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Brumadinho: livro conta história da associação de parentes das vítimas

Repro­dução: © Adri­ano Machado/Reuters/Direitos reser­va­dos

Organizada em verbetes, obra será lançada nesta terça-feira


Publicado em 27/08/2024 — 08:30 Por Francielly Barbosa* — Rio de Janeiro

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“Eu per­di meu fil­ho, que me deixou um neto de 8 anos, e eu vejo que meu neto não sabe nem mes­mo como o pai foi enter­ra­do. Ele tin­ha 33 anos”, con­tou à Agên­cia Brasil a segun­da secretária da Asso­ci­ação dos Famil­iares de Víti­mas e Atingi­dos pelo Rompi­men­to da Bar­ragem Mina Cór­rego do Fei­jão (Avabrum), Jaci­ra Fran­cis­ca Mateus Cos­ta. Mãe de Thi­a­go Mateus Cos­ta, ela é uma das fun­dado­ras da enti­dade cri­a­da em 2019 como uma reação dos famil­iares ao rompi­men­to da estru­tu­ra da min­er­ado­ra Vale local­iza­da em Bru­mad­in­ho (MG).

A tragé­dia, que matou 272 pes­soas em poucos min­u­tos em 25 de janeiro daque­le ano, é assun­to do livro Avabrum — 272 Vidas Pre­sentes, que será lança­do na noite des­ta terça-feira (27). A pro­dução da obra é uma ini­cia­ti­va do Pro­je­to Lega­do de Bru­mad­in­ho, que nasceu em 2022 a par­tir do dese­jo da Avabrum de con­stru­ir um lega­do a par­tir dos apren­diza­dos nasci­dos da dor da per­da.

Suas ações são finan­ciadas com recur­sos ind­eniza­tórios pagos pela Vale e que são admin­istra­dos pelo Comitê Gestor do Dano Moral Cole­ti­vo, com­pos­to pela Avabrum, pela Defen­so­ria Públi­ca da União (DPU), pelo Min­istério Públi­co do Tra­bal­ho (MPT) e pelo Tri­bunal Region­al do Tra­bal­ho de Minas Gerais (TRT-MG). Entre out­ras ini­cia­ti­vas do Pro­je­to Lega­do Bru­mad­in­ho, já foram pro­duzi­dos uma revista jurídi­ca sobre temas conex­os com a tragé­dia, um gibi infan­til sobre a recon­strução das comu­nidades e uma cam­pan­ha vir­tu­al com vídeos que deu voz aos par­entes das víti­mas.

Brasília (DF), 26.08.2024 - Capa do livro 272 Vidas Presentes. Foto: Projeto Legado Brumadinho/Divulgação
Capa do livro Avabrum — 272 Vidas Pre­sentes — Pro­je­to Lega­do Brumadinho/Divulgação

O livro será lança­do no Teatro Munic­i­pal de Bru­mad­in­ho, às 18h30. Tam­bém haverá trans­mis­são online pelo canal do Pro­je­to Lega­do de Bru­mad­in­ho, na platafor­ma YouTube. A obra ficará disponív­el gra­tuita­mente em por­tuguês, inglês e espan­hol. O livro foi orga­ni­za­do em ver­betes, com base em out­ros livros escritos sobre a tragé­dia, arti­gos de jor­nais, doc­u­men­tos ofi­ci­ais e o próprio con­vívio com os famil­iares.

Os dois primeiros ter­mos trazem a história da Avabrum, for­ma­da pelos famil­iares das víti­mas que pas­saram a ser chamadas car­in­hosa­mente de “joias”, e dos atos real­iza­dos men­salmente pela orga­ni­za­ção. “Todo mês, os famil­iares fazem um ato no letreiro da entra­da de Bru­mad­in­ho em hom­e­nagem às víti­mas, exata­mente no horário do rompi­men­to das bar­ra­gens. É feito um min­u­to de silên­cio e são soltos balões que rep­re­sen­tam as 272 víti­mas”, con­ta a coor­de­nado­ra de Comu­ni­cação Insti­tu­cional do Pro­je­to Lega­do de Bru­mad­in­ho, Viviane Ray­mun­di.

Tam­bém respon­sáv­el pela pesquisa e edição da obra, Viviane comen­ta que o livro é uma for­ma de con­tar a história da Avabrum, “que surge como uma reação ao crime e à indifer­ença da Vale”. “Esse é um pro­je­to de não esquec­i­men­to, de mobi­liza­ção, de cul­tura e de comu­ni­cação para que a tragé­dia não seja esque­ci­da. Par­ti­mos do princí­pio de que, se for esque­ci­da, o risco de se repe­tir é muito maior”, com­ple­men­ta.

