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Governo volta olhar para mulheres, negros, trans e vítimas da ditadura

Repro­dução: © Tânia Rêgo/Agência Brasil

Políticas de Direitos Humanos voltam com fôlego nos 100 primeiros dias


Pub­li­ca­do em 09/04/2023 — 11:21 Por Lety­cia Bond — Repórter da Agên­cia Brasil — São Paulo

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No cam­po dos dire­itos humanos e socioam­bi­en­tais, que com­preende mino­rias soci­ais em todas as suas par­tic­u­lar­i­dades, o gov­er­no fed­er­al começou sua gestão atuan­do na lóg­i­ca do “nada por nós sem nós”, con­stan­te­mente reivin­di­ca­da pelos movi­men­tos soci­ais. Nos seus primeiros 100 dias, ele reparou feri­das da ditadu­ra mil­i­tar, lev­ou o debate do racis­mo nova­mente ao gov­er­no e ampliou o olhar para as mul­heres e à comu­nidade LGBTQIA+, entre out­ras medi­das.

A equipe de tran­sição do gov­er­no de Luiz Iná­cio Lula da Sil­va apre­sen­tou a ver­são final de seu relatório em 22 de dezem­bro de 2022. No doc­u­men­to, o Min­istério dos Dire­itos Humanos e da Cidada­nia (MDHC) con­tex­tu­al­i­zou o cenário. Na avali­ação da pas­ta, o desmonte pro­movi­do pela gestão ante­ri­or ocor­reu por três vias que oca­sion­aram a inter­rupção de políti­cas públi­cas: o revi­sion­is­mo do sig­nifi­ca­do históri­co dos dire­itos humanos, a restrição à par­tic­i­pação social e o corte no orça­men­to.

O primeiro mar­co do min­istério foi a própria indi­cação do advo­ga­do, pro­fes­sor uni­ver­sitário e filó­so­fo Sil­vio Almei­da ao car­go de tit­u­lar da pas­ta. Um homem negro, com tra­jetória na luta antir­racista e esteve à frente do Insti­tu­to Luiz Gama, que ofer­ece asses­so­ria jurídi­ca a mino­rias soci­ais. Almei­da tam­bém foi rela­tor da comis­são de juris­tas, cri­a­da pela Câmara dos Dep­uta­dos para apri­morar a leg­is­lação de com­bate ao racis­mo no Brasil.

Composição do ministério

O Min­istério da Mul­her, da Família e dos Dire­itos Humanos tin­ha em sua com­posição oito Sec­re­tarias Nacionais: a de Políti­ca para as Mul­heres; a da Família; a dos Dire­itos da Cri­ança e do Ado­les­cente; a da Juven­tude; a de Pro­teção Glob­al; a de Políti­cas de Pro­moção da Igual­dade Racial; a dos Dire­itos da Pes­soa com Defi­ciên­cia e a de Pro­moção e Defe­sa dos Dire­itos da Pes­soa Idosa. Com a reor­ga­ni­za­ção do pres­i­dente Lula e do min­istro Sil­vio Almei­da, o organogra­ma pas­sou a con­tar com cin­co, além das asses­so­rias dire­tas ao min­istro: a dos Dire­itos da Pes­soa Idosa; a dos Dire­itos da Cri­ança e do Ado­les­cente; a de Pro­moção e Defe­sa dos Dire­itos Humanos; a dos Dire­itos da Pes­soa com Defi­ciên­cia e a dos Dire­itos das Pes­soas LGBTQIA+. Pau­tas ref­er­entes a mul­heres e ao enfrenta­men­to ao racis­mo ficam sob respon­s­abil­i­dade de dois min­istérios especí­fi­cos.

Ditadura e autoritarismo

As con­se­quên­cias da ditadu­ra mil­i­tar e seus pos­síveis reflex­os nos dias de hoje é um dos temas que tem a atenção do novo gov­er­no. Durante a posse dos novos secretários, Sil­vio Almei­da anun­ciou a reati­vação da Comis­são de Mor­tos e Desa­pare­ci­dos Políti­cos e a cri­ação da Asses­so­ria Espe­cial de Defe­sa da Democ­ra­cia, Memória e Ver­dade.

