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Programas educacionais são estratégicos para autoestima de estudantes

Escolas de Sergipe e Rio de Janeiro são exemplos de sucesso

Mar­i­ana Tokar­nia – Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­da em 02/10/2024 — 07:21
Rio de Janeiro
Rio de Janeiro (RJ), 16/09/2024 - Os estudantes Jéssica Maysa Sousa, Pedro Araújo, Isaac Filipe e Marcelle Muniz e o professor Antonio Miranda, da Escola Municipal Nilo Peçanha, em São Cristóvão, zona norte da cidade. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
© Tânia Rêgo/Agência Brasil

“Você que está com difi­cul­dade de estu­dar, peça aju­da a alguém, que alguém pode te aju­dar. Se tiv­er estu­do, você tem tudo”. A frase é de Ygor, 15 anos de idade. Ele é de Ara­ca­ju e estu­da na Esco­la Estad­ual Poeta Gar­cia Rosa, onde faz parte do Pro­gra­ma Sergipe na Idade Cer­ta (Prosic).

O pro­gra­ma é volta­do para cor­ri­gir a dis­torção idade-série em um esta­do que chegou a ocu­par a primeira posição nacional na por­cent­agem de estu­dantes que estão fora da idade con­sid­er­a­da cor­re­ta para os estu­dos. Ygor é um dess­es estu­dantes. E foi no pro­gra­ma que ele super­ou uma grande defasagem: não sabia ler.

“Quan­do eu entrei aqui eu não sabia de nada, eu não tin­ha ami­gos, as pro­fes­so­ras começaram a me ensi­nar a ler. Ago­ra eu estou con­seguin­do ler e escr­ev­er, que eu não sabia dire­ito”, con­ta em vídeo do Fun­do das Nações Unidas para a Infân­cia (Unicef), par­ceiro no pro­gra­ma.

Garan­tir que os estu­dantes sigam o fluxo esco­lar, não reprovem e apren­dam o que é esper­a­do para cada eta­pa de ensi­no é uma das for­mas de garan­tir que todos con­clu­am os estu­dos, que como afir­mou Yago, são tão necessários para a inserção na sociedade.

No Brasil, a edu­cação é obri­gatória dos 4 aos 17 anos de idade. Os anos finais do ensi­no fun­da­men­tal, eta­pa que vai do 6º ao 9º ano, são con­sid­er­a­dos cru­ci­ais. E é cur­sa­da, ideal­mente, entre 11 e 14 anos. Estu­dos mostram que é uma eta­pa na qual os estu­dantes enfrentam grandes mudanças na própria vida, com a entra­da na ado­lescên­cia. Tam­bém, geral­mente, mudam-se para esco­las maiores e lidam com apren­diza­gens mais com­plexas. Tra­ta-se de um perío­do con­sid­er­a­do deter­mi­nante para que as pes­soas con­clu­am os estu­dos, até o final do ensi­no médio.

O aban­dono dos estu­dos e a evasão esco­lar difi­cul­tam inclu­sive a inserção no mer­ca­do de tra­bal­ho. No Brasil, em 2023, entre os jovens de 15 a 29 anos de idade, cer­ca de 10 mil­hões, o equiv­a­lente a 22%, não estu­davam e não tra­bal­havam. Cer­ca de 4 mil­hões de jovens não estu­davam, não tra­bal­havam e não havi­am con­cluí­do a edu­cação bási­ca — eta­pa que vai da edu­cação infan­til ao ensi­no médio. Os dados foram com­pi­la­dos pela platafor­ma QEdu Juven­tudes e Tra­bal­ho, a par­tir de pesquisas ofi­ci­ais.

Formação intensiva

Em Sergipe, o Prosic acel­era os estu­dos, para que os estu­dantes não fiquem tão atrasa­dos. No fluxo reg­u­lar, demor­aria 4 anos para con­cluir os anos finais do ensi­no fun­da­men­tal. Pelo Prosic, isso é feito de for­ma inten­si­va, por 2 anos. Yago está ago­ra no chama­do fluxo 4, cur­san­do jun­tos o 8º e o 9º anos.

“Nos­so esta­do tin­ha uma das maiores quan­ti­dade de meni­nos em idade incor­re­ta na sala de aula. Esse número ger­al era de 39,4%. E para você ter ideia, o ano mais críti­co, que é o 6º, a gente esta­va com 48,8% de dis­torção, e isso acio­nou um aler­ta”, expli­ca o pro­fes­sor Ever­ton Pes­san, que tra­bal­ha com a for­mação em lín­gua por­tugue­sa dos pro­fes­sores que irão atu­ar no Prosic.

“O pro­gra­ma surgiu para ten­tar mudar ess­es indi­cadores. Des­de 2019, já pas­saram por nós cer­ca de 42 mil estu­dantes, e a nos­sa dis­torção ger­al caiu de 39,4% para 22,5%”, disse o pro­fes­sor.

