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Exposição retrata jornada de Ailton Krenak por comunidades na Amazônia

Repro­dução: © Rove­na Rosa/Agência Brasil

Mostra começa hoje em São Paulo e vai até 4 de fevereiro de 2024


Pub­li­ca­do em 25/10/2023 — 12:07 Por Cami­la Boehm – Repórter da Agên­cia Brasil — São Paulo

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A exposição Hiro­mi Nagaku­ra até a Amazô­nia com Ail­ton Kre­nak, aber­ta à vis­i­tação nes­ta quar­ta-feira (25), no Insti­tu­to Tomie Ohtake, apre­sen­ta fotografias de via­gens às aldeias e comu­nidades na Amazô­nia brasileira, reg­istradas entre 1993 e 1997. Os tra­bal­hos do fotó­grafo Nagaku­ra foram real­iza­dos em incursões acom­pan­han­do o líder indí­ge­na Ail­ton Kre­nak.

Nos per­cur­sos, que duraram dezenas de horas, ocor­reram encon­tros em canoas, pra­ias de rios e em aldeias com as etnias Ashanin­ka, Xavante, Krikati, Gav­ião, Yawanawá, Huni Kuin, além do povo Guarani de São Paulo e em comu­nidades ribeir­in­has no Rio Juruá e região do lavra­do em Roraima. As via­gens, que tin­ham a com­pan­hia tam­bém da pro­du­to­ra e intér­prete Eliza Otsu­ka, alcançaram os esta­dos do Acre, Roraima, Mato Grosso, Maran­hão, São Paulo e Ama­zonas.

“Essa é uma cel­e­bração em torno de uma amizade de mais de 30 anos com o fotó­grafo japonês Hiro­mi Nagaku­ra. Ele vin­ha ao Brasil uma ou duas vezes por ano e a gente via­ja­va vis­i­tan­do áreas de pro­je­to que eu esta­va desen­vol­ven­do na Amazô­nia em ter­ritórios indí­ge­nas. Eu esta­va fazen­do pesquisas flo­restais. E o Nagaku­ra decid­iu que ia me acom­pan­har nes­sas via­gens todas e pro­duzir pub­li­cações no Japão”, con­tou Ail­ton Kre­nak, que fez a curado­ria da exposição.

São Paulo (SP), 24/10/2023 - Exposição Hiromi Nagakura até a Amazônia com Ailton Krenak, com curadoria de Ailton Krenak, no Instituto Tomie Ohtake. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Repro­dução: Ail­ton Kre­nak, curador da exposição em SP– Rove­na Rosa/Agência Brasil

A aprox­i­mação entre Kre­nak e Nagaku­ra começou em con­ver­sa, sen­ta­dos em esteiras, na sede da Aliança dos Povos da Flo­res­ta, na cap­i­tal paulista, onde se con­hece­r­am, quan­do Eliza apre­sen­tou o plano de via­gens do fotó­grafo.

“Quan­do Nagaku­ra pub­li­cou no Japão, fez uma exposição grande em Tóquio e pub­li­cou o primeiro livro, ele inti­t­u­lou essas via­gens de via­gens filosó­fi­cas. E foi tam­bém a primeira pes­soa que me atribuiu o títu­lo de filó­so­fo da flo­res­ta, há 30 anos atrás, lá no Japão”, lem­brou Kre­nak. Essa é a primeira exposição da obra de Nagaku­ra no Brasil.

O fotó­grafo Nagaku­ra, em entre­vista à Agên­cia Brasil por meio da intér­prete Eliza, con­tou que a importân­cia do encon­tro com o Ail­ton e das nos­sas via­gens é o pen­sa­men­to e o respeito do líder indí­ge­na pela vida. “Quan­do ele entra na flo­res­ta, vê os rios, as árvores, a mon­tan­ha, ele sem­pre tem muito respeito e pede licença para poder aden­trar ess­es lugares. Isso não ocorre com os europeus, por exem­p­lo. E nesse nos­so tra­je­to, eu apren­di a ver a importân­cia que os indí­ge­nas dão a toda for­ma de vida. E o priv­ilé­gio foi ter o Ail­ton como guia” rev­el­ou o fotó­grafo.

“Os indí­ge­nas não têm fluên­cia no por­tuguês e eu tam­bém não. Então o guia, que não é um guia turís­ti­co, ele traduz para mim qual é o pen­sa­men­to dess­es povos e assim fica mais fácil de eu enten­der a vida de cada um deles. Não é ape­nas uma viagem de tur­is­mo, é uma viagem de relações humanas. Escrevi livros sobre ele e, de algu­ma maneira, eu pas­sei o pen­sa­men­to dele para os japone­ses. As palavras do Ail­ton ficaram encu­ti­das em mim. Essas palavras têm poder e mudaram a min­ha for­ma de ver o mun­do. Fiquei mais pro­fun­do”, disse Nagaku­ra.

Para o líder indí­ge­na Kre­nak, a exposição rep­re­sen­ta uma exten­são dos afe­tos, dessa amizade entre os dois e do con­tenta­men­to que foi con­hecer tan­tas pes­soas naque­las via­gens. “Foram pes­soas, comu­nidades, que con­sti­tuíram rede de afe­tos que está sendo cel­e­bra­da nes­sa curado­ria que tive a opor­tu­nidade de faz­er com uma prox­im­i­dade muito grande com Hiro­mi Nagaku­ra, que é o autor das ima­gens, e com Eliza Utsu­ki, que é a min­ha intér­prete nes­sa con­vivên­cia com o Nagaku­ra já há décadas”, disse Kre­nak.

