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Educação indígena mantém conhecimentos ancestrais, diz professor

Repro­dução: © Alexan­dre Souza/ TV Brasil

Cerca de 3,5 mil escolas de educação básica ficam em terra indígena


Pub­li­ca­do em 31/01/2024 — 08:00 Por Ana Gra­ziela Aguiar — Envi­a­da espe­cial — Boa Vista

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Na fron­teira do Brasil com a Venezuela, em uma área de cer­ca de 9,6 mil­hões de hectares e perímetro de 3.370 quilômet­ros, a Ter­ra Indí­ge­na (TI) Yanoma­mi tam­bém abri­ga uma out­ra etnia, os ye’kwana.

Há muitos anos, ess­es povos vivem em uma área que inclui os rios Medee­waa­di (Cuara), Fadaawa (Paragua), Din­haku (Orinoco) e Fadi­ime (Urari­co­era). Na Venezuela são cer­ca de 5 mil indí­ge­nas. Já do lado brasileiro, segun­do dados da Sec­re­taria de Saúde Indí­ge­na (Siasi/Sesai, 2019), são 760 pes­soas viven­do em três aldeias prin­ci­pais: Fudu­uwaadunnha e Kudaatannha, na região de Auaris, e Wachannha, às mar­gens do Rio Urari­co­era.

Além de lutarem hoje con­tra o garim­po que atinge prin­ci­pal­mente a comu­nidade Wachannha e o Rio Urari­co­era, os ye’kwana apren­der­am que a manutenção do ter­ritório pas­sa tam­bém pela edu­cação. Uma edu­cação indí­ge­na pen­sa­da e desen­volvi­da tam­bém por eles.

O indí­ge­na ye’kwana Reinal­do Wadeyu­na Rocha apren­deu cedo a ler. “Come­cei a ser alfa­bet­i­za­do jun­to com a pro­fes­so­ra Jandi­ra, que era mis­sionária”, con­ta. E nun­ca mais parou de estu­dar. Mas sem­pre se ques­tio­nou como podia adap­tar a edu­cação dos home­ns bran­cos à edu­cação indí­ge­na. “Eu vi os pro­fes­sores e alguns cole­gas que tam­bém estavam tra­bal­han­do como vol­un­tário. E eu me inter­es­sei tam­bém. Por que que eu não faço isso aí?“.

Reinal­do resolveu então ser pro­fes­sor. Fez mag­istério e anos depois ingres­sou na Uni­ver­si­dade Fed­er­al de Roraima, que há 30 anos ofer­ece, no Insti­tu­to Insiki­ran de For­mação Supe­ri­or Indí­ge­na, os  cur­sos de licen­ciatu­ra cul­tur­al indí­ge­na, gestão ter­ri­to­r­i­al Indí­ge­na e Saúde Cole­ti­va Indí­ge­na.

Ele voltou para sua aldeia e hoje é pro­fes­sor da esco­la local. Segun­do ele, 80% dos indí­ge­nas ye’kwana estão alfa­bet­i­za­dos. “Não é somente os pro­fes­sores. Con­jun­to, a comu­nidade inteira. Tem que ter envolvi­do nis­so aí pra ter resul­ta­do. E isso que nós con­struí­mos tam­bém. Quase nós lev­a­mos cin­co, sete anos para ter esse pro­je­to políti­co-pedagógi­co.”

De acor­do com dados do Cen­so Indí­ge­na 2022, o Brasil tem hoje 178,3 mil esco­las de ensi­no bási­co. Segun­do as infor­mações, um per­centu­al de 1,9% (3.541) fica em ter­ra indí­ge­na e 2% (3.597) ofer­e­cem edu­cação indí­ge­na por meio das redes de ensi­no.

Depois da grad­u­ação, Reinal­do seguiu os estu­dos e con­cluiu o mestra­do pela Uni­ver­si­dade Fed­er­al de Minas Gerais. Hoje desen­volve um pro­je­to, jun­to com o sociól­o­go e pro­fes­sor da Uni­ver­si­dade Fed­er­al de Roraima Daniel Bampi, para ampli­ar a edu­cação indí­ge­na para out­ros povos a par­tir da exper­iên­cia ye’kwana. “Eles têm um históri­co já bas­tante anti­go de edu­cação, de edu­cação esco­lar muito avança­da, um índice de esco­lar­iza­ção altís­si­mo, já com pro­fes­sores for­ma­dos em licen­ciatu­ra. Eles mes­mos procu­raram o proces­so de for­mação com a exper­iên­cia que eles tin­ham na Venezuela”, con­ta Daniel Bampi.

Bampi con­ta que a uni­ver­si­dade desen­volve há 11 anos um pro­je­to de edu­cação com os ye’kwana e que ago­ra o pro­gra­ma será ampli­a­do com os sanö­ma, um sub­grupo da etnia Yanoma­mi. “Tra­ta da gestão ter­ri­to­r­i­al indí­ge­na toman­do como base para o desen­volvi­men­to de ações nesse cam­po a for­mação esco­lar dos jovens. A esco­la é uma insti­tu­ição de fron­teira e na atu­al­i­dade gan­hou muito espaço na for­mação dos indí­ge­nas, jun­ta­mente com suas for­mas tradi­cionais de edu­cação. Neste sen­ti­do tem grande poten­cial para tratar das questões que impli­cam na vida atu­al das pop­u­lações indí­ge­nas em seus ter­ritórios, for­man­do a novas ger­ações, por isso pre­cisa ser pro­fun­da­mente ter­ri­to­ri­al­iza­da.”

Ele expli­ca que o pro­je­to não é ape­nas para o ensi­no bási­co. “Para os ye’kwana que já estão com as esco­las con­sol­i­dadas, a pro­pos­ta é con­stru­ir uma for­mação em nív­el médio con­comi­tante com um téc­ni­co na gestão do ter­ritório. Os sanö­ma con­tam com um proces­so de esco­lar­iza­ção bas­tante ini­cial, então o foco será artic­u­lar as neces­si­dades ter­ri­to­ri­ais com o ensi­no fun­da­men­tal.”

Para Reinal­do, é mais do que edu­cação indí­ge­na. É uma for­ma de man­ter os con­hec­i­men­tos dos sábios, os acchu­di edhaamo na lín­gua ye’kwana, vivos para as novas ger­ações. “Nos­sa ances­tral­i­dade deixou só na memória. É isso que alguns pro­fes­sores pesquisadores ye’kuana fiz­er­am. Colo­caram ano­tações. Fal­ta só divul­gar, assim, desen­volver mais. Mate­r­i­al didáti­co, falan­do nos­sas cul­turas, nos­so ter­ritório. Sem­pre man­ten­do a nos­sa lin­guagem, nos­sas cul­turas, e nos­sos ritos, con­hec­i­men­tos tradi­cionais. Tem que ser man­ti­do. Para ter esse exem­p­lo para out­ros povos tam­bém”, con­clui.

Edição: Juliana Andrade

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