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Cerâmica de barro é tradição que cria laços no Brasil

Repro­dução: © Rove­na Rosa/Agência Brasil

A saga de três mulheres contada no Sesc de São Paulo


Pub­li­ca­do em 29/04/2023 — 19:09 Por Elaine Patri­cia Cruz – Repórter da Agên­cia Brasil — São Paulo

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Três mul­heres, três histórias, três her­anças cul­tur­ais. Dona Cadu, Dona Mar­ciana e Dé Kariri Xocó não se con­heci­am. Uma baiana, out­ra ama­paense e out­ra alagoana, elas saíram de suas casas para se encon­trar esta sem­ana no Sesc 24 de Maio, no cen­tro de São Paulo. Ali, além de um bate-papo, foi exibido filme con­tan­do a história de cada uma. O que as uniu foi uma arte que apren­der­am des­de meni­nas e que esta sem­ana elas vier­am trans­mi­tir aos paulis­tanos: a ciên­cia de trans­for­mar o bar­ro em belas louças e cerâmi­cas.

“Esta­mos cole­gas ago­ra”, con­tou a cen­tenária dona Cadu. É com as mãos que elas vão moldan­do cada peça, como uma exten­são de seus cor­pos. E é com as mãos que elas sus­ten­tam a casa: repetindo o que já fiz­er­am suas antepas­sadas.

“Para mim e para o meu povo Kariri Xocó, ele [esse tra­bal­ho em cerâmi­ca] rep­re­sen­ta uma coisa muito boa. Min­ha mãe teve 18 fil­hos. Criou ess­es 18 fil­hos com o bar­ro, tra­bal­han­do na cerâmi­ca. Igual­mente eu, que só tive qua­tro [fil­hos]. Tam­bém ajudei a min­ha mãe a cri­ar meus irmãos com a cerâmi­ca. Me sin­to muito orgul­hosa de eu ser uma lou­ceira de cerâmi­ca”, con­tou Dé, à reportagem da Agên­cia Brasil.

Sen­tadas lado a lado, aguardan­do o momen­to em que iri­am se apre­sen­tar ao públi­co do Sesc 24 de Maio, as três lou­ceiras con­tam que foram pelas mãos de out­ras mul­heres que rece­ber­am essas bençãos. E é por suas mãos que ago­ra elas estão repas­san­do essa mes­ma tradição para out­ras ger­ações de mul­heres. “Eu já pas­sei [essa téc­ni­ca] de ger­ação para ger­ação. Min­ha fil­ha faz, min­ha neta faz, min­ha bis­ne­ta faz. Essa é uma cul­tura para nós do esta­do do Amapá”, disse Mar­ciana.

Dona Cadu

Foi ain­da meni­na que Ricar­di­na Pereira da Sil­va, a dona Cadu, de 103 anos, que ain­da car­rega o sor­riso e dis­posição de meni­na, apren­deu a arte e o ofí­cio de faz­er louças. Morado­ra de Coqueiros, em Mar­a­gogipe, na Bahia, ela é lou­ceira há 93 anos. Mostran­do o muque nos braços para falar sobre o tra­bal­ho doloroso e difí­cil dessa téc­ni­ca, dona Cadu con­tou como ini­ciou os tra­bal­hos em cerâmi­ca.

“Des­de a idade de 10 anos [faço as louças]. Apren­di com uma sen­ho­ra do sertão porque nasci e me criei em São Félix. Essa sen­ho­ra chegou do sertão, da roça. Era chão vel­ho, mas era roça. E aí ela sabia faz­er. Eu todo dia ia doi­da para apren­der. Todo dia eu pega­va um mol­hin­ho do bar­ro e lev­a­va para a casa de meus pais para faz­er brin­que­dos. Mas eu esta­va pen­san­do que ela não esta­va ven­do eu levar o bar­ro. Mas ela esta­va ven­do. E ela me per­gun­tou: ‘você quer apren­der?’. Eu disse que que­ria. Com 15 dias que eu esta­va tra­bal­han­do com ela, eu já esta­va fazen­do mel­hor do que ela. E aí fui tra­bal­har na casa dos meus pais”, recor­dou ela.

