...
segunda-feira ,17 março 2025
Home / Noticias / Ciclista: dia nacional alerta sobre desafios para trânsito mais seguro

Ciclista: dia nacional alerta sobre desafios para trânsito mais seguro

Repro­dução:  © Fabio Rodrigues-Pozze­bom/Agên­cia Brasil

Ciclismo é visto por como um dos melhores modais de transporte


Pub­li­ca­do em 19/08/2021 — 07:00 Por Pedro Peduzzi — Repórter da Agên­cia Brasil — Brasília

Trans­for­mar a dor em uma ação pos­i­ti­va, ain­da que em meio a proces­sos muito difí­ceis, foi a exper­iên­cia vivi­da pelo econ­o­mista Per­sio Davi­son, de 73 anos. Da trág­i­ca morte de seu fil­ho, Pedro Davi­son, atro­pela­do por um motorista alcooliza­do na chama­da faixa pres­i­den­cial do Eixão Sul, em Brasília, ele viu sur­gir, em todo o país, um movi­men­to de con­sci­en­ti­za­ção e de mudanças de ati­tudes que, des­de então, aju­dam a mel­ho­rar as estatís­ti­cas de ciclis­tas mor­tos no trân­si­to.

Todos os esforços de con­sci­en­ti­za­ção cul­mi­naram na cri­ação do Dia Nacional do Ciclista, em 19 de agos­to.

“O Dia Nacional do Ciclista, para nós, é o dia da morte de nos­so fil­ho. Por out­ro lado, é, para a sociedade, um dia de con­sci­en­ti­za­ção e de bus­ca por novos cam­in­hos para a mobil­i­dade. Um dia para lem­brar que todos temos de ser pro­te­tores de todos, e que a real­i­dade só será menos trág­i­ca se nos respeitar­mos. Um dia para lem­brar que temos o mes­mo dire­ito de respeito pela escol­ha sobre como quer­e­mos nos loco­mover”, disse Per­sio à Agên­cia Brasil.

Foi no dia 19 de agos­to de 2006 que, após par­tic­i­par de um chur­ras­co em comem­o­ração ao aniver­sário da fil­ha Lulu, de 8 anos, que Pedro, aos 25 anos e com um cur­so de biolo­gia recém-con­cluí­do, optou por faz­er algo que esta­va muito acos­tu­ma­do: “dar um ped­al”.

Forma de diálogo

O ciclis­mo, para ele, era mais que um modal de trans­porte. Era uma for­ma de man­i­fes­tar todo o amor que sen­tia pela natureza e pela vida. Pro­va dis­so foi a viagem que fez a Tran­coso, na Bahia. Foram 11 dias ped­a­lan­do e fazen­do novas amizades.

“Ped­alar, para ele, era uma for­ma de diál­o­go com as pop­u­lações locais. Ele per­noita­va em quin­tais e na casa das pes­soas que ia con­hecen­do. Meu fil­ho fazia dis­so um modo de vida”, lem­bra Per­sio.

Em out­ra viagem, acom­pan­hado de dois cole­gas, pas­sou 45 dias ped­a­lan­do pelo Tocan­tins e, no retorno a Brasília, mar­geou o Planal­to Cen­tral na direção do Pan­tanal. “A vocação dele, como biól­o­go e ambi­en­tal­ista, esta­va pre­sente tam­bém no ciclis­mo”, afir­ma Per­sio.

Após o impacto com um veícu­lo a mais de 110 quilômet­ros por hora (km/h), o jovem Pedro foi arremes­sa­do a uma dis­tân­cia de 84 met­ros e mor­reu. O motorista Leonar­do Luiz da Cos­ta foi encon­tra­do cer­ca de meia hora depois, ten­tan­do escapar de uma blitz no Setor de Indús­tria e Abastec­i­men­to. Ele esta­va alcooliza­do. Sua pla­ca já havia sido infor­ma­da por um moto­ci­clista que teste­munhou o crime. A história do biól­o­go é con­ta­da em um cur­ta-metragem chama­do Lulu Vai de Bike. Entre as ativi­dades pro­gra­madas pela orga­ni­za­ção não gov­er­na­men­tal (ONG) Rodas da Vida para o Dia Nacional do Ciclista em Brasília está a exibição do cur­ta, às 19h, Espaço Infinu, na 506 Sul. Para aces­sar a pro­gra­mação, clique aqui.

