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Cinco estados tiveram mais de 20 mil ações policiais durante pandemia

Repro­dução: © Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

Dados estão em boletim da Rede de Observatórios da Segurança


Pub­li­ca­do em 18/08/2022 — 07:51 Por Alana Gan­dra — Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro

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Em dois anos de pan­demia de covid-19 — de jul­ho de 2020 a jun­ho de 2022, a Rede de Obser­vatórios da Segu­rança reg­istrou 20.243 ações poli­ci­ais em cin­co dos sete esta­dos em que atua (Bahia, Ceará, Per­nam­bu­co, Rio de Janeiro e São Paulo), com um total de 1.989 mortes. O número rep­re­sen­tou quase metade dos cer­ca de 50 mil even­tos mon­i­tora­dos pelos obser­vatórios estad­u­ais no perío­do. Desse total, 12.693 foram ações de patrul­hamen­to, 6.671 oper­ações poli­ci­ais e 879 ações de com­bate ao novo coro­n­avírus. Os dados con­stam do bole­tim Raio x das ações de poli­ci­a­men­to, divul­ga­do hoje (18) pela rede.

Dos cin­co esta­dos rela­ciona­dos, o úni­co que apre­sen­tou aumen­to do número de ações poli­ci­ais, na com­para­ção do primeiro perío­do da pan­demia (jul­ho de 2020 a jun­ho de 2021) com o segun­do (jul­ho de 2021 a jun­ho de 2022), foi o Rio de Janeiro (5,96%). Esse aumen­to das ações de poli­ci­a­men­to está lig­a­da “pos­sivel­mente” à prox­im­i­dade das eleições, disse à Agên­cia Brasil a pesquisado­ra da rede Bruna Sotero. “Nos últi­mos meses, em todos os esta­dos, hou­ve aumen­to no número dessas ações, o que evi­den­cia pos­sív­el relação com o perío­do eleitoral, prin­ci­pal­mente com o obje­ti­vo de ocu­par as manchetes dos jor­nais”. Bruna expli­cou que no ter­ritório flu­mi­nense, o cresci­men­to das ações poli­ci­ais vem sendo obser­va­do des­de o ano pas­sa­do, enquan­to, nos demais esta­dos tem ocor­ri­do prin­ci­pal­mente nos últi­mos meses.

De acor­do com o bole­tim, no trimestre de abril, maio e jun­ho deste ano, as ações poli­ci­ais somaram, respec­ti­va­mente, 681, 962 e 934, alta de 18% em relação às 584, 736 e 849 obser­vadas no mes­mo perío­do de 2021. O mês em que ocor­reu o maior cresci­men­to das ações poli­ci­ais foi maio de 2022 (30%), em com­para­ção com o mes­mo perío­do do ano ante­ri­or. Os dados mostraram que gov­er­nadores can­didatos à reeleição ten­dem a “mostrar serviço”, à medi­da em que se aprox­i­ma a votação.

Chacinas

A pesquisado­ra obser­vou tam­bém que o Rio de Janeiro foi o úni­co esta­do em que o Supre­mo Tri­bunal Fed­er­al (STF) deter­mi­nou, em maio de 2020, a restrição das oper­ações poli­ci­ais em comu­nidades, enquan­to vig­o­rasse a emergên­cia san­itária. Ape­sar de ain­da estar em vig­or, a rede con­sta­tou que a ADPF 635 foi desafi­a­da pelas polí­cias e autori­dades gov­er­na­men­tais flu­mi­nens­es, resul­tan­do nas maiores chaci­nas reg­istradas em oper­ações poli­ci­ais, em maio de 2021 e maio de 2022, nas fave­las do Jacarez­in­ho e da Vila Cruzeiro, respec­ti­va­mente. “A gente vê que é uma políti­ca insti­tu­cional­iza­da”. De um ano pesquisa­do para o out­ro, as ações de poli­ci­a­men­to no esta­do do Rio subi­ram de 2.854 para 3.024.

O Ceará, que teve duas chaci­nas nos últi­mos 12 meses, rep­re­sen­tan­do o dobro do perío­do ante­ri­or, pre­ocu­pa a Rede de Obser­vatórios da Segu­rança porque não apre­sen­ta a mes­ma dinâmi­ca do Rio, com ações decor­rentes de oper­ações poli­ci­ais em que são mor­tas mais de três pes­soas. ”Mas pre­cisamos estar aten­tos ao que está ocor­ren­do, bus­car o por quê desse aumen­to”, disse a pesquisado­ra.

