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Grande Rio registra média de 17 confrontos por dia, diz estudo

Repro­dução: © Tânia Regô/Agência Brasil

Em metade dos conflitos havia presença policial


Publicado em 05/06/2024 — 17:16 Por Alana Gandra – Repórter da Agência Brasil — Rio de Janeiro
Atualizado em 05/06/2024 — 17:55

A região met­ro­pol­i­tana do Rio de Janeiro reg­istrou, de 2017 a 2023, uma média de 17 con­fron­tos por dia, total­izan­do 38.271 no perío­do. Quase 50% dos con­fron­tos mapea­d­os tin­ham a pre­sença de poli­ci­ais. Ape­sar dos números ele­va­dos, mais da metade dos bair­ros não são afe­ta­dos por nen­hum tipo de ocor­rên­cia.

Os dados fazem parte do estu­do inédi­to Grande Rio sob Dis­pu­ta: Mapea­men­to dos Con­fron­tos por Ter­ritório, elab­o­ra­do pela insti­tu­ição e pelo Grupo de Estu­dos dos Novos Ile­gal­is­mos da Uni­ver­si­dade Fed­er­al Flu­mi­nense (Geni-UFF), divul­ga­do hoje. O tra­bal­ho con­sider­ou dados sobre tiroteios e oper­ações entre 2017 e 2023 obti­dos pelo Fogo Cruza­do, pelo Geni, pelo Disque Denún­cia e tam­bém pelo Insti­tu­to de Segu­rança Públi­ca (ISP-RJ) no perío­do de 2017 a 2022.

Quan­do se anal­isam todos os ter­ritórios ao lon­go dess­es anos, ver­i­fi­ca-se que 60% dos bair­ros foram afe­ta­dos por con­fron­tos envol­ven­do poli­ci­ais. Os 40% restantes reg­is­traram con­fron­tos, mas sem a pre­sença de poli­ci­ais.

Para a dire­to­ra de Dados e Transparên­cia do Insti­tu­to Fogo Cruza­do, Maria Isabel Couto, a segu­rança públi­ca tem que ser fei­ta com base em evidên­cias, tan­to no esta­do do Rio de Janeiro quan­to no Brasil como um todo. “O prob­le­ma é grave no Rio de Janeiro, mas, quan­do nos baseamos em evidên­cias, con­seguimos ver luz no fim do túnel.”

Den­tro dos bair­ros afe­ta­dos por con­fron­tos, a maio­r­ia reg­is­tra even­tos pon­tu­ais e de baixa inten­si­dade. “São vio­lên­cias episódi­cas. Não são vio­lên­cias crôni­cas. Na média, só 3,7% dos bair­ros, a cada ano, foram afe­ta­dos por con­fli­tos reg­u­lares e de alta inten­si­dade”, avalia Maria Isabel.

Um em cada qua­tro bair­ros afe­ta­dos por con­fron­to foi car­ac­ter­i­za­do por con­fli­tos de pre­pon­derân­cia poli­cial: 85% dos casos naque­le bair­ro ocor­reram com a pre­sença da polí­cia. “Sig­nifi­ca que o remé­dio não está lis­ta­do para a doença”, disse Maria Isabel, acres­cen­tan­do que a solução ofer­e­ci­da para a segu­rança públi­ca não está cal­ca­da em evidên­cias da real­i­dade enfrenta­da. Por isso, a medi­da está descal­i­bra­da e pio­ran­do o prob­le­ma, acen­tu­ou.

Segun­do ela, uma políti­ca públi­ca efi­ciente pre­cisa levar em con­sid­er­ação tais evidên­cias para aplicar medi­das cor­re­tas e nos locais necessários.

“Se são apli­ca­dos recur­sos de guer­ra, como fuzis, de for­ma indis­crim­i­na­da, em áreas de baixa inten­si­dade e de baixa reg­u­lar­i­dade de con­fli­tos, agra­va-se a vio­lên­cia. A vio­lên­cia está na parte do prob­le­ma e da solução. O que se vê é a polí­cia atuan­do de for­ma indis­crim­i­na­da e, às vezes, tor­nan­do-se parte do prob­le­ma”, disse Maria Isabel.

Distribuição

O Rio de Janeiro tem um número muito ele­va­do de con­fli­tos. De acor­do com o relatório, na região met­ro­pol­i­tana do Rio de Janeiro são, em média, 17 con­fron­tos por dia, total­izan­do 38.271 no perío­do de sete anos. Maria Isabel ressalta, con­tu­do, que os con­fli­tos não se dis­tribuem igual­mente pelos bair­ros da região met­ro­pol­i­tana.

“Existe uma con­cen­tração em deter­mi­nadas áreas. E essa con­cen­tração não se dá só por recorte geográ­fi­co. Obser­vam-se tam­bém padrões de con­cen­tração no que diz respeito à atu­ação das forças poli­ci­ais e qual grupo arma­do é pre­pon­der­ante no ter­ritório.”

De cer­ta for­ma, esper­avam-se mais con­fron­tos com a pre­sença da polí­cia em áreas do trá­fi­co do que em áreas da milí­cia porque, para ess­es anos estu­da­dos, há uma área maior cober­ta pelo trá­fi­co. No entan­to, percebe-se dis­pari­dade de con­cen­tração de con­fron­tos envol­ven­do poli­ci­ais em área do trá­fi­co, que é muito maior do que na milí­cia. “Isso ocorre não só sobre quan­tos ter­ritórios cada grupo arma­do tem”, disse a dire­to­ra do Insti­tu­to Fogo Cruza­do. ”Tem algo a mais do que isso.”

