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Caso Samarco: mineradoras propõem mais R$ 90 bi para reparar danos

Repro­dução: © Anto­nio Cruz/ Agên­cia Brasil

Rompimento de barragem ocorreu há oito anos; 19 pessoas morreram


Publicado em 30/04/2024 — 08:28 Por Léo Rodrigues ‑Repórter da Agência Brasil — Rio de Janeiro

A min­er­ado­ra Samar­co e suas acionistas Vale e BHP Bil­li­ton pro­puser­am apor­tar mais R$ 90 bil­hões no proces­so de reparação dos danos cau­sa­dos pelo rompi­men­to da bar­ragem, ocor­ri­do em 2015 no municí­pio de Mar­i­ana (MG). Desse total, R$ 72 bil­hões seri­am repass­es em din­heiro, que seri­am real­iza­dos ao lon­go de um perío­do a ser deter­mi­na­do. Out­ros R$ 18 bil­hões seri­am para custear medi­das a serem imple­men­tadas pela própria Samar­co.

A tragé­dia ocor­reu em 5 de novem­bro de 2015, quan­do cer­ca de 39 mil­hões de met­ros cúbi­cos de rejeito escoaram pela Bacia do Rio Doce. Dezen­ove pes­soas mor­reram e hou­ve impactos às pop­u­lações de dezenas de municí­pios até a foz no Espíri­to San­to.

Nego­ci­ações para uma repactu­ação do acor­do de reparação dos danos se arras­tam há mais de dois anos. As trata­ti­vas bus­cam solução para diver­sos prob­le­mas até hoje não solu­ciona­dos. Pas­sa­dos mais de oito anos do episó­dio, trami­tam no Judi­ciário brasileiro mais de 85 mil proces­sos entre ações civis públi­cas, ações cole­ti­vas e indi­vid­u­ais.

Mariana (MG) - Pessoas foram hospedadas em hotel na cidade de Mariana após rompimento de duas barragens de rejeitos da mineradora Samarco (Antonio Cruz/Agência Brasil)
Repro­dução: Mar­i­ana — Atingi­dos por rompi­men­to de bar­ragem em Mar­i­ana (MG) são lev­a­dos para hoteis — Foto Anto­nio Cruz/ Agên­cia Brasil

Além das min­er­ado­ras, a mesa de nego­ci­ação é com­pos­ta pelo gov­er­no fed­er­al, pelos gov­er­nos de Minas Gerais e do Espíri­to San­to, pelo Min­istério Públi­co Fed­er­al (MPF) e pela Defen­so­ria Públi­ca da União, além dos min­istérios públi­cos e das defen­so­rias públi­cas dos dois esta­dos atingi­dos. Até o fim do ano pas­sa­do, as min­er­ado­ras prop­un­ham des­ti­nar ape­nas R$ 42 bil­hões para as medi­das reparatórias. As cifras apre­sen­tadas estavam bem abaixo dos R$ 126 bil­hões pleit­ea­d­os pelos gov­er­nos e pelas insti­tu­ições de Justiça.

A nova pro­pos­ta das min­er­ado­ras foi con­fir­ma­da pela Vale em comu­ni­ca­do ao mer­ca­do divul­ga­do nes­sa segun­da-feira (29). De acor­do com o tex­to, a pro­pos­ta total­iza R$ 127 bil­hões. Esse val­or inclui, além dos R$ 90 bil­hões em novos aportes, mais R$ 37 bil­hões que teri­am sido investi­dos na reparação até março deste ano.

Se esse cál­cu­lo for con­sid­er­a­do, a pro­pos­ta aten­de­ria às expec­ta­ti­vas dos gov­er­nos e das insti­tu­ições de Justiça. No entan­to, ain­da não hou­ve man­i­fes­tações dos demais par­tic­i­pantes da mesa de nego­ci­ação.

