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Jornalistas foram perseguidos e torturados por resistência à ditadura

Repro­dução: © Arqui­vo Nacional

Neste domingo, 7 de abril, é celebrado o Dia do Jornalista


Publicado em 07/04/2024 — 17:53 Por Andreia Verdélio — Repórter da Agência Brasil — Brasília

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Vladimir Her­zog é o mais con­heci­do deles, mas há tam­bém Djal­ma Car­val­ho Maran­hão, Ieda San­tos Del­ga­do, Jane Vani­ni, Luiz Eduar­do da Rocha Mer­li­no, Luiz Iná­cio Maran­hão Fil­ho, Orlan­do da Sil­va Rosa Bon­fim Júnior e Wânio José de Mat­tos. Estes foram jor­nal­is­tas assas­si­na­dos pela ditadu­ra mil­i­tar no Brasil, entre 1964 e 1985.

Neste domin­go (7), é cel­e­bra­do o Dia do Jor­nal­ista e, no con­tex­to dos 60 anos do golpe mil­i­tar na democ­ra­cia do país, a Agên­cia Brasil lem­bra a perseguição e repressão sofridas por ess­es profis­sion­ais e os veícu­los de impren­sa durante a ditadu­ra mil­i­tar. Para o vice-pres­i­dente da Fed­er­ação Nacional dos Jor­nal­is­tas (Fenaj), Célio Mar­tins, o tra­bal­ho de resistên­cia dos profis­sion­ais no perío­do foi fun­da­men­tal para que o regime mil­i­tar se encer­rasse, a par­tir da cir­cu­lação de infor­mações aos movi­men­tos soci­ais orga­ni­za­dos.

“Na min­ha visão, o regime mil­i­tar pode­ria ter dura­do um perío­do maior do que durou não fos­se uma série de resistên­cias den­tro da sociedade civ­il orga­ni­za­da e, nesse con­tex­to, estão os jor­nal­is­tas”, disse.

“Uma infor­mação que não se veic­ula­va nos veícu­los de mídia, mas acaba­va chegan­do nos movi­men­tos da sociedade civ­il orga­ni­za­da era impor­tan­tís­si­ma. Essa infor­mação era vital para poder orga­ni­zar a resistên­cia, para poder tomar medi­das, vamos diz­er, con­trárias àquele esta­do de coisa que era repres­sor, que não per­mi­tia a liber­dade de impren­sa e tudo mais que a gente sabe”, expli­cou Mar­tins.

Da mes­ma for­ma, segun­do o diri­gente da Fenaj, os agentes de cen­sura tam­bém tin­ham os seus canais para saber de onde estavam sain­do as infor­mações. Neste con­tex­to estão os jor­nal­is­tas persegui­dos e mor­tos e aque­les que sofr­eram ameaças.

“No caso do Her­zog, ele sofreu uma vio­lên­cia muito grande, então, é uma situ­ação que tornou-se muito evi­dente para a sociedade. Mas exis­tem inúmeros out­ros casos que a sociedade não sabe, em que o jor­nal­ista era ficha­do e sofria aque­la ameaça ver­bal”, con­tou.

São Paulo (SP) - Instituto Vladimir Herzog lança campanha para oficializar 25 de outubro como dia nacional da democracia. Foto: Wilson Ribeiro/Acervo Vladimir Herzog
Repro­dução: Vladimir Her­zog foi tor­tu­ra­do e mor­to durante a ditadu­ra mil­i­tar. Foto: Wil­son Ribeiro/Acervo Vladimir Her­zog

Dire­tor de jor­nal­is­mo da TV Cul­tura de São Paulo, Vladimir Her­zog mor­reu no dia 25 de out­ubro de 1975 em con­se­quên­cia de tor­turas no Depar­ta­men­to de Oper­ações de Infor­mações – Cen­tro de Oper­ações de Defe­sa Inter­na (DOI-Codi), do Exérci­to, em São Paulo. Ele se apre­sen­tou vol­un­tari­a­mente para prestar esclarec­i­men­tos sobre sua atu­ação políti­ca e profis­sion­al. Após o assas­si­na­to, foi mon­ta­da uma farsa para enco­brir a causa real da morte, afir­man­do que o jor­nal­ista se sui­ci­dara.

