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Evento discute em Salvador futuro da capoeira no Brasil e no mundo

Repro­dução: © Rede de Capoeira/Divulgação

Edição deste ano propõe ressignificação de mestres mais antigos


Pub­li­ca­do em 14/01/2024 — 12:07 Por Alana Gan­dra – Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro

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O maior even­to nacional para dis­cussão do futuro da capoeira no Brasil e no mun­do será real­iza­do em Sal­vador no perío­do de 24 a 27 deste mês, em três locais do cen­tro históri­co da cap­i­tal baiana: Espaço Cul­tur­al da Bar­ro­quin­ha, Praça da Sé e Praça da Cruz Caí­da. A entra­da é fran­ca, e a pro­gra­mação com­ple­ta do 5º Rede Capoeira pode ser con­feri­da no Insta­gram.

O ide­al­izador e coor­de­nador do even­to, cri­a­do em 2013, Mestre Sabiá, disse à Agên­cia Brasil que a edição deste ano propõe a ressig­nifi­cação dos heróis pop­u­lares, ou seja, dos mestres mais anti­gos, para que os mais novos pos­sam rev­er­en­ciar, enten­der a importân­cia deles e os serviços que prestaram à comu­nidade capoeirís­ti­ca e à cul­tura pop­u­lar, de for­ma ger­al. Para ele, esse novo olhar deve ser esten­di­do a toda a sociedade que, muitas vezes, tem um olhar menor para com a capoeira.

Segun­do Mestre Sabiá, a capoeira hoje está pre­sente em cer­ca de 170 país­es e é a maior divul­gado­ra da lín­gua por­tugue­sa no mun­do. “Vem desem­pen­han­do um papel necessário e sig­ni­fica­ti­vo, pre­sente em diver­sas esco­las e uni­ver­si­dades. A capoeira está inseri­da em diver­sos espaços. É uma das maiores redes infor­mais que exis­tem e tem a grande respon­s­abil­i­dade de agre­gar as cul­turas que a trans­ver­sal­izam”.

Ele enfa­ti­zou que onde existe capoeira vai-se encon­trar sem­pre o sam­ba de roda, assim como a pux­a­da de rede e o mac­ulelê, que são man­i­fes­tações da cul­tura pop­u­lar afrode­scen­dente.

Mestre Sabiá - Matéria sobre encontro de capoeira em Salvador. Foto: Bruna Laja/Divulgação
Repro­dução: Mestre Sabiá, cri­ador do Rede Capoeira e orga­ni­zador do even­to em Sal­vador — Foto: Bruna Laja/Divulgação

Patrimônio

Um ano após a cri­ação do Rede Capoeira, a capoeira tornou-se a quin­ta man­i­fes­tação cul­tur­al brasileira recon­heci­da pela Orga­ni­za­ção das Nações Unidas para a Edu­cação, a Ciên­cia e a Cul­tura (Unesco), como Patrimônio Cul­tur­al Ima­te­r­i­al da Humanidade, soman­do-se ao sam­ba de roda do Recôn­ca­vo Baiano; ao Kusi­wa, arte e pin­tu­ra cor­po­ral própria dos povos indí­ge­nas Wajãpi, do Amapá; o fre­vo, de Per­nam­bu­co; e a pere­gri­nação reli­giosa do Círio de Nazaré, do Pará.

Mestre Sabiá chamou a atenção para o fato de a capoeira, além de ser patrimônio cul­tur­al ima­te­r­i­al, ter de ser ali­men­ta­da como bem mate­r­i­al e disse que essa reflexão pre­cisa chegar ao poder públi­co. Segun­do o mestre, o país vive um momen­to favoráv­el a isso, com pes­soas bem-inten­cionadas no âmbito gov­er­na­men­tal. Ele desta­cou que a capoeira está inseri­da na rede par­tic­u­lar de ensi­no, mas ain­da não entrou como matéria cur­ric­u­lar na rede públi­ca. “A capoeira ocu­pa um papel de extrema sig­nificân­cia como um veícu­lo de trans­for­mação social, em nív­el de edu­cação, de inclusão. É impor­tante ter um olhar maior para a comu­nidade capoeirís­ti­ca, ver a capoeira de uma for­ma maior.”

A capoeira, man­i­fes­tação de origem escra­va, que resul­tou em perseguições aos que a prat­i­cavam, atual­mente é refer­ên­cia de edu­cação em Por­tu­gal, país que col­o­ni­zou o Brasil, nos demais país­es europeus e em vários con­ti­nentes, desta­cou o mestre. Por isso, os brasileiros pre­cisam ver a capoeira como uma cul­tura maior, que englo­ba várias ver­tentes, tan­to edu­ca­cionais quan­to esporti­vas. “É uma arte que englo­ba várias artes e tem a respon­s­abil­i­dade tam­bém da con­sciên­cia políti­ca. É impor­tante enten­der os serviços presta­dos pela capoeira. Em um mun­do de tan­tas super­fi­cial­i­dades, a capoeira vem tra­bal­han­do e res­gatan­do, man­i­fe­s­tando a ances­tral­i­dade, a resil­iên­cia. É um movi­men­to de resistên­cia extrema­mente sig­ni­fica­ti­vo”, acres­cen­tou.

