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Conselho tutelar pode ser diferença entre vida e morte, diz ministério

Repro­dução: © Antônio Cruz/Agência Brasil

Neste domingo, eleitores vão escolher cerca de 30,5 mil conselheiros


Pub­li­ca­do em 01/10/2023 — 08:00 Por Car­oli­na Pimentel — Repórter da Agên­cia Brasil — Brasília

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Neste domin­go (1º), eleitores de todos os municí­pios brasileiros irão às urnas para escol­her seus rep­re­sen­tantes nos 6,1 mil con­sel­hos tute­lares exis­tentes no país. No total, 30,5 mil con­sel­heiros serão escol­hi­dos, segun­do o Min­istério dos Dire­itos Humanos e da Cidada­nia (MDHC).  Os con­sel­heiros e con­sel­heiras tute­lares são eleitos com a mis­são de garan­tir que os dire­itos de cri­anças e ado­les­centes sejam respeita­dos. Exis­tentes há mais três décadas, os con­sel­hos foram cri­a­dos a par­tir de uma deter­mi­nação pre­vista no Estatu­to da Cri­ança e do Ado­les­cente (ECA).

Em entre­vista à Agên­cia Brasil, o coor­de­nador-ger­al de For­t­alec­i­men­to do Sis­tema de Garan­tia de Dire­itos do MDHC, Diego Alves, desta­cou a importân­cia da mobi­liza­ção pop­u­lar para a escol­ha dos con­sel­heiros e con­sel­heiras tute­lares. “A escol­ha do con­sel­heiro tute­lar mais ade­qua­do sim­ples­mente pode ser a difer­ença entre a vida e a morte de quem pre­cisa desse atendi­men­to. É desse nív­el de importân­cia que a gente está falan­do. A cri­ança que está sofren­do vio­lações com reit­er­a­do esta­do de vio­lên­cia, de neg­ligên­cia e que não tem o atendi­men­to ade­qua­do ou que é aten­di­da por um con­sel­heiro que não está capac­i­ta­do, que não é a figu­ra ade­qua­da para faz­er esse atendi­men­to, pode acabar até mes­mo mor­ren­do”, disse.

Leia a seguir os prin­ci­pais tre­chos da entre­vista:

Agên­cia Brasil: Qual a importân­cia des­ta eleição de domin­go para con­sel­heiros tute­lares?
Diego Alves: Bom, o Con­sel­ho Tute­lar é um órgão essen­cial para cri­anças e ado­les­centes. Não é à toa que, quan­do se cria o Estatu­to da Cri­ança e do Ado­les­cente, você cria esse órgão que é para ser o fis­cal­izador da garan­tia dos dire­itos. Ele é o rep­re­sen­tante de cada comu­nidade, de cada cidade para ver se os dire­itos da lei pre­vis­tos no estatu­to estão sendo garan­ti­dos ou não, se não estão, para artic­u­lar todo o sis­tema de garan­tia em torno dele e defend­er e efe­ti­var ess­es dire­itos. Então, é um órgão abso­lu­ta­mente essen­cial para as cri­anças e ado­les­centes. E não só isso, ele é um órgão democráti­co. Ele é pre­vis­to para ser eleito pela sociedade, jus­ta­mente para rep­re­sen­tar a von­tade daque­la comu­nidade e as pes­soas mais qual­i­fi­cadas, enga­jadas ref­er­en­ci­adas pela sociedade a atu­ar em nome dela na garan­tia dos dire­itos das ado­les­centes, para aten­der às cri­anças, ori­en­tar as famílias e artic­u­lar a rede. É uma lid­er­ança comu­nitária muito impor­tante e pre­sente em todas as cidades do Brasil. É algo de mui­ta capi­lar­i­dade.

