...
sexta-feira ,17 janeiro 2025
Home / Cultura / Petrobras Sinfônica celebra 90 anos do maestro Isaac Karabtchevsky

Petrobras Sinfônica celebra 90 anos do maestro Isaac Karabtchevsky

Concerto será às 19h na Cinelândia, em frente ao Theatro Municipal

Cristi­na Índio do Brasil — Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­do em 27/12/2024 — 07:39
Rio de Janeiro
Ver­são em áudio
Rio de Janeiro (RJ), 19/12/2024 - O diretor artístico e maestro titular da Orquestra Petrobras Sinfônica, Isaac Karabtchevsky, durante sessão fotográfica para a Agência Brasil. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil
Repro­dução: © Tomaz Silva/Agência Brasil

A Orques­tra Petro­bras Sin­fôni­ca tem, nes­ta sex­ta-feira (27), às 19h, uma apre­sen­tação espe­cial. Vai cel­e­brar na Cinelân­dia, em frente ao The­atro Munic­i­pal do Rio de Janeiro, no cen­tro da cidade, os 90 anos do seu dire­tor artís­ti­co e mae­stro tit­u­lar Isaac Karabtchevsky. No con­cer­to orga­ni­za­do em parce­ria pela Petro­bras Sin­fôni­ca (OPES), o Serviço Social do Comér­cio (Sesc RJ) e o The­atro Munic­i­pal, uma das car­ac­terís­ti­cas mais mar­cantes da tra­jetória do mae­stro estará de vol­ta: a pop­u­lar­iza­ção da músi­ca clás­si­ca.

Durante décadas era comum vê-lo à frente de orques­tras em con­cer­tos que reu­ni­am em espaços públi­cos, como praças e par­ques, grande quan­ti­dade de pes­soas que mostravam inter­ação com a músi­ca clás­si­ca. “Isso é algo total­mente inex­plicáv­el. É do ser humano ao se entu­si­as­mar, se agi­tar. Esse é um con­ceito bási­co. A músi­ca tem esse poder mági­co. Ela exerce sobre o ser humano uma função quase que ema­nente à sua for­mação sen­so­r­i­al. Por meio do nos­so sis­tema ner­voso, as notas se mul­ti­pli­cam e nos tomam por com­ple­to. É uma asso­ci­ação que se deve faz­er quan­do se ouve músi­ca. Não con­scien­te­mente, é do ser humano ouvir músi­ca e se deixar emo­cionar por ela”, disse Isaac Karabtchevsky em entre­vista à Agên­cia Brasil.

A von­tade de faz­er a pop­u­lar­iza­ção da músi­ca, segun­do o mae­stro, nasceu na época em que ia a teatros, via o públi­co empol­ga­do com músi­ca e pen­sa­va que ess­es espaços só tin­ham cer­ca de 2 mil lugares. “Eu pen­sa­va: tão pou­ca gente para arte tão grandiosa e ain­da jovem, quase cri­ança, já esta­va na ado­lescên­cia, me ocor­reu um impul­so de que pre­cisá­va­mos faz­er algu­ma coisa para que maior quan­ti­dade de públi­co pudesse des­fru­tar de momen­tos tão lin­dos”, afir­mou.

Um exem­p­lo de apre­sen­tação com grande públi­co ocor­reu em 1986, no Pro­je­to Aquar­ius, cri­a­do em 1972 pelo mae­stro, pelo jor­nal­ista Rober­to Mar­in­ho e pelo ger­ente de pro­moções do Jor­nal O Globo, Péri­cles de Bar­ros. A intenção era levar a músi­ca clás­si­ca ao maior número pos­sív­el de pes­soas. A ence­nação da ópera Aída, de Ver­di, lev­ou cer­ca de 200 mil pes­soas à Quin­ta da Boa Vista, na zona norte do Rio. O elen­co tin­ha 470 artis­tas e o con­cer­to teve mais de duas horas de duração. Lá o públi­co se aco­mod­ou no gra­ma­do e ocupou as águas do lago local.

Turnê Orquestra Petrobras Sinfônica - 5 cidades
Repro­dução: Turnê da Orques­tra Petro­bras Sin­fôni­ca — Foto arqui­vo Orques­tra Petro­bras Sin­fôni­ca 

Para o mae­stro, a reação pos­i­ti­va da plateia que, em muitos casos, assis­tia pela primeira vez um con­cer­to é quase um rit­u­al reli­gioso onde as pes­soas se movem, agrade­cem e se entu­si­as­mam pelo can­to. “Eles estão inti­ma­mente lig­a­dos. A origem do ser humano foi sem­pre por meio de gru­pos que, em tem­pos pas­sa­dos, se reu­ni­am como con­gre­gações ou irman­dades que can­tavam em vol­ta do fogo. Acho que a músi­ca impreg­nou a vida das civ­i­liza­ções pas­sadas de uma maneira tão forte quan­to hoje”, disse.

