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Escola quilombola forma jovens lideranças para defesa de comunidades

Repro­dução: © Bruno Peres/Agência Brasil

Primeira turma do projeto concluiu ciclo de formação na última semana


Publicado em 25/08/2024 — 11:25 Por Ana Carolina Alli* — Brasília

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Edu­cação para o futuro. Um pro­je­to ino­vador da Coor­de­nação Nacional das Comu­nidades Negras Rurais Quilom­bo­las (CONAQ) começa a col­her seus primeiros fru­tos. Na últi­ma sem­ana, um encon­tro em Brasília cele­brou a for­matu­ra da primeira tur­ma da Esco­la Nacional de For­mação de Meni­nas Quilom­bo­las. A ini­cia­ti­va do Cole­ti­vo Nacional de Edu­cação da CONAQ con­ta com a par­tic­i­pação de 39 meni­nas e 11 meni­nos com idades entre 15 e 18 anos.

Com apoio do Fun­do Malala, a esco­la tem o obje­ti­vo de for­mar jovens quilom­bo­las, pref­er­en­cial­mente meni­nas, em temas difer­entes de uma esco­la reg­u­lar, foca­dos em bus­car pro­postas para prob­le­mas enfrenta­dos pela comu­nidade, com­bate às desigual­dades na edu­cação e for­mação de lid­er­anças.

Incen­ti­va­da por um pro­fes­sor, Juliany Car­la da Sil­va, de 16 anos, resolveu par­tic­i­par de um proces­so sele­ti­vo e con­quis­tou uma vaga na Esco­la Nacional de For­mação de Meni­nas Quilom­bo­las. Ago­ra, a jovem da comu­nidade de Trigueiros, em Vicên­cia (PE), faz parte da primeira tur­ma de for­man­das da esco­la.

“Sem­pre fui muito incen­ti­va­da por parte da família, por parte de ami­gos e por parte da CONAQ. Romero, que era um dos pro­fes­sores da CONAQ, foi um dos que mais me apoiaram, que sem­pre incen­tivou os meus son­hos, sem­pre falou: ‘Corre atrás que tu con­segue, é só estu­dar, estu­dar, estu­dar, estu­dar que você vai con­seguir’. E é isso que estou fazen­do, estou estu­dan­do e creio que um dia eu vou chegar lá”, diz a estu­dante à Agên­cia Brasil.

Brasília (DF), 21.08.2024 - Juliany Carla da Silva na Comissão de Educação do Senado Federal (CE) durante audiência pública sobre a implementação da educação escolar quilombola. Foto: Bruno Peres/Agência Brasil
Repro­dução: Brasília (DF), 21.08.2024 — Juliany Car­la faz parte da primeira tur­ma da Esco­la de Meni­nas Quilom­bo­las. Foto: Bruno Peres/Agência Brasil

Atual­mente, as aulas da esco­la são real­izadas no for­ma­to vir­tu­al para estu­dantes de diver­sas regiões do Brasil. Os estu­dantes con­tin­u­am a fre­quen­tar as aulas reg­u­lares.

Após três anos no pro­je­to, Glayd­son Íta­lo de Jesus, de 16 anos, da comu­nidade Ita­matatiua, em Alcân­tara (MA), inte­gra a tur­ma de for­man­dos. Ele faz um cur­so téc­ni­co no Insti­tu­to Fed­er­al do Maran­hão, em São Luís. Mas pre­tende ir mais longe, e cur­sar fac­ul­dade de dire­ito na uni­ver­si­dade fed­er­al e inter­câm­bio nos Esta­dos Unidos ou no Canadá.

“Os quilom­bo­las hoje em dia não têm muito dire­ito à posse de ter­ra. Na min­ha comu­nidade, ain­da não temos o títu­lo da ter­ra e eles lutam por isso. Então, a CONAQ e essa movi­men­tação me aju­daram muito a escol­her a profis­são que eu quero seguir futu­ra­mente”, con­ta.

Des­de 2022, ativis­tas e pro­fes­sores vêm con­stru­in­do a própria metodolo­gia de tra­bal­ho em parce­ria com a juven­tude quilom­bo­la, obser­van­do a real­i­dade e as neces­si­dades da comu­nidade. Quarenta pro­fes­sores quilom­bo­las pas­saram por cur­sos de qual­i­fi­cação da CONAQ.