Em 17 de janeiro, o min­istério definiu os novos mem­bros da Comis­são de Anis­tia, para retomar a análise de proces­sos que pro­movam a dev­i­da reparação a víti­mas de perseguições políti­cas no país. Na ocasião, a pas­ta infor­mou que, de 2019 a 2022, 4.081 (95%) dos 4.285 proces­sos jul­ga­dos pela comis­são ante­ri­or, do gov­er­no Jair Bol­sonaro, foram inde­feri­dos. A primeira sessão públi­ca da comis­são, que tem como pres­i­dente Eneá de Stutz e Almei­da, foi real­iza­da em 30 de março.

Brasília (DF) 28/03/2023 Enea Schutz nova presidenta da Comissão de anistia.
Repro­dução: Enea Schutz, nova pres­i­den­ta da Comis­são de anis­tia. — Lula Marques/ Agên­cia Brasil

Entre 24 de março e 2 de abril, o MDHC orga­ni­zou uma série de ini­cia­ti­vas que pre­ten­dem retomar agen­das insti­tu­cionais pela preser­vação da memória, da ver­dade, da luta pela democ­ra­cia e justiça social. O con­jun­to de ativi­dades lev­ou o nome de “Sem­ana do Nun­ca Mais – Memória Restau­ra­da, Democ­ra­cia Viva”. Foi tam­bém lança­do o doc­u­men­tário “Nun­ca mais”, disponív­el no YouTube.

Out­ro aspec­to que entrou na agen­da do min­istério foi o com­bate a dis­cur­sos de ódio. No dia 27 de janeiro, o órgão anun­ciou a cri­ação de um Grupo de Tra­bal­ho Inter­min­is­te­r­i­al (GTI), inte­gra­do por espe­cial­is­tas, profis­sion­ais e comu­ni­cadores que encam­pem a cul­tura da paz. Cer­ca de um mês depois, em 22 de fevereiro, foi pub­li­ca­da uma por­taria que for­mal­i­zou a con­sti­tu­ição do grupo, coman­da­do pela ex-dep­uta­da fed­er­al Manuela D´Ávila.

Janeiro chegou ao fim com a assi­natu­ra de decre­tos que cri­aram o Con­sel­ho de Par­tic­i­pação Social e o Sis­tema de Par­tic­i­pação Social Inter­min­is­te­r­i­al, para se restau­rar o vín­cu­lo com movi­men­tos soci­ais e orga­ni­za­ções da sociedade civ­il. O sis­tema insti­tui uma Asses­so­ria de Par­tic­i­pação Social e Diver­si­dade em cada um dos min­istérios, que ficam sub­or­di­nadas à Sec­re­taria-Ger­al da Presidên­cia da Repúbli­ca.

O pro­gra­ma Abrace o Mara­jó, ini­cia­ti­va do gov­er­no Bol­sonaro para mel­ho­rar o Índice de Desen­volvi­men­to Humano (IDH) dos municí­pios da região, no Pará, será obje­to de audi­to­ria a pedi­do do MDHC, con­forme anun­ciou a pas­ta no iní­cio de fevereiro. No entendi­men­to do min­istério, a ação teria sido usa­da para ben­e­fi­ciar inter­ess­es estrangeiros, sem par­tic­i­pação social e sem ben­e­fi­ciar cidadãos da região.

Desastres naturais

Os tem­po­rais que atin­gi­ram o esta­do de Per­nam­bu­co foram mais uma adver­si­dade que exigiu respos­ta do gov­er­no fed­er­al. O MDHC mon­i­torou a situ­ação das pes­soas desabri­gadas e man­teve con­ta­to com orga­ni­za­ções locais, para prestar apoio, se aciona­do.

