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Pacientes de câncer com origem em HPV sofrem com atraso no atendimento

Repro­dução: © Marce­lo Camargo/Agência Brasil

Pesquisa mostra que maioria é tratada mais de 60 dias após diagnóstico


Pub­li­ca­do em 09/12/2023 — 08:52 Por Cristi­na Indio do Brasil – Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro

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A quar­ta edição da pub­li­cação info.oncollect, chama­da O Impacto do HPV em Difer­entes Tipos de Câncer no Brasil, da Fun­dação do Câncer mostra que a maio­r­ia das pes­soas que chegam ao hos­pi­tal com o diag­nós­ti­co é trata­da após mais de 60 dias. Esse tem­po vai em sen­ti­do opos­to ao da Lei 12.732/12, que garante o iní­cio do trata­men­to den­tro desse pra­zo depois da con­statação da doença. Segun­do os pesquisadores, a demo­ra indi­ca fal­ha no fluxo da rede de atendi­men­to.

O estu­do anal­isou cin­co tipos de câncer: oro­faringe, ânus e canal anal, vagi­na, vul­va e pênis.

De acor­do com a pesquisa, a maior parte dos pacientes chega às unidades de saúde em está­gios avança­dos da doença – cer­ca de 6 mil casos de câncer rela­ciona­dos ao HPV (Human Papi­lo­mavirus) pode­ri­am ser evi­ta­dos, a cada ano, por meio da pre­venção primária. Além dis­so, são esti­ma­dos por ano 17 mil casos de câncer do colo do útero, o tipo mais fre­quente asso­ci­a­do ao HPV.

Para a con­sul­to­ra médi­ca da Fun­dação do Câncer, Flávia Miran­da, exis­tem vários fatores que lev­am à ocor­rên­cia de casos com está­gios avança­dos da doença. Segun­do a médi­ca, são tipos de cânceres com lugares um pouco mais sen­síveis em ter­mos de bus­ca de atendi­men­to médi­co. “Talvez este seja o primeiro moti­vo – a pes­soa pode notar algum sinal de aler­ta e não val­orizar ou ficar con­strangi­da de bus­car um atendi­men­to”, disse Flávia, em entre­vista à Agên­cia Brasil.

Out­ro moti­vo é a demo­ra na con­fir­mação dos casos após o perío­do de 60 dias entre o diag­nós­ti­co e o iní­cio do trata­men­to. “Este é um gar­ga­lo que existe na rede de assistên­cia. Sabe­mos que bióp­sias e histopa­tológi­cos para con­fir­mação diag­nós­ti­ca são o maior entrave”, afir­mou a con­sul­to­ra, aler­tan­do que, quan­to mais demor­a­do for o diag­nós­ti­co, maior a prob­a­bil­i­dade de chegar ao trata­men­to em está­gio avança­do.

No aspec­to econômi­co, a pesquisa mostra que a pre­venção do surg­i­men­to desse tipo de câncer pode­ria reduzir, em grande parte, os gas­tos com saúde no Brasil. Para o dire­tor exec­u­ti­vo da Fun­dação do Câncer, Luiz Augus­to Mal­toni Júnior, a pre­venção tam­bém favore­ce­ria a apli­cação de recur­sos em out­ros trata­men­tos.

“Além de evi­tar 4,5 mil mortes por ano, o que equiv­ale a um expres­si­vo número de 75% de mor­tal­i­dade, a pre­venção reduziria os gas­tos com diag­nós­ti­co, trata­men­to e inter­nações, inclu­sive abrindo espaço para pacientes com out­ros tipos de câncer no sis­tema de saúde”, disse.

“O câncer é uma doença que tem um dos maiores impactos na saúde porque os trata­men­tos são caros, envolvem cirur­gia, quimioter­apia, hoje em dia imunoter­apia. Todo esse mer­ca­do em oncolo­gia cresce a cada ano. Real­mente, o câncer é uma doença que tem cus­to muito pre­pon­der­ante quan­do a gente anal­isa gas­tos em saúde”, com­ple­tou a médi­ca.

