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Cemitérios do país recebem visitas guiadas e viram museus a céu aberto

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Atividades incluem pesquisadores que estudam temas ligados à morte


Pub­li­ca­do em 17/05/2023 — 08:32 Por Rafael Car­doso — Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro

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De dia ou de noite, eles per­cor­rem lugares que causam arrepios em muitas pes­soas. Entre túmu­los e epitá­fios, encon­tram mate­ri­ais de val­or históri­co, artís­ti­co e cul­tur­al. Con­vic­tos de que os cemitérios podem ser uma gale­ria a céu aber­to, pesquisadores da Asso­ci­ação Brasileira de Estu­dos Cemi­te­ri­ais (Abec) orga­ni­zaram uma agen­da de vis­i­tas gra­tu­itas pelo país. A pro­gra­mação faz parte da 21ª Sem­ana Nacional de Museus, que começou na segun­da-feira (15).

Dois even­tos já ocor­reram na últi­ma sex­ta-feira (12) — os pas­seios guia­dos no Cemitério São Bonifá­cio, em Curuçá (PA), e no Cemitério do Araçá, na cap­i­tal paulista. Estão pre­vis­tos mais 13 even­tos, entre os dias 18 e 28 de maio, em Belém, na cap­i­tal paulista, em  Camp­inas, Guarul­hos, Piraci­ca­ba e Jaú, em São Paulo, em Belo Hor­i­zonte (MG) e Tor­res (RS).

No Rio de Janeiro, a visi­ta será no Cemitério São João Batista, no próx­i­mo sába­do (20, medi­a­da pelas his­to­ri­ado­ras Maria de Fáti­ma Fon­se­ca e Mar­cia Cos­ta Carneiro, ao lado da ped­a­goga Isabela Sil­veira. No cemitério, há um número grande de pes­soas famosas sepul­tadas, como o ex-pres­i­dentes Flo­ri­ano Peixo­to, o com­pos­i­tor Tom Jobim e o escritor Car­los Drum­mond de Andrade. Mas a visi­ta des­ta vez tem enfoque difer­ente. O tema é a memória do sam­ba e do car­naval, pen­sa­da a par­tir das desigual­dades soci­ais.

“A maior parte dos sam­bis­tas car­i­o­cas foi sepul­ta­da em cemitérios da zona norte, uma vez que o São João Batista é his­tori­ca­mente um local de elites. Ali, os poucos negros estão em áreas menos val­orizadas. Na nos­sa visi­ta, dois exem­p­los são os jazi­gos de Clementi­na de Jesus e Don­ga”, expli­ca a his­to­ri­ado­ra Maria de Fáti­ma. “A pro­pos­ta é chamar a atenção para os cemitérios como locais de memória e história da cidade. As desigual­dades soci­ais têm reflex­os nos espaços cemi­te­ri­ais, o que nos mostra que nem a morte é igual para todos”.

Rio de Janeiro (RJ) - Visitas em cemiterios - Semana de Museus - Cemitério do Araçá, São Paulo. Foto: Divulgação
Repro­dução: Rio de Janeiro (RJ) — Vis­i­tas em cemi­te­rios — Sem­ana de Museus — Cemitério do Araçá, São Paulo. Foto: Divul­gação — Divul­gação

Maria de Fáti­ma pesquisa no mestra­do os funerais das artis­tas Car­men Miran­da e Clara Nunes. O foco é enten­der mudanças na per­spec­ti­va sobre o luto no sécu­lo 20 e o papel da mídia em estim­u­lar a comoção públi­ca. O inter­esse pelo tema da morte surgiu durante o perío­do mais críti­co da pan­demia de covid-19. Para ela, foi um jeito de lidar com o próprio medo de mor­rer.

“Estu­dar a morte foi a for­ma que encon­trei não ape­nas para a temer menos, mas tam­bém para val­orizar a vida. Quan­do estu­damos a história da morte, percebe­mos o quan­to o tema se tornou tabu na sociedade con­tem­porânea. Foi desnat­u­ral­iza­da, quan­do na ver­dade é o rever­so da vida. Isso inter­fere na nos­sa capaci­dade de elab­o­rar o luto quan­do perdemos alguém queri­do. Sofre­mos mais e soz­in­hos”.