Agên­cia Brasil: Como o gov­er­no está acom­pan­han­do as eleições no país?
Alves: O Min­istério dos Dire­itos Humanos e da Cidada­nia, por meio da Sec­re­taria Nacional dos Dire­itos da Cri­ança e do Ado­les­cente, tem acom­pan­hado muito de per­to essas eleições ao lon­go de todo ano. No ano pas­sa­do, o Con­sel­ho Nacional dos Dire­itos da Cri­ança e do Ado­les­cente já emi­tiu uma res­olução sobre o proces­so de escol­ha deste ano bus­can­do mel­ho­rias, para transcor­rer de uma for­ma mais cor­re­ta, mais trans­par­ente e mais alin­ha­da com o que é o obje­ti­vo do estatu­to. Este ano, o min­istério teve uma série de ações. Primeira­mente, lançou um guia para os con­sel­hos munic­i­pais dos dire­itos da cri­ança e do ado­les­cente, que é o órgão respon­sáv­el por orga­ni­zar a eleição. Tem esse guia aqui assi­na­do pelo min­istério de for­ma a ori­en­tar os con­sel­hos de dire­ito. Além dis­so, o min­istério tam­bém criou um grupo de tra­bal­ho para acom­pan­har dire­ta­mente esse proces­so de escol­ha em todas essas eta­pas. Está fun­cio­nan­do durante todo este ano, e ao final, vai até emi­tir um relatório pro­pon­do mel­ho­rias no proces­so de escol­ha, porque a gente acha que tem muito a ser mel­ho­ra­do. O min­istério tem se enga­ja­do com mui­ta ded­i­cação nas infor­mações para a sociedade visan­do mobi­lizar e con­vencer as pes­soas da importân­cia de votar, já que essa é uma eleição fac­ul­ta­ti­va, não é obri­gatória. Aprovei­tan­do esse momen­to para con­vencer e traz­er infor­mação para as pes­soas sobre os dire­itos da cri­ança e do ado­les­cente e sobre o Con­sel­ho Tute­lar, que pre­cisa ser muito mais con­heci­do, for­t­ale­ci­do e val­oriza­do pela sociedade. Além dis­so, a gente provo­cou o TSE [Tri­bunal Supe­ri­or Eleitoral] para par­tic­i­par mais ati­va­mente do proces­so e resul­tou numa res­olução do TSE, de jun­ho, que dis­ci­plinou o fornec­i­men­to das urnas eletrôni­cas para uti­liza­ção nes­sas eleições, o que é uma vitória históri­ca. Este ano a gente deve ter o maior número de urnas eletrôni­cas usadas pelo maior número de cidades, o que vai favore­cer o com­parec­i­men­to, a transparên­cia e a agili­dade da votação.

Agên­cia Brasil: Por que o brasileiro deve sair de casa para votar em um con­sel­heiro tute­lar? O que isso muda na vida do cidadão e da sociedade?
Alves: Olha, a escol­ha do con­sel­heiro tute­lar mais ade­qua­do sim­ples­mente pode ser a difer­ença entre a vida e a morte de quem pre­cisa desse atendi­men­to. É desse nív­el de importân­cia que a gente está falan­do. A cri­ança que está sofren­do vio­lações com reit­er­a­do esta­do de vio­lên­cia, de neg­ligên­cia e que não tem o atendi­men­to ade­qua­do ou que é aten­di­do por um con­sel­heiro que não está capac­i­ta­do, que não é a figu­ra ade­qua­da para faz­er esse atendi­men­to, pode acabar até mes­mo mor­ren­do, como vários casos que a gente já viu. Vamos lem­brar de um caso que teve mui­ta reper­cussão da meni­na Sophia, em Cam­po Grande. Ela foi aten­di­da por reit­er­a­dos órgãos, entre eles o Con­sel­ho Tute­lar, e ninguém foi capaz de iden­ti­ficar a vio­lên­cia que ela esta­va sendo sub­meti­da até que ela fale­ceu. [Sophia, de 2 anos, foi mor­ta pela mãe e padras­to. Ela tin­ha sido aten­di­da pelo menos 30 vezes em unidades de saúde].