Perfil

Flávia Miran­da desta­cou que a maio­r­ia dos pacientes com algum dess­es cânceres, con­sideran­do home­ns e mul­heres, é de pes­soas com mais de 50 anos de idade (78%), com baixa esco­lar­i­dade (64%) e é negra (56% e 53%, respec­ti­va­mente).

“É o que a gente vê em todas as doenças, não só no câncer, que tem maior prevalên­cia em pes­soas mais vel­has e infe­liz­mente em pop­u­lações mais vul­neráveis com baixa condição socioe­conômi­ca e baixa esco­lar­i­dade. A questão de raça e de cor aqui no país é pre­pon­der­ante. São pes­soas que têm mais difi­cul­dade de aces­so aos serviços de saúde”, acres­cen­tou.

Estágios e estadiamento

Em todas as regiões do Brasil, mais de 80% de pacientes, tan­to home­ns (88%) quan­to mul­heres (84%) com câncer de oro­faringe, tumor que se desen­volve em parte da gar­gan­ta, são diag­nos­ti­ca­dos em está­gios avança­dos da doença. Segun­do o estu­do, que 65% dos home­ns começam o trata­men­to em até 60 dias, quan­do encam­in­hados sem diag­nós­ti­co prévio. Nas regiões  Nordeste (44%) e Sud­este (36%), obser­vam-se os maiores tem­pos de espera entre a con­statação da doença e o trata­men­to.

A situ­ação muda quan­do as pes­soas são os encam­in­hadas com algum diag­nós­ti­co. Nesse grupo, ape­nas 39% têm o trata­men­to ini­ci­a­do em até 60 dias. Entre as mul­heres, as que chegam com o diag­nós­ti­co da doença têm um tem­po maior de espera (62%). Nas regiões Cen­tro-Oeste (70%), Sud­este (65%) e Norte (64%), o tem­po de espera delas é maior que o tem­po médio do país.

Comportamentos

Nos cânceres de ânus e canal anal, o esta­di­a­men­to atinge um per­centu­al sig­ni­fica­ti­vo de pacientes, que vão à unidade de saúde em está­gios avança­dos da doença. Nos home­ns, chega a 55% e nas mul­heres, a 54%. Entre os pacientes sem diag­nós­ti­co prévio que vão às unidades de saúde, 66% começam o trata­men­to em até 60 dias, mas nos encam­in­hados com o diag­nós­ti­co em mãos somente 40% ini­cia o trata­men­to den­tro deste pra­zo. Nas mul­heres sem o diag­nós­ti­co, 64% con­seguem começar o trata­men­to em até 60 dias. O per­centu­al cai muito entre as que chegam com o diag­nós­ti­co em mão (37%) e con­seguem começar o trata­men­to den­tro do mes­mo tem­po.

Out­ro que reg­is­tra per­centu­al ele­va­do (43%) nos casos diag­nos­ti­ca­dos em está­gios avança­dos é o câncer de pênis, espe­cial­mente nas regiões Norte e Cen­tro-Oeste, onde estão os maiores índices de câncer em esta­di­a­men­to avança­do (55%). O menor é no Sud­este (34%). A difer­ença do tem­po que ocorre do diag­nós­ti­co ao trata­men­to é bas­tante grande entre os home­ns sem diag­nós­ti­co prévio ini­cian­do o trata­men­to em até 60 dias (82%) e aque­les com diag­nós­ti­co que começam trata­men­to no mes­mo perío­do (37%).