“Não é acidente. É crime”

“O Dia do Ciclista é ato políti­co. Teve sua origem, mas não é a ela que se vol­ta e sim à defe­sa do dire­ito de o ciclista ter sua mobil­i­dade segu­ra e respeita­da. O foco está na con­strução e não nas tragé­dias de tan­tas per­das. A men­sagem é de mobi­liza­ção e futuro”, resume o pai da víti­ma, ao se referir à tragé­dia que, hoje, sim­boliza uma que­bra de par­a­dig­mas.

O que antes era vis­to como “aci­dente”, des­de então pas­sou a ser perce­bido, tan­to pela sociedade quan­to pela Justiça, como “crime”.

“Não há aci­dentes, há crimes no trân­si­to. Não são cir­cun­stân­cias aci­den­tais: são decisões con­scientes tomadas por um adul­to que decide diri­gir aci­ma da veloci­dade per­mi­ti­da, sob efeito do álcool ou trans­gredin­do qual­quer out­ra nor­ma das boas práti­cas ao volante”, argu­men­ta a coor­de­nado­ra admin­is­tra­ti­va da ONG Rodas da Paz, Joyce Ibi­ap­ina.

Toda a mobi­liza­ção decor­rente desse crime prat­i­ca­do con­tra Pedro Davi­son favore­ceu um ambi­ente que, dois anos depois, em 2008, resul­tou em uma leg­is­lação que salvou muitas vidas no trân­si­to: a Lei Seca.

Rodas da Paz

Repro­dução: Per­sio e Beth Davi­son, jun­to à bici­cle­ta que lem­bra o fil­ho Pedro, no local do aci­dente — Foto Mar­cel­lo Júnior/Agência Brasil

Per­sio lem­bra que, com a aju­da de orga­ni­za­ções como a Rodas da Paz, um movi­men­to tomou con­ta do país que, por meio do Con­gres­so Nacional, criou leis visan­do uma “mobil­i­dade respeitosa à vida, com um olhar para os ciclis­tas e pedestres”. Entre as causas defen­di­das pelo movi­men­to está “o dev­er de recon­hec­i­men­to, pelas leis e pela Justiça, da tip­i­fi­cação de crime no trân­si­to e a con­de­nação e punição dess­es crimes pelo Judi­ciário”.

Na época, lem­bra Per­sio, havia o entendi­men­to de que o tomba­men­to impe­dia a con­strução de ciclovias em Brasília. “Hoje, o DF lid­era a ofer­ta de infraestru­tu­ra cicloviária, e a fis­cal­iza­ção mais efe­ti­va tem coibido motoris­tas trans­gres­sores, a direção e o con­sumo de bebi­da”.

Em meio à luta pelos dire­itos dos ciclis­tas – e ao fato de seu fil­ho ter se tor­na­do um sím­bo­lo da causa – Per­sio e sua esposa, Beth Davi­son, tornaram-se con­sel­heiros e, no caso dele, vice-pres­i­dente da ONG.

“Brasília tem seu sim­bolis­mo e cumpre esse papel de incen­ti­vo, moti­van­do um movi­men­to nacional para a trans­for­mação de nos­sas cidades e de nos­sa con­du­ta, de for­ma a prop­i­ciar maior respeito aos ciclis­tas e aos pedestres, em relação a seus dire­itos e a uma mobil­i­dade segu­ra”, diz.

Economia, clima e saúde

A ONG desen­volve diver­sas ações nas quais apre­sen­ta a bici­cle­ta como o “mais promis­sor dos veícu­los” para enfrentar a crise econômi­ca, climáti­ca e de saúde que o país atrav­es­sa, agrava­da pela pan­demia.

“O trans­porte por bici­cle­ta é recomen­da­do pela Orga­ni­za­ção Mundi­al de Saúde (OMS) e pela ONU Habi­tat como alter­na­ti­va ao trans­porte cole­ti­vo e ao trans­porte indi­vid­ual motor­iza­do, para que as pes­soas façam seus deslo­ca­men­tos com risco reduzi­do de con­tá­gio pela covid-19 e pos­sam praticar exer­cí­cios físi­cos reg­u­lar­mente, o que aumen­tou o número de bici­cle­tas no mun­do todo”, rela­ta Joyce Ibi­ap­ina, do Rodas da Paz.

União dos Ciclistas do Brasil

Out­ra enti­dade que atua na defe­sa dos dire­itos dos ciclis­tas é a União de Ciclis­tas do Brasil (UCB), que tem Felipe Alves como um de seus dire­tores. A enti­dade tam­bém aprovei­ta a data de hoje para chamar a atenção ao “per­ma­nente desca­so com ciclis­tas no trân­si­to”.

