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Bienal de São Paulo abre hoje com Coreografias do Impossível

Repro­dução: © Rove­na Rosa/Agência Brasil

Evento estará no Parque Ibirapuera até 10 de dezembro


Pub­li­ca­do em 06/09/2023 — 07:48 Por Elaine Patri­cia Cruz – Repórter da Agên­cia Brasil — São Paulo

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Não há começo e não há fim na Bien­al de Arte de São Paulo, even­to que começa nes­ta quar­ta-feira (6), no pré­dio da Bien­al, no Par­que Ibi­ra­puera, na cap­i­tal paulista. No ano em que ado­ta como tema as Core­ografias do Impos­sív­el, a Bien­al deste ano propõe ao vis­i­tante que se movi­mente por entre os sons dos ambi­entes e dos obje­tos expos­tos, e que encare o tem­po não como uma lin­ha reta ou com des­ti­no definido, mas como um cír­cu­lo de muitos iní­cios e retornos.

“As core­ografias do impos­sív­el nos aju­dam a perce­ber que, diari­a­mente, encon­tramos estraté­gias que desafi­am o impos­sív­el, e são essas estraté­gias e fer­ra­men­tas para tornar o impos­sív­el pos­sív­el que encon­traremos nas obras dos artis­tas”, expli­cam os curadores em tex­to sobre esta edição da mostra.

São Paulo (SP), 05/09/2023 - 35ª Bienal de Arte - coreografias do impossível, com curadoria de Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel, no parque do Ibirapuera. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Repro­dução: 35ª Bien­al de Arte — Core­ografias do Impos­sív­el, no Par­que do Ibi­ra­puera — Foto: Rove­na Rosa/Agência Brasil

É embal­a­do por ess­es sons que per­me­iam várias salas e andares do pré­dio da Bien­al, que o cor­po vai se movi­men­tar por entre 1,1 mil obras em exposição, cri­adas por 121 artis­tas, e que explo­ram os sen­ti­dos e dis­cutem sobre as urgên­cias do mun­do.

“O som está sem­pre lig­a­do ao movi­men­to. Mas acho que, aci­ma de tudo, uma das grandes bases do nos­so pen­sa­men­to é que a músi­ca é cri­a­da através do movi­men­to no espaço. Ou seja, a for­ma como nós rit­mamos e como atrav­es­samos o espaço e o tem­po é que cria a músi­ca”, expli­ca Gra­da Kilo­m­ba, uma das curado­ras da Bien­al deste ano.

Gra­da ressalta que até mes­mo a dis­posição dos obje­tos no espaço expos­i­ti­vo cria rit­mos para essas core­ografias que pre­ten­dem enfrentar as impos­si­bil­i­dades do mun­do. “Nesse espaço da Bien­al onde esta­mos, o som tam­bém está pre­sente na core­ografia dos obje­tos que estão sus­pen­sos no ar. Eles têm um rit­mo para serem vis­tos, que são vis­tos em segui­da e, depois, há uma pausa e, depois, há um crescen­do, e a músi­ca aparece, mes­mo sem ser audív­el. Isso para nós foi um con­ceito extrema­mente impor­tante na expografia”, ressaltou.

São Paulo (SP), 05/09/2023 - Obra de Mounira Al Solth na 35ª Bienal de Arte - coreografias do impossível, com curadoria de Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel, no parque do Ibirapuera. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Repro­dução: Obra de Mouni­ra Al Solth, na 35ª Bien­al de Arte — Core­ografias do Impos­sív­el — Foto: Rove­na Rosa/Agência Brasil

Essa pro­fusão de sons, por exem­p­lo, pode ser sen­ti­da na obra Flo­res­ta de Infini­tos, cri­a­da por Ayr­son Herá­cli­to e Tiganá San­tana e que con­vi­da o vis­i­tante a entrar em uma mata sagra­da, povoa­da de vidas mate­ri­ais, inan­i­madas ou ances­trais. “Dis­cutin­do sobre as nos­sas flo­restas inte­ri­ores e tam­bém gri­tan­do pela preser­vação da natureza, a flo­res­ta é um labir­in­to de bam­bus, espel­hos, ruí­dos, pro­jeções e baixa ilu­mi­nação. E que con­vi­da o públi­co a core­ogra­far por entre seus sons, cheiros e urgên­cias”, dizem os artis­tas.