Já entre os casos de câncer de vul­va mais da metade (50%) chegam em fase ini­cial da doença. O maior per­centu­al (60%) de mul­heres com neo­pla­sia que chegam com esta­di­a­men­to ini­cial da doença é da região Sud­este. O tem­po de espera entre o diag­nós­ti­co e o trata­men­to, a pesquisa obser­vou maior perío­do de espera para trata­men­to das mul­heres que chegam ao hos­pi­tal já com o diag­nós­ti­co em mãos, se com­para­do às que chegam sem o diag­nós­ti­co. Somente 26% são aten­di­das em até 60 dias, em todo o país. O menor per­centu­al brasileiro (16%) de mul­heres que chegam ao hos­pi­tal com diag­nós­ti­co e ini­ci­am o trata­men­to em até 60 dias foi nota­do na Região Norte.

O maior per­centu­al de mul­heres com câncer de vagi­na que chegam às unidades de saúde em está­gios ini­ci­ais da doença é da Região Cen­tro-Oeste (63%). Entre as que vão às unidades de saúde sem o diag­nós­ti­co e sem trata­men­to, 64% recebem o atendi­men­to em até 60 dias após o diag­nós­ti­co. A Região Sud­este tem o maior per­centu­al de mul­heres que tiver­am trata­men­to após 60 dias do diag­nós­ti­co (42%). O estu­do rev­el­ou ain­da que é alto (66%) o per­centu­al de mul­heres com a doença que chegam com diag­nós­ti­co na unidade hos­pi­ta­lar e recebem o trata­men­to após 60 dias.

Na avali­ação dos pesquisadores, a quar­ta edição do info.oncollect pode aju­dar na for­mu­lação de políti­cas públi­cas especí­fi­cas. Além de detecção pre­coce, o estu­do apon­ta a neces­si­dade de aces­so rápi­do e igual­itário aos cuida­dos de saúde. É pre­ciso levar em con­sid­er­ação tam­bém as dis­pari­dades region­ais, porque, com essas infor­mações, será pos­sív­el desen­volver inter­venções dire­cionadas e garan­tir mel­hores resul­ta­dos para todos os pacientes.

Vacinação

Como medi­da pre­ven­ti­va, Flávia Miran­da ressaltou a importân­cia da vaci­na no con­tex­to dos cânceres rela­ciona­dos ao HPV, mas disse que a questão ain­da enfrenta resistên­cias, ape­sar da com­pro­vação da eficá­cia do imu­nizante, e que é pre­ciso mod­i­ficar esse cenário.

“É infor­mação, comu­ni­cação e edu­cação. Basi­ca­mente isso. As vaci­nas estão disponíveis para meni­nas e meni­nos de 9 a 14 anos em todas unidades de saúde. Tam­bém podem ser vaci­nadas as pes­soas imunos­suprim­i­das, as que vivem com HIV/aids, trans­plan­ta­dos e pacientes oncológi­cos até os 45 anos, mas existe mui­ta polêmi­ca porque lig­am a vaci­na do HPV a uma infecção sex­ual­mente trans­mis­sív­el, em vez de lig­ar à pre­venção de câncer”, afir­mou a médi­ca.

A polêmi­ca estende-se ain­da a críti­cos da vaci­na por enten­derem que esta vai pro­mover o iní­cio de ativi­dade sex­u­al mais pre­coce. Está com­pro­va­do que isso não acon­tece, acres­cen­tou a con­sul­to­ra da Fun­dação Câncer. “Pelo con­trário, as cri­anças e ado­les­centes que são vaci­na­dos con­tra o HPV ini­ci­am mais tarde a ativi­dade sex­u­al e, quan­do ini­ci­am, pro­tegem-se e fazem a anti­con­cepção. Quer diz­er, tudo demon­stra que quem se vaci­na já tem um olhar de cuida­do com a saúde. É fake news [a asso­ci­ação da vaci­na à ini­ci­ação social pre­coce].”

A médi­ca acres­cen­tou que na pre­venção ao HPV é necessário tam­bém ir além do câncer do colo do útero.

O estu­do com­ple­to está disponív­el neste endereço.

Edição: Nádia Fran­co

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