A pro­pos­ta pre­vê que todos os novos recur­sos sejam apor­ta­dos pela Samar­co. Caso ela enfrente algu­ma difi­cul­dade de finan­cia­men­to, a Vale e a BHP Bil­li­ton são indi­cadas como deve­dores secundários e dividiri­am, de for­ma igual­itária, a respon­s­abil­i­dade pelos paga­men­tos. Ou seja, cada uma assumiria a obri­gação de arcar com 50% dos val­ores.

Os novos val­ores pro­pos­tos pelas min­er­ado­ras vêm a públi­co pouco mais de três meses após sofr­erem uma der­ro­ta em âmbito judi­cial. Diante das difi­cul­dades para o fechamen­to de um acor­do de repactu­ação, as insti­tu­ições de Justiça, lid­er­adas pelo MPF, vin­ham pleit­e­an­do des­de o ano pas­sa­do que fos­se jul­ga­da parte dos pedi­dos for­mu­la­dos em ações civis públi­cas que bus­cam a reparação. A expec­ta­ti­va era de que hou­vesse uma decisão final ao menos para deter­mi­nadas questões, envol­ven­do inclu­sive ind­eniza­ções.

O pedi­do foi par­cial­mente aten­di­do: em janeiro deste ano. A Justiça Fed­er­al con­de­nou a Samar­co, a Vale e a BHP a pagar R$ 47,6 bil­hões para reparar os danos morais cole­tivos cau­sa­dos pelo rompi­men­to da bar­ragem. As min­er­ado­ras recor­rem da decisão. Caso seja cel­e­bra­do o acor­do de repactu­ação, essa decisão poderá ser rever­ti­da, pois devem ser incluí­das cláusu­las nas quais as partes desistem de ações judi­ci­ais em anda­men­to.

Enti­dades que rep­re­sen­tam os atingi­dos não foram chamadas para par­tic­i­par das nego­ci­ações. Críti­cos da nova pro­pos­ta das min­er­ado­ras, elas avaliam que conc­re­ta­mente se tra­ta de R$ 72 bil­hões em din­heiro, o que seria insu­fi­ciente para cobrir a reparação inte­gral dos danos cau­sa­dos. O Movi­men­to dos Atingi­dos por Bar­ragem (MAB) man­i­festou a expec­ta­ti­va de que a ofer­ta seja recu­sa­da pelos gov­er­nos e pelas insti­tu­ições de Justiça. A enti­dade con­sid­era que caso seja feito um novo acor­do de cúpu­la, sem par­tic­i­pação das víti­mas, não será pos­sív­el resolver os prin­ci­pais prob­le­mas.

Mariana (MG) - João Leôncio Martins, com sua casa ao fundo no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana (MG), atingido pelo rompimento de duas barragens de rejeitos da mineradora Samarco (Antonio Cruz/Agência Brasil)
Repro­dução: Mar­i­ana — João Leôn­cio Mar­tins mostra sua casa no dis­tri­to de Ben­to Rodrigues, atingi­do pelo rompi­men­to de bar­ragem da Samar­co — Foto Anto­nio Cruz/ Agên­cia Brasil

Descon­tentes com o proces­so reparatório no Brasil, cer­ca de 700 mil atingi­dos acionaram as cortes no Reino Unido. Eles proces­sam a BHP Bil­li­ton, que tem sede em Lon­dres. O escritório de advo­ca­cia Pogust Good­head, que os rep­re­sen­ta, divul­gou nota que colo­ca em dúvi­da se a nova ofer­ta das min­er­ado­ras incluiria as ind­eniza­ções indi­vid­u­ais das víti­mas. O tex­to traz uma man­i­fes­tação de Tom Good­head, CEO do escritório. “Não resolve os proces­sos movi­dos por quase 700 mil víti­mas em Lon­dres. As víti­mas foram excluí­das desse proces­so e a ofer­ta não atende às suas deman­das por justiça”.

