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Redes da Meta facilitam aplicação de golpes financeiros, aponta estudo

Pesquisa é do Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais

Léo Rodrigues — Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­do em 07/02/2025 — 08:02
Rio de Janeiro
Facebook, Instagram e WhatsApp têm problemas de acesso nesta segunda
Repro­dução: © Mar­cel­lo Casal jr/Agência Brasil

O Lab­o­ratório de Estu­dos de Inter­net e Redes Soci­ais (Net­Lab), vin­cu­la­do à Uni­ver­si­dade Fed­er­al do Rio de Janeiro (UFRJ), pub­li­cou nes­ta quar­ta-feira (5) os resul­ta­dos de um estu­do sobre a pre­sença de anún­cios mali­ciosos nas redes soci­ais admin­istradas pela Meta, como Face­book, Insta­gram e What­sApp. O obje­ti­vo foi ampli­ar o con­hec­i­men­to sobre a pub­li­ci­dade enganosa, por meio da qual são apli­ca­dos golpes aos cidadãos brasileiros. Os resul­ta­dos indicam que as platafor­mas da Meta estão sendo vis­tas por golpis­tas como um ter­reno fér­til para a práti­ca de fraudes.

O estu­do envolveu um inten­so mon­i­tora­men­to entre 10 e 21 de janeiro deste ano. Esse perío­do coin­cide com os des­do­bra­men­tos da edição da Instrução Nor­ma­ti­va 2.219/2024 pela Recei­ta Fed­er­al. O tex­to fixou a obri­ga­to­riedade de oper­ado­ras de cartões de crédi­to e insti­tu­ições de paga­men­to apre­sentarem semes­tral­mente deter­mi­nadas infor­mações sobre oper­ações finan­ceiras de con­tribuintes. A medi­da, que pas­sou a valer a par­tir de 1º de janeiro de 2025, des­en­cadeou uma onda de notí­cias fal­sas, segun­do as quais as transações por Pix pas­sari­am a ser tax­adas. Pres­sion­a­do pela dis­sem­i­nação das fake news, o gov­er­no fed­er­al acabou decidin­do revog­ar a nova regra no dia 15 de janeiro.

De acor­do com a pesquisa, a onda de notí­cias fal­sas fomen­tou dúvi­das na pop­u­lação, e este­lion­atários aproveitaram o momen­to para aplicar golpes. Ao todo, foram iden­ti­fi­ca­dos 151 anun­ciantes que com­par­til­haram 1.770 anún­cios com con­teú­do mali­cioso. Tam­bém foram mapea­d­os 87 sites fraud­u­len­tos para os quais os usuários eram redi­re­ciona­dos. Ao anun­ciar a revo­gação, o gov­er­no se jus­ti­fi­cou afir­man­do que o recuo bus­ca­va, entre out­ras coisas, frear a cir­cu­lação da desin­for­mação. A análise do Net­Lab indi­ca que, em relação aos anún­cios fraud­u­len­tos, o obje­ti­vo não foi atingi­do. Ao con­trário, nas platafor­mas da Meta, ess­es con­teú­dos cresce­r­am 35% após o recuo.

Em muitos casos, os anún­cios recor­reram à sim­u­lação de pági­nas de insti­tu­ições públi­cas e pri­vadas. Em 40,5%, eles foram veic­u­la­dos por anun­ciantes que se pas­savam pelo gov­er­no fed­er­al. Os pesquisadores do Net­Lab obser­vam que os anún­cios explo­ram a desin­for­mação em torno das políti­cas públi­cas voltadas à inclusão finan­ceira. Chamou a atenção deles que, entre as peças pub­lic­itárias fraud­u­len­tas, apare­cem promes­sas de aces­so tan­to a pro­gra­mas gov­er­na­men­tais reais como tam­bém a out­ros fic­tí­cios. Res­ga­ta Brasil, Bene­fí­cio Cidadão, Brasil Ben­e­fi­ci­a­do e Com­pen­sação da Vira­da são alguns nomes uti­liza­dos.

