...
terça-feira ,15 outubro 2024
Home / Direitos Humanos / Aviões ilegais entram diariamente no Território Yanomami

Aviões ilegais entram diariamente no Território Yanomami

Repro­dução: © Poli­cia Federal/divulgação

Informação faz parte de levantamento do setor de inteligência da PF


Pub­li­ca­do em 21/01/2024 — 13:48 Por Pedro Rafael Vilela – Repórter da Agên­cia Brasil — Brasília

ouvir:

Prin­ci­pal apoio logís­ti­co para entra­da de armas e supri­men­tos e para reti­ra­da de ouro e minérios extraí­dos ile­gal­mente da Ter­ra Indí­ge­na Yanoma­mi (TIY), os voos ile­gais con­tin­u­am ocor­ren­do diari­a­mente den­tro do ter­ritório, mes­mo um ano após o iní­cio de ações de emergên­cia para con­ter a crise human­itária vivi­da pelas pop­u­lações indí­ge­nas locais.

A infor­mação foi dada pelo dire­tor de Amazô­nia e Meio Ambi­ente da Polí­cia Fed­er­al (PF), Hum­ber­to Freire de Bar­ros, com base em mon­i­tora­men­to e lev­an­ta­men­tos de inteligên­cia feitos pela cor­po­ração.   

Brasília (DF) 19/01/2024 - O diretor de Amazônia da Polícia Federal (PF), Humberto Freire de Barros, concederá entrevista para a Agência Brasil, fala sobre um ano das operações de desintrusão e combate ao garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami. Foto: Jose Cruz/Agência Brasil
Repro­dução: O dire­tor de Amazô­nia e Meio Ambi­ente da Polí­cia Fed­er­al, Hum­ber­to Freire de Bar­ros — José Cruz/Agência Brasil

“Diari­a­mente, há reg­istro de voos ile­gais. Nós temos fil­ma­gens, e há pes­soas que post­am, inclu­sive, aque­le fato que acon­te­ceu, em novem­bro do ano pas­sa­do, de garimpeiros que fil­maram uma comu­nidade indí­ge­na sobrevoan­do ter­ra yanoma­mi. Não há dúvi­da de que há ess­es voos ile­gais acon­te­cen­do”, rev­el­ou o dire­tor da PF, em entre­vista exclu­si­va à Agên­cia Brasil. O caso men­ciona­do por Freire de Bar­ros foi divul­ga­do por garimpeiros em rede social enquan­to sobrevoavam uma comu­nidade de indí­ge­nas iso­la­dos Mox­i­hatëtë.

“Nós temos acom­pan­hamen­tos de inteligên­cia, lev­an­ta­men­tos de inteligên­cia. E as equipes [da PF] que atu­am lá, não rara­mente, cruzam com voos em alturas difer­entes. Eu, pes­soal­mente, em um dos sobrevoos que fiz na Ter­ra Indí­ge­na Yanoma­mi, avis­tei uma aeron­ave clan­des­ti­na. Eu reit­ero: é pre­ciso ter um con­t­role efe­ti­vo do espaço aéreo sobre o ter­ritório”, acres­cen­tou Bar­ros.

con­t­role do espaço aéreo sobre o ter­ritório foi inten­si­fi­ca­do no iní­cio do ano pas­sa­do pela Força Aérea Brasileira (FAB), para impedir a entra­da de aeron­aves não autor­izadas den­tro do ter­ritório. Des­de então, nen­hum bal­anço mais amp­lo das oper­ações foi divul­ga­do, como o número de aeron­aves inter­cep­tadas em voos ile­gais, por exem­p­lo. Há ain­da cer­ca de 40 pis­tas de pouso que servem ao garim­po e que não foram desati­vadas. A reportagem da Agên­cia Brasil procurou a FAB e o Min­istério da Defe­sa para comentarem o mon­i­tora­men­to da PF que apon­ta a per­sistên­cia na entra­da de aviões ile­gais no ter­ritório, mas, até o fechamen­to des­ta reportagem, não obteve retorno.

Em nota, a FAB ape­nas infor­mou ter ati­va­do uma nova oper­ação de apoio logís­ti­co na dis­tribuição de ces­tas de ali­men­tos, no perío­do de 17 de janeiro e 31 de março de 2024. A pre­visão é que cer­ca de 15 mil ces­tas sejam dis­tribuí­das nas próx­i­mas sem­anas.