Agên­cia Brasil: Em sua avali­ação, qual o per­fil ide­al de um con­sel­heiro tute­lar?
Alves: Os req­ui­si­tos que o Estatu­to da Cri­ança e do Ado­les­cente esta­b­ele­cem, como mín­i­mos, para con­tem­plar são três: idade supe­ri­or a 21 anos; residir no domicílio onde vai se can­di­datar, ou seja, morar na cidade onde vai ser con­sel­heiro tute­lar, isso mostra o vín­cu­lo com a comu­nidade, o que é impre­scindív­el; e a idonei­dade moral, é necessário que não ten­ha nada no históri­co que o impeça de exercer esta função. Tem que ser uma pes­soa de con­fi­ança. Mas para além dess­es req­ui­si­tos que o estatu­to pre­vê, as prefeituras, as leis munic­i­pais podem esta­b­ele­cer mais critérios, inclu­sive o Con­sel­ho Nacional dos Dire­itos Humanos recomen­da tam­bém a exigên­cia de exper­iên­cia prévia na atu­ação com a pro­moção, defe­sa e garan­tia do dire­ito, de ten­ha tem­po de atu­ação em algum serviço públi­co munic­i­pal e ou estad­ual que aten­da cri­anças e ado­les­centes, de acol­hi­men­to, socioe­d­uca­ti­va e de profis­sion­al­iza­ção, que tra­bal­ha com cri­anças e ado­les­centes. É muito impor­tante que ten­ha essa exper­iên­cia e tam­bém hoje em dia pre­cisa de ter um con­hec­i­men­to téc­ni­co para lidar com a leg­is­lação, com as nor­mas, com o sis­tema de garan­tia de dire­ito. Em muitos casos, o con­sel­heiro tam­bém deve demon­strar esse con­hec­i­men­to por meio de provas que muitos municí­pios apli­cam.

Agên­cia Brasil: Quais são os prin­ci­pais desafios dos con­sel­hos tute­lares?
Alves: O con­sel­ho tute­lar tem muitos desafios. E o primeiro é ser mais recon­heci­do, val­oriza­do e for­t­ale­ci­do pela sociedade. Os con­sel­hos tute­lares têm que atu­ar com mui­ta diligên­cia, mui­ta ded­i­cação de cumpri­men­to das suas atribuições na for­ma da lei, inclu­sive porque tem sido muito detur­pa­da. Pou­ca gente con­hece e às vezes desvia dessa função, chegan­do inclu­sive a casos em que con­sel­heiros vio­lam dire­itos em vez de garan­ti-los. A gente vive uma real­i­dade de muitas vio­lações de dire­ito no Brasil. Cri­anças fora da esco­la, de tra­bal­ho infan­til, de vio­lên­cia, em espe­cial da vio­lên­cia sex­u­al enorme, que pre­cisa ser com­bat­i­da. Pre­cisa ser uma atu­ação muito deci­si­va dos con­sel­hos, que são órgãos mais pre­sentes na comu­nidade para aten­der, iden­ti­ficar, denun­ciar, atu­ar na respon­s­abi­liza­ção e na defe­sa dessas víti­mas.

Agên­cia Brasil: Quais políti­cas públi­cas o gov­er­no tem elab­o­ra­do para for­mação dos con­sel­heiros?
Alves: O Min­istério dos Dire­itos Humanos está voltan­do uma políti­ca de for­mação, que é a esco­la de con­tex­tos. Uma políti­ca que já foi imple­men­ta­da em alguns momen­tos, mas ago­ra a gente está retoman­do, porque acha que ess­es con­sel­heiros pre­cisam de for­mação con­tin­u­a­da, como pre­vê o Estatu­to da Cri­ança e do Ado­les­cente, e que seja pres­en­cial e integra­da entre os con­sel­hos tute­lares com demais órgãos do sis­tema de garan­tia de dire­itos, que atu­am jun­tos aten­den­do cri­anças e ado­les­centes. Essa rede de atendi­men­to pre­cisa ser for­t­ale­ci­da como uma for­mação con­jun­ta para todos. Este ano, o min­istério deve inve­stir mais de R$ 5 mil­hões na retoma­da desse pro­gra­ma, esperan­do con­seguir colo­car cada vez mais recur­so nesse pro­je­to e assim estru­tu­rar um órgão em todos os esta­dos do Brasil, para que seja uma estru­tu­ra cen­tral­izado­ra da for­mação de refer­ên­cia. Além dis­so, a gente segue disponi­bi­lizan­do cur­sos online na Esco­la Nacional de Dire­ito da Cri­ança e do Ado­les­cente, que podem ser aces­sa­dos por qual­quer um a qual­quer tem­po.