Lideranças indígenas

Nes­ta sem­ana, haverá rodas de con­ver­sas aber­tas ao públi­co com fotó­grafo e curador, além de lid­er­anças indí­ge­nas con­vi­dadas que rece­ber­am a visi­ta dos dois em suas via­gens à flo­res­ta. Kre­nak desta­cou que, para a exposição, vier­am pes­soas de diver­sas regiões do país, onde foram feitas as fotografias. “Ago­ra, eles estão aqui vis­i­tan­do, nos encon­tran­do aqui. Pes­soas fotografadas estão se recon­hecen­do nas ima­gens quan­do eles tin­ham 20 anos, quan­do eram cri­anças, e ago­ra eles são avôs, são pais. É mar­avil­hoso”, comem­o­rou.

Nagaku­ra tam­bém já fez reg­istros de ter­ritórios em con­fli­to, como África do Sul, Palesti­na, El Sal­vador e Afe­gan­istão, antes das via­gens pela Amazô­nia. “Ele é um fotó­grafo que acom­pan­hou guer­ras no mun­do e que decid­iu me acom­pan­har na flo­res­ta. Foi uma tran­sição do cam­in­ho que ele fazia, esta­va exaus­to de ver guer­ra, e resolveu ver a flo­res­ta jun­to comi­go, e pra mim foi um pre­sente mar­avil­hoso”, expli­cou.

Kre­nak afir­ma que a exposição é uma cel­e­bração e um alívio ime­di­a­to após o gov­er­no de Jair Bol­sonaro, que deixou pre­juí­zos pro­fun­dos aos povos indí­ge­nas. “Infe­liz­mente a gente teve que supor­tar aque­le perío­do de fla­ge­lo e ago­ra nós esta­mos aqui cel­e­bran­do a vida”, disse.

“Para as comu­nidades indí­ge­nas, é uma opor­tu­nidade muito grande de reen­con­tro com Hiro­mi Nagaku­ra e com suas próprias ima­gens, que estão aqui refletindo um tem­po de lutas e tam­bém um tem­po de mui­ta fes­ta, mui­ta cel­e­bração e de ale­gria que ess­es povos expres­sam no seu cotid­i­ano nas aldeias”, final­i­zou.

Para o fotó­grafo, as ima­gens mostram como essas pes­soas con­tin­u­am vivas, que a mostra é atem­po­ral. “Você vê os Krikatis, Yanoma­mi, Yawanawá, Kax­i­nawá, eles con­tin­u­am vivos, eles estão aumen­tan­do. Veio uma Ashanin­ka [na exposição], trouxe uma fil­ha de 15 anos. Então a gente vê que é assim, não é uma coisa da história, eles acabaram. É uma exposição de pes­soas vivas. Não acabou, não é história. A gente vê a esper­ança do futuro”, rev­el­ou.

“Eu fico feliz de ser um sujeito, de ter vis­to essa evolução. Tem uma krikati que veio pra cá nos vis­i­tar e ela falou que o pai dela mor­reu, eu a con­heci cri­anc­in­ha e ago­ra ela vem aqui e me fala que teve o neném, que cresceu e que ago­ra tem um out­ro neném tam­bém. Então é a con­tinuidade que é boni­ta. E as pes­soas que estão aqui são a pro­va viva dis­so. É assim, ape­sar dos 20 anos, eu não vejo nos­tal­gia, eu só vejo vida e futuro”, disse Nagaku­ra.

 

São Paulo (SP), 24/10/2023 - Exposição Hiromi Nagakura até a Amazônia com Ailton Krenak, com curadoria de Ailton Krenak, no Instituto Tomie Ohtake. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Repro­dução: Exposição Hiro­mi Nagaku­ra até a Amazô­nia com Ail­ton Kre­nak, com curado­ria de Ail­ton Kre­nak, no Insti­tu­to Tomie Ohtake. Foto: Rove­na Rosa/Agência Brasil

O fotó­grafo con­tou sobre uma das pas­sagens que teve com o líder indí­ge­na, mostran­do que tradição e lugar de vida são impor­tantes. “Eu ten­ho certeza que se essas pes­soas quis­erem viv­er na cidade, elas vão con­seguir. Se tiv­er din­heiro, com­pra tudo. Mas o que eu apren­di com a Ail­ton é que não com­pra vida. Uma cer­ta vez ele me falou: tem um povo que ven­dia uma ces­ta por 50 reais para com­prar algu­ma coisa, mas aí veio um europeu, achou a ces­ta lin­da, falou não, eu quero que vocês façam mil. E essas pes­soas se recusaram, dis­ser­am que, para faz­er mil, eles vão ter que parar de viv­er. E aí eu obser­vo que foi o que os japone­ses fiz­er­am. Os japone­ses viver­am de tra­bal­har e esque­ce­r­am de viv­er”, con­tou Nagaku­ra.

A exposição Hiro­mi Nagaku­ra até a Amazô­nia com Ail­ton Kre­nak fica aber­ta ao públi­co até 4 de fevereiro de 2024, de terça a domin­go, das 11h às 19h, com entra­da gra­tui­ta, no Insti­tu­to Tomie Ohtake, local­iza­do na Aveni­da Faria Lima, 201. Haverá ain­da o lança­men­to do livro Um rio, um pás­saro, de Ail­ton Kre­nak, na sex­ta-feira (27).

* Matéria foi alter­a­da às 15h05 para cor­ri­gir a infor­mação, no 9º pará­grafo, de que a exposição trazia ima­gens fei­ta em ter­ritórios em con­fli­to. Na ver­dade, Nagaku­ra fez os reg­istros, mas eles não con­stam na mostra.

Edição: Valéria Aguiar

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