Iniciação

O inter­esse pela músi­ca surgiu cedo na vida do mae­stro, recon­heci­do como um dos mais rel­e­vantes da atu­al­i­dade. “Eu ver­i­fiquei que o primeiro impul­so já esta­va ali há muito tem­po, des­de que a min­ha mãe me ama­men­tou e eu já a ouvia can­tar. Então, era uma coisa instin­ti­va, nat­ur­al, orgâni­ca. Ela veio com o primeiro amor, o primeiro car­in­ho da min­ha mãe, que can­ta­va em rus­so as canções de ninar. O elo de comu­ni­cação entre a matéria espir­i­tu­al que é a músi­ca surgiu, cer­ta­mente, com a min­ha mãe e de lá foi um crescen­do con­tín­uo”, con­tou.

Ain­da cri­ança, por ori­en­tação da mãe que tin­ha sido can­to­ra mez­zo sopra­no em Kiev, na Ucrâ­nia, começou com aulas de can­to com o pro­fes­sor aus­traliano dela e, na sequên­cia, vier­am os instru­men­tos. “A min­ha mãe foi fun­da­men­tal nesse proces­so, porque ela viu um tal­en­to nat­ur­al, que o meu gesto era sem­pre sin­tomáti­co com o con­teú­do musi­cal. Ela intu­iu isso e me pôs ime­di­ata­mente em con­ta­to com o pro­fes­sor de can­to dela aqui no Brasil, em São Paulo, que se chama­va Fan Krause, um aus­tría­co que imi­grou para o Brasil e dava aulas de can­to e con­tin­u­a­va ensa­ian­do com ela. Eu assis­tia todos os ensaios e ele começou a me preparar para a futu­ra car­reira. Eu fazia exer­cí­cios, can­ta­va muito, foi a min­ha primeira vocação, o meu primeiro ingres­so no uni­ver­so musi­cal per­cor­reu o can­to. Devo muito, em primeiro lugar à min­ha mãe e, em segun­do, ao pro­fes­sor que me intro­duz­iu nos seg­re­dos da músi­ca” rela­tou.

O estu­do de can­to era sem­pre com músi­cas clás­si­cas, em ger­al Tchaikovsky, e tre­chos de óperas. “Isso durou mais ou menos até 12 anos de idade, quan­do ela me fez estu­dar músi­ca mais seri­amente. Aí eu tin­ha pro­fes­sor de teo­ria e solfe­jo, nada em relação a regên­cia ain­da, mas essa a primeira fase foi a que cristal­i­zou e solid­i­fi­cou min­ha car­reira musi­cal. Foram os primeiros pas­sos, que são sem­pre tor­tu­osos, até chegar a um pon­to em que eu pudesse andar livre­mente.

O primeiro instru­men­to foi o piano e depois desen­volveu-se em out­ros. “O oboé foi uma decor­rên­cia nat­ur­al dis­so. Por que um instru­men­to de sopro? Porque era um instru­men­to que can­ta­va, então escol­hi um instru­men­to de sopro, o oboé, que tin­ha uma sonori­dade pas­to­ril, ínti­ma, lin­da. Até hoje quan­do me lem­bro das fras­es emi­ti­das pelo oboé, é uma sen­sação de plen­i­tude”, descreveu.

Karabtchevsky sen­tiu que pode­ria ser mae­stro ao se dar con­ta, no seu desen­volvi­men­to, de que a músi­ca tem relação com o gesto. “As mãos rep­re­sen­tam um plano sen­so­r­i­al na dimen­são de espaço que a músi­ca propõe. A músi­ca é uma arte que se reparte no tem­po, mas o con­ceito dos gestos é total­mente espa­cial. Ele procu­ra rep­re­sen­tar a músi­ca, as tonal­i­dades, as inflexões que têm um frasea­do musi­cal. Quan­do você fala, por exem­p­lo, eu estou falan­do com você e estou fazen­do gestos incon­scientes, porque o gesto deno­ta sim­i­lar­i­dade com o frasea­do musi­cal e a regên­cia. Como eu ges­tic­ula­va muito ao can­tar, foi daí que sur­gi­ram os primeiros esboços do que seria o futuro regente”, rev­el­ou.

A car­reira bril­hante tem destaques den­tro e fora do país. Foi mae­stro tit­u­lar de orques­tras em Viena, em Veneza, onde começou a sua incursão no ter­reno da ópera. “Como esta­va fazen­do ópera pela primeira vez, porque nun­ca tin­ha tido essa opor­tu­nidade aqui no Brasil, real­mente foi uma descober­ta. Esta­va lá à frente da orques­tra fazen­do as min­has primeiras óperas que tan­to amo de Mozart, Ver­di, Puc­ci­ni, aque­les com­pos­i­tores que sem­pre me cer­cavam mas nun­ca eu os domi­na­va”. Em 2009, Karabtchevsky foi incluí­do entre os ícones vivos do Brasil pelo jor­nal britâni­co The Guardian.