As 1.989 mortes con­tabi­lizadas pela rede, no perío­do de dois anos, sig­nifi­cam que a cada dez horas uma pes­soa mor­reu em ação de poli­ci­a­men­to. De acor­do com o bole­tim, o esta­do mais letal, con­sideran­do a pro­porção média de mortes por ação mon­i­tora­da, foi a Bahia, onde 16% das oper­ações resul­taram em mortes. No Rio de Janeiro, 10,4% dos reg­istros ger­aram mortes e, em São Paulo, 11,8%.

Para a Rede de Obser­vatórios de Segu­rança, o Rio de Janeiro e a Bahia “são exem­p­los de cor­po­rações com cul­tura de tol­erân­cia com a bru­tal­i­dade, cor­rupção e val­oriza­ção da vio­lên­cia poli­cial”. No mes­mo perío­do, 47 agentes mor­reram em ação, o que pode sinalizar que as mortes, durante as oper­ações, seri­am uma retal­i­ação à pop­u­lação e um padrão nacional de polí­cias que usam a força de for­ma abu­si­va. A pesquisado­ra desta­cou que durante a pan­demia, as pes­soas pobres, pre­tas e fave­ladas dess­es ter­ritórios ficaram reféns da vio­lên­cia e sofr­eram duas vezes. “Além de se pro­te­gerem do vírus, tin­ham que fugir dos tiros”.

Drogas e armas

Bruna Sotero afir­mou que emb­o­ra grande parte das ações ten­ha como moti­vação o com­bate ao trá­fi­co de dro­gas, as apreen­sões de entor­pe­centes não são roti­na. Na média dos dois anos mon­i­tora­dos, menos de 26% das ações poli­ci­ais resul­taram em apreen­são de dro­gas. O Ceará foi o esta­do que reg­istrou menor número de apreen­sões (7%) no últi­mo ano. “Não tem sur­tido efeito pos­i­ti­vo para a pop­u­lação”, disse Sotero. O com­bate ao trá­fi­co de dro­gas é con­sid­er­a­do uma polit­i­ca inefi­caz.

O mes­mo ocorre em relação à apreen­são de armas que, segun­do Bruna, é indica­ti­vo para aumen­to da letal­i­dade e da inse­gu­rança. A políti­ca de ampli­ação do aces­so da pop­u­lação às armas no Brasil foi crit­i­ca­da pela pesquisado­ra. “Eles [as autori­dades] con­tin­u­am investin­do em uma políti­ca total­mente inefi­caz [de com­bate às dro­gas] e, em con­tra­parti­da, ao invés de apos­tar no con­t­role do arma­men­to e na apreen­são de armas ile­gais, aumen­tam a chance de as pes­soas andarem cada vez mais armadas e de maior cir­cu­lação de armas”.

O bole­tim indi­ca que 76% das mortes vio­len­tas no país são cau­sadas por armas de fogo, com apreen­sões em somente 15% das oper­ações. São Paulo é o esta­do com o menor reg­istro pro­por­cional, de 13% e 12%, nos dois anos anal­isa­dos. No perío­do pesquisa­do, foram apreen­di­das 540 armas, sem mortes. Bruna argu­men­tou que a facil­i­dade de aces­so às armas no país “aumen­ta a pos­si­bil­i­dade de con­fli­tos inter­pes­soais”. A arma pas­sa a ser vista como meio para a res­olução de con­fli­tos, acres­cen­tou.

O bole­tim desta­ca que ações de poli­ci­a­men­to não são mon­i­toradas pelos gov­er­nos. Afir­ma que, com raras exceções, como se vê recen­te­mente em São Paulo, agentes de polí­cia real­izam nas ruas as ações que acham impor­tantes, sem qual­quer super­visão e sem avali­ação de sua efe­tivi­dade.

Forças

Entre as forças poli­ci­ais envolvi­das nas ações de jul­ho de 2020 a jun­ho de 2022, a Polí­cia Mil­i­tar respon­deu pela maior pre­sença no poli­ci­a­men­to diário, com 56,15% do total de oper­ações, segui­da pela Polí­cia Civ­il (33,52%), Guar­da Munic­i­pal (6,72%), Polí­cia Rodoviária Fed­er­al (6,01%) e Polí­cia Fed­er­al (4,36%).

