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Performance no ato AI‑5 Nunca Mais reforça memória contra ditadura

Manifesto foi em frente à sede do antigo Dops, no Rio de Janeiro

Mar­i­ana Tokar­nia – Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­do em 13/12/2024 — 20:29
Rio de Janeiro
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O movimento Ocupa Dops promove um ato público em frente ao antigo prédio do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) no Rio, para marcar o Dia Internacional de Combate à Tortura (Tânia Rêgo/Agência Brasil)
Repro­dução: © Tânia Rêgo/Agência Brasil

Um cor­po humano adul­to é for­ma­do por 250 gra­mas de sal. Em frente à sede do anti­go Depar­ta­men­to de Ordem Políti­ca e Social (Dops), no cen­tro do Rio de Janeiro, foram car­rega­dos e posi­ciona­dos oito sacos de 25 qui­los de sal, total­izan­do 200 qui­los. Mais do que ape­nas sal, os sacos têm um sim­bolis­mo maior: 800 pes­soas.

São pes­soas que lutaram con­tra a ditadu­ra mil­i­tar e cuja memória e ausên­cia são lem­bradas na per­for­mance artís­ti­ca de Julia Cseko, que fez parte do ato AI‑5 Nun­ca mais, real­iza­do nes­ta sex­ta-feira (13), para lem­brar a assi­natu­ra, em 13 de dezem­bro de 1968, do Ato Insti­tu­cional nº 5, o mais repres­sor dos 17 atos insti­tu­cionais dec­re­ta­dos na ditadu­ra mil­i­tar e que mar­cou o iní­cio do perío­do mais san­gren­to do regime autoritário.

“[A per­for­mance é] Para a gente pen­sar nas pes­soas que perdemos, na fisi­cal­i­dade das ausên­cias que temos e tudo que perdemos tam­bém na ditadu­ra. Foram vidas, foi a sanidade. A polí­cia ape­nas se tornou mais tru­cu­len­ta, mais vio­len­ta. A cor­rupção se tornou uma coisa cada vez endêmi­ca”, disse a artista.

O ato, que reúne artis­tas, pes­soas que viver­am a ditadu­ra e que perder­am entes queri­dos no perío­do, políti­cos, ativis­tas e defen­sores dos dire­itos humanos é real­iza­do há 11 anos em frente ao Dops e reivin­di­ca que esse espaço se torne um espaço de memória de toda a repressão e tor­tu­ra que ocor­reu jus­ta­mente no local.

Centro de memória

O pré­dio da Polí­cia Cen­tral é atual­mente um dos bens do patrimônio históri­co e artís­ti­co do esta­do do Rio de Janeiro. Hoje, não há qual­quer indi­cação ou pla­ca do papel desse edifí­cio ao lon­go da história. Nele fun­cio­nou o Dops, cri­a­do para asse­gu­rar e dis­ci­pli­nar a ordem mil­i­tar no país. Ele foi uti­liza­do prin­ci­pal­mente durante o Esta­do Novo e na ditadu­ra mil­i­tar. Foi usa­do como um apara­to do Esta­do para perseguir e tor­tu­rar quem se opun­ha aos regimes autoritários.

“Nós luta­mos, há muitos anos, para trans­for­mar esse pré­dio num cen­tro de memória. Essa é mais uma ini­cia­ti­va, sem­pre lem­bran­do que nós não quer­e­mos nem ditadu­ra, nem sequer AI‑5, que foi um perío­do onde nós perdemos muitos com­pan­heiros, tive­mos muitos desa­pare­ci­dos. Além daque­les que lutavam con­tra a ditadu­ra, muitos seg­men­tos foram atingi­dos vil­mente por uma cru­el­dade ina­ceitáv­el. Então, ditadu­ra nun­ca mais, AI‑5 nun­ca mais”, disse uma das orga­ni­zado­ras do ato Vera Vital Brasil, do Cole­ti­vo RJ Memória, Ver­dade, Justiça, Reparação e Democ­ra­cia.