“Já vín­hamos son­han­do com nos­sas flo­restas inter­nas e, a par­tir dessa obra, quise­mos hom­e­nagear enti­dades antropomór­fi­cas e bio­mór­fi­cas que se extin­guiram e que voltam, nes­sa flo­res­ta son­ha­da, como forças pro­te­toras do que existe”, expli­cou Tiganá San­tana, em entre­vista à Agên­cia Brasil.

“A ideia é que essa insta­lação toda rea­cen­da essas flo­restas inte­ri­ores, com os abis­mos e mis­térios. Por isso ela é sinestési­ca e sen­so­r­i­al, para ati­vação do cor­po. Ela não se pre­tende explica­ti­va ou infor­ma­ti­va. A ideia é que ela se comu­nique com os cor­pos diver­sos aqui. Que flo­restas as pes­soas verão? Que ideia de natureza ou de morte ou de vida ou de encan­ta­men­to as pes­soas em con­ta­to com essa obra terão?”, expli­ca o artista.

Assim como o tema dessa Bien­al, essa flo­res­ta infini­ta cria diver­sas core­ografias e não tem lin­eari­dade. “Acho que a reta não per­tence bem à natureza. Acho que core­ogra­far é isso, é ser­pen­tear a exper­iên­cia de viv­er, de se espan­tar, de temer e de se enco­ra­jar”, avalia Tiganá San­tana.

A ideia de movi­men­to e de baila­do con­tra as impos­si­bil­i­dades do mun­do per­corre toda a Bien­al. O seu pro­je­to arquitetôni­co e expográ­fi­co foi real­iza­do pelo escritório Vão, que pen­sou em pro­por um novo fluxo para o vis­i­tante, no qual ele escol­he seu cam­in­ho e se tor­na pro­tag­o­nista de todo o proces­so. Com isso, o vão cen­tral do Pavil­hão Cic­cil­lo Mataraz­zo, da Bien­al, será inteira­mente fecha­do pela primeira vez na história. A ideia é que o vis­i­tante con­strua sua própria Bien­al, desafian­do o pro­je­to arquitetôni­co de Oscar Niemey­er.

Coreografia coletiva

Como em uma core­ografia, a Bien­al deste ano propõe que os cor­pos dos vis­i­tantes se movi­mentem por esse espaço e que esse emba­lo seja feito de for­ma cole­ti­va. Esse sen­so de cole­tivi­dade já se ini­cia pela curado­ria do even­to que, pela primeira vez, é fei­ta de for­ma com­par­til­ha­da por qua­tro pes­soas — Diane Lima, Gra­da Kilo­m­ba, Hélio Menezes e Manuel Bor­ja-Vil­lel -, sem a figu­ra de um curador-chefe.

Essa cole­tivi­dade se estende tam­bém entre obras e artis­tas sele­ciona­dos e é uma for­ma de se com­bat­er os lim­ites históri­cos, ter­ri­to­ri­ais e colo­ni­ais que nos foram impos­tos, desta­cou Gra­da Kilo­m­ba.