Poucos dias depois, foi a vez do litoral paulista, que enfren­tou ten­são semel­hante. Nesse caso, a solução do min­istério foi coor­denar ações através da Ouvi­do­ria Nacional de Dire­itos Humanos, em con­jun­to com o Min­istério da Inte­gração e do Desen­volvi­men­to Region­al (MDR). Em para­le­lo, uma equipe sobrevoou a região para cal­cu­lar os danos e acom­pan­hou a reti­ra­da de moradores das zonas de risco. Além dis­so, o MDHC se colo­cou à dis­posição para dar suporte à rede local que prestou assistên­cia à pop­u­lação.

São Sebastião (SP), 20-02-2023, Desmoronamento causado pelas chuvas no bairro Itatinga, conhecido como Topolândia, no litoral norte de São Paulo. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Repro­dução: Desmoron­a­men­to cau­sa­do pelas chu­vas no bair­ro Itatin­ga, con­heci­do como Topolân­dia, no litoral norte de São Paulo. Foto: Rove­na Rosa/Agência Brasil — Rove­na Rosa/Agência Brasil

Ain­da em fevereiro, o min­istério lançou, no car­naval, a cam­pan­ha “Blo­co do Disque 100”, em parce­ria com a Agên­cia Brasileira de Pro­moção Inter­na­cional do Tur­is­mo (Embratur). O propósi­to foi a divul­gação do canal, que recebe denún­cias de vio­lações de dire­itos humanos. O mote foi “a ale­gria é um dire­ito fun­da­men­tal”.

Ain­da na primeira metade de fevereiro, o pres­i­dente Lula e o min­istro Sil­vio Almei­da par­tic­i­param de cer­imô­nia, no Palá­cio do Planal­to, para cel­e­brar a recri­ação do Pro­gra­ma Pró-Cata­dor e edi­tar decre­tos de fomen­to à reci­clagem.

Brasília (DF), 13/02/2023 - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante cerimônia de assinatura de decretos recriando o Programa Pró-Catador de materiais recicláveis.
Repro­dução: Pres­i­dente  Lula em cer­imô­nia de assi­natu­ra de decre­tos recrian­do o Pro­gra­ma Pró-Cata­dor de mate­ri­ais reci­cláveis. — Marce­lo Camargo/Agência Brasil

Com­bi­nan­do com o acol­hi­men­to de reivin­di­cações dos cata­dores de resí­du­os reci­cláveis, o gov­er­no fed­er­al tomou medi­das no sen­ti­do de res­guardar dire­itos das pes­soas com defi­ciên­cia. Um dos prin­ci­pais pas­sos dados foi o lança­men­to de uma lin­ha de crédi­to especí­fi­ca, que per­mi­tirá emprés­ti­mos com val­or entre R$ 5 mil e R$ 30 mil. Para quitá-los, as pes­soas com defi­ciên­cia poderão parce­lar a quan­tia total em até 60 meses, com taxas de juros de 6% a 7,5% ao ano.

Durante os primeiros 100 dias de gov­er­no Lula, o MDHC tam­bém pro­duz­iu um relatório sobre o esta­do do sis­tema pri­sion­al no Rio Grande do Norte. O tex­to foi pro­duzi­do e divul­ga­do pelo Mecan­is­mo Nacional de Pre­venção e Com­bate à Tor­tu­ra (MNPCT), que doc­u­men­tou casos de tor­tu­ra con­tra deten­tos e out­ras situ­ações, como fal­ta de atendi­men­to médi­co.

Out­ro pro­je­to que deve expor vul­ner­a­bil­i­dades pelo Brasil é a cri­ação de um painel nacional de indi­cadores em dire­itos humanos e de políti­cas públi­cas de dire­itos humanos baseadas em evidên­cias, que deve se con­cretizar com o apoio de espe­cial­is­tas do Insti­tu­to de Pesquisa Econômi­ca Apli­ca­da (Ipea).

