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Caso Samarco: e‑mail revelado em Londres indica que BHP avaliou riscos

Repro­dução: © Anto­nio Cruz/ Agên­cia Brasil

Tragédia no Brasil causou morte de 19 pessoas


Publicado em 20/04/2024 — 10:17 Por Léo Rodrigues — Repórter da Agência Brasil — Rio de Janeiro

Um e‑mail que con­s­ta do proces­so judi­cial que trami­ta no Reino Unido sobre o rompi­men­to da bar­ragem da min­er­ado­ra Samar­co vem sendo usa­do pela defe­sa dos atingi­dos para reforçar argu­men­tos.

No episó­dio, ocor­ri­do em novem­bro de 2015 na cidade de Mar­i­ana, em Minas Gerais, uma avalanche de rejeitos foi lib­er­a­da no meio-ambi­ente, cau­san­do 19 mortes e geran­do impactos para pop­u­lações de dezenas de cidades ao lon­go da bacia do Rio Doce. Os atingi­dos acionam as cortes britâni­cas visan­do respon­s­abi­lizar a BHP Bil­li­ton. A min­er­ado­ra anglo-aus­traliana com sede em Lon­dres é acionista da Samar­co, jun­to com a Vale.

O teor do e‑mail foi rev­e­la­do nes­sa quin­ta-feira (18) em audiên­cia no Tri­bunal de Tec­nolo­gia e Con­strução, na cap­i­tal ingle­sa. Ele foi envi­a­do um dia após a tragé­dia por Mar­cus Ran­dolph, ex-chefe de divisão da BHP e ex-inte­grante do con­sel­ho de admin­is­tração da Samar­co. Os des­ti­natários eram out­ros dois exec­u­tivos da min­er­ado­ra anglo-aus­traliana: o dire­tor exec­u­ti­vo Andrew Macken­zie e o dire­tor de minério de fer­ro Jim­my Wil­son.

“Fico muito triste ao ler sobre o rompi­men­to da bar­ragem de rejeitos da Samar­co. Há cer­ca de 3 a 4 anos, a pedi­do da BHP, o con­sel­ho da Samar­co fez um relatório inde­pen­dente sobre a segu­rança da bar­ragem. Seus resul­ta­dos foram apre­sen­ta­dos no con­sel­ho da Samar­co”, ini­cia o e‑mail.

Responsabilidade

O con­sel­ho de admin­is­tração da Samar­co men­ciona­do é com­pos­to por rep­re­sen­tantes da BHP Bil­li­ton e da Vale. Ele tem caráter delib­er­a­ti­vo e é respon­sáv­el por tomar decisões estratég­i­cas para os negó­cios. Ran­dolph, que era dire­tor de fer­rosos e carvão da BHP entre 2007 e 2013, foi um dos inte­grantes indi­ca­dos pela min­er­ado­ra anglo-aus­traliana. Quan­do ocor­reu a tragé­dia, no entan­to, ele já não atu­a­va mais no con­sel­ho.

Ran­dolph desta­ca no e‑mail sua atu­ação e se colo­ca à dis­posição para colab­o­rar. “Nós nos empen­hamos muito na segu­rança da bar­ragem. Depois de uma visi­ta ao local, enviei uma nota à Samar­co que con­tin­ha comen­tários exten­sos sobre o risco da bar­ragem. Se eu pud­er aju­dar de algu­ma for­ma, entre em con­ta­to comi­go. Enviei várias car­tas à dire­to­ria solic­i­tan­do revisões da bar­ragem e me lem­bro muito bem dos acon­tec­i­men­tos. Acred­i­to que tam­bém havia alguns doc­u­men­tos no reg­istro de riscos da BHP e nos­sos nos­sos comitês tiver­am dis­cussões sobre o risco”, acres­cen­ta o tex­to.

No proces­so que trami­ta no Reino Unido, cer­ca de 700 mil atingi­dos são rep­re­sen­ta­dos pelo escritório Pogust Good­head e cobram ind­eniza­ção por danos morais e mate­ri­ais. São lis­tadas per­das de pro­priedades e de ren­da, aumen­to de despe­sas, impactos psi­cológi­cos, impactos decor­rentes de deslo­ca­men­to e fal­ta de aces­so à água e ener­gia elétri­ca, entre out­ros pre­juí­zos.

No caso de indí­ge­nas e quilom­bo­las que tam­bém fig­u­ram na ação, são men­ciona­dos os efeitos para as práti­cas cul­tur­ais e os impactos decor­rentes da relação com o meio ambi­ente.

