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Avanço da inteligência artificial gera busca por proteção de direitos

Repro­dução: © REUTERS/Florence Lo/Arquivos

Em todo o país, cartórios registraram cerca de 5 mil pedidos


Pub­li­ca­do em 03/09/2023 — 16:30 Por Alana Gan­dra — Repórter da Agên­cia Brasil — São Paulo

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Des­de a pan­demia da covid-19, têm se tor­na­do cada vez mais fre­quentes nos cartórios de notas do Brasil reg­istros de dire­ti­vas ante­ci­padas de von­tade (DAVs) feitas por pes­soas que dese­jam pro­te­ger sua imagem e voz, diante do avanço da inteligên­cia arti­fi­cial (IA).

Segun­do disse à Agên­cia Brasil a vice-pres­i­dente do Colé­gio Notar­i­al do Brasil seção Rio de Janeiro, Edyanne de Moura Fro­ta Cordeiro, tabeliã tit­u­lar do 7º Ofí­cio de Notas, os tabe­lion­atos já reg­is­traram cer­ca de 5 mil DAVs em todo o país, nos últi­mos três anos. No esta­do do Rio de Janeiro, foram 107 escrit­uras sobre dire­itos dig­i­tais, sendo 31 somente nos primeiros semes­tre deste ano. O maior número de reg­istros se con­cen­tra nas regiões Sud­este e Sul, infor­mou.

cartório
Repro­dução: Cartórios de notas recebem cada vez mais pedi­dos de pro­teção de dire­itos — Arquivo/Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O assun­to gan­hou destaque recen­te­mente após a aparição da can­to­ra Elis Regi­na em um com­er­cial da Volk­swa­gen, cuja imagem foi recon­sti­tuí­da a par­tir de inteligên­cia arti­fi­cial. Elis Regi­na mor­reu em 1982.

Caso semel­hante ocor­reu com o ator amer­i­cano Paul Walk­er, que fale­ceu em um desas­tre de car­ro, em 2013, no meio das fil­ma­gens do filme Velozes e Furiosos 7. Para con­cluir o lon­ga-metragem, foi uti­liza­da tec­nolo­gia de com­putação grá­fi­ca (CGI, na sigla em inglês).

Na tec­nolo­gia, as ima­gens ger­adas por com­puta­dor têm três dimen­sões e pro­fun­di­dade de cam­po. A can­to­ra Madon­na tam­bém alter­ou seu tes­ta­men­to, proibindo o uso de holo­gra­mas após sua morte. Tais fatos des­per­taram a atenção da sociedade para as escrit­uras sobre dire­itos dig­i­tais.

A tabeliã lem­brou que, em para­le­lo ao desen­volvi­men­to da mídia e ao aparec­i­men­to de influ­encers em platafor­mas dig­i­tais, a IA vem sendo cada vez mais apri­mora­da “e, hoje em dia, se pode faz­er várias coisas com a voz da pes­soa e imagem, mes­mo pós-mortem. Por isso, ela desta­cou a neces­si­dade de se reg­u­lar as relações jurídi­cas.

Instrumentos

De acor­do com Edyanne, os instru­men­tos vão se difer­en­ciar. No caso de uma pes­soa que quer ter suas obras per­pet­u­adas depois de mor­ta, como letras de músi­ca, ima­gens, voz, por exem­p­lo, ou mes­mo par­til­ha de bens, o instru­men­to ade­qua­do seria o tes­ta­men­to, que só terá eficá­cia depois que a pes­soa mor­rer.

Con­tu­do, se for uma pre­ocu­pação em vida, o instru­men­to são as DAVs. Isso se apli­ca a pes­soas vivas que dese­jam preser­var os dire­itos de voz ou imagem em caso de algum acon­tec­i­men­to ines­per­a­do, como prob­le­ma de saúde, aci­dentes, situ­ação de hos­pi­tal­iza­ção sem dis­cern­i­men­to ou coma. Ness­es casos, a pes­soa pode faz­er uma dire­ti­va para pro­te­ger tan­to sen­has de aces­so, códi­gos de redes soci­ais, ativos, mas tam­bém reg­u­lar o que vai ser feito com sua imagem e voz, caso ela este­ja impos­si­bil­i­ta­da de man­i­fes­tar a sua von­tade. Esse é um instru­men­to novo que pou­cas pes­soas sabem que existe, afir­mou. “Nós temos ess­es dois tipos de doc­u­men­tos de escrit­uras notari­ais.”

Ética

Os dire­itos dig­i­tais são obje­to do Pro­je­to de Lei 3.592/2023, de auto­ria do senador Rodri­go Cun­ha (Podemos/AL), que bus­ca dis­ci­pli­nar e esta­b­ele­cer regras para a uti­liza­ção das ima­gens e recur­sos dig­i­tais, prin­ci­pal­mente no caso de pes­soas já fale­ci­das. “Porque a pes­soa viva ain­da tem como se defend­er”, adver­tiu a vice-pres­i­dente do CNB/RJ.