“O fato de estas pági­nas terem obti­do a per­mis­são para veic­u­lar anún­cios em nome do gov­er­no evi­den­cia as frag­ili­dades dos proces­sos de ver­i­fi­cação de anun­ciantes da Meta”, reg­is­tra o estu­do. Os golpis­tas ofer­e­ci­am serviços para iden­ti­ficar val­ores que os usuários teri­am dire­ito a rece­ber ou anun­ci­avam a pos­si­bil­i­dade de res­gate de din­heiro de deter­mi­na­do bene­fí­cio. Os usuários eram even­tual­mente lev­a­dos a crer que pre­cisavam pagar taxas ante­ci­padas para ter aces­so a estes serviços. Alguns dess­es anún­cios tam­bém pro­movi­am guias fraud­u­len­tos que instruíam con­sum­i­dores a “driblarem a tax­ação do Pix.”

Para os pesquisadores, o alcance das fraudes tem sido max­i­miza­do pela uti­liza­ção das fer­ra­men­tas de mar­ket­ing disponi­bi­lizadas pela Meta, que per­mitem o impul­sion­a­men­to de anún­cios mali­ciosos e seu dire­ciona­men­to para públi­cos seg­men­ta­dos de acor­do com critérios demográ­fi­cos, geográ­fi­cos e inter­ess­es dos usuários. Eles criti­cam a fal­ta de transparên­cia no trata­men­to dos dados pes­soais e veem uma fal­ta de con­t­role e de segu­rança con­tra a pub­li­ci­dade enganosa, o que favorece a apli­cação de crimes dig­i­tais no Face­book, no Insta­gram e no What­sApp.

De acor­do com o Net­Lab, ao per­mi­tir o dire­ciona­men­to de anún­cios fraud­u­len­tos para públi­cos especí­fi­cos, as fer­ra­men­tas da Meta dão aos golpis­tas a capaci­dade de atin­gir as víti­mas ideais. “Há no país uma vas­ta pop­u­lação ávi­da por opor­tu­nidades de ascen­são social, que pre­cisa de suporte e políti­cas públi­cas do Esta­do para mudar de vida, o que faz com que os mais neces­si­ta­dos se tornem um alvo pri­or­itário de golpes online”, reg­is­tra o estu­do.

Procu­ra­da pela Agên­cia Brasil, a Meta afir­mou em nota que anún­cios que ten­ham como obje­ti­vo enga­nar, frau­dar ou explo­rar ter­ceiros não são per­mi­ti­dos em suas platafor­mas. “Esta­mos sem­pre apri­moran­do a nos­sa tec­nolo­gia para com­bat­er ativi­dades sus­peitas. Tam­bém recomen­damos que as pes­soas denun­ciem quais­quer con­teú­dos que acred­item ir con­tra os Padrões da Comu­nidade do Face­book, as Dire­trizes da Comu­nidade do Insta­gram e os Padrões de Pub­li­ci­dade da Meta através dos próprios aplica­tivos”, acres­cen­ta o tex­to.

Inteligência artificial

O estu­do rev­el­ou que em 1.244 dos anún­cios fraud­u­len­tos, 70,3% do total, hou­ve uso de fer­ra­men­tas de inteligên­cia arti­fi­cial. Foram encon­tra­dos vídeos que podem ser enquadra­dos como deep­fakes (fal­si­fi­cação pro­fun­da, em tradução livre). As fer­ra­men­tas foram larga­mente uti­lizadas para manip­u­lar a imagem do dep­uta­do fed­er­al Niko­las Fer­reira (PL), pro­tag­o­nista da cam­pan­ha pela revo­gação da Instrução Nor­ma­ti­va 2.219/2024. Ao todo, adul­ter­ações envol­ven­do o par­la­men­tar apare­cem em 561 anún­cios, sendo 70% destes veic­u­la­dos após o recuo do gov­er­no fed­er­al.