“Desca­so por parte de motoris­tas, moto­ci­clis­tas e, prin­ci­pal­mente, do Poder Públi­co, tan­to fed­er­al quan­to estad­u­ais ou munic­i­pais, que pouco se esforçam para tornar o trân­si­to mais seguro no Brasil, seja não aten­den­do às neces­si­dades dos usuários mais vul­neráveis (como pedestres e ciclis­tas), seja afrouxan­do as leis de trân­si­to e as punições pre­vis­tas para con­du­tores que não cumprem a lei”, declar­ou à Agên­cia Brasil.

Empregos

As duas enti­dades desta­cam que os bene­fí­cios do ciclis­mo vão além da saúde, favore­cen­do tam­bém a econo­mia, inclu­sive por meio da ger­ação de empre­gos.

Citan­do estu­do divul­ga­do este ano pela Aliança Bike – que tem por base dados do Cadas­tro Ger­al de Empre­ga­dos e Desem­pre­ga­dos (Caged) de 2020 e 2021 – Ibi­ap­ina, do Rodas da Paz, diz que, “mes­mo com pouco ou nen­hum incen­ti­vo, o setor de bici­cle­tas é resiliente e pode ser impor­tante vetor para a recu­per­ação da econo­mia brasileira em momen­tos de crise e fora deles”.

Con­sideran­do empre­gos com carteira assi­na­da em dois setores da econo­mia da bici­cle­ta no Brasil (o indus­tri­al e o vare­jista), o estu­do mostra um impacto ini­cial neg­a­ti­vo da pan­demia no setor, espe­cial­mente em abril de 2020. “Porém, foi ver­i­fi­ca­da uma ráp­i­da recu­per­ação nos meses a par­tir de maio de 2020, e o bal­anço do setor foi pos­i­ti­vo tan­to ao lon­go do ano de 2020 quan­to nos dois primeiros meses de 2021”.

Pandemia

A chega­da da pan­demia favore­ceu e ampliou o uso desse modal, o que pode ser perce­bido pelo aumen­to de ven­da de bici­cle­tas, peças, acessórios e serviços como mecâni­ca, o que tam­bém é mostra­do por out­ro estu­do da Aliança Bike – este cita­do pelo dire­tor da UCB.

Os motivos do maior uso da bici­cle­ta como meio de trans­porte têm tan­to fatores econômi­cos, por ser mais bara­to, como san­itários, já que é muito mais seguro que trans­porte públi­co ou por aplica­ti­vo em relação à trans­mis­são do novo coro­n­avírus, afir­ma.

Ele cita tam­bém fatores esportivos, de saúde e de laz­er, já que a ativi­dade é recomen­da­da mes­mo com as restrições e recomen­dações durante a pan­demia, por ser real­iza­da em espaço aber­to e com dis­tan­ci­a­men­to das pes­soas.

Aumento de sinistros

O cresci­men­to do uso da bici­cle­ta trouxe out­ro tipo de aumen­to – o número de sin­istros graves, infor­ma a Asso­ci­ação Brasileira de Med­i­c­i­na do Tráfego (Abram­et).

De acor­do com a insti­tu­ição, hou­ve um “aumen­to rel­e­vante de 30%” no reg­istro de sin­istros que exi­gi­ram atendi­men­to médi­co a ciclis­tas trauma­ti­za­dos nos primeiros cin­co meses de 2021.

“Os dados demon­stram a importân­cia de ter­mos atenção e ini­cia­ti­vas focadas nesse públi­co. O uso da bici­cle­ta cresceu no Brasil e exige uma abor­dagem de pre­venção ao sin­istro”, diz o pres­i­dente da Abram­et, Anto­nio Meira Júnior.

Segun­do a asso­ci­ação, em janeiro de 2019 foram reg­istra­dos 1,1 mil sin­istros graves com ciclis­tas, número que subiu para 1.451 em janeiro de 2021, “o mais alto nív­el no perío­do estu­da­do”.

Os dados avali­a­dos pela asso­ci­ação mostram a evolução dos sin­istros graves com ciclis­tas em todo o Brasil. “Chama a atenção a escal­a­da no reg­istro no esta­do de Goiás: em 2021, hou­ve um aumen­to de 240% em relação a 2020, com 406 casos a mais”, diz o lev­an­ta­men­to.

