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Pesquisadores criticam invisibilidade de palestinos no noticiário

Repro­dução: © Reuters

Estudos apontam tendência de abordagem pró-Israel


Pub­li­ca­do em 14/10/2023 — 09:45 Por Rafael Car­doso — Rio de Janeiro

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Des­de o últi­mo sába­do (7), noti­ciários de todo o mun­do colo­cam em destaque os con­fli­tos entre Israel e Hamas. O pon­to de par­ti­da para a retoma­da dessa cober­tu­ra mais exten­sa foi o ataque do grupo islâmi­co Hamas con­tra comu­nidades israe­lens­es próx­i­mas à Faixa de Gaza. São acon­tec­i­men­tos mais recentes de uma história com­plexa que remete a décadas ou a sécu­los, a depen­der da escol­ha inter­pre­ta­ti­va. Para alguns espe­cial­is­tas, no entan­to, o assun­to tem sido abor­da­do de for­ma sim­plista e dese­qui­li­bra­da pela mídia tradi­cional.

Ausên­cia de con­tex­tu­al­iza­ção históri­ca, escol­has restri­tas de fontes e temas, atribuição de adje­tivos maniqueís­tas para car­ac­teri­zar os dois lados: difer­entes ele­men­tos estari­am favore­cen­do uma visão pró-Israel e tor­nan­do quase invisív­el os prob­le­mas enfrenta­dos pelos palesti­nos. É dessa for­ma que o geó­grafo e pesquisador de dis­cur­sos midiáti­cos, Fran­cis­co Fer­nan­des Ladeira, anal­isa a atu­al cober­tu­ra jor­nalís­ti­ca do con­fli­to.

“É uma cober­tu­ra que não tem o con­tra­ditório, se vol­ta ape­nas para um lado. São usa­dos atal­hos cog­ni­tivos que, primeiro, ten­tam sim­pli­ficar para o cidadão comum um con­fli­to que é muito com­plexo. Exem­p­lo é cri­ar uma batal­ha entre o bem, que seria Israel, e o mal, que seria a Palesti­na. Tam­bém se procu­ra tirar a his­to­ri­ci­dade do con­fli­to, que remete a sécu­los, e focar em acon­tec­i­men­tos ime­di­atos. Assim, é noti­ci­a­do ape­nas o ataque do Hamas a Israel”, defende Ladeira.

“Há jogos de palavras e armadil­has semân­ti­cas que mex­em com as emoções. Quan­do você vai falar das per­das em Gaza, são per­das mate­ri­ais, ataques às insta­lações mil­itares. Em Israel, são enfa­ti­zadas as per­das humanas e os dra­mas famil­iares, os ataques con­tra a pop­u­lação civ­il”, com­ple­men­ta o pesquisador.

O pro­fes­sor de Relações Inter­na­cionais da PUC-SP, Bruno Huber­man, argu­men­ta que existe uma indig­nação sele­ti­va no debate públi­co, que neg­li­gen­cia o lado palesti­no. Em pub­li­cação na rede social X (ex-twit­ter), ele diz que o “apartheid israe­lense” provo­ca a morte de palesti­nos todos os dias, sem que reper­cussão e comoção sejam as mes­mas.

“É injus­ti­ficáv­el a morte de cen­te­nas de israe­lens­es, assim como é a dos palesti­nos. Mas o grau de nor­mal­iza­ção da bar­bárie em Gaza pode ser vis­to nes­sa rave orga­ni­za­da na fron­teira com Gaza. Como um fes­ti­val que pre­ga paz e amor é real­iza­do na fron­teira com duas mil­hões de pes­soas sofren­do dia a dia? Essa é a alien­ação que israe­lens­es, brasileiros e oci­den­tais têm em relação ao que se pas­sa com os palesti­nos. A bar­bárie con­tra os palesti­nos não sen­si­bi­liza, são mor­tos sem nome, sem ros­to, difer­ente dos israe­lens­es”, disse Huber­man.

Discordância

A pesquisado­ra Kari­na Stange Cal­adrin, vin­cu­la­da ao Insti­tu­to de Relações Inter­na­cionais da Uni­ver­si­dade de São Paulo (USP) e ao Insti­tu­to Brasil-Israel, dis­cor­da que haja uma abor­dagem pró-Israel nos noti­ciários. Para ela, espe­cial­is­tas de difer­entes visões têm sido chama­dos para comen­tar os con­fli­tos, o que tor­na a cober­tu­ra mais com­ple­ta e diver­sa. O ataque do Hamas no últi­mo sába­do ter sido trata­do de for­ma mais “emo­cional” e neg­a­ti­va em difer­entes veícu­los, seria o esper­a­do, por envolver civis mor­tos. Jus­ti­ficar os ataques é que seria con­denáv­el.

