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Atos públicos em todo o país marcam 29ª edição do Grito dos Excluídos

Repro­dução: © Léo Rodrigues/Agência Brasil/Arquivo

Tema este ano é Você tem fome e sede de quê?


Pub­li­ca­do em 06/09/2023 — 08:07 Por Luciano Nasci­men­to — Repórter da Agên­cia Brasil — Brasília

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Com atos públi­cos, man­i­fes­tações e cam­in­hadas, a 29ª edição do Gri­to dos Excluí­dos e Excluí­das toma as ruas de 26 esta­dos para pro­por uma reflexão sobre a garan­tia de vida digna para os seg­men­tos da pop­u­lação mar­gin­al­iza­dos. Este ano o gri­to traz o tema Você tem fome e sede de quê?, chaman­do a atenção para o prob­le­ma, que voltou a atin­gir grande parcela da pop­u­lação brasileira. Relatório divul­ga­do em jul­ho pela Orga­ni­za­ção das Nações Unidas para Ali­men­tação e Agri­cul­tura (FAO) con­fir­mou a pio­ra dos indi­cadores de fome e inse­gu­rança ali­men­tar no Brasil no ano pas­sa­do.

Segun­do a FAO, em 2022, 70,3 mil­hões de pes­soas estiver­am em esta­do de inse­gu­rança ali­men­tar mod­er­a­da, que é quan­do têm difi­cul­dade para se ali­men­tar. O lev­an­ta­men­to tam­bém mostra que 21,1 mil­hões de pes­soas no país pas­saram por inse­gu­rança ali­men­tar grave, car­ac­ter­i­za­da por esta­do de fome.

A maio­r­ia das ações ocor­rem na sem­ana do 7 de Setem­bro, com o obje­ti­vo de mobi­lizar as pes­soas para a luta por seus dire­itos, na denún­cia das injustiças e vio­lên­cias, val­orizan­do a vida e na bus­ca de um mun­do com justiça social.

“O gri­to é essa opor­tu­nidade para refle­tir­mos e para diz­er que quer­e­mos cam­in­har jun­tos e jun­tas com vida e dig­nidade. Ali­men­tar a esper­ança de um mun­do mel­hor, de uma sociedade mais jus­ta e mais fra­ter­na. E esse mun­do será con­cretiza­do, na medi­da em que as orga­ni­za­ções, jun­ta­mente com aque­les e aque­las que têm seus dire­itos nega­dos, pos­sam ser sujeitos dessa sociedade”, disse em entre­vista segun­da-feira (4) o bis­po de Bre­jo (MA) e pres­i­dente da Comis­são Epis­co­pal Pas­toral para Ação Socio­trans­for­mado­ra da Con­fer­ên­cia Nacional dos Bis­pos do Brasil (CNBB) dom José Valde­ci San­tos Mendes.

Ele lem­brou que o Gri­to sem­pre dialo­ga com o tema da Cam­pan­ha da Frater­nidade, da CNBB, que este ano tem o lema “Dai-lhes vós mes­mos de com­er”. O tema abor­da a neces­si­dade de ações em bus­ca de alter­na­ti­vas para a difi­cul­dade de aces­so aos ali­men­tos e à água, bem como chama a atenção para a neces­si­dade de maior par­tic­i­pação pop­u­lar e con­strução cole­ti­va em bus­ca de soluções para os difer­entes tipos de prob­le­mas que atingem a parcela mais vul­neráv­el da pop­u­lação.

Uma das vozes excluí­das que bus­cam ser ouvi­das é a da raizeira e arte edu­cado­ra Rosi­lene de Jesus San­tos, a Negah Rosi, uma das pes­soas atingi­das pelas fortes chu­vas que atin­gi­ram o litoral norte de São Paulo, espe­cialm­rente o municí­pio de São Sebastião. As chu­vas deixaram 64 mor­tos no municí­pio e, segun­do Negah Rose, afe­taram dire­ta e indi­re­ta­mente mais de 4 mil pes­soas. Morado­ra há 32 anos da Bar­ra do Sahy, uma das áreas mais atingi­das, ela rela­ta que após a tragé­dia, os moradores estão lutan­do por mora­dia digna, sanea­men­to e aces­so à água potáv­el

São Sebastião (SP), 22/02/2023, Casas destruídas em deslizamentos na Barra do Sahy após tempestades no litoral norte de São Paulo.
Repro­dução: São Sebastião (SP), 22/02/2023, Casas destruí­das em desliza­men­tos na Bar­ra do Sahy após tem­pes­tades no litoral norte de São Paulo. — Rove­na Rosa/Agência Brasil

“Moro aqui há uns 32 anos e nun­ca pen­sei em pas­sar o que a gente enfren­tou aqui den­tro. Perdemos muitos ami­gos, pes­soas próx­i­mas, e fica difí­cil falar sobre isso. Estou falan­do aqui sobre justiça, sobre o que acon­te­ceu e está acon­te­cen­do em São Sebastião. Tem gente ain­da em área de risco, muitas mães solo não estão nem con­seguin­do tra­bal­har. Esta­mos aqui nesse desca­so”, desabafou.