Em Rondô­nia, a incidên­cia de sin­istros graves aumen­tou 113%, e em Sergipe, 100%.

A Abram­et avaliou tam­bém o per­fil dos ciclis­tas envolvi­dos em sin­istros graves. Cer­ca de 80% eram home­ns e a faixa etária pre­dom­i­nante é de 20 a 59 anos (60% dos casos).

“A supe­ri­or­i­dade numéri­ca dos aci­dentes envol­ven­do pedestres e moto­ci­clis­tas fez com que os ciclis­tas fos­sem neg­li­gen­ci­a­dos em relação às políti­cas de pre­venção. Per­cor­rem ruas e estradas, par­til­han­do espaço com veícu­los pesa­dos. Muitas vezes, sequer sendo perce­bidos. Com­para­da a alguém que se deslo­ca em um automóv­el, uma pes­soa que cir­cu­la em uma bici­cle­ta tem prob­a­bil­i­dade de óbito oito vezes maior”, expli­ca Flavio Adu­ra, dire­tor cien­tí­fi­co da Abram­et.

Limites de velocidade

Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

A Rodas da Paz tem algu­mas dicas de segu­rança que, se seguidas, podem aju­dar a tornar a mobil­i­dade do modal cicloviário mais segu­ra, de for­ma a revert­er os números infla­ciona­dos pela pan­demia e pro­mover uma con­vivên­cia mais har­môni­ca nas ruas do país.

“Sem baixar a veloci­dade das vias, é impos­sív­el con­ter a epi­demia das mortes no trân­si­to. Para que seja pos­sív­el a con­vivên­cia pací­fi­ca e human­iza­da no trân­si­to, é necessário a respon­s­abil­i­dade dos con­du­tores de veícu­los maiores, para que pro­te­jam os menores, e a read­e­quação dos lim­ites de veloci­dade”, afir­ma Joyce Ibi­ap­ina, ao defend­er inves­ti­men­tos em fis­cal­iza­ção e medi­das tec­nológ­i­cas e de engen­haria.

Citan­do o man­u­al Gestão da Veloci­dade, elab­o­ra­do pela Orga­ni­za­ção das Nações Unidas (ONU), ela diz que as chances de sobre­vivên­cia em um atro­pela­men­to “dimin­uem expo­nen­cial­mente” quan­do a veloci­dade de impacto do veícu­lo é maior.

Se a veloci­dade de impacto do veícu­lo sobre o pedestre for de 32 km/h, as chances de sobre­vivên­cia são de 95%. Se a veloci­dade for 48 km/h, a prob­a­bil­i­dade cai para 55%. A par­tir de 64 km/h, a prob­a­bil­i­dade de sobre­viv­er é reduzi­da a 15%.

“Ciclis­tas devem trafe­gar ao lado dire­ito da via, ocu­pan­do um terço da faixa e sem­pre no sen­ti­do de cir­cu­lação reg­u­la­men­ta­do no local. Para evi­tar sin­istros de trân­si­to como atro­pela­men­tos, os motoris­tas devem diri­gir respei­tan­do o lim­ite de veloci­dade máx­i­ma reg­u­la­men­ta­da e reduzir a veloci­dade ao ultra­pas­sar ciclis­tas, guardan­do dis­tân­cia lat­er­al de 1,5 metro”, diz a coor­de­nado­ra da ONG.

Felipe Alves, da UCB, sug­ere, além da diminuição da veloci­dade em perímet­ros urbanos, maior pro­teção e mel­hor infraestru­tu­ra para ciclis­tas e pedestres, bem como “inves­ti­men­tos per­ma­nentes” em edu­cação para o trân­si­to. “E, claro, mais rig­or nas punições aos infratores”, com­ple­men­ta.

Saiba Mais» Confira série de reportagens “Vamos de Bicicleta” produzida pelo Rádio Nacional:

Bicicleta: o transporte que salva vidas e o planeta Terra

Vamos de Bicicleta: é urgente reduzir o espaço para carros nas ruas

Conheça a cidade com um único meio de transporte: a bicicleta

 

Edição: Graça Adju­to e Kel­ly Oliveira

LOGO AG BRASIL

Você pode Gostar de:

Apostas para a Dupla de Páscoa começam nesta segunda-feira

Prêmio está estimado em R$ 30 milhões Agên­cia Brasil Pub­li­ca­do em 17/03/2025 — 07:44 Brasília …