Fundação Renova

Para reparar os danos cau­sa­dos na tragé­dia, as três min­er­ado­ras, o gov­er­no fed­er­al e os gov­er­nos de Minas Gerais e do Espíri­to San­to fir­maram ter­mo de transação e ajus­ta­men­to de con­du­ta (TTAC) em 2016. Ele esta­b­ele­ceu as dire­trizes para a cri­ação da Fun­dação Ren­o­va, atual­mente respon­sáv­el por admin­is­trar uma série de pro­gra­mas que tratam de temas diver­sas como as ind­eniza­ções, o reassen­ta­men­to dos desabri­ga­dos, o reflo­resta­men­to, a qual­i­dade da água, entre out­ros. Todas as ini­cia­ti­vas devem ser custeadas com recur­sos da Samar­co, da Vale e da BHP Bil­li­ton. Críti­cos desse acor­do, o MPF e as demais insti­tu­ições de Justiça não assi­naram.

No decor­rer dos anos, as críti­cas à atu­ação da Fun­dação Ren­o­va foram crescen­do. Enti­dades que rep­re­sen­tam os atingi­dos e as difer­entes insti­tu­ições de Justiça con­sid­er­am insat­is­fatórias as medi­das tomadas até o momen­to e cobram revisão do acor­do em vig­or. O anda­men­to dos pro­gra­mas de reparação tam­bém pas­sou a ser alvo de críti­cas do gov­er­no fed­er­al e dos gov­er­nos de Minas Gerais e do Espíri­to San­to.

O MPMG chegou a pedir judi­cial­mente a extinção da enti­dade, ale­gan­do que ela não goza da dev­i­da autono­mia frentes às min­er­ado­ras. A morosi­dade de alguns pro­gra­mas moti­va difer­entes ques­tion­a­men­tos aos tri­bunais. A recon­strução das duas comu­nidades destruí­das em Mar­i­ana, por exem­p­lo, até hoje não foi total­mente con­cluí­da. Questões envol­ven­do as ind­eniza­ções por danos morais e mate­ri­ais e a recu­per­ação ambi­en­tal tam­bém ger­am dis­cordân­cias em proces­so judi­ci­ais.

Na sem­ana pas­sa­da, a Justiça Fed­er­al encer­rou uma das divergên­cias e recon­heceu cin­co municí­pios do litoral do Espíri­to San­to como atingi­dos pela tragé­dia. Os impactos nes­sas cidades já havi­am sido ates­ta­dos pelo Comitê Interfed­er­a­ti­vo (CIF), com­pos­to por órgãos ambi­en­tais estad­u­ais e fed­erais sob a coor­de­nação do Insti­tu­to Brasileiro do Meio Ambi­ente e dos Recur­sos Nat­u­rais (Iba­ma). Cabe a ele definir dire­trizes para a reparação e fis­calizar a Fun­dação Ren­o­va, tal como pre­vis­to no TTAC.

O acor­do fir­ma­do em 2016 nomeou 39 municí­pios. Mas, com base em estu­dos e em uma cláusu­la que men­ciona­va danos nas áreas estu­ar­i­nas, costeira e de mar­in­ha, o CIF deliber­ou pela inclusão dos cin­co municí­pios capix­abas. Diante da con­tes­tação das min­er­ado­ras, o caso foi parar nos tri­bunais. Com a decisão que legit­i­ma a delib­er­ação do CIF, as medi­das reparatórias pro­movi­das pela Fun­dação Ren­o­va dev­erão ser esten­di­das para os novos municí­pios: São Mateus, Lin­hares, Aracruz, Ser­ra e Con­ceição da Bar­ra.

No comu­ni­ca­do ao mer­ca­do, a Vale afir­mou que a reparação é pri­or­i­dade para as três min­er­ado­ras e ale­ga que, por meio da Fun­dação Ren­o­va, R$ 17 bil­hões foram pagos a mais de 430 mil pes­soas. Segun­do a min­er­ado­ra, esse val­or inclui gas­tos com ind­eniza­ções indi­vid­u­ais e auxílios finan­ceiros emer­gen­ci­ais. “Além dis­so, aprox­i­mada­mente 85% dos casos de reassen­ta­men­to para comu­nidades impactadas pelo rompi­men­to da bar­ragem da Samar­co foram con­cluí­dos”, afir­ma a empre­sa.