A reflexão que faz o dire­tor de Lit­igân­cia e Incidên­cia Conec­tas Dire­itos Humanos, Gabriel Sam­paio, é de que o país neces­si­ta, antes de tudo, de uma rever­são do cenário de declínio em diver­sas áreas. “Para um país com um racis­mo arraiga­do, com desigual­dades estru­tu­rais, toda vez em que não há avanço nos dire­itos humanos, por sua con­sol­i­dação, temos sem­pre um agrava­men­to muito cru­el dessas desigual­dades. Por­tan­to, um ciclo de qua­tro anos de retro­ces­sos não é facil­mente suplan­ta­do”, argu­men­ta.

“Pas­sos impor­tantes foram toma­dos em relação a casos de pro­fun­da relevân­cia, como é o caso do con­t­role de armas, do enfrenta­men­to ao tra­bal­ho anál­o­go à escravidão”, exem­pli­fi­ca.

Sobre a relação com o Con­gres­so Nacional, capaz de travar ou destravar matérias de inter­esse do gov­er­no fed­er­al, a econ­o­mista e douto­ra em Políti­cas Soci­ais Nathalie Begh­in ressalta que “a ten­são é per­ma­nente”, mas con­fia no poder de artic­u­lação dos min­istros de Lula. “Vai ser um debate ten­so, mas os profis­sion­ais nomea­d­os para as pas­tas, como os min­istros Sil­vio Almei­da, Anielle Fran­co e Cida Gonçalves, são pes­soas com­pro­meti­das com suas agen­das, mas pen­so que aber­tas ao diál­o­go”, pon­tua ela, que tam­bém é mem­bro do Insti­tu­to de Estu­dos Socioe­conômi­cos (Inesc).

Comunidade LGBTQIA+

A Secretária Nacional LGBTQIA+ do Ministério dos Direitos Humanos, Symmy Larrat.
Repro­dução: Secretária Nacional LGBTQIA+ do Min­istério dos Dire­itos Humanos, Sym­my Lar­rat. — Marce­lo Camargo/Agência Brasil

Um dos nomes de destaque do min­istério, em ter­mos de diver­si­dade e, por­tan­to, rep­re­sen­ta­tivi­dade, é a trav­es­ti Sym­my Lar­rat, que assum­iu a sec­re­taria que faz a defe­sa da pop­u­lação LGBTQIA+. Sym­my pre­side a Asso­ci­ação Brasileira de Gays, Lés­bi­cas, Bis­sex­u­ais, Trav­es­tis, Tran­sex­u­ais e Inter­sex­os (ABGLT).

Após um perío­do de escant­ea­men­to por parte do gov­er­no fed­er­al, a comu­nidade de pes­soas trans­gênero viu novi­dades ain­da em janeiro: o lança­men­to da cam­pan­ha “Con­stru­ir para Recon­stru­ir”, em alusão ao Mês da Vis­i­bil­i­dade Trans. A cam­pan­ha con­sis­tiu na veic­u­lação de pub­li­cações dig­i­tais e matérias espe­ci­ais, por meio das redes soci­ais do órgão.

No Brasil, o con­jun­to de agressões que sis­tem­ati­ca­mente viti­mam a pop­u­lação trans faz com que a expec­ta­ti­va de vida de uma pes­soa per­ten­cente a esse grupo seja de 35 anos. Por isso, uma das men­sagens difun­di­das durante a cam­pan­ha foi “A min­ha existên­cia não fere você, mas o seu pre­con­ceito me impede de viv­er”.

Em 2 de fevereiro, o min­istro Sil­vio Almei­da disse que con­ce­ber o Con­sel­ho Nacional LGBTQIA+ é “uma das maiores neces­si­dades na con­strução de políti­cas públi­cas” para dar con­ta das deman­das desse grupo pop­u­la­cional. A fala surge no con­tex­to do res­gate da par­tic­i­pação social.

