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Empreendedorismo quilombola é destaque em cartão-postal carioca

Barracas de comunidades tradicionais ocupam Arcos da Lapa

Bruno de Fre­itas Moura — Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­do em 30/11/2024 — 17:42
Rio de Janeiro
Rio de Janeiro (RJ) 30/11/2024 - Empreendedores quilombolas Foto: Anderson Astor/ICCERepro­dução: © Ander­son Astor/ICCE

Ao lado dos Arcos da Lapa, cartão-postal que atrai tur­is­tas para o cen­tro do Rio de Janeiro, Mar­ta da Cos­ta orga­ni­za a bar­raquin­ha que expõe dezenas de bonecas de teci­do feitas a mão pela comu­nidade dela. Um detal­he: todas são pre­tas. Mar­ta é uma das rep­re­sen­tantes do Quilom­bo da Rasa, em Armação dos Búzios, cidade da Região dos Lagos flu­mi­nense, e par­tic­i­pa da Feira Aquilom­bar, neste fim de sem­ana.

“A gente está aqui par­tic­i­pan­do desse even­to, divul­gan­do nos­sa arte, nos­so poten­cial”, diz ela à Agên­cia Brasil, ten­do nas mãos uma das bonecas, chamadas de jongueiras. “Ela rep­re­sen­ta nos­so grupo de jon­go”, com­ple­ta. Ela expli­ca que a pro­dução arte­sanal das bonecas é uma tradição que pas­sa de ger­ação em ger­ação.

Além de ser uma for­ma de vender os pro­du­tos e adquirir ren­da, Mar­ta desta­ca que a feira de empreende­dores quilom­bo­las é uma opor­tu­nidade para atrair vis­i­tantes para out­ra ativi­dade da comu­nidade tradi­cional.

“Tam­bém esta­mos na pega­da do tur­is­mo de base comu­nitária, receben­do as pes­soas e con­tan­do a nos­sa história, porque temos locais que con­sid­er­amos sagra­dos da nos­sa existên­cia. A Pon­ta do Pai Vitório, Mangue de Pedra, Pra­ia da Gor­da. São locais lin­dos.”

Paulo César dos Anjos é um dos mais de mil vis­i­tantes que pas­saram pela feira neste sába­do (30). Ele diz que a diver­si­dade cul­tur­al foi um dos pon­tos que mais chama­ram a atenção dele no local que reúne 30 bar­raquin­has expos­i­toras, espaço para gas­trono­mia típi­ca, músi­ca e dança.

“É impor­tante para reforçar, reafir­mar a iden­ti­dade, se aprox­i­mar mais com a cul­tura ances­tral. Acho que há uma um encon­tro não só com a questão históri­ca do Rio de Janeiro, mas com a própria história do negro”, disse.

 

Rio de Janeiro (RJ) 30/11/2024 - Empreendedores quilombolas Foto: Marcelo Curia/ICCE
Repro­dução: Paulo César dos Anjos (de pre­to) vis­i­tou a Feira Aquilom­bar neste sába­do — Marce­lo Curia/ICCE

A Feira Aquilom­bar, que une cul­tura afro-brasileira e empreende­doris­mo, é pro­movi­da pelo Serviço de Apoio às Micro e Peque­nas Empre­sas no Esta­do do Rio de Janeiro (Sebrae Rio), em parce­ria com a Asso­ci­ação das Comu­nidades Quilom­bo­las do Esta­do do Rio de Janeiro (Acquil­erj). A Empre­sa Brasil de Comu­ni­cação (EBC), da qual faz parte a Agên­cia Brasil, é uma das apoiado­ras da ini­cia­ti­va.

O vis­i­tante que pas­seia entre as bar­raquin­has de pro­du­tos típi­cos, como biju­te­rias, adereços e tra­jes, tem a opor­tu­nidade de, seja por fol­hetos infor­ma­tivos, car­tazes ou em con­ver­sas com os expos­i­tores, con­hecer mais das respec­ti­vas comu­nidades quilom­bo­las – rem­i­nis­cên­cias da resistên­cia de negros à escravidão, que durou até o sécu­lo 19. A feira fecha o chama­do Novem­bro Negro, mês que traz reflexão sobre con­sciên­cia negra.

Resistência

A pres­i­dente da Acquil­erj, Bia Nunes, acred­i­ta que a real­iza­ção da feira é uma for­ma de colo­car em pau­ta um ter­mo que ela con­sid­era não ser muito difun­di­do. “Você não escu­ta falar no empreende­doris­mo quilom­bo­la”, apon­ta.

“A pop­u­lação não con­hece as nos­sas comu­nidades, poucos já vis­i­taram as nos­sas comu­nidades. Então esta­mos trazen­do aqui para um pon­to turís­ti­co da cap­i­tal do Rio de Janeiro, as comu­nidades de Cabo Frio, Paraty, Angra dos Reis…”, diz ela, citan­do municí­pios flu­mi­nens­es.

Ao lado de uma bar­raquin­ha que ven­dia itens como um doce de ameixa com bacon, Bia con­vi­dou a sociedade a con­hecer “o que o quilom­bo pro­duz”.

