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No Brasil, 1,4 milhão de estudantes não têm água tratada na escola

Maioria desses alunos é negra e estuda em estabelecimentos públicos

Mar­i­ana Tokar­nia – Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­do em 11/12/2024 — 08:02
Rio de Janeiro
água, torneira de água, desperdício de água, abastecimento de água
Repro­dução: © Jef­fer­son Rudy/Agência Sena­do

Em todo o país, cer­ca de 1,4 mil­hão de estu­dantes estão matric­u­la­dos em esco­las públi­cas que não con­tam com fornec­i­men­to de água trata­da, própria para o con­sumo. A maior parte dess­es alunos é negra. Os dados são do estu­do Água e Sanea­men­to nas Esco­las Brasileiras: Indi­cadores de Desigual­dade Racial a par­tir do Cen­so Esco­lar, divul­ga­do nes­ta sem­ana. 

Pro­duzi­do pelo Insti­tu­to de Água e Sanea­men­to e pelo Cen­tro de Estu­dos e Dados sobre Desigual­dades Raci­ais (Cedra), o estu­do usa dados do Cen­so Esco­lar da Edu­cação Bási­ca de 2023, real­iza­do pelo Insti­tu­to Nacional de Estu­dos e Pesquisas Edu­ca­cionais Aní­sio Teix­eira (Inep), e clas­si­fi­ca as esco­las em pre­dom­i­nan­te­mente negras ou pre­dom­i­nan­te­mente bran­cas. Isso sig­nifi­ca que tais esta­b­elec­i­men­tos têm mais de 60% de alunos declar­a­dos negros ou bran­cos, respec­ti­va­mente. As demais esco­las são con­sid­er­adas mis­tas.

A pesquisa mostra que a chance de um aluno estar em uma esco­la de pre­dom­inân­cia negra que não fornece água potáv­el é cer­ca de sete vezes maior, se com­para­da à da esco­la de pre­dom­inân­cia bran­ca. Do total de 1,2 mil­hão de estu­dantes sem aces­so bási­co à água, 768,6 mil estão em esco­las pre­dom­i­nan­te­mente negras; 528,4 mil, em esco­las mis­tas; e 75,2 mil, em esco­las pre­dom­i­nan­te­mente bran­cas.

O con­sel­heiro do Cedra e pro­fes­sor da Uni­ver­si­dade Fed­er­al de San­ta Cata­ri­na Marce­lo Tragten­berg expli­ca que os dados se ref­er­em à ausên­cia de água trata­da e que as esco­las podem dis­por de out­ras fontes, como moringas ou fil­tros arte­sanais. “Isso tem impacto dire­to na saúde e impacto no apren­diza­do, através da saúde.”

Em todo o país, cer­ca de 5,5, mil­hões de estu­dantes estão em esco­las sem qual­quer abastec­i­men­to de água pela rede públi­ca. Dess­es, 2,4 mil­hões fre­quen­tam esco­las pre­dom­i­nan­te­mente negras e 260 mil, esco­las de maio­r­ia bran­ca. Os 2,8 mil­hões restantes estão em esco­las mis­tas.

Saneamento básico

Além do aces­so à água potáv­el e ao fornec­i­men­to ger­al de água, a pesquisa anal­isa se as esco­las con­tam com ban­heiro, cole­ta de lixo e esgo­to. Para todos os itens, são con­sid­er­adas todas as eta­pas da edu­cação bási­ca: edu­cação infan­til, ensi­no fun­da­men­tal, ensi­no médio e edu­cação para jovens e adul­tos (EJA).

Em todo o país, mais da metade, 52,3% dos alunos matric­u­la­dos em esco­las pre­dom­i­nan­te­mente negras lida com a fal­ta de ao menos um dos serviços ou infraestru­tu­ra de sanea­men­to, enquan­to, nas esco­las pre­dom­i­nan­te­mente bran­cas, essa por­cent­agem cai para 16,3%.

Segun­do o estu­do, os serviços de sanea­men­to são condições essen­ci­ais à dig­nidade humana, “e sua ausên­cia nas unidades edu­ca­cionais cer­ta­mente afe­ta a apren­diza­gem dos estu­dantes. Por­tan­to, a fal­ta dess­es serviços é mais um obstácu­lo na tra­jetória edu­ca­cional dos estu­dantes negros e con­sti­tui-se em uma cama­da adi­cional a ser soma­da às tan­tas out­ras que for­mam o amp­lo e com­plexo panora­ma da desigual­dade racial na edu­cação”, diz o tex­to.

Ao todo, 14,1 mil­hões de estu­dantes que fre­quen­tam esco­las não conec­tadas à rede públi­ca de esgo­to – dos quais cer­ca de 6 mil­hões estão em esco­las pre­dom­i­nan­te­mente negras; 1,2 mil­hão onde bran­cos são maio­r­ia, e os demais em esco­las mis­tas.

