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Sarampo, meningite, pólio: vacinas evitam sequelas para a vida toda

Repro­dução: © Paulo Pinto/ Agên­cia Brasil/Arquivo

Quem passou pelas doenças faz alerta aos pais: vacinem seus filhos


Pub­li­ca­do em 10/09/2023 — 08:40 Por Viní­cius Lis­boa — Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro

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Em 1960, Hele­na Teodoro Mich­e­lon tin­ha 1 ano e 2 meses de idade quan­do deu entra­da no Hos­pi­tal das Clíni­cas de São Paulo, com a per­na dire­i­ta par­al­isa­da. Até então, a febre alta tin­ha sido trata­da com dipirona por um far­ma­cêu­ti­co, mas o temi­do sin­toma aler­tou a avó e a mãe de que o moti­vo pode­ria ser mais grave. As duas viraram a noite para con­seguir uma vaga de inter­nação. 

“Só naque­la noite, jun­to comi­go, internaram 49 cri­anças com pólio. E lá fiquei dois meses, em um iso­la­men­to só com cri­anças com pólio. Fiquei no pul­mão de aço. Assim começou min­ha luta de seque­la­da da pólio”, con­ta Hele­na, que hoje tem 64 anos. “Falo para as mães novas que não deix­em de vaci­nar seus fil­hos. Me olhem, olhem com olhos fixos, porque eu sou pro­va viva da sequela da pólio. A sequela da pólio é o que eu sou hoje. Então, prestem atenção. A sequela da pólio é para o resto da vida, não tem cura. É uma defi­ciên­cia per­ma­nente”.

Rio de Janeiro (RJ) - Dona Helena para matéria sobre, Sarampo, meningite, pólio: vacinas evitam sequelas para a vida todaFoto: Arquivo Pessoal/Divulgação
Repro­dução: Hele­na teve pólio na infân­cia e vive com seque­las da doença, por Arqui­vo pessoal/Divulgação

A pre­venção da par­al­isia infan­til era uma esper­ança urgente, mas ain­da dis­tante no ano em que Hele­na foi inter­na­da. Albert Sabin havia descober­to a vaci­na oral con­tra a poliomielite (VOP) três anos antes, e a vaci­nação con­tra a doença no Brasil começaria ape­nas em 1961, no Rio de Janeiro e em São Paulo. O Plano Nacional de Con­t­role da Poliomielite, primeira ten­ta­ti­va orga­ni­za­da nacional­mente de con­tro­lar a doença no país, viria ape­nas 10 anos depois, em 1971.

“Per­to da min­ha casa, teve o Fer­nan­do, a Eliz­a­beth, a fil­ha dela… Que eu con­heci, foram qua­tro cri­anças com pólio. Comi­go, cin­co”, lem­bra Hele­na.

“Eu fui tomar vaci­na de pólio quan­do já esta­va grande, com 7 anos de idade, na esco­la. Vi os casos dimin­uin­do até chegar nos anos em que tin­ha sido exter­mi­na­do da gente esse vírus maldito”.

A elim­i­nação da poliomielite do Brasil foi recon­heci­da pela Orga­ni­za­ção Pan-Amer­i­cana de Saúde em 1994, mas o últi­mo caso reg­istra­do foi em 1989. Hele­na Teodoro já era mãe de três fil­hos. “É óbvio que a gente rece­beu com a maior ale­gria essa notí­cia, por que qual é a mãe que quer ver um fil­ho acometi­do por uma sequela que fica para o resto da vida? Se a pólio não voltar, ela ter­mi­na com a gente. Espero que isso acon­teça. Per­cor­re­mos todo esse per­cur­so da vida e esta­mos ter­mi­nan­do, esta­mos idosos. Então, espero que as mães ten­ham con­sciên­cia”.

Doença que pode ser pre­veni­da pela vaci­na do PNI, a poliomielite tem um esque­ma vaci­nal com três dos­es da vaci­na ina­ti­va­da da pólio, inje­ta­da, aos 2, 4 e 6 meses de idade, e duas dos­es de reforço da vaci­na oral, em got­in­has, aos 15 meses e aos 4 anos de idade.

Sequelas

A alta hos­pi­ta­lar após dois meses de inter­nação foi o iní­cio da saga de Hele­na Teodoro para enfrentar as seque­las da pólio, o pre­con­ceito e a fal­ta de aces­si­bil­i­dade para pes­soas com defi­ciên­cia no Brasil. O encur­ta­men­to na per­na dire­i­ta con­tin­u­ou por toda a vida, e, para que sua mobil­i­dade pudesse ter uma mel­ho­ra, ela pas­sou por 13 cirur­gias entre os 13 e os 16 anos na San­ta Casa de Mis­er­icór­dia, onde rece­beu tam­bém a indi­cação para usar uma órtese que desse firmeza à per­na mais afe­ta­da.

