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Corais podem evitar R$ 160 bilhões em danos ao litoral do Nordeste

Repro­dução: © Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

Recifes costeiros também podem render R$ 7 bilhões para o turismo


Pub­li­ca­do em 31/10/2023 — 07:03 Por Vitor Abdala – Repórter da Agên­cia Brasil — Taman­daré (PE)*

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As fran­jas de recifes de corais que atraem tur­is­tas para a cos­ta do Nordeste brasileiro tam­bém fun­cionam como impor­tantes bar­reiras con­tra a ação do mar em muitas cidades da região.

Um estu­do inédi­to, real­iza­do pela Fun­dação Grupo Boticário, mostra que essas for­mações nat­u­rais impe­dem pre­juí­zos de até R$ 160 bil­hões na infraestru­tu­ra urbana, reduzin­do a força e a altura das ondas que chegam ao litoral.

Recife(PE), 24/10/2023 - Explosão de ondas nos recifes costeiros na praia do Buraco da Véia, com a orla de Boa Viagem ao fundo, funcionando como barreira natural. As formações rochosas absorvem até 96% do impacto das ondas. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Repro­dução: Explosão de ondas nos recifes costeiros na pra­ia do Bura­co da Véia, com a orla de Boa Viagem ao fun­do. As for­mações rochosas absorvem até 96% do impacto das ondas — Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

O val­or foi cal­cu­la­do usan­do como base o poten­cial pre­juí­zo que ressacas e tem­pes­tades pode­ri­am causar a estru­turas como pré­dios, casas, indús­trias, por­tos, rodovias, ruas e calçadas, por exem­p­lo, caso não hou­vesse recifes de corais para amorte­cer as ondas mais fortes.

Qua­tro cidades foram usadas como parâmetro para o cál­cu­lo (Recife e Ipo­ju­ca, em Per­nam­bu­co; e Mar­a­go­gi e São Miguel dos Mila­gres, em Alagoas). Os val­ores encon­tra­dos nes­sas cidades foram depois extrap­o­la­dos para out­ros municí­pios que tam­bém recebem a pro­teção dos recifes.

Já as cidades costeiras não pro­te­gi­das por recifes de corais como San­tos ou Rio de Janeiro, por exem­p­lo, enfrentam destru­ição de estru­turas da orla quan­do se veem afe­tadas por ressacas mais fortes.

» Clique aqui e leia todas as reporta­gens da Agên­cia Brasil sobre os recifes de corais no litoral do Nordeste

Turismo

“Já é con­heci­do que os recifes de corais prestam diver­sos serviços, entre eles a pro­teção costeira e o tur­is­mo. O que nós troux­e­mos foram val­ores, em reais. Todo esse patrimônio, seja cul­tur­al, públi­co ou par­tic­u­lar, está sendo pro­te­gi­do diari­a­mente pelos recifes de coral”, expli­ca a biólo­ga mar­in­ha Janaí­na Bum­beer, ger­ente de pro­je­tos da Fun­dação Boticário.

Tamandaré (PE), 25/10/2023 - A bióloga Janaína Bumbeer, doutora em Ecologia e Conservação Marinha, mergulha no recife Pirambu, na APA Costa dos Corais. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Repro­dução: A biólo­ga Janaí­na Bum­beer, douto­ra em Ecolo­gia e Con­ser­vação Mar­in­ha, mer­gul­ha no recife Piram­bu, em Taman­daré (PE) — Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

Além de evi­tar danos bil­ionários, os 170 quilômet­ros quadra­dos (km²) de fran­jas de recifes de coral que exis­tem no Nordeste brasileiro tam­bém podem ger­ar, anual­mente, R$ 7 bil­hões em receitas, com ativi­dades de tur­is­mo como mer­gul­hos e pas­seios de bar­co.

O estu­do con­sider­ou a recei­ta ger­a­da por essas fran­jas em Mar­a­go­gi, São Miguel dos Mila­gres, Ipo­ju­ca (onde fica Por­to de Gal­in­has), Car­ave­las (BA) – onde fica o arquipéla­go de Abrol­hos – e Fer­nan­do de Noron­ha (PE). Ess­es des­ti­nos têm os recifes entre seus prin­ci­pais atra­tivos.

A par­tir daí, o estu­do tam­bém fez extrap­o­lações para municí­pios com poten­cial para explo­rar tur­is­ti­ca­mente essas for­mações costeiras, mas que ain­da não o fazem.