Repactuação

Ao lon­go do ano pas­sa­do, as partes envolvi­das nas nego­ci­ações de repactu­ação chegaram a avançar no tex­to. Havia crença em um des­fe­cho, mas a divergên­cia em torno dos val­ores impediu o con­sen­so. Em audiên­cia públi­ca real­iza­da em dezem­bro na Câmara dos Dep­uta­dos, a defen­so­ra públi­ca da União, Isabela Karen Araújo Simões, expli­cou que o mon­tante de R$ 126 bil­hões pedi­do às min­er­ado­ras era resul­ta­do de avali­ações téc­ni­cas e fru­to de debate com espe­cial­is­tas em min­er­ação, em meio ambi­ente, em saúde, entre out­ras áreas.

“Não são val­ores chuta­dos e não são irre­spon­sáveis. E sequer são val­ores que vão efe­ti­va­mente reparar todos os danos porque eu acho que eles são irreparáveis. Mas são val­ores para mit­i­gar os danos”. Na ocasião, a con­trapro­pos­ta de R$ 42 bil­hões ofer­e­ci­da pelas min­er­ado­ras foi crit­i­ca­da por Junior Divi­no Fide­les, adjun­to do advo­ga­do ger­al da União. “É ver­gonhosa e desre­speitosa com o Poder Públi­co”, definiu.

Prefeitos se posicionam contra homologação do acordo entre Samarco e os governos federal e os de Minas Gerais e Espírito Santo
Repro­dução: Prefeitos se posi­cionam con­tra homolo­gação do acor­do entre Samar­co e os gov­er­nos fed­er­al e os de Minas Gerais e Espíri­to San­to — Foto Prefeitu­ra de Mar­i­ana — Divul­gação

Mas se havia um entrave em torno dos val­ores, de out­ro lado Fide­les con­fir­mou que já havia con­sen­so em torno das cláusu­las da nova pro­pos­ta. Para os par­tic­i­pantes da audiên­cia públi­ca, o novo acor­do tra­ta de temas como o for­t­alec­i­men­to do sis­tema de saúde públi­ca da região atingi­da, a respon­s­abil­i­dade das min­er­ado­ras na reti­ra­da dos rejeitos, a real­iza­ção de obras de infraestru­tu­ra e de sanea­men­to bási­co, a con­dução de estu­dos para aferir a con­t­a­m­i­nação do meio ambi­ente e o paga­men­to de auxílio finan­ceiro emer­gen­cial.

Além dis­so, define que uma parte do val­or seja empre­ga­da con­forme delib­er­ação das pes­soas atingi­das. Tam­bém já há con­sen­so para a cri­ação de um con­sel­ho de par­tic­i­pação social a fim de acom­pan­har a exe­cução do novo acor­do, bem como de um Por­tal da Transparên­cia.

As trata­ti­vas têm ocor­ri­do em reuniões sig­ilosas. O MPMG e o MPF afir­mam man­ter diál­o­go com as comu­nidades locais para encon­trar soluções que os con­tem­plem, mas enti­dades que rep­re­sen­tam os atingi­dos fazem críti­cas. “O pes­soal con­funde falar com par­tic­i­par. Par­tic­i­par é sen­tar à mesa, dis­cu­tir a pau­ta, levan­do os prob­le­mas da comu­nidade e da Bacia do Rio Doce”, disse Simone Maria da Sil­va, inte­grante da comis­são de atingi­dos da cidade de Bar­ra Lon­ga (MG), durante audiên­cia públi­ca real­iza­da em 2022 pela Assem­bleia Leg­isla­ti­va de Minas Gerais.

Edição: Graça Adju­to

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