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Pequena vila na região do Paredão é rota de fuga de garimpeiros em RR

Repro­dução: © Rove­na Rosa/Agência Brasil

Local é ponto de parada entre o rio Uraricoera e Boa Vista


Pub­li­ca­do em 12/02/2023 — 12:45 Por Vitor Abdala – Envi­a­do espe­cial — Boa Vista (Roraima)

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Com casas sim­ples, ruas poeirentas, alguns poucos esta­b­elec­i­men­tos com­er­ci­ais e igre­jas, e local­iza­da a duas horas de car­ro de Boa Vista, Vila Reis­lân­dia é um dos prin­ci­pais pon­tos de para­da dos garimpeiros que deix­am os locais de min­er­ação ile­gal de ouro na região do rio Urari­co­era, nas ter­ras yanoma­mi.

Depois de uma viagem de bar­co que pode durar alguns dias – ao cus­to de dois e cin­co gra­mas de ouro – segun­do relatos de garimpeiros, eles pre­cisam desem­bar­car em um pon­to chama­do de “beira” e ain­da encar­ar uma esbu­ra­ca­da estra­da de ter­ra de quase 40 quilômet­ros a bor­do de uma cam­in­honete, em um tra­je­to que cus­ta R$ 250, para chegar à peque­na vila.

Vila Reislândia (RR), 11/02/2012, Vila Reislândia, região também conhecida como Paredão, é passagem para quem vem das áreas de garimpo ilegal de ouro no rio Uraricoera.
Repro­dução: Vila Reis­lân­dia (RR), 11/02/2012, Vila Reis­lân­dia, região tam­bém con­heci­da como Paredão, é pas­sagem para quem vem das áreas de garim­po ile­gal de ouro no Urari­co­era. — Rove­na Rosa/Agência Brasil

A área onde fica Reis­lân­dia é mais con­heci­da como Paredão. Ali já fun­ciona­va como pon­to de chega­da e saí­da daque­les que bus­cav­am o son­ho de enrique­cer na região do Urari­co­era, rio que cor­ta as ter­ras yanoma­mi e vai desaguar no Rio Bran­co, já na cap­i­tal Boa Vista.

Rota de fuga

Mas, com a Oper­ação Lib­er­tação, que reúne forças gov­er­na­men­tais para acabar com a ativi­dade garimpeira ile­gal nas ter­ras yanoma­mi, o local virou uma efer­ves­cente rota de fuga. Ali, dezenas de motoris­tas de aplica­ti­vo fazem fila, próx­i­mo a um pos­to de gasoli­na, para aju­dar a evac­uar os garimpeiros da região.

Uma cor­ri­da até Boa Vista cus­ta R$ 150 por pes­soa em uma viagem cole­ti­va. O cli­ma entre os motoris­tas é de descon­fi­ança em relação à impren­sa e aos car­ros de polí­cia que even­tual­mente cir­cu­lam por ali, mas tam­bém de com­petição entre eles. Quan­do uma cam­in­honete chega da “beira”, com um grupo de garimpeiros, os motoris­tas dis­putam a cor­ri­da.

Alguns esper­am horas pela opor­tu­nidade de con­seguir a “cor­ri­da”. Vários deles havi­am per­noita­do em Reis­lân­dia e, ao meio-dia deste sába­do (11), ain­da esper­avam os primeiros clientes garimpeiros chegarem da “beira”.

De repente, uma cam­in­honete surge na estra­da, vin­do do rio, e entra em veloci­dade pela rua prin­ci­pal de Reis­lân­dia, mas não para no pos­to de gasoli­na onde os motoris­tas de aplica­ti­vo estão con­cen­tra­dos. Um deles, pos­sivel­mente de for­ma já pre­vi­a­mente acer­ta­da, segue a cam­in­honete até uma casa de madeira.

Três garimpeiros

Ali, três garimpeiros descem da cam­in­honete com seus poucos per­tences e acer­tam a cor­ri­da até Boa Vista. O paraense Mar­co Rogério Brandão, de 51 anos, é um deles.