Há ain­da reivin­di­cações de 46 municí­pios, além empre­sas e insti­tu­ições reli­giosas. As audiên­cias que avaliarão as respon­s­abil­i­dades pela tragé­dia estão mar­cadas para out­ubro deste ano.

e‑mail chegou ao proces­so através de um instru­men­to pre­vis­to no dire­ito proces­su­al inglês, pelo qual o escritório Pogust Good­head foi autor­iza­do a aces­sar alguns doc­u­men­tos inter­nos da BHP Bil­li­ton. Em meio a eles, encon­trou a cor­re­spondên­cia de Ran­dolph. Os advo­ga­dos dos atingi­dos sus­ten­tam que o acha­do reforça o entendi­men­to de que a BHP Bil­li­ton foi aler­ta­da dos riscos de colap­so da bar­ragem e afas­ta ale­gações de que a min­er­ado­ra não se envolvia na oper­ação diária da mina da Samar­co. Eles pleit­eiam ago­ra aces­so aos doc­u­men­tos cita­dos no e‑mail.

Procu­ra­da pela Agên­cia Brasil, a BHP Bil­li­ton desta­cou, em nota, que a audiên­cia foi pro­ced­i­men­tal e não dis­cu­tiu o méri­to do caso. “Dis­cussões sobre pro­dução de provas e doc­u­men­tos são usuais na atu­al fase do proces­so inglês e não se con­fun­dem com a apre­ci­ação de ale­gações acer­ca da respon­s­abil­i­dade da BHP, que serão obje­to das audiên­cias des­ig­nadas para out­ubro de 2024 com duração de 14 sem­anas”, reg­is­tra o tex­to.

Tramitação

O proces­so começou a trami­tar no Reino Unido em 2018. Des­de o iní­cio, a BHP Bil­li­ton ale­gou haver dupli­cação de jul­ga­men­tos e defend­eu que a reparação dos danos dev­e­ria se dar uni­ca­mente sob a super­visão dos tri­bunais brasileiros. A ação chegou a ser sus­pen­sa na eta­pa ini­cial, quan­do ain­da se dis­cu­tia se o caso pode­ria ser anal­isa­do no país.

Em 2020, sem entrar no méri­to da questão, o juiz inglês Mark Turn­er aca­tou os argu­men­tos da BHP Bil­li­ton e con­sider­ou que havia abu­so, entre out­ras coisas, porque pode­ria haver sen­tenças inc­on­cil­iáveis com jul­ga­men­tos simultâ­neos no Brasil e no Reino Unido. A defe­sa dos atingi­dos, no entan­to, con­seguiu revert­er essa decisão em instân­cias supe­ri­ores.

Com o avanço do proces­so, a BHP Bill­ton decid­iu mover uma ação para reivin­dicar que a Vale tam­bém fos­se incluí­da. A min­er­ado­ra anglo-aus­traliana pas­sou a sus­ten­tar que, em caso de con­de­nação, sua sócia dev­e­ria arcar com pelo menos 50% do val­or fix­a­do. A Vale tam­bém bus­cou ques­tionar a com­petên­cia das cortes britâni­cas para anal­is­ar o caso, mas o pedi­do da BHP Bil­li­ton foi acata­do e ela pas­sou a ser con­sid­er­a­da ré.

O proces­so ain­da deve se arras­tar. Mes­mo que a respon­s­abil­i­dade das min­er­ado­ras seja recon­heci­da em out­ubro deste ano, o crono­gra­ma do tri­bunal inglês indi­ca que a análise dos pedi­dos de ind­eniza­ção indi­vid­ual poderá ocor­rer ape­nas no fim de 2026.

Reparação no Brasil

No Brasil, o proces­so reparatório gira em torno do Ter­mo de Transação e Ajus­ta­men­to de Con­du­ta (TTAC) — fir­ma­do entre as três min­er­ado­ras, a União e os gov­er­nos de Minas Gerais e do Espíri­to San­to. Com base nele, foi cri­a­da a Fun­dação Ren­o­va. Ela assum­iu a gestão de mais de 40 pro­gra­mas, caben­do às min­er­ado­ras o custeio de todas as medi­das.

Porém, pas­sa­dos mais de oito anos, a atu­ação da enti­dade é alvo de diver­sos ques­tion­a­men­tos judi­ci­ais por parte dos atingi­dos, do Min­istério Públi­co de Minas Gerais (MPMG) e do Min­istério Públi­co Fed­er­al (MPF). Há dis­cussões envol­ven­do des­de a demo­ra para a con­clusão das obras de recon­strução dos dis­tri­tos arrasa­dos na tragé­dia até os val­ores ind­eniza­tórios. Uma ten­ta­ti­va de repactu­ação do proces­so reparatório, capaz de apon­tar solução para mais de 85 mil proces­sos sobre a tragé­dia, está em anda­men­to des­de 2022. Até o momen­to, não hou­ve suces­so.

Diante desse cenário, em janeiro desse ano, a Justiça Fed­er­al con­de­nou a Samar­co, a Vale e a BHP a pagar R$ 47,6 bil­hões para reparar os danos morais cole­tivos cau­sa­dos pelo rompi­men­to da bar­ragem. As min­er­ado­ras recor­rem da decisão.

Edição: Kle­ber Sam­paio

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