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Aumentam casos de violência contra pessoas idosas no Brasil

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Repro­dução: © Daniel Mello/Agência Brasil

Isolamento social aumentou número de denúncias


Pub­li­ca­do em 15/06/2021 — 07:00 Por Alana Gan­dra — Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro

As denún­cias de vio­lên­cia con­tra pes­soas idosas rep­re­sen­tavam, em 2019, 30% do total de denún­cias de vio­lações de dire­itos humanos rece­bidas pelo canal tele­fôni­co Disque 100, disponi­bi­liza­do pelo gov­er­no fed­er­al, o que soma­va em torno de 48,5 mil reg­istros. Em 2018, o serviço rece­beu 37,4 mil denún­cias de crimes con­tra idosos.

No fim do ano pas­sa­do, com o iso­la­men­to social impos­to pela pan­demia de covid-19, o número obser­va­do em 2019 aumen­tou 53%, pas­san­do para 77,18 mil denún­cias. No primeiro semes­tre de 2021, o Disque 100 já reg­is­tra mais de 33,6 mil casos de vio­lações de dire­itos humanos con­tra o idoso, no Brasil.

Ape­sar de o Estatu­to do Idoso, insti­tuí­do pela Lei 10.741/2003, garan­tir dire­itos às pes­soas com idade igual ou maior que 60 anos, com fre­quên­cia se tem notí­cia de que­bra ou não do cumpri­men­to de dire­itos bási­cos, como à vida, à saúde, à ali­men­tação, à edu­cação, à cul­tura, ao esporte, ao laz­er, ao tra­bal­ho, à cidada­nia, à liber­dade, à dig­nidade, à con­vivên­cia famil­iar e comu­nitária.

O Estatu­to do Idoso descreve a vio­lên­cia con­tra o idoso como qual­quer ação ou omis­são, prat­i­ca­da em local públi­co ou pri­va­do, que lhe cause morte, dano ou sofri­men­to físi­co ou psi­cológi­co.

Medo ou vergonha

Muitos idosos, porém, não denun­ci­am a vio­lên­cia sofri­da por medo ou por ver­gonha, uma vez que, na maio­r­ia das vezes, as agressões ocor­rem já há bas­tante tem­po e den­tro do próprio domicílio. Por isso, o número de denún­cias feitas por meio do Disque 100 não cor­re­sponde inteira­mente à ver­dade — é sub­no­ti­fi­ca­do.

A pres­i­dente da Câmara de Títu­los de Espe­cial­iza­ção em Geron­tolo­gia, da Sociedade Brasileira de Geri­a­tria e Geron­tolo­gia (SBGG), e pro­fes­so­ra da Uni­ver­si­dade Fed­er­al de São Paulo (Unife­sp), a assis­tente social Naira Dutra Lemos, não vê o Dia Mundi­al de Con­sci­en­ti­za­ção da Vio­lên­cia con­tra a Pes­soa Idosa, que ocorre hoje (15), como uma data de comem­o­ração, mas de aler­ta. “Acho que é um dia para a gente pen­sar sobre o assun­to, para dar vis­i­bil­i­dade sobre o tema. Um dia para a gente parar, refle­tir e mobi­lizar nos­sas forças para pen­sar sobre isso”, disse Naira à Agên­cia Brasil.

A SBGG lançou a cam­pan­ha Jun­ho Vio­le­ta e espal­hou men­sagens para os serviços de assistên­cia social, atendi­men­to à saúde e uni­ver­si­dades, incen­ti­van­do alunos, profis­sion­ais e idosos a usar o laço roxo. “É uma mobi­liza­ção que tem de ser de todos”. Naira defend­eu tam­bém que os idosos devem ser trata­dos com respeito pelos mais jovens, que devem se con­sci­en­ti­zar de que não terão 20 anos para sem­pre e envel­he­cerão do mes­mo modo. Para Naira Lemos, o 15 de jun­ho é impor­tante ain­da para mostrar à pop­u­lação que a pan­demia rev­el­ou um grande número de casos de vio­lên­cia con­tra idosos e mul­heres no âmbito famil­iar.