“O meu car­rin­ho de bebê, que o meu pai com­prou pra mim antes de eu nascer, quan­do min­ha mãe foi vender, a pes­soa falou: não vou com­prar, porque ela teve par­al­isia e pode pas­sar pra min­ha cri­ança. Tin­ham mães que pedi­am para os fil­hos se afastarem da gente na esco­la. Havia muito pre­con­ceito”, lem­bra. “Não tin­ha aces­si­bil­i­dade nen­hu­ma na esco­la. Eu tin­ha que subir escadas para ir à aula que não tin­ham cor­rimão. Pra subir, eu con­seguia, sen­tan­do e enco­stan­do na parede. Mas, para descer, descia rolan­do. Se chovia na esco­la, eu não descia nem no recreio. Para ir ao ban­heiro, eu pre­cisa­va aju­da das pro­fes­so­ras e nem sem­pre elas estavam dis­postas a aju­dar”.

O uso de órtese e a difi­cul­dade de cam­in­har se agravaram con­forme a dona de casa envel­he­ceu. Em 1998, uma que­da fez com que frat­urasse o joel­ho e ini­ci­asse o acom­pan­hamen­to na Asso­ci­ação de Assistên­cia à Cri­ança com Defi­ciên­cia (AACD), insti­tu­ição sem fins lucra­tivos fun­da­da ini­cial­mente para acom­pan­har cri­anças com seque­las da poliomielite. A  super­in­ten­dente de práti­cas assis­ten­ci­ais da AACD, Alice Rosa Ramos, con­ta que hoje os pacientes com seque­las da poliomielite são poucos e com trata­men­tos de lon­ga data, ou imi­grantes de país­es onde a pólio não foi elim­i­na­da ain­da.

Rio de Janeiro (RJ) - Doutora Alice Rosa para matéria sobre, Sarampo, meningite, pólio: vacinas evitam sequelas para a vida todaFoto: Arquivo Pessoal/Divulgação
Repro­dução: Alice Rosa con­ta que hoje os pacientes com seque­las da poliomielite são poucos– Arqui­vo pessoal/Divulgação

“Mas a gente tem out­ras doenças tam­bém, prin­ci­pal­mente o saram­po e a menin­gite, que podem ser pre­venidas por vaci­na e causam prin­ci­pal­mente quadros impor­tantes de lesão ence­fáli­ca e de seque­las motoras, visuais, audi­ti­vas e int­elec­tu­ais. O saram­po e as doenças pós menin­gite têm uma exten­são de seque­las muito maior”, acres­cen­ta. “A fal­ta do con­hec­i­men­to da sequela leva mui­ta gente a optar por não vaci­nar. Ninguém em sã con­sciên­cia vai optar por par­tic­i­par de uma role­ta rus­sa. O número de pes­soas com a sequela real­mente é pequeno se com­para­do ao todo. Mas e se for eu? E se for o meu fil­ho? O meu neto? Vou faz­er uma apos­ta nis­so? Eu não apos­taria”.

Múltiplas cirurgias

No caso dos pacientes de pólio, é comum que apre­sen­tem em algum momen­to da vida a sín­drome pós-pólio, com um quadro de dor, per­das motoras, maior difi­cul­dade fun­cional. A médi­ca acres­cen­ta que a própria idade faz com que pacientes já seque­la­dos per­cam ain­da mais mobil­i­dade e, por exem­p­lo, parem de andar com órte­ses e fiquem na cadeira de rodas. No caso dos pacientes com seque­las da pólio, lim­i­tações motoras que são comuns à vel­hice chegam mais cedo e de for­ma mais ráp­i­da.

“Todos temos per­das fun­cionais. Só que eles já têm a per­da, e isso se acen­tua com a idade, com o gan­ho de peso. As lim­i­tações se tornaram maiores pela asso­ci­ação entre o envel­hec­i­men­to e a doença de base”, con­ta. “São pes­soas que pre­cisam de um esque­ma de saúde grande, com muitas cirur­gias ao lon­go da vida para cor­ri­gir deformi­dades ortopédi­cas. Muitos evoluem com esco­l­iose, pre­cisam de cirur­gias grandes na col­u­na, que podem levar a restrições res­pi­ratórias. A pólio não requer só fisioter­apia. Ela requer muito trata­men­to cirúr­gi­co e muitos apar­el­hos ortopédi­cos”

No caso do saram­po, Alice con­ta que as seque­las são ain­da mais graves, com grandes com­pro­me­ti­men­tos visuais, audi­tivos, int­elec­tu­ais e físi­cos. “São cri­anças que vão pre­cis­ar ser cuidadas ao lon­go de toda vida. A pólio causa a par­al­isia flá­ci­da, que é o mús­cu­lo atrofi­a­do, mais molin­ho. Mas tan­to no saram­po como na menin­gite, a gente tem uma lesão cere­bral. Ocorre um aumen­to do tônus mus­cu­lar, cau­sa­do por uma lesão cen­tral, com mús­cu­los muito ten­sos, que fazem a pes­soa entrar em várias deformi­dades”, diz a médi­ca, que detal­ha: “Na visão, pos­so ter des­de a baixa de visão até a cegueira total. Da mes­ma for­ma que o int­elec­to, que pos­so ter cri­anças que enten­dem um pouco ou que deix­am de enten­der abso­lu­ta­mente tudo. E isso pode afe­tar um adul­to tam­bém”.

