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Painéis discutem história da capital paulista por visão afrobrasileira

Repro­dução: © Rove­na Rosa/Agência Brasil

Trabalho é aberto à visitação neste sábado


Pub­li­ca­do em 07/10/2023 — 10:47 Por Daniel Mel­lo — Repórter da Agên­cia Brasil — São Paulo

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Para apro­fun­dar a dis­cussão sobre a for­mação da cidade de São Paulo, o artista Jaime Lau­ri­ano criou ima­gens que se des­man­cham à medi­da que se desce pelas escadarias do Beco do Pin­to, no cen­tro históri­co paulis­tano. O espaço fica entre dois casarões do sécu­lo 19 — o Solar da Mar­que­sa e a Casa nº 1, que fazem parte do Museu da Cidade. O tra­bal­ho será aber­to à vis­i­tação neste sába­do (7).

Os três painéis insta­l­a­dos no local trazem repro­duções do Panora­ma da Cidade de São Paulo, pin­ta­do por Arnaud Julien Pal­lière, em 1821, com inter­venções pro­postas pelo artista. O quadro mostra a pais­agem da região da anti­ga Rua do Car­mo, onde fica o Beco do Pin­to, à época. “Nada mais é que uma vista do out­ro lado do rio Taman­d­u­ateí, no sécu­lo 19, olhan­do para cá”, diz Lau­ri­ano, ao apon­tar para uma caixa d’água no hor­i­zonte, onde antes era a margem do rio, atual­mente canal­iza­do e cober­to por con­cre­to e asfal­to.

“Então, você tem a várzea do Car­mo, você tem o Con­ven­to do Car­mo, você tem todo um land­scape [pais­agem] dessa parte do cen­tro de São Paulo, vista de lá, que era per­ife­ria à época”, detal­ha o artista sobre o que é pos­sív­el ver no afres­co orig­i­nal.

São Paulo (SP), 05/10/2023 - O artista Jaime Lauriano apresenta as obras que fazem parte do Panorama da Cidade de São Paulo, projeto que propõem releituras de pinturas históricas, nas escadarias do Beco do Pinto. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Repro­dução: Jaime Lau­ri­ano apre­sen­ta as obras que fazem parte do Panora­ma da Cidade de São Paulo — Rove­na Rosa/Agência Brasil

Militares e bandeirantes

Para os tra­bal­hos, Lau­ri­ano removeu as fig­uras humanas que tam­bém fazi­am parte da com­posição e inseriu, em uma mon­tagem, per­son­agens de diver­sos momen­tos da história do país. Apare­cem mon­ta­dos em cav­a­l­os, Dom Pedro I, o gen­er­al João Figueire­do, o ex-gov­er­nador paulista João Doria, poli­ci­ais mil­itares e ban­deirantes. “Eu vou adi­cio­nan­do tam­bém alguns ele­men­tos que fazem parte da min­ha gramáti­ca visu­al, que são desen­hos feitos com pem­ba, que é esse giz usa­do nos rit­u­ais afro-brasileiros”, expli­ca Lau­ri­ano “Aqui, eu desen­hei três caças da FAB [Força Aérea Brasileira]e adi­cionei palavras, como genocí­dio e invasão”, com­ple­ta sobre as inter­venções em um dos painéis.

Imagens que se desmancham

As ima­gens, no entan­to, foram con­struí­das com uma estraté­gia usa­da para out­doors, divi­di­da ver­ti­cal­mente em pris­mas, de modo que, ao olhar o painel em out­ro ângu­lo, há uma out­ra figu­ra no lado inver­so. Essa mon­tagem tam­bém faz com que a imagem mude à medi­da que a pes­soa se movi­men­ta pelo espaço. “A par­tir do momen­to que você vai andan­do, ela [imagem] vai se destru­in­do e vão se rev­e­lando os tri­dentes de Exu desen­hados com pem­ba. Então, se você vir nesse out­ro pon­to de vista, você já não vê mais nen­hu­ma imagem colo­nial”, mostra.

Para quem sobe as escadarias, são visíveis ini­cial­mente os sím­bo­los que reme­tem a Exu, orixá cul­tua­do pela umban­da e can­domblé. “Ele é o primeiro orixá, porque o criou vazio. Den­tro da cos­molo­gia iorubana, se você não cri­ar o vazio, você não con­segue cri­ar nada”, expli­ca o artista sobre a escol­ha. “A gente não vai apa­gar e não vai esque­cer essa história, só que nesse movi­men­to decolo­nial [de enfrentar o pen­sa­men­to colo­nial], a gente vai cri­ar um vazio para a pos­si­bil­i­dade de cri­ação de out­ra história”, acres­cen­ta.

Apagamento

A pro­pos­ta surgiu a par­tir de um incô­mo­do do artista com o apaga­men­to da história da cidade ante­ri­or a déca­da de 1920. “A gente anda pelo cen­tro de São Paulo e não vê quase nen­hu­ma refer­ên­cia ao perío­do de col­o­niza­ção, de escrav­iza­ção e ao perío­do de inde­pendên­cia tam­bém, antes de 1920. E, aqui, é um lugar dess­es que a gente tem a memória do perío­do colo­nial brasileiro”, comen­ta Lau­ri­ano, que fez o tra­bal­ho a pedi­do do museu munic­i­pal que fun­ciona no espaço.

O local, que fica ao lado do Pateo do Col­lé­gio e próx­i­mo a Praça da Sé, mar­cos de origem da cap­i­tal paulista, é tam­bém por onde pas­sa­va a rota usa­da por povos indí­ge­nas antes da invasão, chama­do de Cam­in­ho do Peabiru. “O Beco do Pin­to fazia parte do Cam­in­ho do Peabiru e a gente esquece. Isso não é um dado con­ver­sa­do em museu nen­hum, cen­tro cul­tur­al nen­hum”, enfa­ti­za.

Samba e hip hop

Os painéis devem ocu­par o beco até jul­ho de 2024. Para que a obra suporte a exposição ao sol e a chu­va, Lau­re­ano se baseou nas estraté­gias de con­strução pop­u­lar e optou por estru­turas metáli­cas. “É o mes­mo zin­co usa­do em bar­racão de esco­la de sam­ba e ban­ca de jor­nal. Usar esse tipo de mate­r­i­al infor­ma tam­bém essa ideia de osten­tação, de uma arquite­tu­ra colo­nial, que está nas ima­gens, em con­traste com a pop­u­lar”, diz.

A inau­gu­ração do tra­bal­ho será fei­ta por um corte­jo, per­for­ma­do pelo Cole­ti­vo Legí­ti­ma Defe­sa, com saí­da da Praça da Sé, às 15h. Ao lon­go do perío­do de exposição, serão real­iza­dos ain­da even­tos com gru­pos de pagode, sam­ba e hip hop.

Edição: Aline Leal

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