Uma ação de pro­teção aos idosos é a Recomen­dação 46, do Con­sel­ho Nacional de Justiça (CNJ), aler­tan­do os serviços notari­ais e de reg­istro do Brasil a adotarem medi­das pre­ven­ti­vas para coibir a práti­ca de abu­sos con­tra pes­soas idosas, espe­cial­mente vul­neráveis, durante a pan­demia. O obje­ti­vo da recomen­dação, divul­ga­da em 22 de jun­ho de 2020, era evi­tar vio­lên­cia pat­ri­mo­ni­al ou finan­ceira ao idoso nos casos de ante­ci­pação de her­ança, movi­men­tação inde­v­i­da de con­tas bancárias, ven­da de imóveis, toma­da ile­gal, mau uso ou ocul­tação de fun­dos, bens ou ativos e qual­quer out­ra hipótese rela­ciona­da à explo­ração inapro­pri­a­da ou ile­gal de recur­sos finan­ceiros e pat­ri­mo­ni­ais sem o dev­i­do con­sen­ti­men­to do idoso.

Ações

A Sec­re­taria Munic­i­pal do Envel­hec­i­men­to Saudáv­el e Qual­i­dade de Vida (SEMESQV) do Rio de Janeiro recebe denún­cias de vio­lações con­tra a pes­soa idosa de vários órgãos, entre eles a Ouvi­do­ria da prefeitu­ra (1746), o Min­istério Públi­co, a Defen­so­ria Públi­ca, Del­e­ga­cia do Idoso, o Juiza­do Crim­i­nal e out­ras ouvi­do­rias. Por meio de uma visi­ta à residên­cia do idoso, a sec­re­taria ver­i­fi­ca a pro­cedên­cia da denún­cia e emite um pare­cer téc­ni­co, disse à Agên­cia Brasil a assis­tente social do Núcleo de Assistên­cia de Pro­moção e Pro­teção Social da Sec­re­taria, San­dra Polo.

Com o envel­hec­i­men­to da pop­u­lação, muitos famil­iares não sabem como lidar com os seus idosos e recebem ori­en­tação do órgão munic­i­pal. “Há situ­ações que são mais de con­fli­to famil­iar e vão para a esfera públi­ca quan­do se ref­er­em ao pri­va­do”. Quan­do os casos pre­cisam de des­do­bra­men­to, a sec­re­taria faz o encam­in­hamen­to necessário, tra­bal­han­do no sen­ti­do de acabar com a vio­lação ou tra­bal­har numa óti­ca de pre­venção”, fir­mou San­dra.

No fim do ano, a sec­re­taria traça uma espé­cie de per­fil da vio­lên­cia. Esse per­fil dá aos profis­sion­ais condições de saber quais foram as maiores vio­lações e abu­sos prat­i­ca­dos con­tra os idosos. O últi­mo bal­anço, feito em 2019, mostrou que a vio­lên­cia mais comum na cap­i­tal flu­mi­nense foi a questão da neg­ligên­cia, seguin­do-se a vio­lên­cia psi­cológ­i­ca e moral, que envolve xinga­men­tos e imped­i­men­to de o idoso rece­ber vis­i­tas, aban­dono, abu­so finan­ceiro, com apro­pri­ação de um bem do idoso e, às vezes, até uma for­ma de con­venci­men­to do idoso de assi­nar doc­u­men­tação. A maior parte das pes­soas idosas, víti­mas de agressões em 2019, era de mul­heres (71%), enquan­to os maiores agres­sores, por grau de par­entesco, eram fil­hos (50%) e em 40% dos casos, o idoso residia com o agres­sor.

A sec­re­taria tem tam­bém pro­je­to de trans­fer­ên­cia de ren­da para idosos em situ­ação de vul­ner­a­bil­i­dade social. “A gente con­cede um bene­fí­cio para ess­es idosos a fim de aju­dar na questão finan­ceira deles e da família, para que pos­sam per­manecer na comu­nidade onde resi­dem, man­ten­do os vín­cu­los. O obje­ti­vo é evi­tar maiores agravos.

A sec­re­taria se pre­ocu­pa tam­bém em recon­hecer o poten­cial e a exper­iên­cia dessas pes­soas. “Porque a gente sabe que quan­do se chega a uma faixa etária mais adi­anta­da, há a questão muito forte da dis­crim­i­nação. As pes­soas com mais de 60 anos foram as que mais saíram do mer­ca­do de tra­bal­ho com essa história da pan­demia. Foi o seg­men­to mais afe­ta­do no sen­ti­do de con­trair da doença. Tem maior risco de con­t­a­m­i­nação. Então, você acir­ra um pre­con­ceito que já existe com relação às pes­soas maiores de 60 anos”.