Procu­ra­da pela Agên­cia Brasil para comen­tar o lança­men­to do livro, a Vale não se man­i­festou. Em seu site, a min­er­ado­ra afir­ma estar com­pro­meti­da com a reparação inte­gral dos danos cau­sa­dos às pes­soas e aos ter­ritórios atingi­dos pelo rompi­men­to da bar­ragem em Bru­mad­in­ho. “Des­de 2019, são desen­volvi­das ações nas frente soci­ais, ambi­en­tais e econômi­cas”, reg­is­tra o tex­to, acres­cen­tan­do que o acor­do de reparação fir­ma­do em 2021 com o gov­er­no mineiro e com o Min­istério Públi­co está sendo exe­cu­ta­do.

A Avabrum

Pas­sa­dos mais de cin­co anos da tragé­dia, a ação crim­i­nal con­tin­ua trami­tan­do sem que ninguém ten­ha sido con­de­na­do, situ­ação que é crit­i­ca­da pela Avabrum. O proces­so de reparação de danos em cur­so por meio do acor­do fir­ma­do em 2021 tam­bém é alvo de con­tes­tações dos atingi­dos.

À Agên­cia Brasil, Jaci­ra Fran­cis­ca Cos­ta, orig­i­nal­mente de Betim (MG), con­ta que a Avabrum começou como uma comis­são for­ma­da pelos famil­iares das víti­mas e atingi­dos pela avalanche de rejeitos lib­er­a­dos com o rompi­men­to da bar­ragem da Mina Cór­rego do Fei­jão. Hoje com 56 anos, a secretária da enti­dade com­par­til­ha que viu out­ros par­entes das víti­mas na tele­visão na época e decid­iu que dev­e­ria se jun­tar a eles em Bru­mad­in­ho. “Eu esta­va estag­na­da com o que hou­ve com o meu fil­ho. Foram todos prati­ca­mente enter­ra­dos vivos e eu fica­va pen­san­do no que faz­er. Esta­va insu­portáv­el, não aguen­ta­va mais”, rela­ta.

A Avabrum foi fun­da­da em agos­to de 2019, sete meses após a tragé­dia que, além das vidas ceifadas, ger­ou dev­as­tação ambi­en­tal e poluição na bacia do Rio Paraope­ba. Segun­do Jaci­ra, a orga­ni­za­ção foi cri­a­da “embaixo de lágri­mas, com o coração san­gran­do”. “A gente já esta­va no lim­ite, não sabíamos mais que faz­er, o peito esta­va despedaça­do e Bru­mad­in­ho esta­va um ter­ror, porque ain­da não havi­am iden­ti­fi­ca­do todo mun­do, metade das pes­soas estavam desa­pare­ci­das. A nos­sa pele­ja era dia e noite foca­dos naqui­lo, lutan­do para a gente ter justiça, o encon­tro dos cor­pos e a tragé­dia nun­ca mais se repe­tir, porque foi muito duro o que a gente pas­sou”, acres­cen­ta.

Para ela, o livro é tam­bém uma for­ma de preser­var a história dos entes queri­dos e a luta dos famil­iares. “A gente luta por justiça, por encon­tro, já que ain­da há três pes­soas não iden­ti­fi­cadas, e pela não repetição”, reforça. Ela lem­bra tam­bém a tragé­dia ocor­ri­da em Mar­i­ana (MG), em novem­bro de 2015, envol­ven­do o rompi­men­to de uma bar­ragem da min­er­ado­ra Samar­co, que tem como acionistas a BHP Bil­li­ton e a própria Vale.

“Em Mar­i­ana mor­reram 19 pes­soas, em Bru­mad­in­ho foram 272. Em Mar­i­ana, as pes­soas foram destroçadas, então por que deixaram isso acon­te­cer em Bru­mad­in­ho? Se acon­te­cer mais uma tragé­dia dessas é porque as autori­dades não nos escu­taram. Se acon­te­cer algu­ma coisa, a gente não deixou de avis­ar.”

“A importân­cia do livro é real­mente man­ter a memória dessas 272 pes­soas que desa­pare­ce­r­am debaixo da lama, que foram mor­tas, então o livro é pelo não esquec­i­men­to”, con­cor­da Viviane. “É uma leitu­ra sim­ples e ráp­i­da, mas não super­fi­cial. Ele se apro­fun­da no que é impor­tante para os famil­iares, então cada um dos ver­betes que escol­he­mos é impor­tante. Ter­mi­namos o livro falan­do sobre zelo, porque não teve zelo, não teve cuida­do com os tra­bal­hadores ali, e foi isso que provo­cou a tragé­dia.”

*Estag­iária sob super­visão de Léo Rodrigues.

Edição: Juliana Andrade

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