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Entenda estudo da Nasa sobre ‘Brasil inabitável’ em 50 anos

Repro­dução: © Paulo Pinto/Agência Brasil

Cientista diz que mídia brasileira exagera dados repassados pela Nasa


Publicado em 24/07/2024 — 14:25 Por Lucas Pordeus León* — Repórter da Agência Brasil — Brasília

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Um estu­do cita­do pela Nasa — agên­cia públi­ca espa­cial dos Esta­dos Unidos (EUA) — reper­cu­tiu nos últi­mos dias na impren­sa brasileira ao pre­v­er que áreas do Brasil pode­ri­am ficar inabitáveis até 2070 dev­i­do ao calor extremo provo­ca­do pelas mudanças climáti­cas.

Lid­er­a­da pelo cien­tista Col­in Ray­mond, a pesquisa foi pub­li­ca­da em 2020 na Sci­ence Advances, uma das mais respeitadas revis­tas cien­tí­fi­cas do mun­do. Porém, no estu­do orig­i­nal não aparece o Brasil. Em março de 2022, um blog da Nasa reper­cu­tiu o estu­do com Col­in, que é fun­cionário da agên­cia espe­cial. O tex­to do blog cita o Brasil como uma das regiões vul­neráveis aos calores mor­tais.

Brasília (DF), 24.07.2024 - Mapa mostra locais que experimentaram brevemente níveis extremos de calor e umidade de 1979 a 2017. Cores mais escuras mostram combinações mais severas de calor e umidade. Algumas áreas já experimentaram condições iguais ou próximas do limite de sobrevivência humana de 35°C (95°F). Foto: NOAA Climate.gov/Divulgação
Repro­dução: Mapa mostra locais que exper­i­men­ta­ram breve­mente níveis extremos de calor e umi­dade de 1979 a 2017. Cores mais escuras mostram com­bi­nações mais sev­eras de calor e umi­dade. Algu­mas áreas já exper­i­men­ta­ram condições iguais ou próx­i­mas do lim­ite de sobre­vivên­cia humana de 35°C (95°F). Foto — NOAA Climate.gov/Divulgação

No estu­do orig­i­nal, foram mapea­d­os even­tos de calor extremo, entre 1979 e 2017, nos quais a umi­dade do ar alta e as tem­per­at­uras aci­ma de 35ºC impe­dem que o suor atue res­frian­do nos­so cor­po, trazen­do risco de morte para as pes­soas.

O cli­ma­tol­o­gista Car­los Nobre, um dos maiores espe­cial­is­tas brasileiros sobre o tema, disse que esse estu­do é muito con­heci­do no meio cien­tí­fi­co e que pre­visões como essas começaram a ser feitas des­de 2010, pelo menos.

“Já avançamos muito nes­sas pesquisas. Hoje, ess­es lim­ites estão muito mel­hor com­puta­dos e esse arti­go dos estu­dos da Nasa de 2020 se tornou muito impor­tante. E não é só o Brasil, tá? É uma imen­sa parte das regiões trop­i­cais e até mes­mo lat­i­tudes médias que podem ficar inabitáveis se a tem­per­atu­ra chegar nesse nív­el de 4º C ou mais”, afir­mou o cien­tista em entre­vista à TV Brasil.

Os 4ºC a mais cita­dos por Nobre se ref­er­em a uma tem­per­atu­ra aci­ma da média dos níveis pré-indus­tri­ais. Para evi­tar chegar nesse pon­to, o Acor­do de Paris se com­pro­m­e­teu a com­bat­er o aque­c­i­men­to glob­al “em bem menos de 2º C aci­ma dos níveis pré-indus­tri­ais”, bus­can­do pref­er­en­cial­mente lim­itá-lo a 1,5ºC aci­ma dos níveis antes da rev­olução indus­tri­al.