Corais

Mar­a­go­gi é um famoso des­ti­no da cos­ta Nordeste brasileira dev­i­do às ‘pisci­nas nat­u­rais’ que ren­dem lin­das fotos para as redes soci­ais e encan­tam tur­is­tas de todo o país. O que as pes­soas chamam de pisci­nas nat­u­rais, no entan­to, são áreas do mar abri­gadas da força das ondas e das cor­rentezas graças aos recifes.

Essas for­mações que pare­cem rochas são, na ver­dade, esquele­tos de corais, ani­mais da classe Antho­zoa (a mes­ma das anê­monas), que têm seu cor­po semel­hante a gelati­nas, mas que for­mam exoesquele­tos (esquele­tos fora do cor­po, assim como os inse­tos) a par­tir do car­bon­a­to de cál­cio.

Tamandaré (PE), 25/10/2023 - Monitoramento do Centro de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Marinha do Nordeste (Cepene) no recife Pirambu, na APA Costa dos Corais. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Repro­dução: Recife Piram­bu, na APA Cos­ta dos Corais, em Per­nam­bu­co — Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

Acred­i­ta-se que essa for­ma de vida ani­mal ten­ha surgi­do entre 400 e 500 mil­hões de anos atrás. Sua existên­cia, porém, está ameaça­da em todo o plan­e­ta, prin­ci­pal­mente dev­i­do às mudanças climáti­cas, que super­aque­cem as águas dos oceanos e matam os corais, e tam­bém dev­i­do a fatores como poluição, alter­ações provo­cadas pelo homem, espé­cies inva­so­ras, tur­is­mo des­or­de­na­do e pesca pre­datória.

Os corais man­têm uma sim­biose, ou seja, uma asso­ci­ação de bene­fí­cio mútuo, com as algas zoox­an­te­las, que dão cor aos ani­mais mar­in­hos e fornecem grande parte dos nutri­entes necessários para ess­es seres.

Quan­do os corais estão estres­sa­dos, no entan­to, acabam expul­san­do as algas, em um fenô­meno con­heci­do como “bran­quea­men­to”, que enfraque­ce os ani­mais e provo­ca sua morte. Isso afe­ta todo o ecos­sis­tema, já que várias for­mas de vida usam os recifes para se ali­men­tar, se repro­duzir e se abri­gar.

Tamandaré (PE), 25/10/2023 - O coral-de-fogo (Millepora alcicornis) no recife Pirambu, na APA Costa dos Corais. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Repro­dução: O coral-de-fogo (Mille­po­ra alci­cor­nis) no recife Piram­bu, na APA Cos­ta dos Corais — Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

Os corais ocu­pam cer­ca de 0,1% da super­fí­cie dos mares e oceanos, mas con­cen­tram 25% da bio­di­ver­si­dade mar­in­ha. Segun­do o Pro­gra­ma de Meio Ambi­ente das Nações Unidas (Unep), esti­ma-se que de 25% a 50% dos recifes de corais do mun­do já foram destruí­dos e, do restante, 60% estari­am ameaça­dos.

“Os corais são fil­tradores e depen­dem da qual­i­dade da água. Além dis­so, o fato de estar­mos ocu­pan­do os espaços onde havia os recifes de coral, aumen­tan­do a sed­i­men­tação, jogan­do a areia por cima [dos recifes], mudan­do a dinâmi­ca da pra­ia, que é muito del­i­ca­da, isso tudo afe­ta os corais na sua sobre­vivên­cia”, expli­ca Janaí­na Bum­beer.

Ameaças

Tamandaré (PE), 25/10/2023 - O oceanógrafo Mauro Maida, professor e pesquisador da UFPE, no recife Pirambu, na APA Costa dos Corais. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Repro­dução: O oceanó­grafo Mau­ro Mai­da, pro­fes­sor e pesquisador da UFPE, no recife Piram­bu, na APA Cos­ta dos Corais — Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

A reportagem da Agên­cia Brasil vis­i­tou o litoral de Per­nam­bu­co entre os dias 24 e 26 de out­ubro e ver­i­fi­cou algu­mas das ameaças, como tur­is­tas pisote­an­do recifes e lotan­do as pisci­nas nat­u­rais, lixo sendo deix­a­do por ess­es tur­is­tas e flu­tuan­do em meio aos corais, con­struções polêmi­cas à beira-mar e água suja fluin­do de rios para o mar.

