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Mudanças climáticas e eventos extremos impactam vacinação no Brasil

Repro­dução: © Prefeitu­ra Recife

Pessoas deixam suas casas sem nenhum documento


Publicado em 21/09/2024 — 12:18 Por Paula Laboissière — Enviada especial* — Recife

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Karen Car­val­ho é enfer­meira diplo­ma­da pela Uni­ver­si­dade do Vale do Rio dos Sinos, no Rio Grande do Sul, com espe­cial­iza­ção em saúde cole­ti­va, estraté­gia de saúde da família e vig­ilân­cia em saúde. Em maio deste ano, ela atu­ou jun­to a out­ros profis­sion­ais da área nas enchentes que asso­laram seu esta­do. A tare­fa de Karen em meio aos caos não era fácil: vaci­nar pes­soas que tiver­am con­ta­to com a água e que se aglom­er­avam em abri­gos, sucetíveis a doenças como hepatite A, influen­za e covid-19.

“Tive­mos que ir aos abri­gos várias vezes. Não foi só uma vez não. Foram várias idas. Até que as pes­soas topassem nos rece­ber. Até que tivésse­mos um vín­cu­lo com aque­la pop­u­lação que esta­va ali”, con­tou. Den­tre os desafios, segun­do ela, esta­va a ausên­cia de doc­u­men­tação para o reg­istro das dos­es apli­cadas. “Aque­las pes­soas saíram de casa sem nada. Sem cartão do Sis­tema Úni­co de Saúde (SUS), sem carteira de vaci­na das cri­anças”.

Out­ra difi­cul­dade enfrenta­da pela enfer­meira e por out­ros profis­sion­ais de saúde que atu­aram nas enchentes do Rio Grande do Sul foi a hes­i­tação vaci­nal. “As pes­soas da região estavam tão frag­ilizadas com tudo o que esta­va acon­te­cen­do que con­vencê-las sobre a vaci­nação não foi fácil. Vaci­nar pare­cia ser o que menos impor­ta­va pra elas naque­le momen­to”, lem­bra.

“Em meio a tudo isso, ficamos sem loco­moção. Os profis­sion­ais de saúde não con­seguiam chegar aos locais onde havia deman­da pra eles. Usamos o serviço do Exérci­to pra levar vaci­na onde pre­cisa­va, pra bus­car vaci­na onde pre­cisa­va. Só aque­le cam­in­hão pas­sa­va, porque é muito alto e a água não tapa­va. Havia pes­soas iso­ladas de um lado da cidade e nós ficamos pre­sos do out­ro lado.”

Karen tam­bém pre­cisou aplicar dos­es antir­rábi­cas de for­ma pre­ven­ti­va em vol­un­tários que res­gatavam ani­mais das águas e nos que cui­davam dess­es mes­mos ani­mais em abri­gos, já que o risco de mor­di­das, arran­hões e out­ros aci­dentes era con­stante. “Acabamos vaci­nan­do por pré-exposição quem par­tic­i­pa­va de res­gates e forças de segu­rança, como a Força Nacional do SUS, home­ns do cor­po de bombeiros e do Exérci­to”.

Plano de contingência

Miche­line Sil­veira é den­tista por for­mação, mas abraçou a enfer­magem em 2016. “Me apaixonei pela profis­são e não larguei mais”. Ela esta­va no cen­tro de Por­to Ale­gre quan­do as águas começaram a subir. Como a empre­sa de imu­niza­ção para a qual tra­bal­ha­va tin­ha um plano de con­tingên­cia para situ­ações extremas, Miche­line pode con­tar com equipa­men­tos ade­qua­dos, como câmaras frias de emergên­cia e unidades móveis para back­up, além de cole­gas capac­i­ta­dos para atu­ar naque­le momen­to.

“Sem­pre achamos que, se algu­ma coisa acon­te­cesse, a gente daria con­ta dela muito bem. E con­seguimos, de fato. Mas a gente nun­ca imag­i­nou que pas­saríamos por algo tão sur­re­al como o que acon­te­ceu no nos­so esta­do”, con­tou. “A gente tin­ha câmara fria, ger­ador. Mas quan­to tem­po tudo aqui­lo ia durar? Desce­mos com a caixa de iso­por pra colo­car as vaci­nas na unidade móv­el. Lev­a­mos pra São Leopol­do, onde havia maior disponi­bil­i­dade de armazena­men­to. E só con­seguimos voltar pra Por­to Ale­gre 43 dias depois.”

Microplanejamento

A enfer­meira Cleia Soares Mar­tins tam­bém pode sen­tir, este ano, os impactos das mudanças climáti­cas e de even­tos extremos nos serviços de vaci­nação. Respon­sáv­el téc­ni­ca pela Cen­tral de Dis­tribuição de Imuno­bilógi­cos do Ama­zonas, ela enfrenta um cenário de calor e esti­agem sem prece­dentes, quan­do o que era esper­a­do para o perío­do era o chama­do inver­no amazôni­co e mui­ta chu­va. “A Amazô­nia vem pas­san­do pela pior seca das últi­mas décadas. Com os incên­dios, tem dias que a gente acor­da e não con­segue ver o out­ro lado do rio”.

Segun­do Cleia, quan­do se tra­bal­ha com imu­niza­ção no Ama­zonas, além de dom­i­nar a téc­ni­ca rela­ciona­da a vaci­nas, é pre­ciso con­hecer toda a hidro­grafia do esta­do no intu­ito de alcançar comu­nidades de difí­cil aces­so, como quilom­bo­las e ribeir­in­hos. “Nos­sas estradas são os rios, mas o que acon­tece quan­do eles secam?” Ela lem­bra que, até o fim de agos­to, nove municí­pios da região tin­ham dec­re­ta­do situ­ação de emergên­cia. Na sem­ana pas­sa­da, o número já havia subido para 13.

“No ano pas­sa­do, nos­sa situ­ação já não foi fácil. A pre­visão era de esti­agem ain­da mais sev­era este ano. Por isso, começamos a nos plane­jar em dezem­bro. Por meio de microplane­ja­men­to, fize­mos o pos­sív­el para que, ain­da no primeiro semes­tre, ante­cipásse­mos todas as ações de vaci­nação, pri­or­izan­do áreas de difí­cil aces­so”, disse, ao citar parce­rias com os gov­er­nos do Acre e de Rondô­nia.

“Mas o que a gente faz hoje ain­da não é sufi­ciente. A gente pre­cisa de mais. Pre­cisamos inve­stir em tec­nolo­gia e ino­vação, pra ter um suporte mel­hor, seja na seca, seja na cheia”, avaliou. “Pra que, jun­tos, a gente pos­sa super­ar ess­es desafios e garan­tir a plen­i­tude do serviço de vaci­nação para todo e qual­quer cidadão no local onde ele reside.”

*A repórter via­jou a con­vite da Sociedade Brasileira de Imu­niza­ções (SBIm).

Edição: Valéria Aguiar

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