“Não adi­anta só falar que nós somos guardiões da flo­res­ta. Somos guardiões da flo­res­ta, mas nós pro­duz­i­mos. Aqui a pop­u­lação vai ver um pouco dessa gas­trono­mia mar­avil­hosa, da beleza, de tudo que essa pop­u­lação pro­duz den­tro da sua comu­nidade”, enfa­ti­za a pres­i­dente da asso­ci­ação. “Quilom­bo existe e resiste”, con­clui Bia Nunes.

Rio de Janeiro (RJ) 30/11/2024 - Empreendedores quilombolas Foto: Anderson Astor/ICCE
Repro­dução: Empreende­dores quilom­bo­las par­tic­i­pam da Feira Aquilom­bar, neste fim de sem­ana — Ander­son Astor/ICCE

Realidade quilombola

O Cen­so 2022 do Insti­tu­to Brasileiro de Geografia e Estatís­ti­ca (IBGE) rev­el­ou que o Brasil tem 1,3 mil­hão de quilom­bo­las espal­ha­dos em quase 7,7 mil comu­nidades. No esta­do do Rio de Janeiro, são 73 comu­nidades onde vivem 20,4 mil quilom­bo­las.

Anális­es com­ple­mentares do Cen­so apon­taram situ­ações desafi­ado­ras. Em jul­ho de 2024, o IBGE rev­el­ou que oito em cada dez quilom­bo­las vivem com sanea­men­to bási­co precário e que o anal­fa­betismo é 2,7 vezes maior que média do país.

Na últi­ma sex­ta-feira (29), o gov­er­no fed­er­al anun­ciou um con­jun­to de ações des­ti­nadas à pop­u­lação negra. Entre elas, desapro­pri­ação de ter­ras para ben­e­fi­ciar quilom­bo­las.

Empreendedorismo

A anal­ista téc­ni­ca Laris­sa Pas­sos, da gerên­cia de Sus­tentabil­i­dade, Diver­si­dade e Inclusão do Sebrae Rio expli­cou à Agên­cia Brasil que os 30 expos­i­tores quilom­bo­las pas­saram por seis meses de capac­i­tação.

“Esse even­to, na ver­dade, é a entre­ga final do pro­je­to Raízes Empreende­dores, que bus­cou capac­i­tar os expos­i­tores. Eles pas­saram por essa tril­ha de capac­i­tação, foram acom­pan­hados com ofic­i­nas, palestras, con­sul­to­rias rela­cionadas a com­por­ta­men­to empreende­dor e gestão finan­ceira”, descreve.

Ela enfa­ti­za que o empreende­doris­mo é um mecan­is­mo de trans­for­mação social. “Con­seguir mon­tar seu próprio e, a par­tir dis­so, ger­ar ren­da, ter opor­tu­nidade, de fato, de estar à frente do seu negó­cio, ten­do retorno sobre isso é uma das grandes mis­sões do Sebrae. A gente quer trans­for­mar os nos­sos empreende­dores nos ver­dadeiros pro­tag­o­nistas do Brasil”, apon­ta.

A expec­ta­ti­va dos orga­ni­zadores é que o públi­co supere o da edição do ano pas­sa­do, que rece­beu 2 mil vis­i­tantes em um fim de sem­ana, na Praça Mauá, tam­bém região cen­tral do Rio.

Rio de Janeiro (RJ) 30/11/2024 - Empreendedores quilombolas Foto: Anderson Astor/ICCE
Repro­dução: Orga­ni­zadores esper­am que públi­co des­ta edição da Feira Aquilom­bar supere o do ano pas­sa­do — Ander­son Astor/ICCE

Antirracismo

Além das ativi­dades com­er­ci­ais e cul­tur­ais, o even­to propõe mesas de debates sobre temas como antir­racis­mo e cul­tura afro-brasileira. O ger­ente exec­u­ti­vo da region­al Rio de Janeiro da EBC, Acá­cio Jac­in­to, par­ticipou de uma das rodas de dis­cussões.

Ele defende que empre­sa públi­ca tem respon­s­abil­i­dade que vai além da sim­ples trans­mis­são de con­teú­dos.

“Nos­sa mis­são é ser uma ponte entre diver­sas cul­turas e a sociedade brasileira, ampli­f­i­can­do vozes que, his­tori­ca­mente, foram silen­ci­adas. Nesse con­tex­to, a cul­tura quilom­bo­la e negra encon­tra na EBC um espaço de recon­hec­i­men­to e val­oriza­ção. Nos­sa pro­gra­mação bus­ca mostrar que essas histórias e tradições são parte essen­cial do teci­do cul­tur­al brasileiro”, afir­mou.

“Um dos grandes desafios da mídia é romper com estereóti­pos que reduzem a cul­tura negra a visões dis­tor­ci­das e mar­gin­al­izadas. A EBC investe em con­teú­dos que cel­e­bram a riqueza das tradições quilom­bo­las e afro-brasileiras, apre­sen­tan­do suas con­tribuições em todas as esferas: arte, músi­ca, culinária, espir­i­tu­al­i­dade e resistên­cia”, com­ple­ta.

Serviço

No domin­go, a Feira Aquilom­bar está aber­ta ao públi­co das 10h às 17h. A entra­da é gra­tui­ta. Uma das atrações de encer­ra­men­to será a roda de sam­ba Quilom­bo do Grotão, a par­tir das 16h.

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