De acor­do com o PL, o uso da imagem de uma pes­soa fale­ci­da por meio de inteligên­cia arti­fi­cial só será per­mi­ti­do com o con­sen­ti­men­to prévio e expres­so da pes­soa em vida ou dos famil­iares mais próx­i­mos. A pro­pos­ta ain­da deter­mi­na que a per­mis­são deve ser obti­da e apre­sen­ta­da de for­ma clara, inequívo­ca e dev­i­da­mente doc­u­men­ta­da, especi­f­i­can­do os obje­tivos a serem alcança­dos com o uso de ima­gens e áudios.

Edyanne Cordeiro avaliou que a questão de bioéti­ca é muito recente e não está ain­da reg­u­la­da. “Tudo surgin­do ago­ra, tan­to no que se ref­ere à sucessão e ao que for usa­do depois da morte, reunidos na chama­da her­ança dig­i­tal, como aos dire­itos da per­son­al­i­dade, porque a pes­soa está viva”. São dire­itos exis­ten­ci­ais, con­sti­tu­cionais. “Têm muitos liames porque, se a pes­soa não deu autor­iza­ção e ter­ceiros forem usar, isso vai ger­ar mui­ta deman­da de ações de ind­eniza­ção por danos morais e, até, danos mate­ri­ais, porque pode-se man­char a imagem da pes­soa e ela acabar per­den­do dire­itos.”.

A tabeliã aler­tou que herdeiros, inclu­sive, podem ser víti­mas de uso inde­v­i­do de imagem e voz de par­entes e dev­erão pedir ind­eniza­ção.

Plataforma

Para realizar uma DAV, a pes­soa inter­es­sa­da deve com­pare­cer em um cartório de notas com doc­u­men­tos pes­soais ou faz­er o pro­ced­i­men­to em platafor­ma dig­i­tal nacional, admin­istra­da pelo Con­sel­ho Fed­er­al do Colé­gio Notar­i­al do Brasil.

No for­ma­to eletrôni­co, o cidadão escol­he o cartório de notas de sua prefer­ên­cia para solic­i­tar o serviço. Em segui­da, é agen­da­da uma video­con­fer­ên­cia com o tabelião de notas e a escrit­u­ra é assi­na­da eletron­i­ca­mente, por meio de um cer­ti­fi­ca­do dig­i­tal gra­tu­ito que pode ser emi­ti­do pela mes­ma platafor­ma. Emb­o­ra gra­tu­ito, esse cer­ti­fi­ca­do vai servir somente para questões de cartório.

Segun­do Edyanne, a ante­ci­pação de von­tade é muito sim­ples e não neces­si­ta de teste­munhas, nem de acom­pan­hamen­to por advo­ga­do. “A DAV é para se pre­caver em vida”, ressaltou. A tabela dos cartórios de notas para faz­er uma DAV esta­b­elece cus­to médio em torno de R$ 300, no esta­do do Rio de Janeiro. Depen­den­do do que for inseri­do na dire­ti­va, o preço pode subir. Para tes­ta­men­tos, o val­or tende a ser maior.

O tes­ta­men­to públi­co é o doc­u­men­to pelo qual uma pes­soa, denom­i­na­da tes­ta­dor, declara como e para quem dese­ja deixar seus bens após sua morte. Para realizar o ato, é necessária a pre­sença de duas teste­munhas que não podem ser herdeiras ou ben­e­fi­ci­adas pelo tes­ta­men­to, além dos doc­u­men­tos de iden­ti­dade de todas as partes, requer­entes e teste­munhas. A pre­sença de um advo­ga­do é opcional. O doc­u­men­to pode ser alter­ado e revo­ga­do enquan­to o tes­ta­dor viv­er e estiv­er lúci­do, e terá val­i­dade e pub­li­ci­dade somente após a sua morte.

Tabelionatos

O Colé­gio Notar­i­al do Brasil — Seção Rio de Janeiro é a enti­dade de classe que rep­re­sen­ta insti­tu­cional­mente os tabe­lion­atos de notas do esta­do. As sec­cionais dos colé­gios notari­ais de cada esta­do estão reunidas em um Con­sel­ho Fed­er­al (CNB/CF), que é fil­i­a­do à União Inter­na­cional do Notari­a­do (UINL).

A enti­dade não gov­er­na­men­tal reúne 88 país­es e rep­re­sen­ta o notari­a­do mundi­al exis­tente em mais de 100 nações, cor­re­spon­dentes a dois terços da pop­u­lação glob­al e 60% do Pro­du­to Inter­no Bru­to (PIB) mundi­al, prat­i­can­do atos que con­fer­em pub­li­ci­dade, aut­en­ti­ci­dade, segu­rança e eficá­cia aos negó­cios jurídi­cos pes­soais e pat­ri­mo­ni­ais, con­tribuin­do para a desju­di­cial­iza­ção.

Edição: Maria Clau­dia

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