São Paulo (SP), 25/04/2023 - A ceramista baiana dona Cadu, de 103 anos, participa do Encontro de Louceiras: modelando geracões, com mediação de Joana Côrtes, no SESC 24 de Maio. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Repro­dução: Dona Cadu, de 103 anos, começou ain­da meni­na no ofí­cio. Foto: Rove­na Rosa/Agência Brasil

Mas dona Cadu não con­seguia viv­er só dessa arte. Teve que tra­bal­har duro – e muito – para con­seguir sus­ten­tar a casa. “Eu tra­bal­ha­va no bar­ro, na roça e na pedreira, que­bran­do bri­ta. E nis­so me criei. Me casei com 22 anos e fui para Mar­a­gogipe. Saí de São Félix e fui para Mar­a­gogipe. E lá até hoje estou”, disse ela, reforçan­do que nun­ca parou de amas­sar o bar­ro.

“Não, min­ha fil­ha, eu ten­ho que tra­bal­har. Isso aqui sig­nifi­ca mui­ta coisa. É dis­so que eu vivo. Estou nes­sa idade, mas ain­da tra­bal­ho para sobre­viv­er. Um salário só não dá para a gente viv­er não. Meu mari­do fale­ceu e eu não rece­bo a pen­são dele. Me aposen­tei pelo fun­do rur­al, porque eu tra­bal­ha­va na roça. Aí eu ten­ho que tra­bal­har. Tem dia que eu estou cansa­da e pen­so: ‘hoje eu não tra­bal­ho’. Mas às vezes eu pen­so: ‘eu tra­bal­han­do e fazen­do uma ou duas peças já está bom’. Aí eu tra­bal­ho”, disse ela.

Dona Cadu acor­da cedo todos os dias na pal­hoça de dormir. Mas essa pal­hoça não é onde ela fica o dia todo. Seu lugar mes­mo é a pal­hoça de tra­bal­har, para onde segue todos os dias para pro­duzir mais de 10 peças [por dia], que depois ela vende para restau­rantes.

“Eu ten­ho a pal­hoça de dormir e a de tra­bal­har. Ela [a neta] me leva uma min­gauz­in­ho e eu tomo. Mais tarde, ela diz: ‘vó, vamb­o­ra com­er’. E eu digo: ‘eu não estou com fome ain­da não’. E ela: ‘a sen­ho­ra vai com­er é ago­ra para não ficar fra­ca’. Se ela deixar, eu fico lá até à noite. Mas ela não deixa”, con­tou.

Até bem pouco tem­po, ela ain­da se sen­ta­va ao chão para con­fec­cionar as peças. Mas uma que­da, que a fez que­brar o fêmur, a impediu de con­tin­uar dessa for­ma. “Eu sen­ta­va no chão. Ess­es tem­pos é que eu não estou poden­do mais sen­tar no chão porque eu caí na por­ta e que­brei o fêmur. Aí eu sen­to num ban­co para poder arran­jar um tostãoz­in­ho. Eu moro com a min­ha neta e eu digo para ela: ‘quero faz­er meu bolin­ho de bar­ro’. E ela: ‘vó, vai te aqui­etar. Como é que tu te sen­ta no chão, vó?’. Aí eu digo: ‘eu não vou sen­tar no chão não. Me bota em um ban­quin­ho assim que eu tra­bal­ho’. E aí me fiz­er­am um ban­quin­ho e uma mesin­ha e eu boto o seco em cima da mesa e fico rodan­do a tábua’’, afir­mou ela.

Para con­seguir o bar­ro, a cen­tenária mul­her pre­cisa com­prá-lo “da mão dos que têm fazen­da”. E paga caro por isso. “Uma caçam­ba cus­ta R$ 2 mil”, avaliou ela. Mas antiga­mente, as coisas eram ain­da mais difí­ceis. “De primeiro, o bar­ro a gente pisa­va. Era pisa­do. Eu criei muque, olha [ela mostra os braços], de faz­er força para pis­ar no bar­ro e tra­bal­har. Mas depois a gente colo­ca na rua, os car­ros vão pas­san­do e vão pisan­do o bar­ro. E aí eu já pon­ho pisa­do para den­tro de casa. Isso já facil­i­tou. Mas, de primeiro, era pisa­do com tron­co de pau”, nar­rou.

