...
sábado ,17 maio 2025
Home / Cultura / Mulheres mostram trabalhos que denunciam violações de direitos humanos

Mulheres mostram trabalhos que denunciam violações de direitos humanos

Bordando direitos é o nome da exposição aberta no Masp

Elaine Patrí­cia Cruz — Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­do em 18/04/2025 — 09:59
São Paulo
São Paulo (SP), 18/04/2025 - Nova exposição no Masp traz trabalhos de mulheres que denunciam violações de direitos humanos e socioambientais no Brasil. Foto: Mulheres Atingidas por Barragens/Masp
Repro­dução: © Mul­heres Atingi­das por Barragens/Masp

É de for­ma cole­ti­va que as mul­heres vão tecen­do, bor­dan­do, com­par­til­han­do histórias e denun­cian­do as vio­lações de dire­itos humanos e socioam­bi­en­tais dos quais são víti­mas no Brasil. Reunidas em ofic­i­nas, essas mul­heres — que inte­gram o Movi­men­to dos Atingi­dos por Bar­ra­gens (MAB) — vão con­ver­san­do sobre as situ­ações que enfrentam e, por entre retal­hos, lin­has e agul­has, vão trans­for­man­do sua história em memórias.

Parte dessas obras pro­duzi­das em ofic­i­nas foi ago­ra reuni­da e está em exposição no Museu de Arte de São Paulo (Masp), que neste ano tra­bal­ha o tema Histórias da Ecolo­gia. Chama­da de Mul­heres Atingi­das por Bar­ra­gens: bor­dan­do dire­itos, a exposição apre­sen­ta 34 arpilleras pro­duzi­das por essas mul­heres e que denun­ci­am, prin­ci­pal­mente, os impactos soci­ais e ambi­en­tais cau­sa­dos pela con­strução, oper­ação e pelo rompi­men­to de bar­ra­gens no país.

Arpilleras é uma lin­guagem têx­til e politi­ca­mente enga­ja­da que surgiu no Chile, expli­cou uma das curado­ras da mostra, Isabel­la Rjeille.

“Durante os anos 70, essa lin­guagem gan­hou tons políti­cos, porque foi uti­liza­da por mul­heres para denun­ciar vio­lações de dire­itos humanos que estavam ocor­ren­do durante o regime dita­to­r­i­al de Augus­to Pinochet”, disse ela, em entre­vista à Agên­cia Brasil.

Arpillera sig­nifi­ca juta, uma fibra na qual essas mul­heres bor­davam as histórias que estavam pres­en­cian­do. “Ven­do seus com­pan­heiros e seus fil­hos serem sequestra­dos pelos mil­itares e todo esse tipo de vio­lação, essa era uma maneira de elas reg­is­trarem essas histórias ness­es bor­da­dos, já que exis­tia mui­ta cen­sura”, expli­cou a curado­ra.

Para ela, uma arpillera é, na real­i­dade, um teste­munho têx­til do ambi­ente social.

“Uma arpillera não ter­mi­na no obje­to que está na parede. Ela é todo o proces­so de feitu­ra e tam­bém todo o proces­so de leitu­ra dis­so depois”.

As oficinas

O cole­ti­vo de mul­heres do MAB começou a uti­lizar essa téc­ni­ca a par­tir de 2013.

“A gente foi faz­er uma ofic­i­na na Argenti­na para apren­der essa téc­ni­ca potente e trazê-la para o movi­men­to. Foi assim que começamos a tra­bal­har e já temos mais de 200 ofic­i­nas real­izadas em todas as regiões do país”, con­tou Ian­dria Fer­reira, da coor­de­nação nacional do MAB.

Cada peça pode demor­ar dias para ser con­fec­ciona­da e todas são elab­o­radas em gru­pos de pelo menos cin­co mul­heres, expli­cou Car­o­line Mota, inte­grante da coor­de­nação do MAB em São Paulo e da Sec­re­taria Nacional do movi­men­to. “As arpil­heiras são bor­dadas dire­ta­mente na juta. Às vezes, a gente for­ra a juta com teci­do de algo­dão mas, em princí­pio, tem que ter a juta, senão não será uma arpillera. Em todo começo de ofic­i­na debate­mos sobre um tema, seja da região, seja um tema de que a gente sofre rela­ciona­do ao preço da luz ou sobre as enchentes, as bar­ra­gens ou mudanças climáti­cas. Faze­mos então um debate com as mul­heres, em um grupo de, no mín­i­mo, cin­co pes­soas. Debate­mos o tema e depois con­tin­u­amos para faz­er o bor­da­do”, disse Car­o­line.