“Qual­quer pes­soa que defen­da a morte de civis, palesti­no ou israe­lense, não está rep­re­sen­tan­do nada. A ideia de dar voz aos dois lados aca­ba colo­can­do pes­soas para falar que defen­d­em mortes de civis, palesti­nos ou israe­lens­es. E isso eu con­sidero inad­mis­sív­el. Isso não dev­e­ria ter espaço na mídia”, defende Cal­adrin.

Situação em Gaza

Infor­mações sobre a situ­ação precária da pop­u­lação palesti­na na Faixa de Gaza têm chega­do com mais detal­h­es por meio de orga­ni­za­ções que atu­am no local. É o caso da Médi­co Sem Fron­teiras (MSF), que denun­cia uma pio­ra das condições de vida no ter­ritório depois dos bom­bardeios recentes. No rela­to de um dos coor­de­nadores da MSF na Palesti­na, Léo Cans, insta­lações e equipa­men­tos médi­cos foram destruí­dos pelas ações israe­lens­es, mil­hares de pes­soas perder­am mora­dias e estão sem aces­so aos serviços primários.

“A inten­si­dade da vio­lên­cia e dos bom­bardeios é chocante, assim como o número de mor­tos. A declar­ação de guer­ra não deve, em hipótese algu­ma, levar à punição cole­ti­va da pop­u­lação de Gaza. Cor­tar o fornec­i­men­to de água, elet­ri­ci­dade e com­bustív­el é ina­ceitáv­el, pois pune toda a pop­u­lação e a pri­va de suas neces­si­dades bási­cas”, disse, em nota, Léo Cans.

As condições socioe­conômi­cas na Faixa de Gaza, segun­do o cien­tista políti­co e pro­fes­sor de Relações Inter­na­cionais Mau­rí­cio San­toro, trans­for­mam a região em “um grande celeiro para orga­ni­za­ções extrem­is­tas e movi­men­tos vio­len­tos”.

“Essa é a quin­ta grande inter­venção mil­i­tar de Israel em Gaza des­de 2008. É um número bem alto. A região é cer­ca­da por muros e grades, tem fron­teiras muito con­tro­ladas. O espaço marí­ti­mo tam­bém é cercea­do em ter­mos de patrul­hamen­to de Israel. Por isso, que se usa a expressão que Gaza é uma ‘prisão a céu aber­to’. É uma área muito pobre, com um nív­el de vul­ner­a­bil­i­dade socioe­conômi­ca gigan­tesca. E nas cir­cun­stân­cias atu­ais é inviáv­el do pon­to de vista econômi­co e social. Não tem real­mente como ter ali o esta­b­elec­i­men­to de um comér­cio inter­na­cional e de inves­ti­men­tos”, disse San­toro.

A Faixa de Gaza tem aprox­i­mada­mente 2,3 mil­hões de pes­soas. Pelo taman­ho pequeno do ter­ritório, 41 quilômet­ros de com­pri­men­to e 10 quilômet­ros de largu­ra, tem uma alta den­si­dade pop­u­la­cional. Segun­do a ONU, pelo menos 80% dos que vivem ali depen­dem de aju­da inter­na­cional, como fornec­i­men­to de ali­men­tos. Além das restrições sobre o espaço aéreo e marí­ti­mo, Israel tam­bém con­tro­la as mer­cado­rias que entram no ter­ritório, o abastec­i­men­to de água, ener­gia, com­bustív­el e comi­da.

“O fornec­i­men­to dess­es serviços aca­ba se tor­nan­do um instru­men­to de pressão políti­ca. É o que está acon­te­cen­do ago­ra, de se cor­tar o fornec­i­men­to de água e ener­gia elétri­ca, algo proibido no dire­ito inter­na­cional. Tan­to as con­venções de Gene­bra quan­to o estatu­to de Roma proíbem uti­lizar esse tipo de fer­ra­men­ta como uma maneira de punir a pop­u­lação civ­il. Isso é uma vio­lação do dire­ito human­itário e das leis da guer­ra. É muito sig­ni­fica­ti­vo tam­bém dessa dependênc

ia extrema que os palesti­nos têm do Esta­do de Israel”, expli­cou Mau­rí­cio San­toro

Edição: Marce­lo Brandão

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