Realidade das comunidades

No cur­so, os jovens debatem e bus­cam soluções para os prob­le­mas enfrenta­dos por suas comu­nidades. Um mais relata­do pelos alunos é a lon­ga dis­tân­cia enfrenta­da diari­a­mente para chegar nas esco­las reg­u­lares, que ficam longe dos ter­ritórios.

“Muitas cri­anças saem da nos­sa comu­nidade atrav­es­san­do o rio pra esco­la. E não tem ônibus, nem nada. Nós temos uma lan­cha esco­lar, só que ela dire­to está que­bra­da e aí as cri­anças fal­tam muito às aulas. Eu que­ria que tivesse uma esco­la den­tro da nos­sa comu­nidade”, afir­ma Lawan­da Bar­ros, 17 anos, morado­ra da Ilha de São Vicente, em Araguatins (TO).

Brasília (DF), 21.08.2024 - Ana Paula Mendes na Comissão de Educação do Senado Federal (CE) durante audiência pública sobre a implementação da educação escolar quilombola. Foto: Bruno Peres/Agência Brasil
Repro­dução: Brasília (DF), 21.08.2024 — Ana Paula Mendes par­tic­i­pa de audiên­cia na Comis­são de Edu­cação do Sena­do Fed­er­al (CE) Foto: Bruno Peres/Agência Brasil

Ana Paula Sousa, 18 anos, do Quilom­bo Mourões, em Colô­nia do Piauí (PI), con­ta como desco­briu os dire­itos de quilom­bo­la ao fre­quen­tar o cur­so.

“Na min­ha comu­nidade, no começo, a gente não sabia muito como era essa questão de quilom­bo­la, de se autode­clarar. Aí, com pouco tem­po que a gente foi ven­do, con­hecen­do, a gente se autode­clar­ou quilom­bo­la. Aí, eu que­ria faz­er parte desse pro­je­to, porque eu vi que era uma coisa muito inter­es­sante”, diz.

Pensamento crítico

Com apoio de edu­cadores, a esco­la se propõe a insti­gar o pen­sa­men­to críti­co dos alunos para pau­tas soci­ais.

“O nos­so foco é muito o cam­po da advo­ca­cia. Tem trans­porte que não fun­ciona? O que a gente pode faz­er para fun­cionar? A quem a gente deve denun­ciar? Como que a gente deve se posi­cionar? Esse é o papel fun­da­men­tal da esco­la, ir além do con­teú­do for­mal. Erguer a voz das meni­nas quilom­bo­las”, expli­ca Givâ­nia Sil­va, uma das fun­dado­ras do pro­je­to.

De terça-feira (20) a sex­ta-feira (22), estu­dantes e par­tic­i­pantes da ini­cia­ti­va reuni­ram-se na cap­i­tal fed­er­al para um encon­tro nacional.

A pro­mo­to­ra de justiça Karo­line Maia — primeira quilom­bo­la a chegar a esse car­go — foi uma das pre­sentes. Ao destacar a importân­cia de a ini­cia­ti­va per­mi­tir que meni­nas quilom­bo­las estu­dem sem ter de deixar seus ter­ritório, ela con­tou ter vivi­do um proces­so de per­da cul­tur­al ao sair do Quilom­bo Jutaí, situ­a­do no municí­pio de Monção (MA), para estu­dar na cidade. “É um proces­so de dester­ri­to­ri­al­iza­ção. Eu ten­ho saberes ances­trais, mas não são tão vívi­dos como seri­am se eu tivesse cresci­do na comu­nidade.”

O even­to tam­bém con­tou com a par­tic­i­pação da min­is­tra das Mul­heres, Cida Gonçalves, que reforçou o tra­bal­ho da esco­la no enfrenta­men­to ao racis­mo e à desigual­dade.

“Não dá para dis­cu­tir ess­es dois ele­men­tos se você não dis­cu­tir o racis­mo no Brasil. Não tem como dis­cu­tir a desigual­dade se você não troux­er efe­ti­va­mente quem são as mul­heres que estão no proces­so de exclusão no nos­so país. Por isso, eu falo da importân­cia da esco­la. A esco­la não é só um espaço para você ser edu­ca­do, como uma esco­la for­mal edu­ca. É um espaço onde for­mam-se lid­er­anças que cri­am raízes no seu ter­ritório, raízes de resistên­cia para per­manecer no ter­ritório (quilom­bo­la)”.

* Estag­iária sob super­visão de Marce­lo Brandão

Edição: Car­oli­na Pimentel

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