São Paulo (SP), 18/04/2025 - Nova exposição no Masp traz trabalhos de mulheres que denunciam violações de direitos humanos e socioambientais no Brasil. Foto: Mulheres Atingidas por Barragens/Masp
Repro­dução: Exposição no Masp traz tra­bal­hos de mul­heres que denun­ci­am vio­lações de dire­itos humanos e socioam­bi­en­tais no Brasil — Foto Mul­heres Atingi­das por Barragens/Masp

Enquan­to no Chile as peças eram pro­duzi­das de for­ma indi­vid­ual, no MAB elas pas­saram a ser feitas de for­ma cole­ti­va. “O tripé da nos­sa estraté­gia é a luta, a for­mação e a orga­ni­za­ção da ação. Como movi­men­to social, a gente acred­i­ta numa luta cole­ti­va. As arpilleras são o espaço onde esse tripé acon­tece”, ressaltou Ian­dria.

“Nes­sas ofic­i­nas há um encon­tro dessas mul­heres, ou seja, você cria um espaço seguro para que elas pos­sam dividir, com­par­til­har e con­ver­sar sobre a exper­iên­cia que estão ten­do naque­la situ­ação de serem atingi­das. Então, a arpillera não é ape­nas um obje­to, mas tam­bém uma fer­ra­men­ta de edu­cação pop­u­lar”, reforçou a curado­ra.

Durante a exposição, o públi­co poderá faz­er parte da exper­iên­cia. O MAB vai pro­mover uma ofic­i­na de arpilleras para o públi­co, no dia 27 de abril, das 10h30 às 13h30.

Denúncias

No Masp, as peças em exposição denun­ci­am não só o rompi­men­to das bar­ra­gens de Mar­i­ana e Bru­mad­in­ho, como tam­bém a refor­ma tra­bal­hista, a espec­u­lação imo­bil­iária, a inse­gu­rança ali­men­tar, a vio­lên­cia sex­u­al e até mes­mo as con­se­quên­cias provo­cadas pela pan­demia da covid-19. “As artis­tas [que con­fec­cionaram essas peças] são todas atingi­das por bar­ra­gens. Todas elas foram atingi­das pelo mod­e­lo energéti­co e por esse sis­tema cap­i­tal­ista e patri­ar­cal. Essa é a beleza e a denún­cia que a gente traz por meio das arpilleras”, afir­mou Ian­dria.

Uma das peças, por exem­p­lo, tra­ta do des­mata­men­to. “Enquan­to eles des­matam e destroem, nós plan­ta­mos a vida”, bor­daram as mul­heres nes­sa obra.

“Hoje em dia, a ideia de atingi­do e atingi­da incor­po­ra muitas out­ras questões, não só pelas bar­ra­gens, hidrelétri­c­as ou min­er­ação, mas tam­bém pelos atingi­dos pelas mudanças climáti­cas”, disse a curado­ra. “Muitas dessas arpilleras vão falar da per­da de vín­cu­lo com a comu­nidade, por exem­p­lo, pois quan­do chega uma bar­ragem, as pes­soas são deslo­cadas. Você é expul­so daque­la região e vai para out­ra casa que foi con­struí­da para rece­ber essas pes­soas. São todas casas impes­soais, sem nen­hum tipo de inter­venção de quem vai morar ali. E, muitas vezes, essas casas ficam ape­nas no nome do homem”.

Cada arpillera vem acom­pan­ha­da por uma car­ta, escri­ta por essas mul­heres. “Na arpillera sem­pre tem uma cart­in­ha, que leva a men­sagem de denún­cia para todo o país e até para fora dele”, expli­cou Ian­dria.

Na mostra, o públi­co terá aces­so à seleção de seis car­tas man­u­scritas. “Todas as peças têm uma car­ta que é pro­duzi­da cole­ti­va­mente pelas mul­heres que a fiz­er­am. Nem todas são man­u­scritas: algu­mas são dig­i­tadas, mas todas têm uma car­ta que fica guarda­da num bolsin­ho bor­da­do atrás da peça”, disse a curado­ra.

Mais infor­mações podem ser encon­tradas no site da mostra. O museu tem entra­da gra­tui­ta às terças-feiras e tam­bém nas noites de sex­ta, a par­tir das 18h. O agen­da­men­to para entra­da no museu é obri­gatório no site do Masp

LOGO AG BRASIL

Você pode Gostar de:

Orquestra de Câmara da USP celebra 30 anos com concertos gratuitos

Serão duas apresentações: uma nesta sexta, às 20; outra no domingo Matheus Cro­belat­ti* – estag­iário …