Um deles faz uso de uma pub­li­cação orig­i­nal com­par­til­ha­da por Niko­las em suas redes soci­ais, na qual comem­o­ra­va a revo­gação das novas regras e ale­ga­va que o tra­bal­hador brasileiro pode­ria se tran­quil­izar por poder “usar o Pix sem a lupa do gov­er­no”. O anún­cio, porém, manip­u­la o tre­cho final do vídeo e mostra o par­la­men­tar anun­cian­do o lança­men­to de uma medi­da que garan­tiria o reem­bol­so par­cial de gas­tos real­iza­dos com cartão de crédi­to nos últi­mos meses.

Emb­o­ra ten­ha sido o prin­ci­pal alvo das manip­u­lações, Niko­las não foi a úni­ca per­son­al­i­dade públi­ca que teve sua imagem explo­ra­da nos anún­cios fraud­u­len­tos. O min­istro da Fazen­da, Fer­nan­do Had­dad, é out­ro que aparece em difer­entes vídeos adul­ter­ados. Tam­bém há con­teú­dos que uti­lizam as ima­gens do pres­i­dente Luiz Iná­cio Lula da Sil­va, do vice-pres­i­dente Ger­al­do Alck­min, do ex-pres­i­dente Jair Bol­sonaro, dos dep­uta­dos Eduar­do Bol­sonaro (PL) e Fred Lin­hares (Repub­li­canos) e do jor­nal­ista William Bon­ner, entre out­ros.

Moderação de conteúdo

Uma pesquisa divul­ga­da pelo Insti­tu­to Datafol­ha no ano pas­sa­do apon­ta que fraudes baseadas em Pix e em bole­tos bancários são os tipos de crimes dig­i­tais que mais ger­am receitas no Brasil, cau­san­do um pre­juí­zo de R$ 25,5 bil­hões por ano aos con­sum­i­dores. Tam­bém em 2024, iden­ti­ficar a origem dos golpes finan­ceiros no país foi o foco de um lev­an­ta­men­to real­iza­do pela Sil­ver­guard, uma empre­sa de tec­nolo­gia que ofer­ece serviços de pro­teção finan­ceira dig­i­tal.

O tra­bal­ho rev­el­ou que 79,3% dos casos denun­ci­a­dos por víti­mas por meio  da platafor­ma SOS Golpe se ini­cia­ram em algu­ma das três platafor­mas da Meta, sendo 39% no What­sApp, 22,6% no Insta­gram e 17,7% no Face­book. Os resul­ta­dos apon­taram tam­bém que 7,3% dos golpes tiver­am origem no Telegram e 5% em uma das duas platafor­mas do Google: o sis­tema de bus­ca ou o YouTube. O restante foi asso­ci­a­do a aplica­tivos de jogos, Tik­Tok, e‑mail e out­ros.

Para os pesquisadores do Net­Lab, difer­entes estu­dos têm apon­ta­do as frag­ili­dades no con­t­role de con­teú­do pub­lic­itário pelas platafor­mas da Meta. Eles apon­tam que uma das con­se­quên­cias é a per­da de cred­i­bil­i­dade das insti­tu­ições gov­er­na­men­tais e públi­cas. Isso porque, com o alto vol­ume de anún­cios fraud­u­len­tos, se reduz a capaci­dade dos usuários de iden­ti­ficar os anún­cios autên­ti­cos.

Há tam­bém pre­ocu­pações envol­ven­do as alter­ações nas regras das redes soci­ais Face­book e Insta­gram que foram anun­ci­adas recen­te­mente por Mark Zucker­berg, pres­i­dente exec­u­ti­vo da Meta. Entre elas está o fim do pro­gra­ma de checagem de fatos e out­ras mudanças envol­ven­do mod­er­ação de con­teú­do, como a redução na uti­liza­ção de fil­tros que bus­cam por pub­li­cações que vio­lam os ter­mos de uso.

De acor­do com o Net­Lab, há incertezas sobre o alcance dessas medi­das. “A ausên­cia de menção especí­fi­ca à mod­er­ação de con­teú­do pub­lic­itário por Zucker­berg em sua fala não deixa claro se as mudanças impactam a cir­cu­lação de anún­cios fraud­u­len­tos”, reg­is­tra o estu­do.

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