A grande van­tagem do Prosic para os alunos, expli­ca Pes­san, é acabar os estu­dos em menos tem­po. “Aca­ba mais cedo, né? Ele adi­anta os estu­dos e o que ele quis­er faz­er lá na frente. O incen­ti­vo é jus­ta­mente adi­antar os seus estu­dos”, ressalta.

As aulas são inten­si­vas e não são como as do ensi­no reg­u­lar. Os estu­dantes recebem uma atenção espe­cial, de acor­do com a pro­fes­so­ra de lín­gua por­tugue­sa Elaysa Lima, da Esco­la Estad­ual Poeta Gar­cia Rosa. “O estu­dante já se sente excluí­do ali daque­le grupo, já tem aque­le aque­le receio de par­tic­i­par das ativi­dades. Muitos sen­tem que não con­seguem, que são inca­pazes. E aí, essas tur­mas são impor­tantes. A gente faz o tra­bal­ho tam­bém de autoes­ti­ma dess­es alunos, para que eles saibam que podem, que são capazes. O pro­fes­sor, em uma tur­ma reg­u­lar, não tem como dar atenção a todos os alunos que estão em um nív­el de apren­diza­gem difer­ente. A tur­ma do Prosic ain­da tem a van­tagem de ter um número menor de alunos, o que tam­bém facili­ta”, expli­ca Elaysa.

O pro­fes­sor Pes­san ressalta que esse cuida­do com a autoes­ti­ma é bas­tante tra­bal­ha­do na for­mação dos pro­fes­sores. “Uma coisa que eu falo aos pro­fes­sores é que nem todo mun­do que está reprovan­do ou já reprovou, nec­es­sari­a­mente tem prob­le­mas de apren­diza­gem. Eu era um meni­no muito tran­qui­lo em relação aos estu­dos, mas foi o ano que meus pais se sep­a­raram, a gente mudou de cidade, e acabei reprovan­do. Aí ficou um caos na min­ha cabeça. A gente sabe que den­tro da bol­ha social onde eles [estu­dantes] vivem, de fato acon­te­cem muitas coisas. Então, o que a gente fala para ess­es pro­fes­sores é não olhar esse meni­no com repú­dio, como se fos­se fra­cas­sar. Se não for a esco­la, quem que vai abrir as por­tas para ele? A gente tem que pen­sar dessa maneira”.

Escola das adolescências

Em jul­ho deste ano, o gov­er­no fed­er­al lançou o Pro­gra­ma de For­t­alec­i­men­to para os Anos Finais do Ensi­no Fun­da­men­tal — Pro­gra­ma Esco­la das Ado­lescên­cias, que tem como obje­ti­vo con­stru­ir uma pro­pos­ta para a eta­pa que se conecte com as diver­sas for­mas de viv­er a ado­lescên­cia no Brasil, pro­mo­va um espaço acol­he­dor e impul­sione a qual­i­dade social da edu­cação, mel­ho­ran­do o aces­so, o pro­gres­so e o desen­volvi­men­to inte­gral dos estu­dantes.

O pro­gra­ma reúne esforços da União, dos esta­dos, do Dis­tri­to Fed­er­al e dos municí­pios e pre­vê apoio téc­ni­co-pedagógi­co e finan­ceiro, pro­dução e divul­gação de guias temáti­cos sobre os anos finais e incen­tivos finan­ceiros a esco­las pri­or­izadas segun­do critérios socioe­conômi­cos e étni­co-raci­ais.

Em setem­bro foi real­iza­do o Sem­i­nário Inter­na­cional Con­stru­in­do uma Esco­la para as Ado­lescên­cias, para dis­cu­tir como o Brasil e out­ros país­es estão lidan­do com a garan­tia de uma edu­cação de qual­i­dade e quais as prin­ci­pais estraté­gias para com­bat­er a reprovação e o aban­dono esco­lar. O Prosic esta­va entre as ini­cia­ti­vas apre­sen­tadas.

Escuta

Out­ra ação real­iza­da no âmbito do pro­gra­ma foi a Sem­ana da Escu­ta das Ado­lescên­cias nas Esco­las real­iza­da em maio, quan­do os estu­dantes respon­der­am a ques­tionários sobre o que pen­sam sobre a esco­la, as aulas, os fun­cionários e os cole­gas. Ao todo, 2,2 mil­hões de estu­dantes de 20 mil esco­las par­tic­i­param. Uma das esco­las par­tic­i­pantes foi, no Rio de Janeiro, a Esco­la Munic­i­pal Nilo Peçan­ha.

A esco­la tem um difer­en­cial. Foi trans­for­ma­da em um dos Giná­sios Edu­ca­cionais Tec­nológi­cos (GET) da prefeitu­ra da cidade. Tra­ta-se de um mod­e­lo de ensi­no que usa a tec­nolo­gia para estim­u­lar a par­tic­i­pação dos alunos e o desen­volvi­men­to de habil­i­dades em diver­sas áreas. A intenção é jus­ta­mente tornar a esco­la um ambi­ente mais atra­ti­vo e mais conec­ta­do à vida dos estu­dantes.

