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Desfile de 7 de Setembro sinaliza para volta da harmonia e comemoração

Repro­dução: © Fabio Rodrigues-Pozze­bom/ Agên­cia Brasil

Slogan deste ano é Democracia, Soberania e União


Pub­li­ca­do em 07/09/2023 — 10:20 Por Luciano Nasci­men­to – Repórter da Agên­cia Brasil — São Luís

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A decisão do gov­er­no do pres­i­dente Luiz Iná­cio Lula da Sil­va de colo­car como tema da sem­ana da Pátria o slo­gan Democ­ra­cia, Sobera­nia e União sinal­iza para a vol­ta da prin­ci­pal data comem­o­ra­ti­va à temáti­ca repub­li­cana e para a har­mo­nia, após a mudança no per­fil do des­file nos últi­mos anos, quan­do a cel­e­bração do 7 de setem­bro foi usa­da politi­ca­mente pelo então pres­i­dente Jair Bol­sonaro para ameaçar insti­tu­ições democráti­cas. A opinião é de espe­cial­is­tas ouvi­dos pela Agên­cia Brasil.

Para o pro­fes­sor Her­al­do Makrakis, pós-doutor em Estu­dos Estratégi­cos Inter­na­cionais pela Uni­ver­si­dade Fed­er­al do Rio Grande do Sul e doutor em Ciên­cias Mil­itares pela Esco­la de Coman­do e Esta­do-Maior do Exérci­to, o gov­er­no acer­tou ao escol­her um tema que reforça o sen­ti­do de democ­ra­cia.

“Todo ato cívi­co tem seu cun­ho políti­co, no entan­to, ele deve ser real­iza­do de for­ma pro­to­co­lar, como todo ato de gov­er­no. O que parece difer­en­ciar a pro­pos­ta atu­al das as ante­ri­ores, fazen­do alusão ao gov­er­no Jair Bol­sonaro, é que o tema dado de antemão indi­ca ser mais repub­li­cano, porque tem um tema rep­re­sen­tan­do preâm­bu­lo con­sti­tu­cional e não grandes dis­cur­sos sobre pátria, família e Deus que são temáti­cas sem vín­cu­lo com um pon­to pro­to­co­lar da Con­sti­tu­ição.”

O pro­fes­sor diz ain­da que o ex-pres­i­dente usa­va o espaço insti­tu­cional em seu bene­fí­cio, ali­men­tan­do a retóri­ca de que as Forças Armadas estavam sub­or­di­nadas a ele, não ao car­go que ocu­pa­va, e para atacar adver­sários.

“Isso é uma retóri­ca para o seu públi­co e foi fei­ta, no meu entendi­men­to, de uma for­ma descon­cer­tante. Se de um lado ele afir­ma­va que joga­va den­tro das qua­tro lin­has da Con­sti­tu­ição Fed­er­al, do out­ro uti­liza­va o palanque e o momen­to cívi­co-políti­co, que dev­e­ria ser pro­to­co­lar, para destratar autori­dades. Não me parece ade­qua­do e nada pro­to­co­lar”, pon­tu­ou.

Ênfase na democracia

Brasília (DF), 07-09-2023 - Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao lado do Vice-presidente Geraldo Alckmin, participam do desfile Cívico-Militar de 7 de Setembro na Esplanada dos Ministérios em Brasília. Foto: Cadu Gomes/VPR
Repro­dução: Públi­co na Esplana­da dos Min­istérios, no cen­tro de Brasília, acom­pan­ha o Des­file de 7 de Setem­bro — Cadu Gomes/VPR

O pesquisador do Insti­tu­to Tri­con­ti­nen­tal de Pesquisa Social, que con­ta com pesquisadores do Brasil, Argenti­na e Índia, e doutoran­do em Ciên­cias Soci­ais pela Uni­ver­si­dade Fed­er­al de Camp­ina Grande (UFCG) Ana­nias Oliveira tem avali­ação sim­i­lar. Oliveira que pesquisa sobre mil­itares, democ­ra­cia e políti­ca, disse à Agên­cia Brasil que a temáti­ca con­sol­i­da a ideia de respeito e democ­ra­cia.

“A temáti­ca escol­hi­da para 7 de setem­bro é muito inter­es­sante porque dá ênfase à democ­ra­cia, à sobera­nia e à união, ou seja, o entendi­men­to de paz e de respeito e tam­bém à sobera­nia”, afir­mou.

