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Indígenas de MT lutam por sobrevivência após um mês de queimadas

Repro­dução: © Erlie Run­ham­re Xavante

Cerca de 41 terras indígenas foram afetadas pelas chamas


Publicado em 21/09/2024 — 18:58 Por Luciano Nascimento — Repórter da Agência Brasil — São Luís

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Há mais de um mês, povos indí­ge­nas de Mato Grosso sofrem com os incên­dios flo­restais que atingem o esta­do. Segun­do a Fed­er­ação dos Povos e Orga­ni­za­ções Indí­ge­nas de Mato Grosso (Fepoimt), cer­ca de 41 ter­ras indí­ge­nas foram afe­tadas pelas chamas. 

A lid­er­ança indí­ge­na Mara Bar­reto Sin­howawe Xavante rela­tou à Agên­cia Brasil a situ­ação pas­sa­da na Ter­ra Indí­ge­na Pimentel Bar­bosa, no leste do Mato Grosso, onde cri­anças Xavante subi­ram em ocas com gar­rafas de água para se pro­te­gerem do fogo que atingiu a comu­nidade no iní­cio da sem­ana.

“No nos­so ter­ritório, a queima­da começou na aldeia Pimentel, é uma aldeia muito longe da nos­sa. E ela começou ali, foi um incên­dio crim­i­noso e esse incên­dio foi se esten­den­do e ficou duas sem­anas o cer­ra­do queiman­do, quilômet­ros e quilômet­ros, até chegar den­tro da nos­sa aldeia”, detal­ha.  De acor­do com Mara, o fogo chegou muito forte pela man­hã, queiman­do tudo ao redor da aldeia com ven­to e uma fuligem muito fortes.

“Quan­do o fogo começou a pegar tudo ali, os nos­sos jovens, os par­entes, subi­ram nas ocas com gar­rafin­ha pet de água para ten­tar se pro­te­ger e pro­te­ger a casa para não vir fogo em cima da oca”, con­tin­u­ou emo­ciona­da.

“É uma situ­ação muito forte, muito emblemáti­ca, porque foi exata­mente isso que eles fiz­er­am”, rela­tou,

Povos indígenas de Mato Grosso sofrem com os incêndios florestais.
Repro­dução: Povos indí­ge­nas de Mato Grosso sofrem com os incên­dios flo­restais. — Erlie Run­ham­re Xavante

Treinamento

Mara con­tou que na aldeia, duas pes­soas foram sele­cionadas para faz­er o cur­so de brigadis­tas, e que eles pouco pud­er­am faz­er para con­ter as chamas. Ela denun­ciou que, após a con­clusão do cur­so ofer­e­ci­do pela Sec­re­taria Estad­ual de Meio Ambi­ente, não foram deix­a­dos equipa­men­tos sufi­cientes para a atu­ação dos brigadis­tas.

“Uma capac­i­tação dessas não dá as condições faz­er um tra­bal­ho num ter­ritório do taman­ho do nos­so. É faz­er para inglês ver. Os nos­sos brigadis­tas não têm os extin­tores sufi­cientes e não têm quan­ti­dade sufi­ciente para com­bat­er qual­quer tipo de fogo. Até que o brigadista lá da out­ra comu­nidade chegasse até a nos­sa, nós já estaríamos todos mor­tos pelo fogo”, criti­cou.

“Se não fos­se o ven­to, o povo ia mor­rer queima­do vivo. Cri­anças, idosos, inocentes, os bichos. Os bichos já estão queima­dos vivos. Porque ali onde o fogo pas­sou, queimou tudo”, lamen­tou Mara

A reportagem da Agên­cia Brasil ten­tou con­ta­to com a sec­re­taria de Meio Ambi­ente do Mato Grosso, mas não obteve retorno.

Saúde

Além de terem que se pro­te­ger dos incên­dios, os indí­ge­nas sofrem ain­da em razão de doenças res­pi­ratórias cau­sadas pela fumaça, difi­cul­dade de aces­so a ali­men­tos e tam­bém a água potáv­el.

“Esta­mos há um mês sem água den­tro da comu­nidade. Nós só temos um cór­rego den­tro da comu­nidade e ele está secan­do, está com uma pro­porção mín­i­ma de água. Ain­da bem que a nos­sa comu­nidade é peque­na, é uma comu­nidade com 150 pes­soas, então está dan­do para sobre­viv­er”. Ela ressalta, entre­tan­to, que a água do cór­rego está cau­san­do vários prob­le­mas, como dis­en­te­ria. “Essa água do cór­rego não é apro­pri­a­da para beber. E é a água que eles estão beben­do nesse momen­to. Então, está geran­do vários transtornos na saúde da comu­nidade”.

A situ­ação deixou todos na aldeia muito abal­a­dos.

“A gente fica muito triste, ficamos abal­a­dos e enfraque­ci­dos quan­do a gente vê a nos­sa fau­na, a nos­sa flo­ra, o nos­so cer­ra­do, sendo destruí­do de for­ma crim­i­nosa. Nós vive­mos den­tro do bio­ma e damos a vida para que ele per­maneça de pé, como for­ma de garan­tir às nos­sas futuras ger­ações um ter­ritório que, para nós, é sagra­do”, afir­mou.

Mara relem­bra que os antepas­sa­dos do povo dela der­am a vida pelo ter­ritório.

“Muito sangue foi der­ra­ma­do e con­tin­ua sendo. É muito difí­cil ver toda essa destru­ição, prin­ci­pal­mente para nós, que depen­demos tan­to da fau­na, da flo­ra. Nos­so ter­ritório ain­da sobre­vive da caça. É muito triste”, com­ple­tou.

