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CNDH denuncia trabalho escravo em oficinas de costura em São Paulo

Repro­dução: @Agência Brasil / EBC

Casos envolvem sobretudo pessoas de outras nacionalidades


Pub­li­ca­do em 29/08/2023 — 17:52 Por Lety­cia Bond — Repórter da Agên­cia Brasil — São Paulo

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Uma comi­ti­va do Con­sel­ho Nacional de Dire­itos Humanos (CNDH) que via­jou à cap­i­tal paulista desco­briu, nes­ta sem­ana, a existên­cia de cer­ca de 150 ofic­i­nas de cos­tu­ra onde tra­bal­hadores, sobre­tu­do de out­ras nacional­i­dades, são víti­mas de tra­bal­ho anál­o­go à escravidão. A infor­mação, que dev­erá con­star de relatório divul­ga­do na próx­i­ma quin­ta-feira (31), foi adi­anta­da à Agên­cia Brasil pela con­sel­heira Virgí­nia Berriel, que coor­de­na a Comis­são de Tra­bal­ho, Edu­cação e Seguri­dade Social do CNDH.

A rep­re­sen­tante do con­sel­ho rela­tou que apurou a situ­ação a par­tir de con­ver­sas, no últi­mo domin­go (27), com um grupo de cer­ca de 120 imi­grantes e refu­gia­dos da Bolívia, do Equador e da Venezuela. Há, ain­da, pes­soas do Paraguai e do Peru nes­sa condição, con­forme salien­ta Virgí­nia. “As ofic­i­nas fun­cionam como casas. As pes­soas moram e tra­bal­ham nelas. Isso é muito doí­do”, afir­mou, em entre­vista, em que sinal­i­zou que o con­sel­ho dev­erá pedir apoio ao Min­istério das Relações Exte­ri­ores para encon­trar soluções.

Virgí­nia con­tou que o tra­bal­ho nas ofic­i­nas começa, geral­mente, às 7h, e se estende até a meia-noite, com peque­nas e raras pausas ao lon­go do dia, o que con­figu­ra jor­na­da exaus­ti­va e fere os dire­itos dos tra­bal­hadores. A coor­de­nado­ra obser­va, ain­da, que a maio­r­ia dos fun­cionários que atu­am no ramo da con­fecção, na cap­i­tal paulista, é boli­viana. “E não é que eles sejam cos­tureiros e cos­tureiras, eles entraram nesse mer­ca­do para sobre­viv­er. Vão apren­den­do e fazen­do cada vez mais.”

Pelos relatos, o CNDH apurou que os tra­bal­hadores pagam tan­to por ali­men­tos quan­to pelos ban­hos que cada inte­grante de suas famílias toma ness­es locais que servem como ofic­i­na e residên­cia. Out­ro aspec­to desta­ca­do pela con­sel­heira é que, mes­mo quan­do os tra­bal­hadores con­seguem rel­a­ti­va lib­er­tação de suas obri­gações com os empre­gadores, acabam optan­do por per­manecer no seg­men­to e na ativi­dade, com­pran­do máquinas de cos­tu­ra e abraçan­do a ideia de que estão empreen­den­do, quan­do, na ver­dade, con­tin­u­am em um quadro de pre­cariedade.

“Às vezes, até con­tratam out­ro tra­bal­hador e aque­le ciclo do tra­bal­ho anál­o­go à escravidão vai se per­pet­uan­do. A nos­sa per­cepção é de que é uma coisa doen­tia, porque eles pro­duzem cada vez mais, se cul­pam por não tra­bal­har mais. Essa jor­na­da é nor­mal para eles, o que é ter­rív­el para nós”, disse Virgí­nia.

As horas em exces­so servem para eles como um parâmetro aceitáv­el no sen­ti­do de que se sen­tem obri­ga­dos a cumpri-las para poder enviar din­heiro a par­entes que estão em seus país­es de origem. Jun­to com isso, há o sen­ti­men­to de que pre­cisam demon­strar gratidão aos brasileiros que suposta­mente lhes der­am uma opor­tu­nidade.