O bole­tim chama a atenção para o aumen­to da par­tic­i­pação da Polí­cia Fed­er­al nas oper­ações e patrul­hamen­tos no Rio de Janeiro (15%), em São Paulo (25%) e no Ceará (28%), com sig­ni­fica­ti­vo cresci­men­to da par­tic­i­pação da Guar­da Munic­i­pal em Per­nam­bu­co (60%). Tam­bém hou­ve ampli­ação das ações da Polí­cia Rodoviária Fed­er­al no Rio (36%), com expres­si­va par­tic­i­pação em ações vio­len­tas e de alta letal­i­dade, como a Chaci­na no Com­plexo da Pen­ha.

Patrimônio

O lev­an­ta­men­to ressalta que as oper­ações moti­vadas por crimes con­tra o patrimônio, rela­cionadas prin­ci­pal­mente a fur­tos e rou­bos de automóveis, residên­cias e a rou­bos de rua, foram as que tiver­am maior cresci­men­to entre os dois perío­dos (159%). Isso seria expli­ca­do pela flex­i­bi­liza­ção de políti­cas de con­t­role da pan­demia e o aumen­to da cir­cu­lação de pes­soas nas ruas. O maior reg­istro nesse tipo de moti­vação ocor­reu em São Paulo (614%), segui­do do Rio de Janeiro com 240%.

Integração

A avali­ação da rede é que segu­rança públi­ca é vista como soma de oper­ações poli­ci­ais, mortes e apreen­são de dro­gas quan­do, na ver­dade, dev­e­ria ter um sen­ti­do mais amp­lo. Para Bruna Sotero, a políti­ca de segu­rança públi­ca não pode entrar só com a polí­cia, mas deve ser uma ação integra­da. “Não se pode entrar ness­es ter­ritórios só com a polí­cia, mas com edu­cação, saúde, sanea­men­to bási­co, para que as pes­soas pos­sam ter uma vida mel­hor”. Ela espera que a par­tir dos dados rev­e­la­dos no bole­tim, seja fei­ta uma análise dos pon­tos neg­a­tivos da segu­rança públi­ca e se comece a pen­sar em políti­ca integra­da para o setor.

Posicionamentos

A Sec­re­taria da Segu­rança Públi­ca da Bahia infor­mou que os dados apre­sen­ta­dos na pesquisa da Rede de Obser­vatórios da Segu­rança estão em total desacor­do com a pro­du­tivi­dade das ações poli­ci­ais no perío­do anal­isa­do, com números “absur­da­mente sub­no­ti­fi­ca­dos”. Só de dro­gas apreen­di­das entre os anos de 2020, 2021 e o primeiro semes­tre de 2022, foram cer­ca de 100 toneladas prove­nientes de oper­ações das polí­cias Mil­i­tar e Civ­il, além de ações real­izadas con­jun­ta­mente com as polí­cias Fed­er­al e Rodoviária, incluin­do a errad­i­cação de plan­tações de macon­ha. No mes­mo perío­do, 98 fuzis foram reti­ra­dos das mãos de crim­i­nosos na Bahia.

O lev­an­ta­men­to tam­bém apre­sen­ta dados rel­a­tivos ao número de pes­soas pre­sas em oper­ações poli­ci­ais. “Ape­nas uma oper­ação da Polí­cia Civ­il, a Uno Cor­pus, foi respon­sáv­el pela prisão de 516 pes­soas, o que demon­stra total descom­pro­mis­so da pesquisa com a real­i­dade”.

A Sec­re­taria estad­ual de Polí­cia Mil­i­tar do Rio respon­deu, por meio da asses­so­ria de impren­sa, que as ações da cor­po­ração “são pre­ce­di­das e dire­cionadas a par­tir de infor­mações do setor de inteligên­cia e de órgãos ofi­ci­ais, como o Insti­tu­to de Segu­rança Públi­ca (ISP), sendo exe­cu­tadas com base em pro­to­co­los téc­ni­cos definidos pelas leg­is­lações e deter­mi­nações judi­ci­ais vigentes”.

Acres­cen­tou que somente neste ano de 2022, foram pre­sos mais de 19.800 crim­i­nosos, apreen­di­dos mais de 2.300 ado­les­centes infratores e reti­radas das ruas mais de 3.900 armas de fogo, sendo 221 fuzis.

A Polí­cia Fed­er­al, por sua vez, comu­ni­cou que não comen­ta declar­ações ou divul­gações de out­ras insti­tu­ições.

Até o fechamen­to des­ta matéria, não foram rece­bidas respostas das sec­re­tarias de Segu­rança Públi­ca do Ceará, de Per­nam­bu­co e São Paulo, nem da Polí­cia Rodoviária Fed­er­al.

Edição: Graça Adju­to

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