Diante de tan­tos quadros graves de saúde, a médi­ca ressalta que tudo isso pode ser evi­ta­do com a vaci­nação gra­tui­ta e disponív­el nas unidades bási­cas de saúde. “As pes­soas mais jovens deixaram de ter con­ta­to com os seque­la­dos da pólio. Muitos profis­sion­ais, médi­cos mes­mo, não viver­am a pólio. Um prob­le­ma que a gente tem é que muitos orto­pe­dis­tas que oper­aram casos de pólio mor­reram ou já se aposen­taram, e no treina­men­to não foi mais necessário ensi­nar aos orto­pe­dis­tas, porque a pólio desa­pare­ceu. Se voltar, vou ter que faz­er a reci­clagem de um monte de gente em todo o país”, aler­ta ela.

Amputações

Rio de Janeiro (RJ) - Maria e Hugo para matéria sobre, Sarampo, meningite, pólio: vacinas evitam sequelas para a vida todaFoto: Arquivo Pessoal/Divulgação
Repro­dução: Maria Fran­cis­ca e Hugo, que sobre­viveu a um quadro grave de menin­gite meningocó­ci­ca — Arqui­vo pessoal/Divulgação

Entre as mais sev­eras doenças imuno­pre­veníveis está a meningo­coc­cemia, infecção gen­er­al­iza­da cau­sa­da pela bac­téria meningo­co­co. Esse foi o caso do paciente Hugo Oliveira da Sil­va, de 16 anos, que teve a doença meningocó­ci­ca aos 7 meses. Após ape­nas um dia, a infecção cau­sou uma gan­grena na per­na esquer­da e, con­se­quente­mente, a amputação deste mem­bro.

A mãe de Hugo, Maria Fran­cis­ca de Oliveira Sil­va, de 47 anos, con­ta que a doença pro­grediu de for­ma ráp­i­da. “Ele foi dormir bem e acor­dou com um febrão de 40 graus. Lev­ei na pedi­atra e, chegan­do lá, ela fez todos os exam­es e pro­ced­i­men­tos, mas não con­seguia baixar a tem­per­atu­ra. Antes dos exam­es ficarem pron­tos, a pedi­atra perce­beu que o cor­po dele esta­va cheio de man­chas ver­mel­has, que foram aumen­tan­do com a for­mação de bol­has de água. Foi então que a pedi­atra falou que o caso dele era meningo­coc­cemia”.

Durante a inter­nação, a doença cau­sou uma série de com­pli­cações, como insu­fi­ciên­cia renal e hepatite medica­men­tosa, que tam­bém deixaram seque­las que pre­cisam ser acom­pan­hadas até hoje. “Ele vai no hepa­tol­o­gista, no orto­pe­dista, faz trata­men­to com fonoaudiól­o­go, fisioter­apia, hema­tol­o­gista e gas­tro”.

Na AACD des­de 1 ano e 9 meses, ele pas­sou pela ter­apia ocu­pa­cional, fisioter­apia solo, fisioter­apia aquáti­ca, musi­coter­apia e fonoau­di­olo­gia. Atual­mente, já não é aten­di­do mais no Cen­tro de Reabil­i­tação da Insti­tu­ição, porém ain­da con­ta com acom­pan­hamen­to médi­co e na Ofic­i­na Ortopédi­ca para ajuste ou tro­ca de prótese da per­na amputa­da.

A menin­gite meningocó­ci­ca pode ser pre­veni­da pela vaci­na meningocó­ci­ca C con­ju­ga­da, que deve ser admin­istra­da com duas dos­es, aos 3 e aos 5 meses de idade, e requer ain­da uma dose de reforço aos 12 meses. O Sis­tema Úni­co de Saúde (SUS) ofer­ece ain­da a vaci­na meningocó­ci­ca ACWY a ado­les­centes de 11 a 14 anos de idade.

Já o saram­po é pre­venido pelas vaci­nas trí­plice e tetra viral. A primeira é apli­ca­da quan­do a cri­ança com­ple­ta o primeiro ano de vida, e pro­tege con­tra saram­po, cax­um­ba e rubéo­la. Já a segun­da é indi­ca­da para os 15 meses de vida, com ao menos 30 dias de inter­va­lo após a trí­plice viral.

Edição: Aline Leal

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