A esposa do jor­nal­ista, Clarice Her­zog, denun­ciou a morte como crime e tam­bém foi víti­ma da perseguição dos mil­itares. Na últi­ma quar­ta-feira (3), a tam­bém jor­nal­ista e pub­lic­itária rece­beu a anis­tia políti­ca e um pedi­do de des­cul­pas do Esta­do brasileiro.

Reparação

Os nomes dos jor­nal­is­tas cita­dos pela reportagem no iní­cio des­ta matéria são do relatório da Comis­são da Ver­dade do Sindi­ca­to dos Jor­nal­is­tas Profis­sion­ais no Esta­do de São Paulo, que, em 2017, lis­tou 25 casos de profis­sion­ais assas­si­na­dos durante o perío­do em que o país foi coman­da­do pelo mil­itares. Além deles, cen­te­nas foram persegui­dos, pre­sos e tor­tu­ra­dos.

O dire­tor de Jor­nal­is­mo da Asso­ci­ação Brasileira de Impren­sa (ABI), Moa­cyr Oliveira Fil­ho, era estu­dante de econo­mia da Uni­ver­si­dade de São Paulo, quan­do foi pre­so e tor­tu­ra­do por mil­itares, em 1972. Acabou aban­do­nan­do o cur­so pois, segun­do ele, a Fac­ul­dade de Econo­mia, na época, era con­tro­la­da por pes­soas lig­adas a Anto­nio Delfim Net­to, que foi min­istro da Fazen­da do regime mil­i­tar, entre 1969 e 1974. “Indi­re­ta­mente, a min­ha prisão me fez virar jor­nal­ista”, disse.

“Hou­ve, durante a ditadu­ra, uma perseguição muito impor­tante à impren­sa. Não só a profis­sion­ais, cen­te­nas de jor­nal­is­tas foram pre­sos e tor­tu­ra­dos, como a cen­sura aos jor­nais, aos grandes jor­nais”, disse.

De acor­do com Oliveira Fil­ho, a perseguição alcança­va níveis como o veto a cre­den­ci­ais, situ­ação em que não era per­mi­ti­do o cre­den­ci­a­men­to de profis­sion­ais a locais como o Palá­cio do Planal­to, em Brasília, sede do gov­er­no fed­er­al, e a even­tos públi­cos. “Eu mes­mo tive a min­ha cre­den­cial da visi­ta do Papa aqui em Brasília nega­da”, disse, sobre a visi­ta de João Paulo II à cap­i­tal fed­er­al, em 1980.

Por out­ro lado, atos públi­cos de resistên­cia tam­bém foram reg­istra­dos, como o gesto de ousa­dia de um grupo de profis­sion­ais de imagem que se recusaram a fotogra­far o então pres­i­dente João Figueire­do, em 1984, na ram­pa do Palá­cio do Planal­to. O ato ficou con­heci­do como Máquinas ao chão” .

O dire­tor da ABI lem­brou que, ape­sar das cen­suras, os grandes jor­nais da época apoiaram o golpe insti­tu­cional­mente. Ao lon­go dos anos, muitos veícu­los já recon­hece­r­am essa par­tic­i­pação e, segun­do Oliveira Fil­ho, a grande impren­sa vem fazen­do uma boa cober­tu­ra nesse perío­do que mar­ca os 60 anos do golpe.

Para Célio Mar­tins, da Fenaj, é necessário ain­da uma “reavali­ação pro­fun­da” da lin­ha edi­to­r­i­al e medi­das ado­tadas pela grande mídia na época. “E, a par­tir daí, faz­er um auto jul­ga­men­to históri­co, para recon­hecer os pon­tos erra­dos, recon­hecer isso per­ante a sociedade, recon­hecer pub­li­ca­mente de for­ma clara, de for­ma trans­par­ente”, disse.