Essa ciên­cia do trans­for­mar o bar­ro em cerâmi­ca ela já trans­mi­tiu para mui­ta gente. Con­tin­ua ensi­nan­do isso até hoje. “O povo estran­ho que chega e me pede para eu ensi­nar, eu ensi­no. Não é fácil, não. Só ven­do tra­bal­har para saber que não é fácil. Teve um sen­hor daqui [de São Paulo] que, na quin­ta-feira pas­sa­da, esteve lá na min­ha casa [na Bahia]. Aí eu esta­va tra­bal­han­do e ele ficou doi­do: ‘Dona Cadu, a sen­ho­ra me ensi­na?’. E eu respon­di que sim. Ele disse que ia pas­sar uma sem­ana na min­ha casa para apren­der a faz­er”, ela gar­gal­ha.

Deten­to­ra de saberes e faz­eres ances­trais, Dona Cadu rece­beu dois títu­los de Douto­ra Hon­oris Causa out­or­ga­dos pela Uni­ver­si­dade Fed­er­al do Recôn­ca­vo da Bahia (UFRB) e pela Uni­ver­si­dade Fed­er­al da Bahia (UFBA).

Se não garan­tiu seu sus­ten­to, o tra­bal­ho com as louças ao menos a fez via­jar por vários can­tos do Brasil. “Já via­jei. Já fui até em Curiti­ba. O gov­er­nador de lá me man­dou bus­car lá na min­ha casa para eu faz­er uma exposição para ele ver. Eu fui e ele gos­tou tan­to que eu fui para pas­sar três dias e eu pas­sei oito dias”, con­ta ela, gar­gal­han­do.

Dona Cadu tam­bém via­ja pelo Brasil para mostrar não só suas louças, mas o seu sam­ba. “Eu ten­ho um grupo de sam­ba, que eu não sou boba. Eu era nova e gosta­va dessas folias. Até que, enfim, que a casa do sam­ba, em San­to Amaro, me cadas­trou no sam­ba. Ten­ho meus instru­men­tos den­tro de casa. Mas ago­ra nun­ca mais sam­bei por causa da per­na, que eu ten­ho medo. Já fui até Curiti­ba, no Paraná, com meu sam­bin­ha. Vamos nós duas sam­bar. Quem sabe, min­ha fil­ha?”, ela  con­vi­da a repórter.

E é can­tan­do e sob o batuque das pal­mas, que ela encer­ra o bate-papo com a reportagem. “Chegou dona Cadu, do queimador de louça. Quan­do o ven­to bate, bal­ança a sua roupa. Bal­ança sua roupa, bal­ança sua roupa. Chegou dona Cadu, do queimador de louça’. E eu fico toda fofin­ha”, acres­cen­tou ela.

Dé Kariri Xocó, 66 anos com­ple­ta­dos nes­ta sem­ana, vive na Aldeia Kariri Xocó, em Por­to Real do Colé­gio, em Alagoas. Assim como as com­pan­heiras que con­heceu em São Paulo, ela começou a tra­bal­har a cerâmi­ca com ape­nas sete anos. Os primeiros potes que fez logo que começou a amas­sar o bar­ro foram “um pote e uma pan­ela”. “Come­cei a faz­er pequeno. Depois já come­cei a faz­er grande, grande, grande. E ago­ra faço de todo taman­ho”, rev­el­ou.

São Paulo (SP), 25/04/2023 - A ceramista Dé Kariri Xocó, da aldeia Kariri Xocó em Alagoas, participa do Encontro de Louceiras: modelando geracões, com mediação de Joana Côrtes, no SESC 24 de Maio. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Repro­dução: Dé Kariri Xocó, da aldeia Kariri Xocó em Alagoas,no Encon­tro de Lou­ceiras. Foto: Rove­na Rosa/Agência Brasil

“Quem me ensi­nou a faz­er foi min­ha avó. Tan­to que até hoje eu con­tin­uo a faz­er. E ensinei. Ten­ho duas irmãs, que já sabem faz­er há tem­pos. E ago­ra eu estou ensi­nan­do min­ha fil­ha e duas netas. Elas vão para a esco­la e, quan­do chegam, elas dizem: ‘vovó Dé, eu quero faz­er pote’. E eu digo: ‘então, ven­ham para cá’. E ela vem, sen­ta mais eu, eu dou o bolin­ho de bar­ro a ela e ela começa a faz­er uma cois­in­ha. Eu estou esperan­do ela [a neta] e min­ha fil­ha ficarem no meu lugar”, afir­mou.