Projeto de trabalho

A sec­re­taria colo­ca essas pes­soas fazen­do acol­hi­men­to em hos­pi­tais, em vis­i­tas guiadas em museus e bib­liote­cas, tra­bal­han­do em out­ros equipa­men­tos da prefeitu­ra na parte admin­is­tra­ti­va. San­dra desta­cou que, no momen­to, dev­i­do à pan­demia, esse pro­je­to está para­do, aguardan­do a vaci­nação do maior número de pes­soas para evi­tar con­tá­gio. Redes soci­ais de apoio e a questão da con­vivên­cia são tam­bém tra­bal­ha­dos pela equipe, para evi­tar o iso­la­men­to e a autoneg­ligên­cia dos idosos.

Hoje (15), em con­jun­to com a Sec­re­taria Munic­i­pal de Trans­portes, a Sec­re­taria de Envel­hec­i­men­to Saudáv­el pro­move ação na Praça Saens Peña, na Tiju­ca, zona norte do Rio, para ori­en­tar os motoris­tas de ônibus e garan­tir trans­porte urbano ade­qua­do aos idosos. A ini­cia­ti­va per­cor­rerá shop­pings das zonas norte e sul da cidade com o mes­mo obje­ti­vo. Car­tazes serão colo­ca­dos na prefeitu­ra, enquan­to vídeos serão divul­ga­dos nas redes soci­ais da admin­is­tração munic­i­pal.

Envelhecimento

Segun­do o Insti­tu­to Brasileiro de Geografia e Estatís­ti­ca (IBGE), o Brasil man­tém a tendên­cia de envel­hec­i­men­to da pop­u­lação. Em 2019, os idosos somavam 32,9 mil­hões de pes­soas, 6 mil­hões a mais que as cri­anças de até 9 anos de idade (26,9 mil­hões). Naque­le ano, os idosos rep­re­sen­tavam 15,7% da pop­u­lação, enquan­to as cri­anças até 9 anos de idade respon­di­am por 12,8%.

A primeira vez que o número de idosos super­ou o de cri­anças foi em 2014: 13,5% da pop­u­lação tin­ham menos de 9 anos de idade, enquan­to 13,6% tin­ham mais de 60 anos. A par­tir daí, a difer­ença foi se acen­tuan­do. A esti­ma­ti­va do IBGE é que, em 2060, um em cada qua­tro brasileiros terá mais de 65 anos de idade.

O médi­co Paulo Ren­zo, da Coor­de­nação de Emergên­cia Region­al (CER) Ilha do Gov­er­nador, do Hos­pi­tal Munic­i­pal Evan­dro Freire, no Rio de Janeiro, desta­cou que o iso­la­men­to provo­ca­do pela pan­demia, além de agravar as vio­lações aos dire­itos dos idosos, favorece a ocor­rên­cia de aci­dentes domés­ti­cos e o con­se­quente atendi­men­to de frat­uras nos hos­pi­tais a essa parcela da pop­u­lação.

Perdas

“O con­fi­na­men­to, prin­ci­pal­mente em relação aos idosos, causa impacto dire­to no aumen­to de aci­dentes domés­ti­cos. A nova condição de iso­la­men­to social, sem os dev­i­dos cuida­dos para man­ter a sanidade físi­ca e men­tal, con­tribui muito para isso. Os idosos deixaram de realizar suas ativi­dades fora de casa e, con­se­quente­mente, per­dem condi­ciona­men­to físi­co e men­tal. Gan­ham em ansiedade e depressão”, expli­cou o médi­co. Entre os casos mais fre­quentes que chegam à Emergên­cia do Evan­dro Freire estão idosos com frat­uras e con­tusões, em ger­al oca­sion­adas por quedas da própria altura.

Paulo Ren­zo disse ter perce­bido tam­bém o aumen­to de casos de inapetên­cia, depressão e ansiedade ness­es tem­pos de pan­demia, o que frag­iliza e até pode ger­ar aci­dentes. Ele lem­brou que o cuida­do com o ambi­ente onde a pes­soa idosa vive é muito impor­tante. Deve-se elim­i­nar do cam­in­ho qual­quer obje­to que pos­sa servir de vetor para aci­dentes., como tapetes e móveis em exces­so.

Ren­zo obser­vou que a mel­hor maneira de man­ter as pes­soas idosas longe das situ­ações de risco é dan­do atenção a elas, con­sideran­do, porém, todos os cuida­dos necessários ao enfrenta­men­to da pan­demia. O médi­co desta­cou a neces­si­dade de se reser­var um tem­po para ouvir os idosos, porque “eles têm mui­ta sabedo­ria, histórias de vida e, cer­ta­mente, amam com­par­til­har e reviv­er suas memórias”.

Edição: Graça Adju­to

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