Agronegócio

Mara criti­cou ain­da o gov­er­no por omis­são em relação aos dire­itos dos povos indí­ge­nas. “Se hoje existe esse aque­c­i­men­to aci­ma do nor­mal den­tro do esta­do de Mato Grosso, com tem­per­at­uras alcançan­do uma média de quase 45° graus e que já chegou a quase 50° graus, os respon­sáveis por isso são as ativi­dades do agronegó­cio, porque são essas ativi­dades que estão geran­do toda essa com­bustão, ao pon­to de qual­quer fogo se alas­trar muito rápi­do”, criti­cou. “Levan­do em con­ta que é o úni­co esta­do que tem três bio­mas [Amazô­nia, Cer­ra­do e Pan­tanal], a gente vê um gov­er­nador que está gov­er­nan­do somente para a ban­ca­da rural­ista”, criti­cou.

Dados do Insti­tu­to Nacional de Pesquisas Espa­ci­ais (Inpe) mostram que, ape­nas em setem­bro, Mato Grosso já reg­is­tou 16.746 focos de queimadas ativos.

Crime

Na quin­ta-feira (19), os gov­er­nadores das regiões Cen­tro-Oeste e Norte se reuni­ram, no Palá­cio do Planal­to, com min­istros do gov­er­no fed­er­al para debater medi­das de enfrenta­men­to às queimadas Uma das prin­ci­pais deman­das apre­sen­tadas é o endurec­i­men­to da punição con­tra quem ateia fogo de for­ma inten­cional. O incên­dio crim­i­noso foi apon­ta­do pelos próprios gov­er­nadores como sendo um dos fatores de agrava­men­to da crise.

Na ocasião, o gov­er­nador de Mato Grosso, Mau­ro Mendes, disse que boa parte dos incên­dios no esta­do foram crim­i­nosos. “Nós tive­mos, esse ano, além de um prob­le­ma climáti­co, que era pre­visív­el, muitos incên­dios, uma boa parte, começou por ações notada­mente crim­i­nosas. Nen­hum incên­dio começa senão por ação humana. Algu­mas por des­cui­do, algu­mas por neg­ligên­cia, mas muitas começaram por ações crim­i­nosas”, disse Mendes, em declar­ação a jor­nal­is­tas ao fim da reunião.

Mendes defend­eu um “endurec­i­men­to gigan­tesco” da pena, para deses­tim­u­lar as ações. “No meu esta­do, pren­demos várias pes­soas e, em pou­cas horas, eles eram lib­er­ta­dos em audiên­cias de custó­dia. Um crime que está cau­san­do pre­juí­zo à saúde, ao meio ambi­ente, à imagem do país, com a pena que não cor­re­sponde ao taman­ho do dano que está cau­san­do à sociedade brasileira”, afir­mou.

Após a reunião, o min­istro-chefe da Casa Civ­il, Rui Cos­ta, disse que o gov­er­no fed­er­al plane­ja a lib­er­ação de mais recur­sos para o com­bate às queimadas e a com­pra de equipa­men­tos para que os esta­dos enfrentem uma das piores esti­a­gens em décadas no país.

O min­istro disse que serão envi­a­dos crédi­tos soman­do R$ 514 mil­hões aos esta­dos que pedi­rem aju­da. Cos­ta tam­bém ressaltou que o Ban­co Nacional de Desen­volvi­men­to Econômi­co e Social (BNDES) tem autor­iza­ção para lib­er­ar, na próx­i­ma sem­ana, mais de R$ 400 mil­hões para apoio aos cor­pos de bombeiros dos esta­dos da Amazô­nia Legal, para com­pra de mate­ri­ais, equipa­men­tos, viat­uras. “Out­ros crédi­tos serão pub­li­ca­dos na medi­da que os gov­er­nadores apre­sen­tem e mate­ri­al­izem suas deman­das”, disse o min­istro.

Par­tic­i­param do encon­tro os gov­er­nadores Hélder Bar­balho (Pará), Mau­ro Mendes (Mato Grosso), Ronal­do Caia­do (Goiás), Ibaneis Rocha (Dis­tri­to Fed­er­al), Eduar­do Riedel (Mato Grosso do Sul), Wil­son Lima (Ama­zonas), Glad­son Cameli (Acre), Wan­der­lei Bar­bosa (Tocan­tins) e Anto­nio Denar­i­um (Roraima). Tam­bém com­pare­ce­r­am os vice-gov­er­nadores Sér­gio Gonçalves da Sil­va (Rondô­nia) e Antônio Pin­heiro Teles Júnior (Amapá).

Outras ações

Esta sem­ana, o min­istro da Inte­gração e Desen­volvi­men­to Region­al, Waldez Góes, disse que o gov­er­no fed­er­al vai garan­tir todos os recur­sos finan­ceiros necessários para o com­bate aos incên­dios e à esti­agem que atingem quase todos os esta­dos brasileiros. Em entre­vista ao Bom Dia, Min­istro, pro­duzi­do pela Empre­sa Brasil de Comu­ni­cação (EBC), Goés disse que o gov­er­no está com liber­dade para apoiar esta­dos, Dis­tri­to Fed­er­al e municí­pios porque as despe­sas para com­bat­er os efeitos da emergên­cia climáti­ca e ambi­en­tal foram excluí­das do atu­al teto de gas­tos. Segun­do o min­istro ess­es recur­sos ini­cial­mente são para a Amazô­nia e o Pan­tanal.

O min­istro da Justiça e Segu­rança Públi­ca, Ricar­do Lewandows­ki, tam­bém autor­i­zou o uso da Força Nacional de Segu­rança Públi­ca em municí­pios dos esta­dos do Ama­zonas, do Pará, de Rondô­nia, do Mato Grosso, de Roraima e do Acre para atu­ar no com­bate a incên­dios flo­restais, por 90 dias.

Edição: Aline Leal

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