O his­to­ri­ador Paulo Cesar Azeve­do Ribeiro, que tam­bém inte­gra o Cole­ti­vo, ressalta a importân­cia em trans­for­mar o edifí­cio em um espaço de memória.

“Isso aqui foi pal­co de prisões de gente famosa, de Gra­cil­iano Ramos [um dos mais impor­tantes autores da lit­er­atu­ra brasileira], de Nise da Sil­veira [psiquia­tra brasileira recon­heci­da por rev­olu­cionar o trata­men­to men­tal]. É, enfim, um lugar sim­bóli­co”, lem­bra.

“Aqui tem 600 met­ros quadra­dos. Imag­i­na, no cen­tro da cidade do Rio de Janeiro, um cen­tro de memória e cul­tura, com ofic­i­nas para os jovens apren­derem, com cin­e­ma, com arte, para armazenar o que se sabe. O Rio de Janeiro merece isso. Nós não temos um cen­tro de memória das lutas con­tra a repressão”, defende o his­to­ri­ador.

Para não repetir

Segun­do a Comis­são Nacional da Ver­dade, 50 mil pes­soas foram pre­sas ape­nas em 1964, ano do golpe mil­i­tar, e boa parte delas sofr­eram tor­turas. A comis­são tam­bém iden­ti­fi­cou pelo menos 434 pes­soas mor­tas ou desa­pare­ci­das pelas forças dita­to­ri­ais.

Para a secretária dos Dire­itos Humanos do Par­tido Comu­nista do Brasil, Dil­ceia Quin­tela, a preser­vação da memória é impor­tante para que a história não se repi­ta.

“Todos os anos, sem­pre no dia 13 de dezem­bro, nós viemos aqui para remem­o­rar, para não deixar que seja esque­ci­da ‘aque­la pági­na infe­liz da nos­sa história’, como diria Chico Buar­que. E no ano que com­ple­ta 60 anos do golpe, com golpis­tas andan­do por aí, né? Com o que acon­te­ceu no dia 8 de janeiro de 2023, em Brasília, com tudo que se desco­briu, com a ten­ta­ti­va de golpe ain­da lá em 2022, após as eleições. Não podemos deixar pas­sar desaperce­bido”, aler­ta.

Em novem­bro, a Polí­cia Fed­er­al defla­grou uma oper­ação para desar­tic­u­lar uma orga­ni­za­ção crim­i­nosa respon­sáv­el por plane­jar um golpe de Esta­do para impedir a posse do pres­i­dente Luiz Iná­cio Lula da Sil­va após o pleito de 2022. O plano que incluía o assas­si­na­to de Lula e do vice-pres­i­dente, Ger­al­do Alck­min, foi impres­so no Palá­cio do Planal­to, em novem­bro daque­le ano.

Botar sal

A artista Julia Cseko nasceu nos Esta­dos Unidos, porque o pai, o com­pos­i­tor Luiz Car­los Cseko, se viu obri­ga­do a deixar o país para evi­tar a perseguição pela ditadu­ra. Atual­mente, ven­do que a ditadu­ra e os crimes cometi­dos no perío­do têm pou­ca reper­cussão na Améri­ca do Norte, ela uti­liza o finan­cia­men­to de uma bol­sa para elab­o­rar obras de arte com essa temáti­ca, como a per­for­ma­da des­ta sex­ta-feira.

“A gente está num momen­to históri­co com­pli­cadís­si­mo. Querem anis­tiar pes­soas que ten­taram faz­er um golpe. Acho que anis­tia para essas pes­soas nem pen­sar. Isso é impor­tante diz­er tam­bém. E é esse o sím­bo­lo de estar jun­to, em sol­i­dariedade, resistin­do, con­tin­uan­do esse tra­bal­ho de resistên­cia, con­tin­uan­do o tra­bal­ho de luta pelos dire­itos humanos, com os cole­tivos. É uma colab­o­ração muito boni­ta. É isso. Vamos lá, vamos botar sal aqui”, con­vo­ca.

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