“A gente tem que enten­der que há uma con­cepção de democ­ra­cia nos­sa, da sociedade civ­il, e a dos mil­itares e isso tem que ser tra­bal­ha­do. Esse dis­tan­ci­a­men­to tem que ser feito. O que o Bol­sonaro fazia era aten­tar con­tra a democ­ra­cia em um dia que era para inspi­rar a Democ­ra­cia”, com­ple­tou Oliveira que apon­tou ain­da que as ações do ex-pres­i­dente con­tavam com “anuên­cia e apoio dos mil­itares ou de mil­itares de alta patente, das cúpu­las hierárquicas”.

Oliveira con­sid­era ain­da que, ao des­do­brar o des­file em qua­tro eixos temáti­cos – Paz e Sobera­nia, Ciên­cia e Tec­nolo­gia, Saúde e Vaci­nação e Defe­sa da Amazô­nia –, o pres­i­dente Luiz Iná­cio Lula da Sil­va fez uma impor­tante con­tra­posição ao gov­er­no ante­ri­or, mostran­do o que é “viv­er na democ­ra­cia”.

“Acho impor­tante o Lula faz­er isso em con­tra­posição ao que foi o desas­troso gov­er­no do Bol­sonaro. E essa con­tra­posição é essen­cial para mostrar­mos como é viv­er na democ­ra­cia, para mostrar como é viv­er sem estar em esta­do de guer­ra, porque, antes, a pop­u­lação era sem­pre ata­ca­da. O que Lula faz com isso é traz­er uma ideia de paz, de har­mo­nia, entre os entes, a sociedade”, afir­mou.

Doutrina militar

O his­to­ri­ador e pro­fes­sor da Uni­ver­si­dade Fed­er­al Flu­mi­nense (UFF) Daniel Aarão Reis con­sid­era que o tema é impor­tante, ain­da mais con­sideran­do os atos anti­democráti­cos de 8 de janeiro, que con­taram com a par­tic­i­pação de mil­itares.

“Cer­ta­mente, vamos ter uma atmos­fera difer­ente da que prevale­cia durante o gov­er­no Bol­sonaro. Mas ain­da pen­so que, no que diz respeito aos mil­itares, a democ­ra­cia brasileira pre­cisa avançar muito no sen­ti­do de faz­er com que os mil­itares e a sociedade passem a con­sid­er­ar os far­da­dos como fun­cionários públi­cos far­da­dos, nada menos, nada mais do que isso. A ideia dos mil­itares como anjos tute­lares da Repúbli­ca enraizou-se muito e será um tra­bal­ho de fôlego revert­er isso”, disse Reis à Agên­cia Brasil.

Para o his­to­ri­ador, o Brasil ain­da con­viverá com a som­bra da tutela ou do golpis­mo mil­i­tar enquan­to a for­mação dos inte­grantes das Forças Armadas não pas­sar por uma pro­fun­da refor­mu­lação da dout­ri­na, ain­da basea­da nos resquí­cios da guer­ra fria e na ideia do “inimi­go inter­no”.

“Pre­cisamos começar pela refor­matação dos cur­rícu­los mil­itares, condi­ciona­dos ain­da, em grande medi­da, pela cul­tura da guer­ra fria e de suas atu­al­iza­ções: guer­ra híbri­da, etc. A chave de tudo encon­tra-se na for­mação dos mil­itares, a começar pelas Agul­has Negras e pelas demais esco­las de for­mação de ofi­ci­ais. Eles são ensi­na­dos a man­ter esta tradição de anjos tute­lares. Enquan­to isso não mudar, a repúbli­ca democráti­ca não se con­sol­i­da”, disse.

A refor­mu­lação da dout­ri­na tam­bém é apon­ta­da por Makrakis e Oliveira como essen­cial para redesen­har o papel que as Forças Armadas devem cumprir no Esta­do.

“Há um entendi­men­to orgâni­co para o com­por­ta­men­to dos mil­itares e, nos meus ensaios, ele se deve muito às doutri­nas mil­itares – como a dout­ri­na da guer­ra da quar­ta ger­ação [em que o inimi­go não é nec­es­sari­a­mente out­ra nação, poden­do ser um grupo ter­ror­ista ou orga­ni­za­ções crim­i­nosas] – e ao geren­cial­is­mo, doutri­nas que, para os mil­itares, é a real­i­dade rev­e­la­da. Então a questão é: se está na dout­ri­na, o mil­i­tar não ques­tiona. Se está na dout­ri­na e alguém vai dar uma palestra de que os mil­itares são um poder mod­er­ador, ele ‘fir­mou dout­ri­na’, como se diz, e isso vai faz­er parte do sis­tema de dout­ri­na dos mil­itares e eles jamais vão ques­tionar ess­es pon­tos”, refletiu Makrakis.