“Para nós é extrema­mente impor­tante ir além dessa noção de nação ten­do em con­ta que muitos artis­tas vêm de ter­ritórios que se esten­dem por várias nações e que não se iden­ti­fi­cam nec­es­sari­a­mente como uma úni­ca nação. Ou ten­do em con­ta tam­bém que muitos de nós habitam várias diás­po­ras que atrav­es­sam várias nações e vários ter­ritórios. Esse é um momen­to em que nós refle­ti­mos e des­man­te­lam­os todos ess­es saberes e ter­mi­nolo­gias que nos foram dadas e que, no fun­do, reduzem nos­sa existên­cia para uma úni­ca iden­ti­dade e que não é capaz de mostrar nos­sa com­plex­i­dade. Eu ten­ho várias nações em min­has diás­po­ras”, disse Kilo­m­ba.

Coletivos

São Paulo (SP), 05/09/2023 - Cozinha Ocupação 9 de Julho - MSTC na 35ª Bienal de Arte - coreografias do impossível, com curadoria de Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel, no parque do Ibirapuera. Foto: Rovena Rosa
Repro­dução: Coz­in­ha Ocu­pação 9 de Jul­ho — MSTC na 35ª Bien­al de Arte — Foto: Rove­na Rosa/Agência Brasil

Nes­ta edição, a Bien­al será for­ma­da por diver­sos cole­tivos e movi­men­tos soci­ais, como a Sauna Lés­bi­ca e a Ocu­pação 9 de Jul­ho, que tomará con­ta da coz­in­ha do even­to, pro­moven­do uma ali­men­tação por meio de uma cadeia pro­du­ti­va de agri­cul­tura famil­iar.

A Coz­in­ha Ocu­pação 9 de Jul­ho nasceu em 2017, por meio do Movi­men­to dos Sem Teto do Cen­tro (MSTC). “A nos­sa atu­ação não é só pela mora­dia. É tam­bém pelo dire­ito à cidade e ten­do a mora­dia como por­ta de entra­da para out­ros dire­itos”, expli­ca Car­men Sil­va, uma das fun­dado­ras do MSTC e que faz a gestão de cin­co ocu­pações em São Paulo, entre elas a Ocu­pação 9 de Jul­ho.

Segun­do ela, a coz­in­ha vai mostrar ao públi­co que comi­da tam­bém é cul­tura. “Comi­da saudáv­el é arte, é alquimia, é ances­tral­i­dade e é res­gate de origem pelo cheiro e pelo gos­to. Comi­da é arte”, ressalta.

Nes­ta Bien­al, a Coz­in­ha Ocu­pação 9 de Jul­ho vai preparar um pra­to novo a cada dia, a preço pop­u­lar. E, nos finais de sem­ana, o preparo ficará por con­ta de um chef con­vi­da­do. “Esta­mos aqui com a pre­sença dessa coz­in­ha, que pas­sa a ser uma pre­sença artís­ti­ca, trazen­do tam­bém toda nos­sa rede de par­ceiros que nos for­t­ale­cem. Além da comi­da de qual­i­dade, além das questões de sobera­nia ali­men­tar e da autono­mia cole­ti­va, traze­mos para cá a ideia de que, jun­tos, con­seguimos mudar a real­i­dade de uma pop­u­lação que sem­pre foi mar­gin­al­iza­da e que nun­ca teve opor­tu­nidade de aden­trar out­ros espaços”, disse a artista Cacá Mou­s­in­ho, apoiado­ra da ocu­pação.

Ao pro­mover um diál­o­go com a curado­ria da Bien­al, a Coz­in­ha Ocu­pação 9 de Jul­ho reforçará a ideia de que coz­in­har é rev­olu­cionário e que essa é uma for­ma de core­ogra­far estraté­gias para a sobre­vivên­cia. “A arte está entre­laça­da com o ativis­mo, com o dia a dia, com políti­cas de dire­itos humanos e em uma inter­sec­cional­i­dade que, muitas vezes, é entoa­da em um cole­ti­vo”, disse Gra­da Kilo­m­ba. “O movi­men­to core­ografa o impos­sív­el des­de sem­pre, quan­do ele ocu­pa pré­dios aban­don­a­dos que dev­e­ri­am ser devolvi­dos à pop­u­lação na sua função social”, acres­cen­ta Cacá.

