra, a dire­i­ta está aí, mais extrem­ista do que nun­ca. Às vezes, a gente se ressente de que somos poucos, mas ninguém está aqui com condições facil­i­tadas como as que a gente viu naque­le 8 de janeiro. A nos­sa luta tem uma dig­nidade. Fico con­tente por todo mun­do que está aqui lem­bran­do a asso­ci­ação [do 8 de janeiro] com 1964”, emen­dou.

A pro­fes­so­ra rela­cio­nou, tam­bém, momen­tos históri­cos do país em que hou­ve rup­tura insti­tu­cional quan­do gov­er­nos pro­gres­sis­tas chegaram ao poder, a exem­p­lo do gov­er­no do pres­i­dente João Goulart (foto). Arleth disse ain­da que é fun­da­men­tal para a memória do país a con­strução do Museu de Memória e Dire­itos Humanos, com memórias da ditadu­ra mil­i­tar.

“Os indí­ge­nas e os quilom­bo­las começam a lev­an­tar a cabeça e vem nova­mente a tal da roda-viva, queren­do de novo nos rebaixar, nos agachar. Foi assim quan­do, por exem­p­lo, a gente, como país, que­ria lev­an­tar a cabeça após a ditadu­ra do Esta­do Novo, aí veio o golpe de 64. Aí, a gente esta­va se reer­guen­do, ago­ra de novo, depois da ditadu­ra mil­i­tar, votan­do por par­tido e pres­i­dente de esquer­da no coman­do do país, aí vem nova­mente. Então, é um desafio que é per­ma­nente, mas que só empres­ta grandiosi­dade à nos­sa luta e à nos­sa resistên­cia. 1964 não acabou, é um desafio, é uma pági­na que paira sobre as nos­sas cabeças. É fun­da­men­tal que a gente nun­ca deixe de lem­brar dis­so, pelos que se foram, por nós que esta­mos aqui e pelos out­ros que ain­da virão e nós temos um com­pro­mis­so com o futuro desse país, com a dig­nidade para as nos­sas novas ger­ações”, final­i­zou Arleth.

Palestina

Os atos de hoje — orga­ni­za­dos pelas Frentes Brasil Pop­u­lar e Povo Sem Medo — con­taram com apoio de cen­trais sindi­cais e par­tidos pro­gres­sis­tas e tam­bém chamam atenção para o mas­sacre con­tra o povo palesti­no pro­movi­do por Israel em Gaza.

As autori­dades de Gaza afir­mam que, des­de o iní­cio da guer­ra de Israel com o Hamas, em 7 de out­ubro, 32.142 pes­soas mor­reram na Faixa de Gaza, a maio­r­ia mul­heres e cri­anças. Pelo menos 72 pes­soas mor­reram nas últi­mas 24 horas. Nes­sa sex­ta-feira (22), o Con­sel­ho de Segu­rança da Orga­ni­za­ção das Nações Unidas (ONU) não con­seguiu aprovar uma res­olução que pedia ces­sar-fogo ime­di­a­to em Gaza.

“A gente está aqui falan­do de memória e a gente sabe que pre­cisa saber da história para saber que está acon­te­cen­do um genocí­dio na Palesti­na”, final­i­zou Azú­ca.

Edição: Kle­ber Sam­paio

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