O mae­stro não dis­tingue um con­cer­to mar­cante, mas desta­cou que todo iní­cio de tem­po­ra­da tem uma ener­gia difer­ente. “Cer­ta­mente, sem­pre os iní­cios de tem­po­radas são como com­por­tas. Algu­mas águas repre­sadas, no momen­to em que são aber­tas, descem com uma vio­lên­cia enorme em uma repre­sa. Assim, vejo os con­cer­tos de inau­gu­ração da tem­po­ra­da. A potên­cia dessas águas se reflete no decor­rer da tem­po­ra­da. É uma coisa legal isso. Todos os primeiros con­cer­tos são os mais formidáveis sob esse aspec­to líri­co. Repre­sas que foram aber­tas. Tem esse sen­ti­do”.

“As plateias reagem sem­pre em função dos mel­hores con­ceitos. Não que saibam dis­so. É uma coisa ema­nente, mas o públi­co car­i­o­ca, espe­cial­mente aqui no Rio de Janeiro, tem dado provas que afer­em a dis­posição do músi­co em dar o seu mel­hor. É uma coisa incon­sciente. Quan­do o músi­co pro­je­ta para a plateia o seu ide­al de pre­cisão, afi­nação e de musi­cal­i­dade, as pes­soas se dão con­ta dis­so.

OPES

Para o mae­stro, é um priv­ilé­gio estar à frente da Orques­tra Petro­bras Sin­fôni­ca aos 90 anos com­ple­ta­dos nes­ta sex­ta-feira. “É o meu esteio e a for­ma que ten­ho de me comu­nicar com humanos, por meio de um instru­men­to per­feito. É um grupo de músi­cos que ultra­pas­sa a dimen­são de uma sim­ples orques­tra. Ela é uma família. Con­sidero a Orques­tra Petro­bras Sin­fôni­ca parte da min­ha família. Eles se inserem nesse con­tex­to humano de dar e rece­ber. É per­ma­nente isso, é diário”, men­cio­nou.

Rio de Janeiro (RJ), 03/10/2023 – Orquestra Petrobras Sinfônica durante evento de comemoração dos 70 anos da empresa, na Ilha do Fundão, no capital fluminense. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil
Repro­dução: Rio de Janeiro — Orques­tra Petro­bras Sin­fôni­ca durante even­to de comem­o­ração dos 70 anos da empre­sa — Foto Tomaz Silva/Agência Brasil

Na visão dele, o ensaio é sem­pre uma dádi­va. “É uma for­ma supe­ri­or de comu­ni­cação. Eu me regoz­i­jo por isso”.

O dire­tor-pres­i­dente da Orques­tra Petro­bras Sin­fôni­ca, Car­los Mendes, disse que o mae­stro é um grande ícone da cul­tura brasileira e da músi­ca de con­cer­to, que sem­pre desen­volveu um tra­bal­ho lin­do de pop­u­lar­iza­ção. “A nos­sa orques­tra vem de uns dez, 12 anos para cá, com um viés muito volta­do para isso. A gente real­mente decid­iu traz­er esse públi­co que não fre­quen­ta sala de con­cer­to para per­to de nós, com todos os nos­sos pro­je­tos, não só na músi­ca pop­u­lar, mas tam­bém na músi­ca de con­cer­to mais volta­da para quem não está muito acos­tu­ma­do a fre­quen­tar as salas”, disse à Agên­cia Brasil.

“A nos­sa relação com o mae­stro é sem­pre de mui­ta tro­ca, sem­pre muito inten­sa. O mae­stro é uma pes­soa incrív­el, agradáv­el, de uma cul­tura ímpar. A gente tem sem­pre a agrade­cer”, comem­o­rou.

Os orga­ni­zadores infor­maram que se no horário mar­ca­do para a apre­sen­tação estiv­er choven­do, o con­cer­to será trans­feri­do para o dia seguinte (28), no mes­mo horário. O repertório da noite começará com a Mar­cha Radet­zky de Johann Strauss, segui­da de Bolero, de Mau­rice Rav­el. Estão incluí­das na lista tam­bém A Dança Hún­gara nº 5, de Johannes Brahms; Danúbio Azul, de Johann Strauss Jr. Toc­ca­ta — Tren­z­in­ho do Caipi­ra, da obra Bachi­anas Brasileiras nº 2 do maior com­pos­i­tor brasileiro, Heitor Vil­la-Lobos. O encer­ra­men­to será com a Val­sa das Flo­res, de O Que­bra-Nozes, e a Aber­tu­ra 1812, ambas de Tchaikovsky.

LOGO AG BRASIL

Você pode Gostar de:

Artistas amazônicos usam versos, danças e corpos em defesa da floresta

Escritor Tiago Hakiy vê a poesia como um instrumento político Rafael Car­doso* — Envi­a­do espe­cial Pub­li­ca­do …