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Infiltração de criminosos na política ameaça segurança eleitoral

Alter­ação de seções eleitorais é uma das medi­das para evi­tar coação
Vitor Abdala — Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­da em 22/09/2024 — 13:28
Rio de Janeiro
Ver­são em áudio
Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro - TRE-RJ
Repro­dução: © Tri­bunal Region­al Eleitoral do Rio de Janeiro — TRE-RJ

No iní­cio do mês, o Tri­bunal Region­al Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) anun­ciou a alter­ação de 53 locais de votação em dez municí­pios do esta­do, por questões rel­a­ti­vas à segu­rança. A maio­r­ia dessas mudanças ocor­reu na cidade do Rio de Janeiro, mas há tam­bém mod­i­fi­cações em Duque de Cax­i­as, Belford Roxo, Nova Iguaçu, São João de Mer­i­ti, Japeri, Itaguaí, Niterói, Itab­o­raí e Sapu­ca­ia. Em todo o esta­do, 171 mil eleitores foram afe­ta­dos pelas alter­ações. A decisão, segun­do o pres­i­dente do tri­bunal, desem­bar­gador Hen­rique Car­los de Andrade Figueira, foi moti­va­da pelo fato de ess­es locais de votação estarem sujeitos a ações do crime orga­ni­za­do.

Para espe­cial­is­tas ouvi­dos pela Agên­cia Brasil, a infil­tração de gru­pos crim­i­nosos na políti­ca é uma das grandes ameaças das eleições munic­i­pais não só no esta­do do Rio, mas no país como um todo. Para garan­tir que seus can­didatos sejam eleitos, essas orga­ni­za­ções podem recor­rer a vio­lên­cias, ameaças e coação con­tra adver­sários e tam­bém con­tra eleitores.

“É um proces­so que vem acon­te­cen­do no Brasil faz tem­po, mas que é rel­a­ti­va­mente novo nas grandes metrópoles: o crime orga­ni­za­do apren­deu a tra­bal­har de den­tro do Esta­do. Nos rincões do Brasil, sobre­tu­do no Norte do Brasil, isso é mais anti­go: um crime orga­ni­za­do que elege políti­cos e inter­fere no proces­so eleitoral. No Rio de Janeiro, em São Paulo, ou em João Pes­soa, isso é mais novo”, expli­ca o doutor em Ciên­cias Poli­ci­ais e Segu­rança Públi­ca Alan Fer­nan­des, pesquisador do Fórum Brasileiro de Segu­rança Públi­ca.

Para ele, no dia da eleição, há um risco de coação, por ess­es gru­pos crim­i­nosos, con­tra eleitores, para que eles votem em deter­mi­na­do can­dida­to ou mes­mo deix­em de com­pare­cer aos locais de votação.

“O prin­ci­pal risco é o imped­i­men­to de com­parec­i­men­to em deter­mi­nadas zonas eleitorais. Em lugares que são dom­i­na­dos pela vio­lên­cia, pelo crime orga­ni­za­do, exis­tem casos em que as pes­soas são impe­di­das de com­pare­cer ao local de votação, a depen­der do inter­esse políti­co daque­la facção. O segun­do prob­le­ma, ness­es locais de votação, é a coação aos eleitores para que eles votem em deter­mi­na­do can­dida­to de prefer­ên­cia daque­le grupo arma­do”, afir­ma Fer­nan­des.

Medidas

No Rio de Janeiro, as milí­cias são um dos gru­pos arma­dos que têm se aproveita­do da políti­ca e da par­tic­i­pação no Esta­do para for­t­ale­cer sua atu­ação. Em con­se­quên­cia, novas medi­das vêm sendo tomadas pelos tri­bunais para garan­tir a lisura do proces­so eleitoral.

A proibição de uso de celu­lares e câmeras em cab­ines de votação, ado­ta­da em 2008, por exem­p­lo, foi uma reação do TRE-RJ a infor­mações de que traf­i­cantes e mili­cianos estavam obri­g­an­do eleitores a reg­is­trar seu voto na urna, para com­pro­var que estavam votan­do nos can­didatos indi­ca­dos pelos gru­pos crim­i­nosos. A medi­da acabou sendo ado­ta­da pelo Tri­bunal Supe­ri­or Eleitoral (TSE) para todos os esta­dos nas eleições munic­i­pais daque­le ano e, depois, incor­po­ra­da à leg­is­lação eleitoral em 2009.

Miguel Carnevale, pesquisador do Grupo de Inves­ti­gação Eleitoral da Uni­ver­si­dade Fed­er­al do Esta­do do Rio de Janeiro (Giel/UniRio), expli­ca que essa atu­ação dos gru­pos crim­i­nosos sobre os eleitores é ain­da mais forte nas eleições munic­i­pais.

“Você vê muito con­ta­to de vereadores com as comu­nidades e mui­ta força do crime orga­ni­za­do [para a eleição de seus can­didatos escol­hi­dos]. Acred­i­to que, para o Rio de Janeiro, a entra­da do crime orga­ni­za­do para a políti­ca seja um tópi­co espe­cial­mente sen­sív­el. Isso afe­ta cer­tas relações, cria laços clien­telis­tas”, expli­ca.

