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Carnaval: África está presente nos enredos das escolas de samba do Rio

Repro­dução: © Gus­ta­vo Domingues/RioTur

Agremiações já trabalham para o carnaval


Pub­li­ca­do em 08/07/2023 — 13:35 Por Cristi­na Índio do Brasil — Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro

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O que Nilópo­lis, Maceió e a Etiópia têm em comum? É a Bei­ja-Flor de Nilópo­lis, que, no car­naval de 2024, apre­sen­tará na aveni­da o enre­do Um delírio de Car­naval na Maceió de Rás Gonguila. A esco­la vai rev­er­en­ciar as realezas dess­es três lugares e, como cos­tu­ma mar­car os seus temas, falar um pouco da cul­tura negra.

A história para mostrar um encon­tro mági­co começa a ser con­ta­da com Bened­i­to dos San­tos, que nasceu em Maceió e mais tarde ficou con­heci­do como Rás Gonguila, porque dizia ser descen­dente dire­to do últi­mo imper­ador da Etiópia.

João Vitor Araújo, car­navale­sco da Bei­ja-Flor, diz que o enre­do surgiu depois do car­naval de 2023 com a pos­si­bil­i­dade de uma parce­ria com a cidade de Maceió. Como ele pre­cisa­va de um gan­cho para con­tar a história da cap­i­tal de Alagoas por um out­ro olhar, acabou encon­tran­do em uma pesquisa a figu­ra do Gonguila para ser o fio con­du­tor do enre­do.

História

Para o car­navale­sco, foi uma grande coin­cidên­cia ser um homem negro e, por incrív­el que pareça, não foi proposi­tal, mas o per­son­agem negro se encaixa per­feita­mente na car­ac­terís­ti­ca da esco­la.

“A história começa na figu­ra de um homem que viveu no iní­cio do sécu­lo pas­sa­do nas ruas de Maceió e um dia delirou. Escutou pelo rádio que o últi­mo imper­ador da Etiópia acabara de ser coroa­do. Ele pen­sou o seguinte: ‘bom, já sou descen­dente de Zumbi e Dan­dara, porque não pos­so ser tam­bém descen­dente desse príncipe lá da África? Então, a par­tir de hoje não me chamarei mais Gonguila, me chamarei Rás Gonguila’. Rás é o títu­lo mais alto da nobreza da Etiópia. Aí, começou a ser con­heci­do como Rás Gonguila”, rev­ela em entre­vista à Agên­cia Brasil.

João Vitor con­ta que a vida de Rás Gonguila mudou com­ple­ta­mente a par­tir desse delírio que ele teve e pas­sou a ser uma pes­soa alta­mente pop­u­lar. Tornou-se o que hoje se chama influ­encer.

“Pre­cisavam da figu­ra do Rás para que ele pudesse ala­van­car cam­pan­has políti­cas, para que fos­se uma espé­cie de con­sel­heiro e, de cer­ta for­ma, for­mador de opinião, já que era tão pop­u­lar. Li em um arti­go que até Getúlio Var­gas pre­cisou que Rás subisse no palanque dele, quan­do fazia cam­pan­ha políti­ca no Nordeste e pre­cisa­va de uma figu­ra pop­u­lar. Um influ­encer daque­la época”, rela­ta.

“O cara não sabia ler, nem escr­ev­er, mas era extrema­mente inteligente e ele­gante. Às vezes, as pes­soas con­fun­dem muito quan­do se fala de uma per­son­al­i­dade, de um homem pre­to no iní­cio do sécu­lo, se pen­sa logo que o cara sofreu e apan­hou. Não. É uma história difer­ente. Ele acred­i­tou naque­le delírio, botou aqui­lo na cabeça e venceu dessa for­ma. O que eu quero diz­er com a história do Rás é que, para vencer na vida, não pre­cisa ser rico, nem obter bens mate­ri­ais. Nada dis­so. Na cabeça dele, a fama como príncipe da Etiópia que vivia em Maceió era sufi­ciente para que ele fos­se feliz”, anal­isa.

O pon­to de lig­ação com a Etiópia é o regente e imper­ador daque­le país, Haile Selassie. Ele foi regente da Etiópia de 1916 a 1930 e imper­ador de 1930 a 1974. Assim, tem-se o pon­to de lig­ação de Gonguila, que se con­sid­er­a­va próx­i­mo e, por isso, tin­ha condição de usar o mes­mo títu­lo do etíope: Rás.

“Já que é um delírio, o car­naval entra na história para pro­mover a coroação do Rás Gonguila. Nesse enre­do a gente con­vi­da o príncipe, a realeza da Etiópia, para que vá até Maceió pro­mover a coroação desse cara. A gente con­ta a história de dois per­son­agens que nun­ca se viram. É inter­es­sante, ele dizia que era descen­dente do out­ro, mas, na ver­dade, os dois nun­ca se viram. A min­ha mis­são nesse car­naval é faz­er o encon­tro das três realezas, porque cito tam­bém a realeza nilopoli­tana: a Bei­ja-Flor de Nilópo­lis. Só o car­naval para pro­mover este tipo de acon­tec­i­men­to”, acres­cen­ta João Vitor.