Para o líder cien­tí­fi­co em Soluções Climáti­cas Nat­u­rais da The Nature Con­ser­van­cy (TNC), Fer­nan­do Cesario, o estu­do cita­do pela Nasa ante­ci­pa — para daqui a 30 ou 50 anos — o aumen­to da ocor­rên­cia de even­tos extremos, com calor que pode levar à morte.

“Os estu­dos anti­gos mostravam que a gente só ia atin­gir ess­es níveis daqui a 100 anos, daqui a 200 anos. E o que ele mostra é que essa prob­a­bil­i­dade, essa janela de peri­go, de ter áreas muito quentes e úmi­das, está mais próx­i­ma do que a gente imag­i­na­va”, com­ple­tou.

Brasília (DF), 24.07.2024 - Líder científico em Soluções Climáticas Naturais da The Nature Conservancy (TNC), Fernando Cesario. Foto: Divulgação/TNC
Repro­dução: O cien­tista Fer­nan­do Cesario diz que o estu­do cita­do ante­ci­pa aumen­to da ocor­rên­cia de even­tos extremos. Foto — Divulgação/TNC

O geó­grafo citou que as áreas no país com mais prob­a­bil­i­dade de reg­is­trar even­tos de calor fatal são as regiões costeiras brasileiras; as áreas muito urban­izadas como Rio de Janeiro e São Paulo, onde há muito asfal­to; áreas próx­i­mas de grandes lagos ou baías, como a Baia de Todos-os-San­tos, na Bahia; e em vol­ta do Rio Ama­zonas, onde a evap­o­ração da água é muito alta.

Calor extremo

O lev­an­ta­men­to do cien­tista norte-amer­i­cano mostrou que, em 40 anos, trip­li­cou o número de casos de calor extremo que podem levar à morte dev­i­do a alta umi­dade. Regiões como Paquistão, Ori­ente Médio e o litoral do Sudoeste da Améri­ca do Norte estão entre as que mais reg­is­traram ess­es momen­tos de calor extremo.

Ain­da segun­do Nobre, se o aque­c­i­men­to da Ter­ra não for rever­tido, além dos gas­es que emiti­mos com fábri­c­as, car­ros e aviões, os oceanos e as geleiras pode­ri­am emi­tir quan­ti­dades enormes de gas­es que ele­vari­am a tem­per­atu­ra a 8 ou 10ºC aci­ma dos níveis pré-indus­tri­ais a par­tir do ano de 2100.

“Com isso, prati­ca­mente o plan­e­ta todo se tor­na inabitáv­el. Os úni­cos lugares habitáveis para o cor­po humano serão o topo de mon­tan­has como os Alpes, a Antár­ti­ca e o Árti­co”, aler­tou.

Estresse térmico

Nos EUA, o calor foi a prin­ci­pal causa de morte rela­ciona­da ao cli­ma entre 1991 e 2020. Enquan­to o calor matou, em média, 143 pes­soas no país norte-amer­i­cano ao ano, as enchentes tiraram a vida de 85 pes­soas todos os anos e os tor­na­dos tiraram a vida de 69 pes­soas na média anu­al dess­es 30 anos.

O espe­cial­ista Car­los Nobre desta­cou que a alta umi­dade e o calor podem estres­sar o cor­po e levar à morte. “Nes­sas situ­ações-lim­ite, uma pes­soa muito idosa ou um bebê resistem só meia hora. Uma pes­soa adul­ta pode mor­rer em duas horas. Se durar um pouquin­ho mais que duas horas, ain­da assim, vai ficar muito doente. Então, este é o estresse tér­mi­co que o estu­do mostra, que pode tornar uma região inabitáv­el”, com­ple­tou.

Out­ro estu­do, lid­er­a­do pelo cien­tista Cami­lo Mora, da Uni­ver­si­dade do Havaí, encon­trou 783 casos de calor extremo com morte em 164 cidades e 36 país­es. Segun­do a pesquisa, 30% da pop­u­lação mundi­al está expos­ta a situ­ações lim­ites de calor em pelo menos 20 dias ao ano.