Olimpíada

Ape­sar de englo­bar tam­bém o lado esporti­vo, a capoeira não está entre as modal­i­dades incluí­das nos Jogos Olímpi­cos. Mestre Sabiá con­sid­era necessário traz­er essa reflexão para o Rede Capoeira, even­to que envolve a real­iza­ção da Estação Paranauê – com­petição em que são escol­hi­dos os mel­hores atle­tas e o campeão mundi­al. “Esse campeão mundi­al vem rev­er­en­ciar, naque­le momen­to, a tradição. Daí, a gente des­per­ta para a importân­cia de rev­er­en­ciar os mestres mais vel­hos. A gente não pode estar bem se eles não estiverem bem”.

Sabiá lem­brou que o Rede Capoeira tem 14 mestres com mais de 80 anos, que foram os des­bravadores do proces­so de inter­na­cional­iza­ção dessa arte nas décadas de 1960 e 1970 e aju­daram a divul­gar a cul­tura afro-brasileira. “Eles, muitas vezes, pas­sam por um olhar esque­ci­do. Daí a neces­si­dade de estar­mos aten­tos para os mais vel­hos, que são ver­dadeiros heróis, e para a importân­cia que eles têm.”

Como a cul­tura da capoeira é fei­ta por meio da oral­i­dade e não há muitos reg­istros sobre essa man­i­fes­tação, é impor­tante preser­var a tradição e inseri-la de algu­ma for­ma, defend­eu Mestre Sabiá. “Quan­do os mestres vão emb­o­ra [mor­rem], vai emb­o­ra com eles uma bib­liote­ca. Porque eles viram o que ninguém viu e ouvi­ram o que ninguém ouviu e só eles podem con­tar uma coisa den­tro do seu olhar.”

No mun­do con­tem­porâ­neo, onde as coisas são ráp­i­das e descartáveis, é pre­ciso refle­tir sobre a importân­cia dos anti­gos, insis­tiu o mestre capoeirista. ”Eles têm importân­cia de dire­ciona­men­to, de deten­tores de um con­hec­i­men­to maior. A sociedade, den­tro de várias reflexões que pre­cisa faz­er, pre­cisa enten­der a capoeira como arte maior.”

Preconceitos

Sabiá citou um dita­do em iorubá, que diz: ”Exu matou um pás­saro ontem com uma pedra que só jogou hoje”. Para ele, esta é uma pos­si­bil­i­dade de cor­ri­gir alguns encon­tros que hou­ve no pas­sa­do, uma revisão muitas vezes pre­con­ceitu­osa em relação à capoeira, den­tro de uma matriz estru­tur­al em que não se sente parte dela. E traz­er novos con­ceitos que vão for­t­ale­cer a cul­tura afrode­scen­dente, com a capoeira que já foi esporte e ativi­dade cul­tur­al mais prat­i­ca­da no Brasil, que saiu do Códi­go Penal na déca­da de 1930. Mas ela con­ta muito sobre um pas­sa­do cru­el.”

Nesse proces­so, desta­ca-se Mestre João Grande, que teve papel de destaque e vive há mais de 30 anos em Nova Iorque. Foi recon­heci­do como doutor hon­oris causa pela Uni­ver­si­dade de Boston, nos Esta­dos Unidos, sem ao menos falar inglês. “Ou seja, é um agente cul­tur­al que sai de uma cul­tura persegui­da, dis­crim­i­na­da, com um olhar menor e, de repente, vira refer­ên­cia den­tro de out­ro país”.

Daí a importân­cia de val­orizar os heróis da capoeira no Brasil e os serviços por eles presta­dos, ressaltou Mestre Sabiá. “A capoeira é uma arte maior que tra­bal­ha músi­ca, edu­cação, história, val­ores, ances­tral­i­dade, fora todos os bene­fí­cios físi­cos e de coor­de­nação, equi­líbrio, per­cepção espa­cial. É uma exce­lente fer­ra­men­ta pedagóg­i­ca para o uni­ver­so infan­til, que tra­bal­ha com a imag­i­nação.”

Participação

Jun­to a mestres, ativis­tas e artis­tas, o even­to con­tará com a par­tic­i­pação da min­is­tra da Cul­tura, Mar­gareth Menezes, do neu­ro­ci­en­tista e biól­o­go Sidar­ta Ribeiro, do pro­fes­sor de história da Uni­ver­si­dade Fed­er­al do Recôn­ca­vo da Bahia Anto­nio Lib­er­ac, da ped­a­goga Môni­ca Bel­trão, auto­ra do livro A Capoeira enquan­to con­strução da iden­ti­dade e de uma edu­cação prob­lema­ti­zado­ra, de Jorge Columá, autor dos livros A Fábu­la do Berim­bau e Lutas e Artes Mar­ci­ais, além de rep­re­sen­tantes do Insti­tu­to do Patrimônio Históri­co e Artís­ti­co Nacional (Iphan) e do Insti­tu­to do Patrimônio Artís­ti­co e Cul­tur­al da Bahia (Ipac).

O Rede Capoeira apre­sen­tará ain­da shows tradi­cionais e hom­e­nageará os mestres João Grande, Acordeon, Boca Rica, Brandão, Felipe de San­to Amaro, Ola­vo, Pelé da Bom­ba, Brasília, Virgílio, Cafuné, Car­cará, Curió, Mestre Cel­so e Som­bra.

Edição: Nádia Fran­co

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