O estig­ma sobre a morte é uma das expli­cações para as vis­i­tações em cemitérios ain­da serem vis­tas com descon­fi­ança no Brasil, de acor­do com o his­to­ri­ador Paulo Rena­to Tot Pin­to. Ele é de Piraci­ca­ba, inte­gra a dire­to­ria da Abec e estu­da o tema da morte na músi­ca ser­tane­ja. Paulo entende que o país pre­cisa val­orizar mais os cemitérios como espaços muse­ológi­cos, mes­mo que fora dos padrões tradi­cionais. Ele cita exem­p­los bem-suce­di­dos de val­oriza­ção pat­ri­mo­ni­al e turís­ti­ca, como o cemitério da Reco­le­ta, em Buenos Aires, na Argenti­na, lugar que, para­doxal­mente, recebe muitos brasileiros que visi­tam o país viz­in­ho.

“Quan­do você mostra que não é ape­nas um lugar para sepul­tar pes­soas, mas que lá exis­tem escul­turas que foram con­struí­das, entre out­ras coisas, relações soci­ais de afe­to, elas con­seguem enten­der mel­hor a cidade dos mor­tos. Que nada mais é do que um reflexo da cidade dos vivos. Lá você tem ruas, divisões entre o cen­tro e a per­ife­ria, a osten­tação de mate­ri­ais. Prin­ci­pal­mente quan­do você anal­isa sepul­turas do sécu­lo 19 e do iní­cio do 20, e vê que as pes­soas ten­tavam se difer­en­ciar social­mente até depois da morte”.

Paulo defende que os cemitérios guardam múlti­plas riquezas. Não à toa, a Abec reúne pesquisadores de diver­sas áreas do con­hec­i­men­to: história, antropolo­gia, soci­olo­gia, ped­a­gogia, arquite­tu­ra, geografia e até med­i­c­i­na. Ela foi fun­da­da em 2004, a par­tir de um encon­tro que ocor­reu na Uni­ver­si­dade de São Paulo (USP). Há asso­ci­a­dos em quase todos os esta­dos do país, em Por­tu­gal e nos Esta­dos Unidos. A cada dois anos, eles se encon­tram para debater sobre escul­turas, ele­men­tos arquitetôni­cos, cos­tumes, relações soci­ais, con­fig­u­ração espa­cial e out­ros temas cemi­te­ri­ais.

Rio de Janeiro (RJ) - Visitas em cemiterios - Semana de Museus - Cemitério do Araçá, São Paulo. Foto: Divulgação
Repro­dução: Rio de Janeiro (RJ) — Vis­i­tas em cemi­te­rios — Sem­ana de Museus — Cemitério do Araçá, São Paulo. Foto: Divul­gação — Divul­gação

Fomen­tar uma agen­da de estu­dos e de vis­i­tas guiadas aju­da, assim, a man­ter a vida nos cemitérios. Mais do que a morte físi­ca, o que pre­ocu­pa os pesquisadores é a morte pelo apaga­men­to da memória.

“Você morre quan­do é esque­ci­do. Quan­do você uti­liza o cemitério para vis­i­tas e pas­seios, está remem­o­ran­do e trazen­do à vida aque­las pes­soas que estão sepul­tadas ali. Se elas são esque­ci­das, real­mente mor­rem e somem da história”, anal­isa Paulo Rena­to Tot. “Você vê nos cemitérios do país mui­ta degradação, muito roubo. Quan­do você ocu­pa o espaço, ele entra no olhar do Poder Públi­co de for­ma difer­ente. E as pes­soas enten­dem que os rou­bos que acon­te­cem ali não são dos mate­ri­ais em si, como o bronze. Mas que foram rou­ba­dos o patrimônio, a história e uma parte da cidade”.

Programação de visitas aos cemitérios

18/05 — Cemitério San­ta Izabel — Belém/PA

19/05 — Cemitério da Saudade — Campinas/SP

20/05 — Cemitério São João Batista — Rio de Janeiro/RJ

20/05 — Cemitério São João Batista — Guarulhos/SP

20/05 — Necró­pole de São Paulo — São Paulo/SP

20/05 — Cemitério da Saudade — Campinas/SP

21/05 — Cemitério São Judas Tadeu — Guarulhos/SP

21/05 — Cemitério da Saudade — Campinas/SP

21/05 — Cemitério Munic­i­pal Cam­po Boni­to — Torres/RS

21/05 — Cemitério da Saudade — Piracicaba/SP

21/05 — Cemitério da Con­so­lação — São Paulo/SP

26/05 — Cemitério Ana Rosa de Paulo — Jahu/SP

28/05 — Cemitério do Bon­fim — Belo Horizonte/MG

Para inscrições e mais infor­mações, acesse a con­ta ofi­cial da Abec no Insta­gram.

Edição: Graça Adju­to

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