A situ­ação das inúmeras famílias de São Sebastião e dos out­ros municí­pios afe­ta­dos ilus­tra o chama­do racis­mo ambi­en­tal — ter­mo que tra­ta da desigual­dade socioam­bi­en­tal, quan­do os impactos não afe­tam da mes­ma maneira a pop­u­lação, incidin­do prin­ci­pal­mente sobre as comu­nidades mar­gin­al­izadas, como pes­soas negras, indí­ge­nas e pobres. Por out­ro lado, as pop­u­lações mais priv­i­le­giadas usufruem de maior pro­teção ambi­en­tal e mel­hores condições de vida, como no caso de São Sebastião.

Após o desas­tre, o gov­er­no de São Paulo disse que iria desapro­pri­ar e declarar de util­i­dade públi­ca um ter­reno par­tic­u­lar de mais de 10 mil met­ros quadra­dos, local­iza­do na Vila Sahy, em São Sebastião, para a con­strução de mora­dias pop­u­lares para famílias atingi­das pelas chu­vas. Entre­tan­to, os moradores não foram ouvi­dos e o pro­je­to apre­sen­ta­do propõe a ver­ti­cal­iza­ção das con­struções, com mora­dias pop­u­lares em pré­dios de cin­co andares.

Para os moradores, as obras não respeitam áreas de povos orig­inários indí­ge­nas, caiçaras e ribeir­in­hos, que tradi­cional­mente habitam em casas.

“Esta­mos lutan­do por mora­dia digna para cada um. Não está fácil para os moradores, porque não é fácil deixar a sua casa e ago­ra fiz­er­am pré­dio, nós não moramos em pré­dios. A maio­r­ia aqui tin­ha roça, fazia sua roça; aqui a gente tin­ha quin­tal e não está nada fácil. As mães e avós solo estão pre­cisan­do muito de atenção e mora­dia digna”, disse Negah Rose.

Pre­ocu­pa­dos com o desca­so das autori­dades nas áreas da edu­cação e saúde men­tal e com os pro­je­tos de mora­dias pop­u­lares, os moradores se orga­ni­zaram por meio da União dos Atingi­dos em São Sebastião, que luta ain­da para que as mora­dias sejam con­struí­das fora de áreas ala­gadas e de risco e denun­ci­am o desca­so com as esco­las estad­u­ais e munic­i­pais.

“Quan­do ocorre a tragé­dia, ficamos sem saber que direção tomar, a gente não foi ouvi­do em momen­to nen­hum. Fomos à prefeitu­ra e a prefeitu­ra fechou as por­tas. E, até o momen­to, não fomos ouvi­dos sobre nos­sas casas, até porque vamos pagar por elas”, afir­mou. “Os colé­gios foram atingi­dos e as cri­anças estão estu­dan­do cer­ca de três horas por dia. Já tin­ha tido antes a pan­demia [de covid-19], em que o ensi­no tin­ha caí­do, e ago­ra esta­mos sem as cri­anças poderem estu­dar dire­ito. Ten­ho fome de justiça e de mora­dia neste momen­to”, con­cluiu Negah Rose.

São Sebastião (SP), 22/02/2023, Casas destruídas em deslizamentos na Barra do Sahy após tempestades no litoral norte de São Paulo.
Repro­dução: São Sebastião (SP), 22/02/2023, Casas destruí­das em desliza­men­tos na Bar­ra do Sahy após tem­pes­tades no litoral norte de São Paulo. — Rove­na Rosa/Agência Brasil

Durante a entre­vista para falar sobre o Gri­to dos Excluí­dos, dom José Valde­ci lem­brou que o esforço tam­bém está na defe­sa do aces­so à ter­ra, teto e tra­bal­ho no cam­po e na cidade, na defe­sa da agroe­colo­gia, com o aces­so a ali­men­tos saudáveis, na sobera­nia ali­men­tar; em defend­er a Mãe Ter­ra, os rios, as flo­restas e o dire­ito dos povos indí­ge­nas, ribeir­in­hos e quilom­bo­las aos seus ter­ritórios.

“Para haver uma sociedade jus­ta, é pre­ciso lutar para que, de fato, ocor­ra uma trans­for­mação e ela deve se con­cretizar em políti­cas públi­cas, deve se realizar em uma boa edu­cação, em saúde para todos e todas, em ter­ritórios livres. Ago­ra mes­mo esta­mos enfrentan­do o desafio do mar­co tem­po­ral, que é um absur­do. Pre­cisamos diz­er que nos­sos irmãos, os povos indí­ge­nas, têm todo o dire­ito ao ter­ritório, como as comu­nidades quilom­bo­las, os pescadores e pescado­ras, os geraizeiros, as que­bradeiras de coco. Nesse sen­ti­do, é impor­tante que con­tin­ue­mos lutan­do ao lado daque­les que são excluí­dos”, reit­er­ou.

Em diver­sas regiões do país, a pro­gra­mação do Gri­to dos Excluí­dos já começou. No Acre, as ativi­dades começaram no dia 2, com o pré-Gri­to. No Maran­hão, as ativi­dades começaram nes­sa terça-feira (5), com uma cam­in­ha­da no cen­tro da cap­i­tal São Luís. No dia 9 de setem­bro (sába­do), haverá cel­e­bração da mis­sa em ação de graças pelo 29º Gri­to dos Excluí­dos, na igre­ja matriz da Paróquia San­ta Clara de Assis, no bair­ro San­ta Clara. Veja aqui a pro­gra­mação nacional do Gri­to.

Edição: Graça Adju­to

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