O pro­fes­sor artic­u­lador de pro­je­tos do GET Anto­nio Miran­da expli­ca que tan­to a esco­la quan­to os alunos ain­da estão se adap­tan­do, mas que os resul­ta­dos têm sido bons. Um deles é jus­ta­mente uma maior prox­im­i­dade e escu­ta con­stante dos alunos. “Tudo é cha­to para eles, chatão como eles falam”, brin­ca. Então,  uma das estraté­gias é per­mi­tir um maior pro­tag­o­nis­mo deles ou, como o pro­fes­sor pref­ere denom­i­nar, uma auto­ria.

Rio de Janeiro (RJ), 16/09/2024 - Antonio Miranda, professor articulador de projetos da Escola Municipal Nilo Peçanha, em São Cristóvão, zona norte da cidade. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Repro­dução: Rio de Janeiro (RJ), 16/09/2024 — Anto­nio Miran­da é artic­u­lador de pro­je­tos da Esco­la Munic­i­pal Nilo Peçan­ha, no Rio de Janeiro — Tânia Rêgo/Agência Brasil

“Um exem­p­lo. A gente tem ago­ra em out­ubro na nos­sa feira de ciên­cias. Um grupo do 7º ano vai tra­bal­har com fun­gos. Um aluno me trouxe uma matéria que eu descon­hecia com­ple­ta­mente, que são fun­gos que se ali­men­tam de radi­ação. Foi uma pesquisa fei­ta por ele, no lab­o­ratório. Ele foi asso­cian­do as ideias e bus­can­do por con­ta própria”, expli­cou, acres­cen­tan­do que é esse tipo de apren­diza­gem que o mod­e­lo de ensi­no ten­ta estim­u­lar.

Rio de Janeiro (RJ), 16/09/2024 - Marcelle Muniz, 13 anos, estudante do 8º ano, na Escola Municipal Nilo Peçanha, em São Cristóvão, zona norte da cidade. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Repro­dução: Rio de Janeiro (RJ), 16/09/2024 — Mar­celle Muniz ressalta que às vezes o impor­tante é apren­der– Tânia Rêgo/Agência Brasil

Para Mar­celle Muniz, 13 anos de idade, estu­dante do 8º ano, essa é jus­ta­mente uma das difer­enças da Esco­la Munic­i­pal Nilo Peçan­ha em relação à anti­ga esco­la.

“Às vezes, o impor­tante é você apren­der. Então, às vezes, o pro­fes­sor tem que  se adap­tar a esse aluno, que tem mais difi­cul­dade. E como é que vai saber a difi­cul­dade que o aluno tem se não con­ver­sar? Por isso é impor­tante ter essa tro­ca. Na min­ha anti­ga esco­la, os pro­fes­sores e os alunos não tin­ham muito essa tro­ca, a maio­r­ia dos alunos tin­ha medo. Inclu­sive quan­do eu cheguei aqui nes­sa esco­la, eu real­mente fiquei com medo”, disse a estu­dante Mar­celle.

Aos poucos, ela foi per­den­do o medo. “Até mes­mo antes dessa Escu­ta dos Ado­les­centes eu perce­bi que os pro­fes­sores real­mente con­ver­sam, tem uma tro­ca boa, e isso fez eu me sen­tir muito mais con­fortáv­el até mes­mo para per­gun­tar, porque eu acho que é impor­tante na apren­diza­gem você per­gun­tar, que aí sim, você aprende”.

Os cole­gas de Mar­celle con­cor­dam. “Ter essa acol­hi­da dos alunos eu acho impor­tante, porque quan­do não se sente ouvi­do ou com dire­ito de inter­a­gir com o pro­fes­sor, isso pode acabar desmo­ti­van­do o aluno a estu­dar”, disse o estu­dante do 9º ano, Isaac Fil­ipe, 15 anos de idade.

Rio de Janeiro (RJ), 16/09/2024 - Pedro Araújo, 13 anos, estudante do 8º ano, na Escola Municipal Nilo Peçanha, em São Cristóvão, zona norte da cidade. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Repro­dução: Rio de Janeiro (RJ), 16/09/2024 — O estu­dante Pedro Araújo entende que exis­tem diver­sas for­mas de apren­diza­do — Tânia Rêgo/Agência Brasil

“A escu­ta é impor­tante porque a gente pode con­ver­sar com os pro­fes­sores, com a dire­to­ria, para falar o que a gente tá sentin­do da esco­la”, disse o estu­dante do 8º ano, Pedro Araújo, 13 anos de idade. “Tem gente que aprende de um jeito. Tem gente que aprende de out­ro. É bom escu­tar por causa dis­so”, com­ple­men­ta a estu­dante do 9º ano, Jés­si­ca Maysa Sousa, 15 anos de idade.

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