No mês seguinte, março, o MDHC lançou um mapea­men­to de políti­cas públi­cas para a pro­moção da cidada­nia das pes­soas LGBTQIA+, dis­tribuí­das em todos os esta­dos e cap­i­tais. O mate­r­i­al inte­gra o Pro­gra­ma Ate­na, real­iza­do pela Aliança Nacional LGBTI+ e Grupo Arco-Íris de Cidada­nia LGBT (GAI), com o apoio insti­tu­cional do Fórum Nacional de Gestoras e Gestores Estad­u­ais e Munic­i­pais de Políti­cas Públi­cas para Pop­u­lação LGBT (Fonges) e da Asso­ci­ação da Para­da LGBT de São Paulo. Tam­bém apoiam o pro­gra­ma a Rede Trans Brasil, o Fórum Nacional de Pes­soas Trans Negras, a Asso­ci­ação Brasileira de Estu­dos da Trans Homo­cul­tura, a Liga Trans Mas­culi­na João W. Nery e o Insti­tu­to Brasileiro de Trans­mas­culin­idade (Ibrat).

A pres­i­dente da Asso­ci­ação Nacional de Trav­es­tis e Tran­sex­u­ais (Antra), Keila Simp­son, acred­i­ta que no cam­in­ho de diál­o­go com o gov­er­no pode haver obstácu­los, mas que nada se com­para ao cenário ante­ri­or. “A gente tem ciên­cia de que não será fácil debater e dar encam­in­hamen­to às políti­cas que a gente quer, que tan­to pre­cisa, mas está, pelo menos, con­sciente de que não será ata­ca­da e que não terá retro­ces­sos nesse perío­do”, comen­ta.

Mulheres

No final de janeiro, o Min­istério das Mul­heres divul­gou as metas a serem alcançadas nos primeiros 100 dias de gov­er­no. Entre os planos, estavam a expan­são da Casa da Mul­her Brasileira, a retoma­da do pro­gra­ma Mul­her Viv­er sem Vio­lên­cia, a recu­per­ação do Ligue 180 e a artic­u­lação inter­min­is­te­r­i­al para a elab­o­ração de uma lei pela igual­dade salar­i­al entre home­ns e mul­heres.

Na últi­ma terça-feira (4), foi lança­do o novo canal do Ligue 180, de denún­cias de vio­lên­cia con­tra a mul­her, via What­sApp. Na Câmara dos Dep­uta­dos, a expan­são de 18,2% da par­tic­i­pação fem­i­ni­na nas ban­cadas ger­ou um aumen­to recorde de pro­postas rela­cionadas à pro­teção de mul­heres. Isso tem o poten­cial de ori­en­tar a agen­da do Poder Exec­u­ti­vo e do min­istério cap­i­tanea­do por Cida Gonçalves.

Brasília (DF) 04/04/2023 Central de atendimento do Ligue 180. Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
Repro­dução: Cen­tral de atendi­men­to do Ligue 180 — Fabio Rodrigues-Pozze­bom/ Agên­cia Brasil

Out­ra medi­da que se con­soli­dou foi o atendi­men­to 24h das del­e­ga­cias espe­cial­izadas de Atendi­men­to à Mul­her (Deam), inclu­sive em feri­ados e finais de sem­ana. A deter­mi­nação está na Lei nº 14.541, pub­li­ca­da nes­ta terça-feira (4), no Diário Ofi­cial da União.

A pas­ta tam­bém esteve no lança­men­to do Pro­gra­ma Nacional de Segu­rança Públi­ca com Cidada­nia (Pronasci II), que tem o enfrenta­men­to à vio­lên­cia de gênero como um dos eixos. Ao todo, o gov­er­no prom­e­teu 270 novas viat­uras para as patrul­has Maria da Pen­ha e del­e­ga­cias espe­cial­izadas de atendi­men­to a mul­heres. Essas e out­ras ações e intenções con­stam de uma lista sis­tem­ati­za­da pelo min­istério.

A dire­to­ra do Cen­tro Pop­u­lar da Mul­her, da União Brasileira de Mul­heres (UBM) de Goiás, Lucia Rin­con, salien­ta que as mul­heres são as primeiras inter­es­sadas na democ­ra­cia. “Sem a democ­ra­cia, não temos nada, nem a condição de falar do difer­ente, de nos man­i­fes­tar­mos, porque onde não há democ­ra­cia, não há man­i­fes­tação, divergên­cia, diver­si­dade. Essa é a grande primeira questão que, ao se avaliar ou se faz­er um apan­hado das ações do gov­er­no Lula, pre­cisamos colo­car”, defende.