Segun­do o estu­do, dos ter­ritórios dom­i­na­dos pelo trá­fi­co, 70% reg­is­tram con­fli­tos envol­ven­do poli­ci­ais. No caso das milí­cias, o per­centu­al cai para 31,6%. “Existe um padrão de desigual­dade muito grande. Sob out­ra abor­dagem, vê-se que para cada área dom­i­na­da por facções do trá­fi­co afe­ta­da por con­fron­tos sem a polí­cia, há cin­co bair­ros afe­ta­dos por con­fron­tos poli­ci­ais. No caso da milí­cia, nes­sa mes­ma com­para­ção, é um para um. Ou seja, cada área de milí­cia que tem con­fron­tos sem a pre­sença da polí­cia tem em con­tra­parti­da uma área de milí­cia que reg­is­tra con­fron­tos poli­ci­ais.”

Conquistas

Pro­por­cional­mente falan­do, a polí­cia inter­vém muito mais em áreas dom­i­nadas pelo trá­fi­co do que em áreas dom­i­nadas pela milí­cia. Maria Isabel desta­cou, porém, que os dados do mapa dos gru­pos arma­dos não apon­ta para a con­clusão de que o trá­fi­co é mais vio­len­to que a milí­cia. Hou­ve um padrão de expan­são dess­es gru­pos ter­ri­to­ri­ais. Quan­do se fala de ter­ritórios con­quis­ta­dos por um grupo arma­do a par­tir de con­fron­tos, con­sta­ta-se que o Coman­do Ver­mel­ho é o que acu­mu­la o maior número de áreas dom­i­nadas (45,3%). A milí­cia vem em segun­do lugar, com 25,5% e, em segui­da, o Ter­ceiro Coman­do Puro (TCP), com 23,3%. “O Coman­do Ver­mel­ho é o que mais con­quista, mas é tam­bém o que mais perde”, comen­tou Maria Isabel.

De acor­do com o estu­do, 78,5% dos ter­ritórios con­quis­ta­dos pela milí­cia por meio de con­fli­tos foram áreas con­tro­ladas pelo Coman­do Ver­mel­ho.

“Os dados mostram que aque­le mito do iní­cio dos anos 2000 de que milí­cia seria um mal menor, que ela se com­por­ta­va através de dinâmi­cas de vio­lên­cia difer­entes do trá­fi­co e de que exis­tia para livrar a pop­u­lação do trá­fi­co não é ver­dade. As milí­cias tam­bém usam a força, o con­fron­to, para dom­i­nar ter­ritórios”.

Segun­do Maria Isabel, o que chama a atenção é que o Esta­do opta por inter­vir muito mais em áreas do trá­fi­co do que em áreas de milí­cia.

Chama-se con­quista quan­do um grupo arma­do dom­i­na um novo ter­ritório por meio de con­fron­to, esta­b­ele­cen­do uma relação de con­fli­to para expul­sar o que domi­na­va aque­la área. Já a col­o­niza­ção é quan­do a estraté­gia de expan­são não pas­sa pelo con­fron­to. “Ou vai ser a dom­i­nação de um ter­ritório que antes não era con­tro­la­do por ninguém, ou pode ser, por exem­p­lo, através da coop­tação da lid­er­ança local, quan­do o líder local que era de uma facção pas­sa para out­ro grupo. São, em ger­al, mod­e­los de expan­são”.

A análise do perío­do de seis anos mostra que todos os gru­pos implan­taram os dois tipos de padrão de expan­são. Mas a maior parte dos ter­ritórios foi con­quis­ta­da por col­o­niza­ção: 82,3% pelo TCP, 84%, no caso do Coman­do Ver­mel­ho e 90% da milí­cia. “A maior parte da expan­são dos gru­pos ter­ri­to­ri­ais não se dá a par­tir do con­fli­to”.

A pesquisa sobre os con­fron­tos no Grande Rio é parte do pro­je­to Mapa Históri­co dos Gru­pos Arma­dos do Rio de Janeiro, lança­do em 2021.

Polícias

Em comu­ni­ca­do, a Sec­re­taria de Esta­do de Polí­cia Mil­i­tar disse que as ações da cor­po­ração são pau­tadas “pelo plane­ja­men­to prévio, sendo dire­cionadas pelas anális­es das man­chas crim­i­nais locais, e são exe­cu­tadas den­tro do pre­vis­to na leg­is­lação vigente”. A PM afir­mou ain­da que a opção pelo con­fron­to “é uma con­du­ta dos crim­i­nosos, que pro­movem ataques incon­se­quentes com armas de guer­ra não somente con­tra as forças de segu­rança do Esta­do, mas tam­bém con­tra toda a sociedade”.

Já a Sec­re­taria de Segu­rança Públi­ca do Rio de Janeiro disse descon­hecer a metodolo­gia da pesquisa e, por­tan­to, não quis comen­tar os dados. A Secretária de Esta­do de Polí­cia Civ­il (Sepol) tam­bém disse que descon­hece a metodolo­gia uti­liza­da na pesquisa cita­da e a pos­si­bil­i­dade de ras­tre­abil­i­dade dos dados. “A insti­tu­ição comen­ta ape­nas sobre o que tem con­hec­i­men­to”, afir­mou em nota.

Edição: Nádia Fran­co

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