Pesquisador do Lab­o­ratório de Estu­dos sobre Políti­ca e Vio­lên­cia da Uni­ver­si­dade Fed­er­al Flu­mi­nense (Lepov/UFF), André Rodrigues afir­ma que as eleições munic­i­pais são sem­pre mais vio­len­tas do que as eleições estad­u­ais e fed­erais, de acor­do com os estu­dos feitos pelo Lepov/UFF no Grande Rio e litoral sul flu­mi­nense. “São as eleições onde a gente vê mais inter­fer­ên­cia vio­len­ta na políti­ca”, afir­ma. “Há três mecan­is­mos que os gru­pos crim­i­nosos ado­tam e que ameaçam as eleições: as ameaças veladas, como declar­ações explíc­i­tas de voto de alguém que con­tro­la uma local­i­dade; a proibição de que alguns can­didatos façam cam­pan­ha em áreas de milí­cia ou de trá­fi­co; e a elim­i­nação vio­len­ta de opos­i­tores. Só na Baix­a­da Flu­mi­nense, de 2015 para cá, a gente já con­tabi­li­zou 60 assas­si­natos de pes­soas impli­cadas na políti­ca local”.

Ape­sar de a maio­r­ia dess­es mecan­is­mos ser usa­da no perío­do de cam­pan­ha, a coação de eleitores pode ocor­rer tam­bém em dia de eleição, segun­do Rodrigues. Por isso, ele acred­i­ta que a mudança de locais de votação é bem-vin­da. “Isso não elim­i­na os mecan­is­mos de que eu falei, mas pelo menos pode cri­ar um con­tex­to, no dia [da votação], de maior segu­rança para os votantes, para que não ten­ham que votar exata­mente no local onde aque­le crim­i­noso dom­i­na dire­ta­mente”. Ele lem­bra que “na últi­ma eleição munic­i­pal, em Paraty e em Angra dos Reis, a gente ouviu muitos relatos de pes­soas com pin­ta de mili­ciano, com tom ameaçador, se posi­cio­nan­do em frente à seção eleitoral”.

Outros casos de violência

Mas não é ape­nas a par­tic­i­pação do crime orga­ni­za­do que ameaça a segu­rança das eleições. Há casos de vio­lên­cia entre can­didatos e entre eleitores por questões ide­ológ­i­cas, por exem­p­lo.

O pesquisador Miguel Carnevale aler­ta que no mês de setem­bro, na reta final das cam­pan­has de primeiro turno das eleições, é pos­sív­el ver um acir­ra­men­to das situ­ações de vio­lên­cia eleitoral. “É quan­do ess­es números começam a aumen­tar, tan­to a vio­lên­cia políti­ca como um todo, como a sua for­ma mais rad­i­cal, que são os homicí­dios”.

Para ele, as redes soci­ais podem ter um papel de ampli­fi­cação dessa vio­lên­cia eleitoral. “Você dá a chance para indi­ví­du­os com questões políti­cas prob­lemáti­cas para expor tendên­cias vio­len­tas. Você vê muitas ameaças nas redes soci­ais. As redes soci­ais são o prin­ci­pal foco para ofen­sas, sejam mis­ógi­nas, racis­tas, LGBT­fóbi­cas. É nesse espaço que se con­cen­tra esse tipo de crime. Vio­lên­cias psi­cológ­i­cas se dão majori­tari­a­mente por esse veícu­lo”, desta­ca Carnevale.

Um lev­an­ta­men­to trimes­tral do Giel/UniRio, chama­do Obser­vatório da Vio­lên­cia Políti­ca e Eleitoral, reg­istrou, entre abril e jun­ho deste ano, perío­do ante­ri­or ao das cam­pan­has eleitorais ofi­ci­ais, 128 casos de vio­lên­cia con­tra lid­er­anças par­tidárias em todo o país, mais que o dobro do trimestre ante­ri­or (59) e 24% maior do que o segun­do trimestre de 2022 (103), quan­do ocor­reram as eleições fed­erais e estad­u­ais.

As ameaças foram a prin­ci­pal ocor­rên­cia, mas pelo menos 25 assas­si­natos foram reg­istra­dos, dos quais seis ocor­reram no Rio, o esta­do com mais ocor­rên­cias. Os car­gos políti­cos lig­a­dos à esfera munic­i­pal con­tin­u­am sendo a cat­e­go­ria mais atingi­da, segun­do o Obser­vatório da Vio­lên­cia Políti­ca e Eleitoral.

Neste mês, o Min­istério da Justiça e Segu­rança Públi­ca esten­deu o pra­zo de per­manên­cia de home­ns da Força Nacional de Segu­rança no esta­do do Rio de Janeiro por mais 90 dias, o que inclui as datas de cam­pan­ha e votação.

A Sec­re­taria Estad­ual de Segu­rança do Rio infor­mou que a Polí­cia Mil­i­tar está fechan­do seu plane­ja­men­to opera­cional para os dias de votação e, em breve, divul­gará à impren­sa.

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