Para a pró-reito­ra de Exten­são e Cul­tura e Pro­fes­so­ra Adjun­ta na Uni­ver­si­dade Fed­er­al de Per­nam­bu­co (UFPE), Con­ceição Reis, ver esse tipo de rep­re­sen­tação crescer no gov­er­no fed­er­al é algo que rev­ela aber­tu­ra de diál­o­go e pos­si­bil­i­dades de mel­ho­ra para gru­pos esque­ci­dos nos últi­mos anos. “A rep­re­sen­ta­tivi­dade e exper­iên­cias dessas mul­heres aju­dam a garan­tir ess­es dire­itos e elab­o­rar políti­cas com este fim”, afir­ma. “Ten­ho muitas expec­ta­ti­vas de mel­ho­rias para nós, mul­heres negras”.

População negra

O gov­er­no Lula tem emi­ti­do uma men­sagem ini­cial de atenção à pop­u­lação negra do Brasil. Sua primeira providên­cia foi a cri­ação do Min­istério da Pro­moção da Igual­dade Racial, onde reser­va assen­to à irmã da vereado­ra Marielle Fran­co, Anielle Fran­co.

No que diz respeito à vereado­ra assas­si­na­da em 2018, o gov­er­no tem bus­ca­do acel­er­ar o anda­men­to das inves­ti­gações. Com isso, em 22 de fevereiro, o min­istro Flávio Dino deter­mi­nou a instau­ração de um novo inquéri­to da Polí­cia Fed­er­al para ampli­ar a colab­o­ração com a apu­ração do caso.

O mês de janeiro começou com um aceno do gov­er­no aos movi­men­tos negro e indí­ge­na. No dia 11 daque­le mês, o pres­i­dente da Repúbli­ca assi­nou a Lei nº 14.532, que equipara injúria racial ao crime de racis­mo. A dis­crim­i­nação tor­na-se um crime impre­scritív­el. Além dis­so, atu­al­iza-se a lei, com a tip­i­fi­cação de racis­mo esporti­vo, artís­ti­co, cul­tur­al e reli­gioso, esse últi­mo vivi­do com fre­quên­cia por adep­tos de religiões de matriz africana.

O pres­i­dente Lula tam­bém san­cio­nou a Lei nº 14.519, de 05 de Janeiro de 2023, que insti­tui o dia 21 de março como o Dia Nacional das Tradições de Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Can­domblé. A sanção pres­i­den­cial foi tida como “um mar­co históri­co” pela Fun­dação Cul­tur­al Pal­mares (FCP).

Em 21 de março, o pres­i­dente Lula assi­nou um decre­to que reser­va 30% dos car­gos em comis­são para negros e indí­ge­nas e entre­gou títu­los de pro­priedade defin­i­ti­va para quilom­bo­las de Minas Gerais e Sergipe. Tam­bém foram assi­na­dos decre­tos ref­er­entes ao Pro­gra­ma Aquilom­ba Brasil, que vai pro­mover dire­itos como aces­so à ter­ra, qual­i­dade de vida e cidada­nia; e que instituem Gru­pos de Tra­bal­ho volta­dos ao novo Pro­gra­ma Nacional de Ações Afir­ma­ti­vas, Plano Juven­tude Negra Viva, Cais do Val­on­go e enfrenta­men­to ao racis­mo reli­gioso.

No iní­cio de abril, o gov­er­no fed­er­al revo­gou a “Ordem do Méri­to Prince­sa Isabel”. No lugar, insti­tu­iu o Prêmio Luiz Gama de Dire­itos Humanos, que será con­ce­di­do, a cada dois anos, sem­pre em anos pares, a pes­soas físi­cas ou jurídi­cas que ten­ham notório tra­bal­ho na pro­moção e defe­sa dos dire­itos humanos, no Brasil.