“Emb­o­ra boa parte dos garimpeiros ten­ha saí­do depois dessas ações do gov­er­no no primeiro semes­tre do ano pas­sa­do, uma parte deles, em uma escala menor, tem volta­do des­de o segun­do semes­tre, com o enfraque­c­i­men­to das ações do con­t­role do espaço aéreo”, disse à Agên­cia Brasil o geó­grafo e anal­ista do Insti­tu­to Socioam­bi­en­tal (ISA) Estevão Sen­ra. “Existe difi­cul­dade de enten­der o que eles [FAB] fiz­er­am, e por que o que eles fiz­er­am não deu cer­to. Eles não detal­ham qual é a estraté­gia, nem nada, e alegam que isso é tec­ni­ca­mente impos­sív­el, faz­er o con­t­role do espaço aéreo de uma área tão grande”, afir­mou Sen­ra.

Com quase 10 mil­hões de hectares, maior do que Por­tu­gal, a Ter­ra Indí­ge­na Yanoma­mi é a mais exten­sa do país, e tem pop­u­lação esti­ma­da em cer­ca de 27 mil pes­soas, de acor­do com dados do Cen­so 2022 do Insti­tu­to Brasileiro de Geografia e Estatís­ti­ca (IBGE).

No auge da atu­ação garimpeira recente den­tro do ter­ritório, espe­cial­mente entre 2018 e 2022, durante o gov­er­no de Jair Bol­sonaro, havia ain­da uma pop­u­lação extra esti­ma­da de 20 mil pes­soas, entre garimpeiros e pes­soas lig­adas às ativi­dades ile­gais. Por ser região de fron­teira com a Venezuela, cabe às Forças Armadas a defe­sa do ter­ritório em uma faixa que se estende por até 100 quilômet­ros. Há dois pelotões de fron­teira das Forças Armadas den­tro do Ter­ritório Yanoma­mi, um no polo base de Suru­cu­cu, e out­ro no de Auaris.

Em jul­ho do ano pas­sa­do, um relatório lança­do por três asso­ci­ações indí­ge­nas – Hutukara Asso­ci­ação Yanoma­mi (HAY), Asso­ci­ação Wanasse­du­ume Ye’kwana (SEDUUME) e Uri­hi Asso­ci­ação Yanoma­mi – denun­ci­a­va a vol­ta do garimpeiros ao ter­ritório, ape­sar dos aler­tas feitos por um sis­tema de satélites da Polí­cia Fed­er­al ter indi­ca­do redução de 85% nes­sa ativi­dade.

“O que o nos­so mon­i­tora­men­to indi­ca, com­bi­nan­do relatos de área com inter­pre­tação de ima­gens de satélite, é que, ape­sar de haver uma redução sig­ni­fica­ti­va da ativi­dade garimpeira na TIY neste primeiro semes­tre, há ain­da a per­sistên­cia de alguns núcleos de explo­ração que resistem à ação das forças de segu­rança, além do retorno de alguns gru­pos de garimpeiros que lograram escon­der os seus equipa­men­tos durante as oper­ações”, diz tre­cho do relatório.

Redução do garimpo

Hum­ber­to Freire de Bar­ros recon­hece que há uma per­sistên­cia da ativi­dade garimpeira na área em torno de 15% do que se tin­ha no fim de 2022, mas cita os avanços das oper­ações real­izadas. “Uma coisa que pre­cisa ficar clara é que a Oper­ação Lib­er­tação nun­ca parou e não vai parar.”

O dire­tor de Amazô­nia e Meio Ambi­ente da Polí­cia Fed­er­al lem­brou que foram real­izadas 13 grandes oper­ações que resul­taram em quase R$ 600 mil­hões em apreen­sões. “Nes­sas oper­ações, hou­ve ordens de blo­queio que chegam a mais de R$ 1 bil­hão, R$ 1,5 bil­hão. Isso foi feito, e efe­ti­va­mente nós avançamos”, afir­mou. Segun­do Freire de Bar­ros, um dos focos da PF ago­ra é atin­gir ao máx­i­mo o cap­i­tal que sus­ten­ta o garim­po, o que inclui não ape­nas a destru­ição de equipa­men­tos, mas inves­ti­gações que iden­ti­fiquem, processem e punam finan­ciadores do garim­po ile­gal.

Em bal­anço da sem­ana pas­sa­da, o Insti­tu­to Brasileiro do Meio Ambi­ente e dos Recur­sos Nat­u­rais Ren­ováveis (Iba­ma) infor­mou ter real­iza­do 205 vis­to­rias em pis­tas de pouso na ter­ra indí­ge­na e entorno. Com isso, 31 pis­tas foram embar­gadas e 209 mon­i­toradas. A força-tare­fa envolveu tam­bém a PF, a Fun­dação Nacional dos Povos Indí­ge­nas (Funai), a Força Nacional de Segu­rança Públi­ca e out­ros órgãos de gov­er­no.