Brasília (DF) 07/09/2023 Militares durante entrevista para Agência Brasil antes do desfile de 7 de setembro na esplanada dos Ministérios. ( Renato Almeida Resende, Cadete da FAB. Foto Lula Marques/ Agência Brasil
Repro­dução: Cadetes da Força Aérea Brasileira no des­file do Dia da Inde­pendên­cia — Lula Marques/ Agên­cia Brasil

Oliveira apon­ta que o pen­sa­men­to mil­i­tar é condi­ciona­do para que eles se vejam como tutores da democ­ra­cia, uma con­strução que vem des­de a procla­mação da Repúbli­ca.

“O prob­le­ma é que eles enten­dem que tem que par­tic­i­par quase como um quar­to poder ou como um poder de tutela no pro­je­to nacional, no pro­je­to de país”, disse Oliveira.

“Temos que mudar a com­preen­são de defe­sa, a ideia de defe­sa nacional para que o lugar dos mil­itares seja bem especí­fi­co: eles são téc­ni­cos, são opera­cionais. Eles têm que par­tic­i­par ati­va­mente e int­elec­tual­mente da con­cepção de parte da estraté­gia de defe­sa nacional, mas a estraté­gia de defe­sa nacional, pro­gra­ma, pro­je­to de nação, são ele­men­tos do gov­er­no civ­il, do esta­do civ­il. Eles são a parte téc­ni­ca opera­cional da defe­sa”, afir­mou.

Para o pesquisador essa mudança pas­sa pela refor­mu­lação do cur­rícu­lo e das esco­las de for­mação, como a Acad­e­mia Mil­i­tar das Agul­has Negras (Aman).

“Isso envolve refor­mu­lar cur­rícu­lo da Aman, plano de estraté­gia de defe­sa com par­tic­i­pação da sociedade civ­il e desmil­i­ta­rizar o esta­do, espe­cial­mente o Min­istério da Defe­sa. Ele é um órgão civ­il, mas boa parte dos car­gos ain­da são de mil­itares na alta cúpu­la”, disse.

“A gente tem que recolo­car ou colo­car as Forças Armadas den­tro do papel insti­tu­cional que lhes cabe, mas que foi sendo pre­cariza­do nas relações entre o gov­er­no civ­il e os mil­itares ao lon­go dos últi­mos anos. Quan­do [o ex-pres­i­dente] Michel Temer nomeia para a Defe­sa um gen­er­al [Joaquim Sil­va e Luna] ele desvir­tua, ata­ca a democ­ra­cia, as insti­tu­ições democráti­cas, porque o Min­istério da Defe­sa é uma for­ma de con­t­role civ­il das Forças Armadas”, con­cluiu Oliveira.

Atos antidemocráticos

Uma das con­se­quên­cias dessa poli­ti­za­ção das Forças Armadas pode ser obser­va­da, segun­do Oliveira, no com­por­ta­men­to dos mil­itares em relação aos acam­pa­men­tos em frente aos quar­téis e nos atos anti­democráti­cos de 8 de janeiro, que con­taram com a par­tic­i­pação ati­va de mil­itares.

“As Forças Armadas foram neg­li­gentes de maneira proposi­tal com os acam­pa­men­tos. Acred­i­to que o Exérci­to não esper­a­va um even­to daque­le porte, acho que eles pre­vi­am que pode­ria acon­te­cer algu­ma coisa, mas não daque­le porte e daque­la maneira e ficou claro que eles acober­taram os golpis­tas. Eles acober­taram, par­tic­i­param ati­va­mente porque pro­te­geram e isso fez com que a sociedade percebesse eles como par­tic­i­pantes daque­le 8 de janeiro, prin­ci­pal­mente o Exérci­to. As cúpu­las hierárquicas ten­tam negar, mas o fato é que deixaram ter­ror­is­tas em frente aos quar­téis e não fiz­er­am nada para tirá-los de lá”, afir­mou.

Para Makrakis é pre­ciso que a sociedade com­preen­da que o con­t­role civ­il sobre as Forças Armadas é um mecan­is­mo ado­ta­do em democ­ra­cias mod­er­nas.

“As car­reiras que são típi­cas de esta­do [como os mil­itares], por essas par­tic­u­lar­i­dades, pos­suem um estatu­to próprio que tem que ter mecan­is­mos para ser­rem fis­cal­iza­dos. Nas nações democráti­cas em que existe o con­ceito de con­t­role civ­il sobre as forças mil­itares, isso não sig­nifi­ca civ­il dan­do ordem para os mil­itares, isso impli­ca jus­ta­mente mecan­is­mos para ver­i­ficar se há as polit­i­cas pub­li­cas que incluem o cumpri­men­to desse estatu­to estão sendo seguidas”, disse.

Edição: Denise Griesinger

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