Nes­ta sem­ana, o pres­i­dente da Fun­dação Cul­tur­al Pal­mares, João Jorge Rodrigues, que foi escol­hi­do para inte­grar a Comis­são Nacional da Ver­dade da Escravidão Negra no Brasil, assi­nou a revo­gação da Por­taria 189/20. O tex­to foi edi­ta­do durante o gov­er­no Bol­sonaro e pro­movia a exclusão de hom­e­na­gens feitas a per­son­al­i­dades negras, como a escrito­ra Con­ceição Evaris­to e o can­tor e com­pos­i­tor Mil­ton Nasci­men­to, do site ofi­cial da fun­dação.

Na últi­ma quin­ta-feira (6), a FCP revo­gou a Por­taria 57/2022, do gov­er­no Bol­sonaro, que tor­na­va mais rig­orosas as nor­mas para emis­são de cer­tidões de autodefinição para comu­nidades quilom­bo­las. Ao mes­mo tem­po, o órgão res­ga­tou a por­taria de 2007, do segun­do gov­er­no Lula, que insti­tui o Cadas­tro Ger­al de Remanes­centes das Comu­nidades dos Quilom­bos, tam­bém auto­de­nom­i­nadas Ter­ras de Pre­to, Comu­nidades Negras, Mocam­bos, Quilom­bos, entre out­ros.

Para a edu­cado­ra Givâ­nia Maria da Sil­va, uma das fun­dado­ras da Coor­de­nação Nacional de Artic­u­lação de Quilom­bos (Conaq), um dos desafios do gov­er­no é recom­por força de tra­bal­ho e orça­men­to para atin­gir os obje­tivos pro­pos­tos.

“Par­tic­i­pan­do do gov­er­no de tran­sição, pude ver: não se tra­ta de uma coin­cidên­cia, tra­tou-se de algu­ma coisa delib­er­a­da para que todas políti­cas com recorte racial fos­sem forte­mente afe­tadas. Fos­se da mudança da políti­ca em si, do fluxo da políti­ca, como da extinção, ou aque­las que não foram extin­tas foram asfix­i­adas em seu orça­men­to. Cos­tu­mo diz­er que foram sufo­cadas finan­ceira­mente, como é o caso da reg­u­lar­iza­ção dos ter­ritórios das comu­nidades quilom­bo­las”, afir­mou, em entre­vista à Agên­cia Brasil.

Givâ­nia acred­i­ta que movi­men­to indí­ge­na con­seguiu, mais do que o movi­men­to negro, sen­si­bi­lizar a sociedade em ger­al. Na sua avali­ação isso ocorre porque grande parte da pop­u­lação brasileira ain­da se recusa a assumir o próprio racis­mo.

“Muitas pes­soas que até defen­d­em as políti­cas indi­genistas, não é porque estão con­cor­dan­do efe­ti­va­mente com elas, mas é porque guardam um cer­to remor­so históri­co quan­to aos povos orig­inários, indí­ge­nas. Em relação à pop­u­lação negra, isso não existe e tem uma razão. A luta do Brasil é para apa­gar as memórias da escravidão e não para que as pes­soas con­heçam o mal que ela cau­sou e ain­da causa. Os reflex­os dessa desigual­dade entre pes­soas negras e não negras estão anco­radas nes­sa escravidão, isso é inegáv­el”, diz. “Uma sociedade racista não com­bi­na com o pen­sa­men­to democráti­co”.

Luka Fran­ca, mem­bro da coor­de­nação estad­ual do Movi­men­to Negro Unifi­ca­do (MNU) São Paulo, lem­bra que a per­spec­ti­va que prevalece no Brasil é a de col­o­nizadores e que isso inter­fere na aprovação ou reprovação de debates e leis. “A gente tem fig­uras que atu­aram e atu­am cotid­i­ana­mente para ampli­ar políti­cas que a gente sabe que atu­am dire­ta­mente sobre a nos­sa morte, como a maior lib­er­ação de armas, políti­cas de restrição ao dire­ito ao abor­to e um monte de out­ras coisas que não estão pen­san­do no con­jun­to da pop­u­lação pobre e negra desse país”, declara.

Edição: Marce­lo Brandão

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