Os potes, con­ta Dé, são parte de sua vida. Tare­fa que ela desem­pen­ha do nascer ao anoite­cer. “Eu me levan­to da cama, esco­vo o lom­bo e vou cor­ren­do para o bar­ro e para os potes. Quan­do é a noite, estou alisan­do, ras­pan­do e movi­men­tan­do o bar­ro”.

Essa argi­la, diz Dé, não é só parte de sua vida ou seu sus­ten­to. Ela já está impreg­na­da em seu cor­po. “Quan­to mais eu estou ape­ga­da ao bar­ro, mais eu estou sentin­do cor­agem no meu cor­po. Estou sen­ta­da fazen­do a min­ha louça, chega a hora de eu almoçar e min­ha nora me chama: ‘Dé, ven­ha almoçar’ E eu respon­do: ‘vou já, vou já mul­her’. Mas eu gos­to tan­to, que me pas­sa a von­tade de com­er e de almoçar. E aí, com o cachim­bo na boca, fuman­do, isso é min­ha resistên­cia. Eu sin­to que ele me dá resistên­cia”, expli­cou.

Con­seguir o mate­r­i­al para faz­er as peças não é um prob­le­ma em sua comu­nidade. “Na min­ha aldeia não é [difí­cil de con­seguir o mate­r­i­al]. Só que eles são muito pro­fun­dos. Para a cerâmi­ca do pote, para nós tirar­mos ele [bar­ro], temos que cavar três camadas. Na quar­ta [cama­da] que ele dá o pos­i­ti­vo. Se eu tirar naque­las três camadas, quan­do eu vou fiz­er o pote, eu não levan­to ele. Ele fica só queren­do cair. Na quar­ta [cama­da] é que eu tiro ele e aí eu tra­go ele pos­i­ti­vo. Assim é na pan­ela tam­bém”, acen­tu­ou.

O difí­cil é arran­jar com­prador para as peças. “Na nos­sa aldeia está fal­tan­do. Não tem com­prador para vir com­prar dire­to”, disse.

Enquan­to enfrenta esse prob­le­ma de fal­ta de com­prador, Dé vai man­ten­do a tradição, que apren­deu de meni­na. “Nós não podemos parar. Não podemos acabar essa tradição. Não podemos parar porque essa é uma tradição de nós, índias”, externou.

Marciana

Mar­ciana Nona­ta Dias tem 82 anos e vive no Quilom­bo San­ta Luzia do Maru­anum, em Macapá (AP). Sua história se assemel­ha a de muitas lou­ceiras desse Brasil.

São Paulo (SP), 25/04/2023 - A ceramista dona Marciana, do quilombo Maruanum em Macapá, participa do Encontro de Louceiras: modelando geracões, com mediação de Joana Côrtes, no SESC 24 de Maio. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Repro­dução: Dona Mar­ciana, do quilom­bo Maru­anum em Macapá, par­tic­i­pa do Encon­tro de Lou­ceiras. Foto — Rove­na Rosa/Agência Brasil

“Come­cei a tra­bal­har a argi­la com dez anos. Min­has tias todas fazi­am arte­sana­to. Eu e min­ha pri­ma pegá­va­mos o bar­ro delas e fazíamos [as peças] escon­di­das. Elas não gostavam [quan­do] a gente pega­va o bar­ro. Mas a gente tira­va e fazia escon­di­do. Depois de casa­da — casei com 22 anos — min­ha comadre me con­vi­dou para faz­er arte­sana­to com ela. Eu me dediquei para a casa dela e fazia arte­sana­to com ela. E hoje estou pas­san­do isso de ger­ação para ger­ação”, disse.

No quilom­bo onde vive, o tra­bal­ho com o bar­ro reúne toda a comu­nidade e fun­ciona tam­bém como um rit­u­al, uma devoção à Mãe do Bar­ro, a guardiã do bar­reiro de onde se extrai a argi­la. “Hoje são 20 lou­ceiras na comu­nidade quilom­bo­la. Os home­ns vão para den­tro da mata para tirar os paus e cavar a argi­la. A gente vai para o lago. Chegan­do lá, a gente escol­he o lugar para tirar o bar­ro, des­pede-se da Mãe do Bar­ro e aí vamos tirar o bar­ro. Pre­cisa tirar qua­tro camadas de ter­ra para chegar no bar­ro. Eu man­do que eles cavem bem no meio do bura­co. Eles escav­am. E quan­do pux­am o fer­ro, já está no bar­ro. Eles limpam o bar­ro, nós for­ramos com o plás­ti­co e eles vão jogan­do aque­la argi­la para nós, para cima. A gente pega aque­la argi­la, vai amas­san­do e colo­can­do em uma saca de plás­ti­co. E aí cada uma de nós faz uma pecin­ha para ofer­e­cer para a Mãe do Bar­ro”, recor­dou ela. Desse rit­u­al só não podem par­tic­i­par as mul­heres ges­tantes, grávi­das e men­stru­adas.