“Na Pra­ia dos Carneiros [em Taman­daré], der­rubaram todas as restin­gas e con­struíram um monte de pré­dio”, con­ta Mau­ro Mai­da, pro­fes­sor do Depar­ta­men­to de Oceanografia da Uni­ver­si­dade Fed­er­al de Per­nam­bu­co (UFPE).

Segun­do ele, os corais têm uma taxa de cresci­men­to muito lenta, alguns milímet­ros por ano, o que faz com que sejam necessárias décadas para se ter uma colô­nia de taman­ho grande.

“Nat­u­ral­mente ocorre a erosão dos recifes. O recife é um bal­anço de con­strução e erosão. Se você não tem coral, você não tem con­strução [do recife]. E se só tem erosão, o recife vai rebaixar e os 2,5 met­ros de maré, que a gente tem no esta­do, avançam e causam erosão costeira”.

A biólo­ga Gis­laine Lima, da orga­ni­za­ção não gov­er­na­men­tal Pro­je­to de Con­ser­vação Reci­fal, expli­ca que a cap­i­tal per­nam­bu­cana, por exem­p­lo, sofreu muito com a expan­são urbana de sua orla nas últi­mas décadas, com a con­strução de cen­te­nas de pré­dios.

“Cinquen­ta, 60 anos atrás, a gente tin­ha três pré­dios aqui [em Boa Viagem]. Era uma área de casas de ver­aneio, para pes­soas mais ric­as de Recife, e uma vila de pescadores”, expli­ca Gis­laine. “Todas essas con­struções aumen­tam o assore­a­men­to”.

Soluções

Para man­ter a saúde dos recifes de corais e garan­tir que eles con­tin­uem pro­te­gen­do a cos­ta e pro­moven­do receitas para os municí­pios que vivem do tur­is­mo costeiro, o estu­do sug­ere algu­mas medi­das, como dire­ciona­men­to de recur­sos dos gov­er­nos para as unidades de con­ser­vação, imple­men­tação de taxas para a preser­vação da cos­ta, mon­i­tora­men­to da saúde dos recifes e pro­moção de um tur­is­mo sus­ten­táv­el.

“Os recifes de coral podem ser mais explo­rados de for­ma pos­i­ti­va, não de for­ma pre­datória que vá dan­i­ficar ain­da mais os corais. Então, é impor­tante a gente inve­stir em tur­is­mo sus­ten­táv­el, o tur­is­mo de base comu­nitária, que envolve as comu­nidades locais; a ciên­cia cidadã e o tur­is­mo regen­er­a­ti­vo, no qual as pes­soas fazem parte do proces­so de aju­dar a restau­rar aque­le ambi­ente”, expli­ca Janaí­na Bum­beer.

Recife(PE), 24/10/2023 - Comunidade de pescadores de Brasília Teimosa, cujo trabalho depende da preservação dos recifes costeiros, habitat de espécies no ecossistema marinho. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Repro­dução: Comu­nidade de pescadores de Brasília Teimosa, cujo tra­bal­ho depende da preser­vação dos recifes costeiros, habi­tat de espé­cies no ecos­sis­tema mar­in­ho — Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

Por meio de nota, a Sec­re­taria Estad­ual do Meio Ambi­ente de Per­nam­bu­co infor­mou que os recifes de corais são um dos prin­ci­pais ecos­sis­temas mar­in­hos do esta­do e que, atual­mente, há dez pro­je­tos volta­dos dire­ta­mente para sua con­ser­vação, como os planos de com­bate ao lixo no mar e de com­bate a espé­cies inva­sores; e o esta­b­elec­i­men­to de regras e zonas para a práti­ca de tur­is­mo náu­ti­co e para a pesca.

Além dis­so, a Sec­re­taria infor­mou que desen­volve ações que, “trans­ver­salmente, estão a ben­e­fi­ciar os recifes de corais, como a Políti­ca Estad­ual de Resí­du­os Sóli­dos, que envolve a capac­i­tação de todos os municí­pios do esta­do para lidar com seus resí­du­os e rejeitos sóli­dos e líqui­dos”, infor­ma a nota.

*A equipe da Agên­cia Brasil via­jou a con­vite da Fun­dação Grupo Boticário

Edição: Denise Griesinger

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