Por out­ro lado, ele lem­brou que alguns veícu­los ofer­e­ce­r­am resistên­cia ao regime mil­i­tar “depois de um perío­do”. “Depois que eles perce­ber­am que a situ­ação não era o que eles achavam que seria, teve algu­ma resistên­cia, sim, que con­tribuiu para aber­tu­ra [para o fim do regime]. Mas a aber­tu­ra foi pro­por­ciona­da, majori­tari­a­mente, pelos movi­men­tos soci­ais e políti­cos”, desta­cou.

Memória

Para Moa­cyr Oliveira, da ABI, o Brasil está “muito atrasa­do” na recu­per­ação da memória e ver­dade do perío­do mil­i­tar. Segun­do ele, das 29 recomen­dações da Comis­são Nacional da Ver­dade, ape­nas duas foram cumpri­das, seis foram aten­di­das par­cial­mente e a maio­r­ia delas foi esque­ci­da, como a cri­ação de memo­ri­ais nos locais que foram cen­tros de tor­tu­ra. A comis­são inves­tigou vio­lações prat­i­cadas pela ditadu­ra mil­i­tar no país e, durante os tra­bal­hos, de 2012 a 2014, iden­ti­fi­cou 434 mor­tos pelos mil­itares e 210 pes­soas ain­da desa­pare­ci­das.

“Na ver­dade, a justiça de tran­sição do Brasil prati­ca­mente não foi fei­ta. Não temos nen­hum caso de agente do Esta­do punido pelos crimes que come­teu, de tor­tu­radores, ao con­trário do que acon­te­ceu na Argenti­na, no Chile, no Uruguai, no Brasil não tem nen­hum con­de­na­do”, desta­cou.

“A memória é fun­da­men­tal para que isso não se repi­ta e para ficar de exem­p­lo para as novas ger­ações. Tem uma frase da neta do Jan­go, Isabela Goulart, que eu acho que resume essa questão: ‘um país sem memória é um país sem iden­ti­dade e o país sem iden­ti­dade é como se fos­se uma fol­ha em bran­co; o primeiro que chegar escreve o que quis­er nes­sa fol­ha em bran­co’”, disse o dire­tor da ABI.

O vice-pres­i­dente da Fenaj cor­rob­o­ra com essa opinião e afir­mou que “o episó­dio lamen­táv­el de 1964” deve ser vis­to como um apren­diza­do pela sociedade brasileira, em todas as suas faces, incluin­do as enti­dades de classe, como os jor­nal­is­tas.

VIOLÊNCIA À IMPRENSA; DITADURA; CENSURA - Reunião de Intelectuais contra a Censura, 1967. Foto: Ruth Toledo/Arquivo Público-SP
Repro­dução: Reunião de Int­elec­tu­ais con­tra a Cen­sura, 1967. Foto: Ruth Toledo/Arquivo Públi­co-SP

“Deve servir de apren­diza­do para impedir, evi­tar que se repi­ta a história. É dessa for­ma que eu vejo que podemos cam­in­har, de uma for­ma que avance a democ­ra­cia cada vez mais no país sem cair em retro­ces­so”, disse.

O Dia do Jor­nal­ista foi insti­tuí­do pela Asso­ci­ação Brasileira de Impren­sa (ABI) em 1931, como hom­e­nagem a Gio­van­ni Bat­tista Líbero Badaró, médi­co e jor­nal­ista assas­si­na­do por inimi­gos políti­cos em 1830. Tam­bém em um 7 de abril, porém de 1908, o jor­nal­ista Gus­ta­vo de Lac­er­da fun­dou a ABI, para atu­ar em favor dos profis­sion­ais da área.

Edição: Car­oli­na Pimentel

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