Agên­cia Brasil: Como é o orça­men­to de um con­sel­ho tute­lar? Há pre­visão de aporte adi­cional?
Alves: O orça­men­to do Con­sel­ho Tute­lar é vin­cu­la­do à prefeitu­ra. É bom lem­brar que o con­sel­ho é um órgão vin­cu­la­do à admin­is­tração públi­ca munic­i­pal pelo que está na lei. Cada municí­pio deve pre­v­er no seu orça­men­to os recur­sos para o fun­ciona­men­to. Ain­da assim, o gov­er­no fed­er­al tem tra­bal­ha­do muito para apoiar ess­es con­sel­hos tute­lares, com aporte de equipa­men­tos que está sendo refor­mu­la­do e for­t­ale­ci­do, com fornec­i­men­to de car­ros, com­puta­dores, impres­so­ras e out­ros bens para serem uti­liza­dos nos atendi­men­tos e for­t­ale­cer o órgão. A par­tir da real­i­dade brasileira, vamos começar a entre­gar tam­bém bar­cos e car­ros com tração, que pos­sam andar nas áreas rurais. Futu­ra­mente, a gente gostaria muito de con­seguir o cofi­nan­cia­men­to do sis­tema de garan­tia de dire­itos, esta­mos tra­bal­han­do para ver se é pos­sív­el. Mas o gov­er­no fed­er­al tem toda a intenção de con­tribuir com as prefeituras nes­sa políti­ca, assim como acred­i­ta­mos que os esta­dos tam­bém devem se envolver e apoiar o sis­tema de garan­tia de dire­itos.

Agên­cia Brasil: Como o sen­hor vê a questão da poli­ti­za­ção das eleições do con­sel­ho? Pes­soas lig­adas a políti­cos ou que usam o con­sel­ho tute­lar como tram­polim para uma car­reira políti­ca?
Alves: É bas­tante prob­lemáti­co na medi­da em que a intenção da pes­soa ao se can­di­datar não é exata­mente a defe­sa dos dire­itos da cri­ança e do ado­les­cente, isso aca­ba resul­tan­do em uma atu­ação enviesa­da, atu­ação vio­lado­ra de dire­itos. É impor­tante diz­er que não há qual­quer prob­le­ma nas pes­soas terem vin­cu­lação par­tidária, ded­i­cação a um par­tido, qual­quer religião, qual­quer grupo des­de que a sua atu­ação seja con­duzi­da pela lei e não pelas suas crenças pes­soais, ou seja, des­de que o inter­esse da cri­ança ven­ha primeiro, não há prob­le­ma pes­soas de qual­quer religião, de qual­quer par­tido e ter um bom con­sel­ho tute­lar, inclu­sive há inúmeros casos de pes­soas vin­cu­ladas a par­tidos e às mais diver­sas religiões que são exce­lentes con­sel­heiros tute­lares, porque sabem difer­en­ciar a sua atu­ação pes­soal da atu­ação no con­sel­ho, porque sabem que pre­cisam ter uma atu­ação profis­sion­al e estri­ta­mente legal. A gente tem iden­ti­fi­ca­do, ten­ta­do ado­tar medi­das para evi­tar abu­so do poder políti­co, do poder reli­gioso nas eleições pelas res­oluções do Conan­da, que é o Con­sel­ho Nacional das Cri­anças e dos Ado­les­centes. De fato, é um prob­le­ma que só vai ser resolvi­do quan­do a sociedade quis­er mobi­lizar-se para votar pelas pes­soas que vão defend­er o dire­ito das cri­anças e ado­les­centes, e não por qual­quer out­ro moti­vo.

Edição: Juliana Andrade

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