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Ensaios técnicos levam emoção do público às escolas de samba do Rio

Repro­dução: © Alexan­dre Macieira/Riotur

Grandes nomes das agremiações destacam envolvimento das comunidades


Pub­li­ca­do em 20/01/2024 — 10:57 Por Cristi­na Indio do Brasil – Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro

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O sen­ti­men­to do públi­co nos ensaios téc­ni­cos das esco­las do Grupo Espe­cial do Rio de Janeiro tem relação dire­ta com seu envolvi­men­to em cada agremi­ação que se apre­sen­ta no Sam­bó­dro­mo na preparação para os des­files ofi­ci­ais durante o car­naval. Este ano, a primeira a com­pro­var isso foi a Unidos do Por­to da Pedra, que teve a respon­s­abil­i­dade de abrir no domin­go (7) os ensaios téc­ni­cos de 2024 e lev­ou para as arquiban­cadas o seu públi­co fiel.

Como campeã em 2023 do grupo da Série Ouro, a esco­la de São Gonça­lo, região met­ro­pol­i­tana do Rio, con­quis­tou o dire­ito de voltar ao pal­co da Sapu­caí nos des­files da elite do car­naval car­i­o­ca.

Para o car­navale­sco Mau­ro Quin­taes, que está à frente do enre­do O Lunário Per­pé­tuo: A Proféti­ca do Saber Pop­u­lar, da ver­mel­ho e bran­co para 2024, o apron­to da Por­to da Pedra neste ano agradou e mostrou o envolvi­men­to da comu­nidade de São Gonça­lo.

“O des­file da Por­to da Pedra foi muito grat­i­f­i­cante porque trouxe a visão de que real­mente escol­he­mos o sam­ba cer­to. Trouxe a visão de que real­mente a comu­nidade de São Gonça­lo está com o sam­ba na pon­ta da lín­gua e can­ta com mui­ta paixão. O resul­ta­do foi muito pos­i­ti­vo nos que­si­tos téc­ni­cos e o ensaio, sat­is­fatório não só para mim, como artista e car­navale­sco, mas tam­bém para toda a direção da esco­la”, disse Quin­taes à Agên­cia Brasil.

Segun­do o car­navale­sco, o ensaio téc­ni­co rep­re­sen­ta treino, coor­de­nação, acer­to de erros, sur­pre­sas e serve para que a direção da esco­la e os com­po­nentes ten­ham uma peque­na noção do que vai ser feito na aveni­da, prin­ci­pal­mente em ter­mos de cronome­tragem, e as apre­sen­tações da comis­são de frente e casal de mestre-sala e por­ta-ban­deira, além da bate­ria.

Quin­taes disse que é fã do ensaio téc­ni­co, que con­sid­era muito necessário. Para ele, seria mel­hor haver mais ensaios téc­ni­cos durante o ano. “O ide­al seria mais de um, mas, na impos­si­bil­i­dade, este nos­so ensaio úni­co foi mar­avil­hoso. A Por­to da Pedra está preparadís­si­ma. Peço que olhem e cur­tam o des­file da Por­to da Pedra com o enre­do O Lunário Per­pé­tuo: A Proféti­ca do Saber Pop­u­lar”, recomen­dou ani­ma­do.

Em 1992, Selmin­ha Sor­riso for­mou com Claud­in­ho o casal de mestre-sala e por­ta-ban­deira Está­cio de Sá. E foram campeões logo na estreia. Em 1996 trans­feri­ram-se para a Bei­ja-Flor, onde estão até hoje e com nove campe­onatos da azul e bran­co de Nilópo­lis. Emb­o­ra veja um aumen­to de rigidez na estru­tu­ra dos ensaios téc­ni­cos com o pas­sar dos anos, Selmin­ha afir­mou que o envolvi­men­to do públi­co per­manece.

