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ONG no DF vende farofa para ajudar crianças que vivem com vírus HIV

Repro­dução: © Mar­cel­lo Casal jr/Agência Brasil

Organização foi criada no Dia Mundial de Luta Contra a Aids


Pub­li­ca­do em 01/12/2021 — 06:47 Por Luiz Clau­dio Fer­reira — Repórter da Agên­cia Brasil — Brasília

O son­ho da estu­dante Mar­i­ana*, de 20 anos de idade, gan­hou cores vivas, vibrantes, algo antes inimag­ináv­el. Ela vai ter­mi­nar o ensi­no médio ago­ra no final de 2021. Quan­do podia imag­i­nar que um dia pode­ria voltar à esco­la? Mais do que isso: emo­ciona-se quan­do pen­sa que é pos­sív­el cri­ar com qual­i­dade os três fil­hos, graças à evolução da ciên­cia e ao apoio de uma enti­dade. Ela dese­ja, para o futuro próx­i­mo, uma profis­são de servir, sal­var, dar a mão… O son­ho é entrar em uma fac­ul­dade e ser enfer­meira. Poder aju­dar out­ras pes­soas, assim como foi com ela, res­gata­da de um pesade­lo.

Mãe de três fil­hos e víti­ma de um estupro, quan­do tin­ha ape­nas 16 anos de idade, ela temeu sobre o próprio futuro e das cri­anças quan­do desco­briu que havia sido con­t­a­m­i­na­da pelo vírus HIV, que pode causar a aids. “Prati­ca­mente, estou a um pas­so de realizar meus son­hos. O que acon­te­ceu comi­go foi um mila­gre”, emo­ciona-se a jovem. Antes, morado­ra da Cidade Oci­den­tal (GO), municí­pio que fica no Entorno do Dis­tri­to Fed­er­al, ela foi acol­hi­da pelo Insti­tu­to Vida Pos­i­ti­va, em Brasília, enti­dade que com­ple­ta 15 anos, nes­ta quar­ta, e que nasceu com a intenção de apoiar cri­anças e ado­les­centes con­t­a­m­i­nadas pelo vírus.

A orga­ni­za­ção não gov­er­na­men­tal (ONG), que fun­ciona em uma casa alu­ga­da no bair­ro da Asa Sul, foi cri­a­da em 1º de dezem­bro,  Dia Mundi­al de Luta Con­tra a Aids. A insti­tu­ição cui­da, em sua casa de apoio, de 27 jovens, incluin­do cri­anças e ado­les­centes, e seus famil­iares. Ao todo, pres­ta assistên­cia a cer­ca de 300 famílias, com dis­tribuição de ces­tas bási­cas, roupas, uten­sílios e eletrodomés­ti­cos. Dis­tribui ain­da mais de 24 mil lanch­in­hos por ano para pacientes que fazem exame de car­ga viral em lab­o­ratórios de cin­co hos­pi­tais públi­cos do Dis­tri­to Fed­er­al.

Repro­dução: Faro­fa da Vovó Vicky aju­da por­ta­dores do vírus HIV em Brasília — Mar­cel­lo Casal jr/Agência Brasil

A pior doença

A fun­dado­ra e coor­de­nado­ra do Vida Pos­i­ti­va, Vicky Tavares, de 72 anos, entende, porém, que, além de garan­tir as condições essen­ci­ais para essas pes­soas, uma função fun­da­men­tal do insti­tu­to é bus­car dire­itos assis­ten­ci­ais, o que inclui infor­mação e a luta con­tra um adver­sário que per­manece muito vivo em 2021, e ain­da mais poderoso que o vírus, o pre­con­ceito. “Essa é uma doença muito pior”, afir­ma.

“Chego a diz­er que, sobre essa situ­ação, muito pouco mudou. Há pes­soas pre­con­ceitu­osas por todos os lugares. Mes­mo com tan­ta evolução dos trata­men­tos de saúde e da ciên­cia, fal­ta de esclarec­i­men­to e insen­si­bil­i­dade são real­i­dades, ain­da hoje”, expli­ca. Olhares, comen­tários e até piadas fazem parte de uma vio­lên­cia que se mostra vela­da (e nem sem­pre escan­car­a­da), como expli­ca a ativista. Ela bus­ca todas as opor­tu­nidades para explicar a viz­in­hos, ami­gos, doadores, empre­sas apoiado­ras que a bem suce­di­da políti­ca públi­ca no país de dis­tribuição de medica­men­tos garante vida com qual­i­dade aos pacientes e que, por vezes, a car­ga viral se tor­na inde­tec­táv­el.

“As unidades públi­cas de saúde daqui têm garan­ti­do todos os remé­dios necessários a pacientes que tiver­am detec­ta­do o HIV. Essa é uma grande con­quista e que mais gente dev­e­ria saber”.  Vicky, que é paraense e era empresária da área da moda, criou a enti­dade depois de perder um grande ami­go para a aids, o cabeleireiro Duda. Antes de cri­ar a própria enti­dade, atu­ou em uma ONG na região admin­is­tra­ti­va de Taguatin­ga (DF), volta­da especi­fi­ca­mente para cuidar de cri­anças com o HIV. Quan­do essa insti­tu­ição iria encer­rar essas ativi­dades, con­seguiu autor­iza­ção para cri­ar o Vida Pos­i­ti­va.

“Eu pas­sei a me dedicar inte­gral­mente a essa causa. Mostrar que podíamos nos abraçar, dividir os pratos, podíamos nos bei­jar. Afe­to e infor­mação são fun­da­men­tais”.