O blo­co Cav­aleiro dos Montes, cri­a­do por Gonguila, não existe mais, porém, está pre­sente na memória afe­ti­va de Maceió. “Esse blo­co não existe mais, mas ain­da hoje, quan­do se per­gun­ta para as pes­soas de Maceió qual o blo­co que elas mais sen­tem fal­ta, todo mun­do cita o Cav­aleiro dos Montes, fun­da­do pelo Gonguila. Esse blo­co, que já era pop­u­lar, se tor­na mais pop­u­lar a par­tir do momen­to em que ele se trans­for­ma na figu­ra do príncipe etíope das Alagoas”, diz.

João Vitor adi­anta que muitos com­pos­i­tores já entre­garam os sam­bas que pas­sarão por uma seleção até a escol­ha do que será lev­a­do para a aveni­da em 2024. O car­navale­sco está ani­ma­do com o nív­el das com­posições. Segun­do ele, o bar­racão tam­bém está em fase avança­da com metade dos pro­tóti­pos de fan­tasias e ale­go­rias con­cluí­dos. Além dis­so, já começou a con­fecção de ale­go­rias a par­tir das fer­ra­gens.

“Eu digo que o fim do ano é sem­pre um ter­mômetro pos­i­ti­vo ou neg­a­ti­vo para o car­naval. Se você está com tudo atrasa­do é uma pre­visão um pouco desas­trosa, mas quan­do ter­mi­na o ano com o bar­racão bem encam­in­hado é sinal de que vai dar tudo cer­to”, ensi­na.

João Vítor comem­o­ra ain­da estar soz­in­ho à frente do car­naval da Bei­ja-Flor. Em 2023, ele divid­iu a função com a car­navalesca super­cam­peã, Rosa Mag­a­l­hães, na Paraí­so do Tuiu­ti.

Ao ser lem­bran­do que já hou­ve um João que fez des­files gan­hadores de campe­onatos, o car­navale­sco sor­ri. “Opa, que eu seja o próx­i­mo. Digo o próx­i­mo, mas acho que ninguém sub­sti­tui Joãos­in­ho Trin­ta. Aque­le cara merece todas as reverên­cias, mas se eu con­seguir um títu­lo nes­sa estreia vou ficar muito feliz”, ante­ci­pa. O car­naval de 2024 será nos dias 10, 11, 12 e 13 de fevereiro.

Vila Isabel

A Unidos de Vila Isabel resolveu reed­i­tar, em 2024, o enre­do Gbala: uma viagem ao Tem­p­lo da Cri­ação”, cri­a­do em 1993 pelo então car­navale­sco Oswal­do Jardim, já fale­ci­do. Ago­ra, o tema será desen­volvi­do por Paulo Bar­ros.

Basea­do na cul­tura Yorubá para traz­er o enre­do a par­tir de uma nar­ra­ti­va fic­tí­cia, ao mes­mo tem­po a Vila hom­e­nageia Oswal­do Jardim e propõe uma reflexão sobre o plan­e­ta, as maze­las pro­duzi­das pelos humanos e a pos­si­bil­i­dade de sal­vação por meio das cri­anças.

“Há 30 anos, Oswal­do Jardim, um dos grandes artesãos do car­naval car­i­o­ca, embar­cou na própria imag­i­nação rumo a uma viagem fan­tás­ti­ca. Partin­do de uma nar­ra­ti­va fic­tí­cia, des­fil­am­os no car­naval de 1993 a cria­tivi­dade e a sen­si­bil­i­dade deste saudoso car­navale­sco que propôs uma reflexão muito atu­al sobre o nos­so plan­e­ta: as maze­las que os humanos fazem à ter­ra e a pos­si­bil­i­dade de nos sal­var­mos por meio das cri­anças e sua can­dura”, afir­mou a Unidos de Vila Isabel em um tex­to de apre­sen­tação do enre­do no seu per­fil do Insta­gram.

No enre­do, o cri­ador Oxalá adoece diante da humanidade cor­romp­i­da nos seus propósi­tos ini­ci­ais. “A úni­ca alter­na­ti­va para salvá-lo era levar as cri­anças da ter­ra para o Tem­p­lo da Cri­ação, para que, con­hecen­do o mun­do tal qual foi con­ce­bido curassem Oxalá dos males e sal­vassem a humanidade. Nes­sa jor­na­da, elas desco­briri­am como o mun­do e o homem foram cri­a­dos e os val­ores da vida humana no sen­ti­do de bon­dade, paz e amor”, com­ple­ta.

Samba

Não haverá dis­putas entre com­pos­i­tores porque a azul e bran­co do bair­ro de Noel Rosa vai para a aveni­da com o sam­ba-enre­do de auto­ria de Mar­t­in­ho da Vila, o mes­mo daque­le ano. Até hoje, o sam­ba é con­sid­er­a­do como um dos mais boni­tos pro­duzi­dos por Mar­t­in­ho. Em 1993, a esco­la teve que enfrentar um tem­po­ral na hora do des­file e na clas­si­fi­cação ficou em oita­vo lugar, mas se depen­der de Mar­t­in­ho a história ago­ra será out­ra.

“Eu estou felizão. Até disse que não esta­va mais a fim de des­fi­lar e ia dar um tem­po, mas a Vila Isabel vai reed­i­tar o enre­do Gbala: uma viagem ao tem­p­lo da cri­ação, que é um que mais gos­to. Aí, vou ter que estar na aveni­da. Vai ser impres­sio­n­ante e tem mais uma: a Vila Isabel vai gan­har”, disse Mar­t­in­ho à Agên­cia Brasil.

Edição: Kle­ber Sam­paio

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