...
sábado ,5 outubro 2024
Home / Direitos Humanos / Ato em Cubatão lembra 40 anos do incêndio da Vila Socó

Ato em Cubatão lembra 40 anos do incêndio da Vila Socó

Repro­dução: © SIND­PETRO-LP/­Di­vul­gação

Oficialmente, tragédia deixou 93 mortos


Pub­li­ca­do em 25/02/2024 — 17:55 Por Eliane Gonçalves– Repórter da Radioagên­cia Nacional — São Paulo

ouvir:

A Comis­são da Ver­dade da OAB de Cubatão (SP) vai pedir para que os nomes das víti­mas do incên­dio da Vila Socó passem a inte­grar a lista de mor­tos e desa­pare­ci­dos políti­cos da ditadu­ra mil­i­tar. O pedi­do vai ser pro­to­co­la­do jun­to à Comis­são Inter­amer­i­cana de Dire­itos Humanos.

A decisão foi anun­ci­a­da neste domin­go (25) em um Ato Ecumêni­co no memo­r­i­al às víti­mas do incên­dio na Vila São José, como foi reba­ti­za­da a comu­nidade.

Há 40 anos, na madru­ga­da de 25 de fevereiro de 1984, um incên­dio provo­ca­do pelo vaza­men­to de gasoli­na de um duto da Petro­brás incen­diou a favela onde moravam cer­ca de 6 mil pes­soas.

Segun­do o rela­to de moradores, o cheiro de gasoli­na começou a ser nota­do na comu­nidade por vol­ta das 11h da man­hã. Mais de doze horas depois, por vol­ta da meia noite, acon­te­ceu a primeira explosão que deu iní­cio ao fogo que se alas­trou por toda a favela, for­ma­da por bar­ra­cos fin­ca­dos em palafi­tas que foram enchar­ca­dos pela gasoli­na que vazou ao lon­go de horas dos dutos que ficavam expos­tos no mangue.

Para  Doji­val Vieira dos San­tos, advo­ga­do, ativista do Cole­ti­vo Cidada­nia Antir­racis­mo e Dire­itos Humanos e que inte­gra a Comis­são da OAB de Cubatão, alguns ele­men­tos jus­ti­fi­cam o recon­hec­i­men­to como víti­mas da ditadu­ra mil­i­tar: o incên­dio acon­te­ceu no final do gov­er­no do últi­mo pres­i­dente mil­i­tar, Joao Bap­tista Figueire­do e Cubatão era uma cidade clas­si­fi­ca­da como Área de Segu­rança Nacional, por­tan­to, admin­istra­da por um prefeito biôni­co indi­ca­do pelo gov­er­no fed­er­al.

Para Doji­val, a tragé­dia pode­ria ter sido evi­ta­da se a prefeitu­ra tivesse aciona­do a Defe­sa Civ­il quan­do havia tem­po de evac­uar os moradores da comu­nidade. Além dis­so, segun­do ele, hou­ve uma oper­ação para impedir as inves­ti­gações, o que ele chama de Oper­ação Abafa:

“Por que que nós falam­os de oper­ação abafa? Primeiro, reduz­iu-se e min­i­mi­zou-se para 93 um número de mortes que o próprio Min­istério Públi­co esti­ma­va entre 508 e 700. Segun­do: esta redução do número de mortes tam­bém reduz­iu o impacto no mer­ca­do para a Petro­brás, tan­to do pon­to de vista nacional quan­to inter­na­cional. Nós esta­mos falan­do de uma estatal gigante como é a Petro­bras, e obvi­a­mente isso tem reflex­os para a empre­sa. Depois, a garan­tia da impunidade dos respon­sáveis. Ninguém jamais foi punido”.

Para Doji­val, o incên­dio da Vila Soco em Cubatão foi uma espé­cie de retra­to do mod­e­lo econômi­co implan­ta­do pela ditadu­ra mil­i­tar:

“Cubatão era e con­tin­ua sendo uma área estratég­i­ca. Fica a 12 quilômet­ros do maior por­to de expor­tação da Améri­ca Lati­na e a 60 quilômet­ros do maior polo finan­ceiro que é São Paulo. Ago­ra, é pos­sív­el insta­lar um par­que indus­tri­al com­plexo, como esse debaixo de uma ser­ra, que é a Ser­ra do Mar, em uma área pan­tanosa, é pos­sív­el? Para eles foi pos­sív­el, sabe por quê? Porque o obje­ti­vo deles era só lucro. E a Vila Socó pro­va isso”.

Entre as pou­cas pes­soas ind­enizadas pelo aci­dente, está Neig­i­la Apare­ci­da Soares da Sil­va. Ela Tin­ha 4 anos e sobre­viveu porque na noite do incên­dio esta­va na casa da avó. Ela e a irmã perder­am a mãe, o pai e o tio. Rece­ber­am uma ind­eniza­ção, em 1985, de 19 mil cruza­dos. Em val­ores atu­ais, segun­do cál­cu­los apre­sen­ta­dos por Doji­val, o equiv­a­lente a cer­da de R$ 7 mil.  Para Neig­i­la, a justiça ain­da não chegou:

“A gente ficou saben­do que a gente teria dire­ito a uma pen­são vitalí­cia. A gente nun­ca rece­beu nen­hum tipo de aju­da. Nen­hum tipo de respal­do. Nun­ca recebe­mos nen­hum tipo de pen­são. Nem do gov­er­no, nem da prefeitu­ra, nem de ninguém. Nun­ca fomos procu­ra­dos por nada. Pagaram a ind­eniza­ção e acham que tá tudo ok. Eu acho que ain­da há uma justiça a ser fei­ta. Mes­mo pas­sa­dos 40 anos, eu acho que a justiça ain­da vai chegar.”

Abandono

O ato que cele­brou a memória das víti­mas foi orga­ni­za­do pela OAB de Cubatão e a Asso­ci­ação de Moradores da Vila São Jose. César da Sil­va Nasci­men­to, Secretário de Gov­er­no da Prefeitu­ra, par­ticipou da cer­imô­nia. Ques­tion­a­do porque a gestão munic­i­pal não apoiou a hom­e­nagem, disse que a decisão foi deixar a tare­fa para a sociedade civ­il.

Na sem­ana pas­sa­da, a prefeitu­ra fez a manutenção do pequeno memo­r­i­al insta­l­a­do na comu­nidade para lem­brar o incên­dio que é um dos maiores da história do país. Mas nem mes­mo a pla­ca com os nomes das 93 víti­mas iden­ti­fi­cadas per­manece no local.

“Havia uma pla­ca de bronze foi fur­ta­da. Colo­camos uma pla­ca de plás­ti­co. Mas tam­bém foi van­dal­iza­da. Tan­to que hoje o pen­sa­men­to do municí­pio é tirar esse mon­u­men­to daqui e levar para a praça, lá para frente. Para faz­er um mon­u­men­to mais hon­roso que fique a vista de todos” expli­cou César

O mon­u­men­to fica em um ter­reno bal­dio entre a Rodovia Anchi­eta e a lin­ha de trem. A Petro­brás não par­ticipou da cer­imô­nia. Ques­tion­a­da sobre a respon­s­abil­i­dade da empre­sa pela tragé­dia da Vila Socó, não hou­ve retorno.

Edição: Denise Griesinger

LOGO AG BRASIL

Você pode Gostar de:

Parada LGBT+ Rio: organizadores planejam iniciativas sustentáveis

Evento no dia 24 de novembro deve se transformar em Parada Verde Rafael Car­doso — …