Brasília (DF), 24.07.2024 - Climatologista Carlos Nobre. Foto: TV Brasil/Divulgação
Repro­dução: O cli­ma­tol­o­gista Car­los Nobre diz que o estu­do é con­heci­do no meio cien­tí­fi­co e que pre­visões assim começaram a apare­cer des­de 2010. Foto: TV Brasil/Divulgação — TV Brasil/Divulgação Foto — TV Brasil/Divulgação

“Até 2100, esta per­cent­agem deve aumen­tar para 48% em um cenário com reduções drás­ti­cas das emis­sões de gas­es de efeito est­u­fa e 74% num cenário de emis­sões cres­centes. Uma ameaça cres­cente à vida humana prove­niente do exces­so de calor ago­ra parece quase inevitáv­el, mas será muito agrava­da se os gas­es com efeito de est­u­fa não forem con­sid­er­av­el­mente reduzi­dos”, afir­ma a pesquisa pub­li­ca­da na Nature Cli­mate Change, em 2017.

Notícias alarmantes

O líder cien­tí­fi­co da TNC, orga­ni­za­ção não gov­er­na­men­tal lig­a­da à preser­vação ambi­en­tal, Fer­nan­do Cesario, avalia que o estu­do é embasa­do, mas que as manchetes da mídia brasileira exager­am os dados repas­sa­dos pela Nasa.

“Achei as notí­cias muito alar­mantes. Essas ocor­rên­cias que ele mediu são local­izadas, não pega o Brasil inteiro, pega algu­mas faixas den­tro do ter­ritório e duram menos de duas horas, porque o cli­ma é muito dinâmi­co. Isso não inval­i­da a emergên­cia climáti­ca que esta­mos viven­do”, afir­mou.

“[O estu­do] mapeou even­tos pon­tu­ais e de menos de duas horas. Mas se a gente con­tin­uar jogan­do CO2 para atmos­fera e o plan­e­ta aque­cen­do, é muito prováv­el que aumente a fre­quên­cia dess­es even­tos e seu tem­po de duração. Isso traz risco para a saúde humana”, com­ple­tou.

Soluções

A redução drás­ti­ca na emis­são de gas­es do efeito est­u­fa está entre as ações que o Brasil e o mun­do devem tomar para reduzir o aque­c­i­men­to da Ter­ra.

“Nós temos que torcer muito para que os país­es assumam a respon­s­abil­i­dade de começar rap­i­da­mente a reduzir as emis­sões de gas­es do efeito est­u­fa. Em 2023, as emis­sões subi­ram em relação a 2022. Em 2024, elas con­tin­u­am altas. Talvez a maior emis­são seja em 2025. Depois, a pre­visão é esta­bi­lizar e começar a reduzir, mas a veloci­dade de redução tem que ser gigan­tesca”, desta­cou Car­los Nobre.

Out­ra medi­da impor­tante é a pro­teção das flo­restas, das matas em vol­ta dos rios e lagos e o reflo­resta­men­to.

“A gente pode pro­duzir, quase que dobrar a nos­sa pro­dução de grão, sem des­matar nen­hu­ma árvore, só uti­lizan­do as pasta­gens degradadas que a gente tem no país”, afir­mou Cesario, expli­can­do a importân­cia da veg­e­tação para a cap­tura dos gas­es que aque­cem a Ter­ra.

Os gas­es do efeito est­u­fa lança­dos na atmos­fera vêm aumen­tan­do a tem­per­atu­ra do plan­e­ta des­de a Rev­olução Indus­tri­al (sécu­los 18 e 19), prin­ci­pal­mente por meio da queima de com­bustíveis fós­seis, o que impul­siona a atu­al crise climáti­ca, mar­ca­da por even­tos extremos, como o calor exces­si­vo, as secas pro­lon­gadas e as chu­vas inten­sas.

*Colaborou a jor­nal­ista Iara Bal­duino da TV Brasil

Edição: Maria Clau­dia

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