Entre apreen­são e destru­ição de bens, os fis­cais inter­di­taram 34 aeron­aves, 362 acam­pa­men­tos, 310 motores, 87 ger­adores de ener­gia, 32 bal­sas, 48 mil litros de com­bustív­el, 172 equipa­men­tos de comu­ni­cação e mais de 150 estru­turas logís­ti­cas e por­tos de apoio. Hou­ve ain­da apreen­são de 37 toneladas de cas­si­teri­ta, o prin­ci­pal minério extraí­do da região, 6,3 qui­los de mer­cúrio e peque­nas porções de ouro.

Há dez dias, o gov­er­no fed­er­al anun­ciou a con­strução de uma estru­tu­ra per­ma­nente na Ter­ra Indí­ge­na Yanoma­mi, envol­ven­do diver­sos órgãos. Há pre­visão de con­strução de três novas bases logís­ti­cas na região.

Saúde indígena

Quan­to à saúde indí­ge­na, a atu­ação fed­er­al no ter­ritório evi­tou uma tragé­dia sem prece­dentes, disse Júnior Heku­rari Yanoa­mi, líder indí­ge­na no polo de Suru­cu­cu . “Muitas cri­anças foram sal­vas pela força aérea de saúde do gov­er­no, vol­un­tários vier­am a Suru­cu­cu, Auaris, Mis­são Catr­mi­nani, para sal­var o povo Yanoma­mi”, recon­heceu o líder indí­ge­na. Em entre­vista à Agên­cia Brasil, Júnior Heku­rari afir­mou que a assistên­cia foi retoma­da em boa parte do ter­ritório, mas ressaltou que ain­da há dezenas de local­i­dades que não estão assis­ti­das, muitas delas pela fal­ta de segu­rança no aces­so, já que são áreas con­tro­ladas pelo garim­po.

Brasileira (FAB), por meio do Comando de Operações Aeroespaciais (COMAE) está apoiando as ações de distribuição de cestas de alimentos na Terra Indígena Yanomami. Foto FAB.
Repro­dução: Força Aérea Brasileira apoia ações de dis­tribuição de ces­tas de ali­men­tos na Ter­ra Indí­ge­na Yanoma­mi — Divul­gação FAB

“Quan­do chegou a emergên­cia Yanoma­mi, tin­ha mais de 300 comu­nidades não assis­ti­das pela saúde indí­ge­na. Eu pen­sei que meu povo ia mor­rer muito. Ali­men­tação e ces­tas bási­cas foram dis­tribuí­das pela Funai e pelo Exérci­to durante seis meses, mas ain­da há cer­ca de 50 comu­nidades onde a saúde não con­seguiu chegar, por causa do garim­po.” Segun­do o indí­ge­na, o caso mais pre­ocu­pante é o polo base Caianaú, que está fecha­do. “As cri­anças e os idosos, prin­ci­pal­mente, ain­da estão pagan­do um preço alto.”

Em nota, o Min­istério da Saúde infor­ma que ter investiu mais de R$ 220 mil­hões para reestru­tu­rar o aces­so à saúde dos indí­ge­nas da região, um val­or 122% mais alto que o do ano ante­ri­or.

“Em 2023, hou­ve uma ampli­ação do número de profis­sion­ais em atu­ação no ter­ritório (+40%, pas­san­do de 690 profis­sion­ais para 960 entre 2022 e 2023).  Tam­bém foram reaber­tos sete polos-base e unidades bási­cas de saúde indí­ge­na, que estavam fecha­dos por ações crim­i­nosas, total­izan­do 68 esta­b­elec­i­men­tos de saúde com atendi­men­to em ter­ra Yanoma­mi. Nes­tas local­i­dades, onde é pos­sív­el prestar assistên­cia e aju­da human­itária, 307 cri­anças diag­nos­ti­cadas com desnu­trição grave ou mod­er­a­da foram recu­per­adas. Além dis­so, o gov­er­no fed­er­al, através do Pro­gra­ma Mais Médi­cos, per­mi­tiu um salto de 9 para 28 no número de médi­cos para o atendi­men­to aos yanomamis em 2023. Três vezes mais médi­cos em atu­ação”, diz a pas­ta.

Em relação à morte de indí­ge­nas, o ano de 2023 ain­da reg­istrou 308 óbitos, um número menor, mas não muito dis­tante das 343 víti­mas reg­istradas em 2022.

Em trans­mis­são nas redes soci­ais na últi­ma sem­ana, a min­is­tra dos Povos Indí­ge­nas, Sonia Gua­ja­jara, admi­tiu que a crise human­itária dos yanoma­mi não será resolvi­da tão cedo, ape­sar dos esforços do gov­er­no fed­er­al.

Edição: Nádia Fran­co

LOGO AG BRASIL

Você pode Gostar de:

Parada LGBT+ Rio: organizadores planejam iniciativas sustentáveis

Evento no dia 24 de novembro deve se transformar em Parada Verde Rafael Car­doso — …