Ela recor­da que o amor ao tra­bal­ho vol­un­tário surgiu quan­do ela era ape­nas uma ado­les­cente em Belém, e uma tia (Cecília) per­cor­ria com ela áreas per­iféri­c­as para aju­dar quem esta­va com fome ou sem assistên­cia de saúde.

Pandemia

Com a pan­demia, a situ­ação se agravou para a enti­dade, que perdeu cer­ca de 40% em doações. A vol­un­tária da enti­dade, a cabeleireira Daniela Gomes, de 44 anos, que par­tic­i­pa das ativi­dades como cap­ta­do­ra de doações por tele­mar­ket­ing, lamen­ta que, com a crise, ou a enti­dade perdeu apoiadores ou reduzi­ram em quan­ti­dade de recur­sos.

Entre as con­quis­tas recentes, Daniela desta­ca que o iso­la­men­to social não impediu as cri­anças de estu­darem. A enti­dade con­seguiu apoio jun­to à Câmara dos Diri­gentes Lojis­tas (CDL), que cedeu com­puta­dores para que as cri­anças pudessem acom­pan­har as aulas on-line nos últi­mos dois anos de dis­tan­ci­a­men­to.

Repro­dução: Faro­fa da Vovó Vicky aju­da por­ta­dores do vírus HIV em Brasília — Mar­cel­lo Casal jr/Agência Brasil

Segun­do Vicky Tavares, as ativi­dades neces­si­tam ain­da de vol­un­tários na área de edu­cação que pos­sam even­tual­mente aju­dar a tirar dúvi­das nas difer­entes dis­ci­plinas.

Roda de conversas

Out­ra vol­un­tária, a admin­istrado­ra Car­oli­na Pereira, de 43 anos, no Vida Pos­i­ti­va faz as vezes diari­a­mente de con­ta­do­ra de histórias. “São cri­anças com muitas neces­si­dades de con­ver­sar e de ter atenção. Nós can­ta­mos, con­ver­samos. Para mim, ness­es 15 anos, tem sido uma ale­gria inex­plicáv­el”.

As histórias e as con­ver­sas gan­ham difer­entes temas de acor­do com as idades dos jovens. “Ado­les­centes têm out­ras dúvi­das e é impor­tante que pos­samos tro­car impressões”. A equipe con­ta ain­da com apoio psi­cológi­co e de assistên­cia social para infor­mar sobre dire­itos de bene­fí­cios que pes­soas com HIV têm no país. “Res­guardar os dire­itos de pes­soas com HIV é uma ação que envolve buro­c­ra­cias, mas fez com que eu apren­desse muito”, garante a assis­tente social Laís Dan­tas. Ela tem a mis­são de via­bi­lizar doc­u­men­tações e con­hecer as real­i­dades de cada um dos aten­di­dos para que os bene­fí­cios saiam do papel.

Farofa

Para aten­der as neces­si­dades finan­ceiras da enti­dade, além das doações, a equipe criou uma for­ma alter­na­ti­va de con­seguir recur­sos: a ven­da de uma “faro­fa” solidária, que é com­er­cial­iza­da em feiras e nas redes soci­ais tam­bém. Um detal­he é que o pro­du­to não é ape­nas no sabor tradi­cional, mas tam­bém ofer­e­ci­do em 20 ver­sões, incluin­do de tor­res­mo, de dam­as­co e até choco­late (com pimen­ta ou sem).

A expec­ta­ti­va é que, com a prox­im­i­dade do final de ano, as ven­das da faro­fa e tam­bém as doações aumentem. “Na época de Natal, as pes­soas ficam mais sen­síveis e recor­dam. O desafio é con­sci­en­ti­zar de que pre­cisamos de apoio sem­pre”, afir­ma a vol­un­tária Daniela Gomes.

O pro­du­to, em seus difer­entes sabores, é todo feito na coz­in­ha da ONG. “Eu sem­pre gostei de coz­in­har e me per­gun­ta­va o que eu pode­ria faz­er que pode­ria ser vendáv­el. O que eu pode­ria faz­er para aju­dar essas pes­soas? Min­ha família sem­pre elo­giou a faro­fa que eu fazia em casa. Achei que podia ser viáv­el. E pas­samos a inven­tar. O tra­bal­ho foi garan­tir mais ingre­di­entes e aumen­tar as pan­elas. Impor­ta aqui com­par­til­har amor entre a gente. Essa é a recei­ta da faro­fa”, ressalta Vicky Tavares. Far­in­ha, man­teiga, cebo­la e bons sen­ti­men­tos.

Os três fil­hos da estu­dante Mar­i­ana* (de 4, 3 e 2 anos) são tam­bém fasci­na­dos pela faro­fa, ingre­di­ente obri­gatório na hora do almoço (antes ou depois tam­bém).. Nada sobra no pra­to. As cri­anças pref­er­em a de choco­late. No sor­riso, expli­cam a razão: “é mais doce”. A mãe sor­ri. Ela não imag­i­na­va que um dia a vida pode­ria ser doce.

O nome da entre­vis­ta­da foi alter­ado para manutenção da pri­vaci­dade.

Repro­dução: Faro­fa da Vovó Vicky aju­da por­ta­dores do vírus HIV em Brasília — Mar­cel­lo Casal jr/Agência Brasil

Edição: Nathália Mendes/ Bruna Saniele

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