Den­tre os que não con­tam com sanea­men­to, 440 mil estu­dantes estão matric­u­la­dos em esco­las que não têm sequer ban­heiro, estando 135,3 mil em esco­las pre­dom­i­nan­te­mente negras e 38,3 mil em esco­las pre­dom­i­nan­te­mente bran­cas. Os demais 266 mil estão em esco­las mis­tas.

Quan­to à des­ti­nação do lixo, 2,15 mil­hões de alunos estão matric­u­la­dos em 30,5 mil esco­las em que o lixo não é cole­ta­do por serviços públi­cos – 955,8 mil estão em esco­las pre­dom­i­nan­te­mente negras, 59 mil em esco­las pre­dom­i­nan­te­mente bran­cas e os demais (1,1 mil­hão), em esco­las mis­tas.

“Em ger­al, não se tem um olhar racial­iza­do sobre os indi­cadores soci­ais, mas, quan­do se racial­iza, o que acon­tece é que as esco­las onde pre­dom­i­nam estu­dantes negros são esco­las com pior infraestru­tu­ra de água e sanea­men­to. Onde pre­dom­i­nam estu­dantes bran­cos, as esco­las têm mel­hor infraestru­tu­ra”, acres­cen­ta Tragten­berg.

O pro­fes­sor diz que, se anal­isa­dos os dados de cada grupo de esco­las, percebe-se que os estu­dantes negros que estão em esco­las majori­tari­a­mente bran­cas, ain­da assim estão nas esco­las desse grupo com as piores infraestru­turas. “Se olhar den­tro de cada sub­grupo, você vai ver que os estu­dantes bran­cos que estão em esco­las negras estão nas mel­hores esco­las negras do pon­to de vista de água e sanea­men­to, e os estu­dantes negros que estão nas esco­las bran­cas estão nas esco­las com pior infraestru­tu­ra de sanea­men­to. Então existe essa dupli­ci­dade de desigual­dade racial.”

Estudantes indígenas

O estu­do chama a atenção tam­bém para o baixo aces­so de estu­dantes indí­ge­nas aos serviços de sanea­men­to bási­co. “Emb­o­ra este estu­do ten­ha foco na com­para­ção do aces­so a sanea­men­to entre esco­las pre­dom­i­nan­te­mente negras e bran­cas, não é pos­sív­el pas­sar des­perce­bi­da a existên­cia de baixís­si­mos índices de atendi­men­to dos serviços públi­cos nas esco­las pre­dom­i­nan­te­mente indí­ge­nas”, diz o tex­to.

Do total de 360 mil indí­ge­nas matric­u­la­dos na rede públi­ca, 60% estão em esco­las sem abastec­i­men­to de água; 81,8% estão em esco­las sem esgo­to; 54,7% não con­tam com cole­ta de lixo; 15,7% não têm aces­so a água potáv­el na esco­la e 14,3% não têm ban­heiro.

Segun­do Tragten­berg, o estu­do mostra que as políti­cas públi­cas pre­cisam con­sid­er­ar as desigual­dades raci­ais e entre as regiões do país. “Não adi­anta só pen­sar em uni­ver­sal­iza­ção”, diz o pro­fes­sor. “Ao não con­sid­er­ar a equidade racial, sem­pre se vai priv­i­le­giar as esco­las mais priv­i­le­giadas e os estu­dantes de raça bran­ca, que são o grupo mais priv­i­le­gia­do. Se olhar só para a uni­ver­sal­iza­ção, as medi­das vão sem­pre chegar primeiro nas pes­soas e nas esco­las mais priv­i­le­giadas. É impor­tante ter um recorte de equidade”, afir­ma.

Fora das escolas

A fal­ta de sanea­men­to bási­co não afe­ta ape­nas as esco­las. O estu­do desta­ca que, con­forme dados do Sis­tema Nacional de Infor­mações sobre Sanea­men­to (SNIS), em 2022, 33 mil­hões de pes­soas no Brasil não tin­ham aces­so aos serviços públi­cos de abastec­i­men­to de água e 90 mil­hões não estavam lig­a­dos à rede públi­ca de cole­ta de esgo­to. Além dis­so, em 2022, havia ao menos 1,2 mil­hões de pes­soas que não tin­ham ban­heiros em seus domicílios, estando sujeitas à defe­cação a céu aber­to.

Além dis­so, a pesquisa con­sid­era que nem todos os estu­dantes têm a cor ou raça declar­a­da no cen­so, o que impacta tam­bém as anális­es feitas. Esse dado começou a ser cole­ta­do em 2004. Em 2007, 60% não declararam cor ou raça. No ano pas­sa­do, essa por­cent­agem caiu para 25,5%, o que ain­da sig­nifi­ca que não se tem essa infor­mação de um a cada qua­tro estu­dantes.

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