Sauna Lésbica

Tam­bém mostran­do a força da cole­tivi­dade, a insta­lação da Sauna Lés­bi­ca se encon­tra no sub­so­lo do edifí­cio, trazen­do em sua facha­da um letreiro em neon com o nome do pro­je­to. A obra foi con­struí­da com base em políti­cas de esquec­i­men­tos e silen­ci­a­men­tos. Segun­do Malu Ave­lar, uma das artis­tas da Sauna Lés­bi­ca, ain­sta­lação surgiu a par­tir do ques­tion­a­men­to “e se exis­tisse uma sauna lés­bi­ca?”.

“O que vai ter aqui na sauna, para além do espaço estéti­co que foi pro­duzi­do por esse cole­ti­vo, é um lugar de escu­ta. Acho que esta­mos pre­cisan­do ouvir. Ao mes­mo tem­po, a obra vai sendo con­struí­da de acor­do com o tem­po”, expli­cou Malu Ave­lar. “E o que mais faz essa obra acon­te­cer é sua ati­vação, que é quan­do con­seguimos con­vi­dar as pes­soas a entrarem e elas faz­erem parte daqui­lo. É isso o que as pes­soas vão sen­tir aqui, um lugar de escu­ta e um lugar de faz­er parte e de con­stru­ir jun­tas”, acres­cen­tou.

São Paulo (SP), 05/09/2023 - As artistas Malu Avelar e Bárbara Esmenia apresentam a instalação Sauna Lésbica na 35ª Bienal de Arte - coreografias do impossível, no parque do Ibirapuera. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Repro­dução: As artis­tas Malu Ave­lar e Bár­bara Esme­nia apre­sen­tam a insta­lação Sauna Lés­bi­ca na 35ª Bien­al de Arte — Core­ografias do Impos­sív­el — Foto: Rove­na Rosa/Agência Brasil

E é assim que essa obra tam­bém vai dialog­ar com o tema Core­ografias do Impos­sív­el. “Para se core­ogra­far, para quer­er estar jun­to, você pre­cisa se deslo­car no espaço-tem­po. Então, a par­tir desse deslo­ca­men­to é que temos os encon­tros. E aí acon­te­cem as relações. Acho que a sauna entra nesse lugar de ter que se deslo­car até ela para que a relação acon­teça e aí core­ogra­far­mos jun­tas o que quer­e­mos para o ago­ra e para o futuro”, disse a artista.

“É a primeira vez que par­ticipo [da Bien­al] e me emo­ciono porque é uma obra que sai de um nicho. Desen­vol­vo tra­bal­hos de les­bian­dade há muitos anos, e ela aca­ba sendo restri­ta para sap­a­tonas. É a primeira vez que estou nesse espaço e ten­do a opor­tu­nidade de dialog­ar com uma pop­u­lação mais ampla. Tive­mos a con­sciên­cia de que era muito impor­tante que esse lugar, ape­sar de per­me­ar o eróti­co, fos­se de clas­si­fi­cação livre para faz­er­mos esse diál­o­go maior com a pop­u­lação”, expli­ca Bár­bara Esme­nia, que tam­bém com­põe a Sauna Lés­bi­ca.

A 35ª Bien­al de São Paulo acon­tece no Pavil­hão Cic­cil­lo Mataraz­zo — pré­dio da Bien­al -, no Par­que Ibi­ra­puera, até o dia 10 de dezem­bro. O even­to tam­bém pre­vê uma pro­gra­mação públi­ca, que inclui apre­sen­tações musi­cais, ati­vações de obras, per­for­mances, encon­tros com artis­tas e mesas de dis­cussão. A entra­da é gra­tui­ta.

Out­ras infor­mações sobre a mostra podem ser obti­das no site da Bien­al.

Edição: Fer­nan­do Fra­ga

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