Dessa tradição é que vem o sus­ten­to de sua comu­nidade. “Nos­sa tradição é impor­tante para a nos­sa comu­nidade por causa da ren­da. Só a aposen­ta­do­ria e a cul­tura da man­dio­ca não estão dan­do”, con­fes­sa.

Difer­ente­mente de Dona Cadu, Mar­ciana não tem difi­cul­dade para encon­trar o bar­ro. “O bar­ro não é difí­cil para nós porque lá na nos­sa comu­nidade tem três quilom­bo­las que têm ter­reno. O que é mais difí­cil para a gente é o caripé (árvore cuja cas­ca é trans­for­ma­da em cin­zas e depois uti­liza­da para a con­fecção de cerâmi­ca) e a jutaici­ca (resina do jutaí, usa­da para dar lus­tro [bril­ho] a louças de bar­ro)”, con­tou ela.

As peças pro­duzi­das no quilom­bo são ven­di­das em feiras e em casas de arte­sana­to. Ela tam­bém vende peças em sua casa ou por encomen­da. “Não ten­do out­ro serviço para faz­er, eu faço três ou qua­tro peças por dia. Faço pan­ela, xícara, caneca”, detal­hou.

Sua roti­na começa bem cedo, assim como a de dona Dé e dona Cadu. “Eu me levan­to às 7h, tomo meu ban­ho, tomo meu café e vou tra­bal­har. Ten­ho a min­ha casa de dormir e a min­ha casa para faz­er as peças. Só saio de lá quan­do me chamam para almoçar”, disse ela. “Quan­do a min­ha neta me chama para eu com­er, eu falo ‘deixa eu ter­mi­nar, que depois eu vou almoçar’. E só quan­do eu ter­mi­no é que eu vou almoçar. E logo quan­do ter­mi­no de almoçar, já estou fazen­do min­has peças de novo”, desta­cou.

Para dona Mar­ciana, o tra­bal­ho com as louças é impor­tante não só para o sus­ten­to de sua comu­nidade. “Essa cul­tura vai pas­san­do de ger­ação em ger­ação para a gente não deixar a nos­sa cul­tura mor­rer”, sin­te­ti­zou.

Coincidente

Três mul­heres. Três tradições. Três for­mas de amas­sar o bar­ro. “É muito difer­ente [o tra­bal­ho das três]. O meu é feito o pra­to, rola­do o bar­ro para faz­er o pavio para faz­er as peças. Da min­ha tia véia [ela apon­ta para dona Cadu], ela faz assim [baten­do a mão]”, exem­pli­fi­cou Mar­ciana.

Dé, Cadu e Mar­ciana podem ter suas difer­enças nes­sa arte. Mas elas se pare­cem não só na for­ma do tra­bal­ho como tam­bém em como se rela­cionam com ele. “Quan­do estou longe do bar­ro fico triste e adoeço”, final­i­zou Mar­ciana.

Dona Cadu tam­bém sofreu ao ter que ficar longe do bar­ro por algum tem­po dev­i­do a uma que­da em que que­brou o fêmur. “Eu lev­ei dois anos e mês sem pegar em um bolo de bar­ro. Como eu não fiquei, hein? Acho que fiquei mais doente porque eu esta­va sem tra­bal­har”, disse ela.

As louças feitas com bar­ro são uma tradição para diver­sas mul­heres e diver­sas comu­nidades e ter­ritórios do Brasil. Do norte ao sul do país, lou­ceiras pro­duzi­ram e pro­duzem pan­elas, caldeirões, pratos e out­ros uten­sílios. Ess­es obje­tos car­regam em si as tradições e os cos­tumes que pas­saram de mãos para mãos. Obje­tos que podem ser difer­entes na for­ma e nas histórias que car­regam, mas que cri­am laços em todo o Brasil. “Esta­mos muito unidas pelo bar­ro”, final­iza Mar­ciana.

Edição: Kle­ber Sam­paio

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