“É um povo que inter­age mais. São pes­soas que, na maio­r­ia, não têm opor­tu­nidade de ir ao des­file ofi­cial e que ficam esperan­do os ensaios para ter um entreten­i­men­to, uma ale­gria, um momen­to de passear. É gra­tu­ito e tem segu­rança, tem amor. Quem gos­ta de sam­ba mes­mo, gos­ta muito de ir ao ensaio téc­ni­co. As comu­nidades vão em peso. Quem é do mor­ro desce o mor­ro, quem é da Baix­a­da vai para o cen­tro [onde se local­iza o Sam­bó­dro­mo]. É uma coisa muito mág­i­ca”, disse à Agên­cia Brasil.

Foi o envolvi­men­to do públi­co que deu força à expe­ri­ente por­ta-ban­deira em um momen­to de difi­cul­dade que pas­sou em 2015. “Já tive a situ­ação do ensaio téc­ni­co mudar a min­ha história. O públi­co gri­tar e ova­cionar a Selmin­ha em um momen­to em que eu pre­cisa­va mes­mo de car­in­ho. Acho que a dança con­ta­giou e eles diziam: ‘esta é a Selmin­ha’, gri­tavam o meu nome. É mar­avil­hoso, eu me emo­ciono sem­pre. Foi muito impor­tante. Aque­le momen­to fez mui­ta difer­ença na min­ha car­reira“, lem­brou Selmin­ha. “O ensaio téc­ni­co é um momen­to de con­graça­men­to das pes­soas sim­ples de comu­nidades que vão ali rev­er­en­ciar os seus ído­los.”

Bateria

Mocidade Independente de Padre Miguel- Ensaio Técnico - Foto: Alexandre Macieira/Riotur
Repro­dução: Bate­ria da Moci­dade Inde­pen­dente de Padre Miguel faz ensaio téc­ni­co para o car­naval — Alexan­dre Macieira/Riotur

A rigidez da orga­ni­za­ção dos ensaios con­trasta com a descon­tração do públi­co des­per­ta­da pela bate­ria das esco­las. A entra­da dos rit­mis­tas na aveni­da sem­pre provo­ca empol­gação nas arquiban­cadas. A inter­ação do públi­co com os rit­mis­tas é evi­dente. “A sen­sação é de que você pode colab­o­rar para a ale­gria do povo. Isso é muito bacana. Eu gos­to muito, porque ali está o ver­dadeiro sam­ba. Aque­le públi­co que está ali não vai ao des­file ofi­cial e se emo­ciona com a gente”, ressaltou Mestre Ciça, dire­tor de bate­ria da Viradouro, em entre­vista à Agên­cia Brasil.

Para o jor­nal­ista Fábio Faba­to, his­to­ri­ador e autor da sinopse do enre­do Pede Caju que Dou… Pé de Caju que Dá!, da Moci­dade Inde­pen­dente de Padre Miguel em 2024, o envolvi­men­to ocorre porque tem a pre­sença do públi­co de fato das esco­las de sam­ba, que vive as agremi­ações o ano inteiro e não tem din­heiro para pagar o ingres­so dos des­files ofi­ci­ais.

“É um espetácu­lo muito mais quente e volta­do às esco­las de sam­ba no ano inteiro. O públi­co que vai para o Sam­bó­dro­mo, que tem din­heiro para pagar, não é o públi­co das esco­las de sam­ba. Por isso, temos uma cer­ta difer­ença de com­por­ta­men­to no ensaio téc­ni­co e no des­file ofi­cial. O públi­co do ensaio téc­ni­co can­ta o sam­ba saben­do a letra, fica muito mais envolvi­do, porque há uma questão pas­sion­al mes­mo. Ele está ali porque ama esco­la de sam­ba. É uma sen­sação com­ple­ta­mente difer­ente, é úni­ca e mág­i­ca porque con­segue uma acla­mação pop­u­lar nat­ur­al”, disse Faba­to em entre­vista à reportagem.

Segun­do Faba­to, o públi­co can­ta até sem sis­tema de som. “O públi­co lev­ou no gogó o sam­ba da Moci­dade, ou seja, era o públi­co dela e apaixon­a­do por ela, que con­some as suas infor­mações o ano inteiro”, con­cluiu.