Há dez anos tra­bal­han­do como garimpeiro, sendo os últi­mos sete meses nas ter­ras yanoma­mi, ele deixou o garim­po na últi­ma quin­ta-feira (9), mas, dev­i­do a prob­le­mas no bar­co, que que­brou o motor duas vezes, só con­seguiu chegar dois dias depois na Vila Reis­lân­dia, pagan­do 3 gra­mas de ouro para o bar­queiro (aprox­i­mada­mente R$ 900 na cotação de hoje).

Brandão plane­ja se esta­b­ele­cer ago­ra em Itaitu­ba, no Pará, out­ra cidade garimpeira, onde sua família tem uma pro­priedade rur­al. Mas ele diz que não quer mais saber de garim­po. Seu plano ago­ra é aju­dar o pai já idoso a cuidar da roça.

“Eu que­ria uma vida mel­hor pra família. Ten­ho uma fil­ha aqui [no Brasil] e out­ra na Venezuela. Antes do garim­po, eu tra­bal­ha­va com roça. Naque­le negó­cio da pes­soa quer­er ter uma vida mel­hor, entrei no garim­po. Eu sei que tem muitos que querem tirar proveito em cima da gente, que estão lá pra roubar, essas coisas. Eu, graças a Deus, não”.

O garimpeiro con­ta que os últi­mos dias foram ten­sos. Tin­ha medo de ser pre­so ou mal­trata­do pelas forças poli­ci­ais. “Deci­di sair há mais ou menos uns cin­co dias. A gente tin­ha tele­visão no bar­ra­co e via as notí­cias. E eu disse: “rapaz, vamos simb­o­ra”. Tem mui­ta gente [lá den­tro] que diz: “eu não vou [emb­o­ra]”. Mas pra eles nós somos crim­i­nosos. E crim­i­noso sabe como é trata­do, né?”.

Uma de suas prin­ci­pais angús­tias foi não ter con­segui­do gan­har o que pre­tendia. “Tá cer­to que eu entrei sem nada, mas vou sair sem nada… Eu até que­ria ter o bas­tante pra eu traz­er, porque eu saía de lá car­regan­do nem que fos­se a pé. Eu que­ria ter um qui­lo de ouro comi­go. O pouquin­ho que eu gan­hei, [ven­di no próprio garim­po e] fiz­er­am trans­fer­ên­cia por pix”.

Out­ro que está no grupo é um venezue­lano que, por sua condição de imi­grante, não quis se iden­ti­ficar. No Brasil há seis anos, ele diz tra­bal­har nas ter­ras yanoma­mi há mais de dois. “Vou voltar pra Venezuela. Porque pagar aluguel aqui, não dá”.

Ele con­ta que chegou a ten­tar se inserir no mer­ca­do de tra­bal­ho for­mal brasileiro, mas não con­seguiu. A opção foi ten­tar a vida no garim­po. Mas, depois de ter que fugir das ter­ras yanoma­mi, assim como Brandão, não quer mais saber desse tipo de tra­bal­ho.

Já o maran­hense Alde­cir Fer­reira da Sil­va, de 60 anos, que tra­bal­ha com garim­po há mais de 40 anos, demon­stra insat­is­fação com as ações poli­ci­ais para expul­sar garimpeiros das ter­ras indí­ge­nas. “O cara vem gan­har um din­heiro pra pagar o estu­do do fil­ho, pra com­prar o que com­er, e o que tá acon­te­cen­do aí? Nós ‘tava’ ali tra­bal­han­do e ago­ra ‘tem que vim’ emb­o­ra todo mun­do… Isso é erra­do. Eu tava há sete meses aí. A ordem [dos poli­ci­ais] é pra [gente] ser pre­so. Quem não fica pre­ocu­pa­do em ser pre­so? Por isso eu vim emb­o­ra. Todo mun­do tá pre­ocu­pa­do com a prisão”.

Os três aceitam con­ver­sar, mas não querem ser fotografa­dos pela reportagem. Estão cansa­dos e só pen­sam em sair dali. Fazem um almoço rápi­do numa peque­na pen­são e depois caem na estra­da, ini­cial­mente, rumo a Boa Vista, e depois para algum lugar, longe das ter­ras yanoma­mi.

Edição: Nélio Neves de Andrade

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