Abusos em ambiente doméstico

A situ­ação de tra­bal­hadores que sofrem explo­ração em ambi­entes domés­ti­cos, a pon­to de con­fig­u­rar tra­bal­ho anál­o­go à escravidão, tam­bém é o foco da comi­ti­va do CNDH, que irá abor­dar o tema aman­hã, na Assem­bleia Leg­isla­ti­va de São Paulo (Ale­sp), em audiên­cia públi­ca. Entre os tra­bal­hadores domés­ti­cos, há o pre­domínio de mul­heres negras.  Virgí­nia disse que as condições de enfrenta­men­to em São Paulo estão com­pro­meti­das, con­forme pon­tu­ou, em reunião, o próprio Min­istério Públi­co do Tra­bal­ho (MPT), que ale­gou con­tar, atual­mente, com um efe­ti­vo reduzi­do e, por­tan­to, insu­fi­ciente para lidar com o desafio que se impõe.

“A Justiça pre­cisa ser mais célere na questão do tra­bal­ho anál­o­go à escravidão, porque, às vezes, é uma vida toda ded­i­ca­da a essas famílias. E tem a coisa da família, porque essas pes­soas se apegam, não querem sair, por não enten­derem que estão sendo escrav­izadas. Eles manip­u­lam essas pes­soas com o sen­ti­men­to”, frisou Virgí­nia Berriel, acres­cen­tan­do que tomou con­hec­i­men­to do caso de uma domés­ti­ca que foi víti­ma de tra­bal­ho anál­o­go à escravidão e mor­reu aos 78 anos, sem rece­ber ind­eniza­ção, porque o Poder Judi­ciário não final­i­zou o proces­so que respon­s­abi­lizaria a família que a explor­ou.

Agên­cia Brasil entrou em con­ta­to com o Min­istério Públi­co do Tra­bal­ho em São Paulo (MPT-SP), a prefeitu­ra, o gov­er­no do esta­do, a Sec­re­taria da Segu­rança Públi­ca e a Polí­cia Fed­er­al e aguar­da con­ta­to, caso queiram se man­i­fes­tar.

Caso da doméstica no Brás

Nes­ta segun­da-feira (28), o Min­istério Públi­co Fed­er­al (MPF) infor­mou que denun­ciou um casal que man­teve uma mul­her em condições análo­gas à escravidão durante 33 anos, na cap­i­tal paulista. A tra­bal­hado­ra emen­da­va expe­di­entes na residên­cia do casal e em uma loja dos dois, ambas no Brás, sem rece­ber remu­ner­ação, nem ter des­can­so e out­ros dire­itos tra­bal­his­tas.

De acor­do com o órgão, ela cumpria jor­nadas das 7h às 22h ou mais tarde e tam­bém sofreu agressões físi­cas e assé­dio moral. O casal a vigia­va através de uma câmera insta­l­a­da na parte do imóv­el em que ela vivia. Ela con­seguiu fugir em jul­ho do ano pas­sa­do, após procu­rar vaga de acol­hi­men­to em um cen­tro de assistên­cia social do municí­pio.

“A situ­ação da tra­bal­hado­ra já havia sido obje­to de um acor­do que os patrões fir­maram em 2014, medi­a­do pelo Min­istério do Tra­bal­ho e Emprego. Na ocasião, eles assumi­ram o com­pro­mis­so de efe­t­u­ar o reg­istro em carteira da empre­ga­da, pagar salários men­sais e sal­dar out­ras obri­gações tra­bal­his­tas. Porém, nen­hum dos deveres foi cumpri­do. A mul­her chegou a gan­har um salário, mas, nos meses seguintes, respon­s­abi­liza­da pela que­bra de uma máquina de lavar roupas, deixou de rece­ber as remu­ner­ações”, escreve o MPF.

“Em depoi­men­to às autori­dades, o casal procurou eximir-se de respon­s­abil­i­dade afir­man­do que con­sid­er­a­va a mul­her uma pes­soa ‘da família’ ”, com­ple­men­ta o órgão.

Edição: Juliana Andrade

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