No mes­mo dia do ensaio téc­ni­co da Por­to da Pedra, a Moci­dade enfren­tou fal­has no car­ro de som usa­do pela orga­ni­za­ção. Depois de recla­mação da esco­la, em reunião plenária, a Liga das Esco­las de Sam­ba do Rio de Janeiro (Liesa) deter­mi­nou que have­ria out­ra data para a esco­la faz­er seu ensaio téc­ni­co. A apre­sen­tação será neste domin­go (21) às 18h30, anteceden­do os ensaios da Paraí­so do Tuiu­ti, às 20h30; e do Salgueiro, às 22h. Pelo menos, é o que está pre­vis­to, caso os ensaios não sejam sus­pen­sos por causa da chu­va, o que já ocor­reu no fim de sem­ana ante­ri­or.

Mudanças

No tem­po que tem de aveni­da, Selmin­ha pôde perce­ber as alter­ações que ocor­reram nos ensaios téc­ni­cos. “Nós podíamos ir e voltar, parar para cor­ri­gir, con­ver­sar. Hoje, não. A cobrança é maior até pela rede social. Com um tele­fone à mão, todo mun­do é jura­do e jor­nal­ista e quer dar o seu pita­co. Tin­ha um tem­po em que você podia faz­er cor­reções e tes­tar o que ensa­ia­va o ano inteiro para, no dia, faz­er o mel­hor pos­sív­el. Ago­ra os ensaios têm uma cer­ta cobrança e parece até que viraram uma dis­pu­ta, e na ver­dade era para se preparar um pouco mais”, enfa­ti­zou.

Expe­ri­ente no car­naval, Mestre Ciça apon­tou tam­bém o espíri­to de com­petição que existe atual­mente no for­ma­to dos ensaios téc­ni­cos. “Hoje em dia, o ensaio téc­ni­co do car­naval virou uma com­petição – esta é min­ha opinião. Hoje não pode nem errar no ensaio téc­ni­co porque as pes­soas se batem pela inter­net e pelas redes soci­ais. Na real­i­dade, esta­mos fazen­do um des­file em que só fal­tam ale­go­ria e fan­ta­sia. A cobrança é muito grande, e as pes­soas rotu­lam como ensaio téc­ni­co”, disse o mestre pre­mi­a­do, que já coman­dou tam­bém bate­rias na Está­cio de Sá, Unidos da Tiju­ca, Grande Rio, União da Ilha.

Para o pres­i­dente da Liesa, Jorge Per­lingeiro, as trans­for­mações ocor­ri­das rep­re­sen­tam um avanço nos ensaios téc­ni­cos. “Até uns seis, sete anos atrás, os com­po­nentes do ensaio téc­ni­co iam até descalços, com um calção de cada cor. Hoje o ensaio téc­ni­co vem com fan­tasias, camise­tas alu­si­vas ao enre­do. No lugar das ale­go­rias, colo­cam cam­in­hões grandes com painéis de led falan­do sobre o enre­do, enfim, com todo um apara­to. O ensaio téc­ni­co hoje é um belís­si­mo espetácu­lo”, afir­mou Per­lingeiro em entre­vista à Agên­cia Brasil.

Ele adiantou que está estu­dan­do uma for­ma de patrocínio para cobrir parte dos gas­tos com o deslo­ca­men­to dos com­po­nentes das esco­las para o Sam­bó­dro­mo e para ban­car o cus­to dos car­ros de som usa­dos nos ensaios téc­ni­cos. “Já há um pro­je­to para que a gente faça o nos­so car­ro de som”, rev­el­ou Per­lingeiro, lem­bran­do que atual­mente o serviço é presta­do por uma das três mel­hores empre­sas do mun­do em sonoriza­ção, com um cus­to muito ele­va­do. Ele não rev­el­ou, porém, o val­or.

Edição: Nádia Fran­co

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