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Só vacinação pode manter febre amarela longe das cidades

Repro­dução: © Rove­na Rosa/Agência Brasil

Doença, em sua forma silvestre, não pode ser erradicada


Pub­li­ca­do em 14/09/2023 — 07:35 Por Viní­cius Lis­boa — Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro

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Antes que san­i­taris­tas como Vital Brazil e Oswal­do Cruz lid­erassem mudanças no cenário da saúde públi­ca no Brasil, no final do sécu­lo 19 e iní­cio do sécu­lo 20, o país tin­ha uma fama assus­ta­do­ra no exte­ri­or: “Túmu­lo de estrangeiros”. O moti­vo era a enorme quan­ti­dade de doenças infec­ciosas que incidi­am de for­ma epidêmi­ca sobre sua pop­u­lação, cau­san­do mil­hares de víti­mas.

Entre elas, uma das mais temi­das era a febre amarela urbana, arbovi­rose cuja letal­i­dade ain­da hoje pode beirar os 50% em casos graves. Somente na cap­i­tal fed­er­al da época, o Rio de Janeiro, a doença mata­va mais de mil pes­soas por ano no iní­cio do sécu­lo 20.

Os esforços para com­bat­er essa doença incluíram uma caça aos mos­qui­tos e fiz­er­am com que ela fos­se elim­i­na­da em 1942. O que trouxe maior resul­ta­do para man­ter essa con­quista, porém, foi a vaci­nação, desen­volvi­da em 1937 e disponív­el no cal­endário infan­til do Pro­gra­ma Nacional de Imu­niza­ções (PNI), que com­ple­ta 50 anos em 18 de setem­bro. A indi­cação para as apli­cações é aos 9 meses e aos 4 anos de idade. Aci­ma dos 5 anos, a recomen­dação é de ape­nas uma dose.

Rio de Janeiro - Secretaria de Saúde abre posto de vacinação contra a febre amarela, no centro do Rio (Tomaz Silva/Agência Brasil)
Repro­dução: Vaci­nação con­tra a febre amarela no Rio de Janeiro — Tomaz Silva/Arquivo/Agência Brasil

A vaci­na con­tra a febre amarela uti­liza­da pela rede públi­ca é pro­duzi­da pelo Insti­tu­to de Tec­nolo­gia em Imuno­bi­ológi­cos (Bio-Man­guin­hos/­Fiocruz) e tam­bém pela far­ma­cêu­ti­ca Sanofi Pas­teur, que fornece tan­to para o PNI quan­to para as clíni­cas pri­vadas. Segun­do a Sociedade Brasileira de Imu­niza­ções, as duas têm per­fis de segu­rança e eficá­cia semel­hantes, esti­ma­dos em mais de 95% para maiores de 2 anos.

Doença não vai desaparecer

Ape­sar do suces­so no caso da febre amarela urbana, a doença em sua for­ma sil­vestre não pode ser errad­i­ca­da. O vírus cau­sador da febre amarela não depende dos seres humanos para con­tin­uar existin­do — ele infec­ta pri­matas e out­ros mamífer­os em flo­restas, onde é trans­mi­ti­do pelo mos­qui­to Haem­a­gogus sabethes. Ess­es mos­qui­tos tam­bém picam humanos que entram nas matas, e o risco é que, com o retorno dessas pes­soas às cidades, elas sejam pic­a­das por mos­qui­tos Aedes aegyp­ti e Aedes albopic­tus, que podem faz­er o vírus voltar a cir­cu­lar em áreas urbanas.

11/09/2023, Coordenadora da Assessoria Clínica de Bio-Manguinhos/Fiocruz, Lurdinha Maia. Foto: Bernardo Portella/ Fiocruz
Repro­dução: Coor­de­nado­ra da Asses­so­ria Clíni­ca de Bio-Man­guin­hos/­Fiocruz, Lur­dinha Maia diz que cober­tu­ra vaci­nal con­tra a febre amarela pre­cisa ser man­ti­da em todo o país — Bernar­do Portella/ Fiocruz

A coor­de­nado­ra da Asses­so­ria Clíni­ca de Bio-Man­guin­hos/­Fiocruz, Lur­dinha Maia, ressalta que, por esse moti­vo, é pre­ciso que a cober­tu­ra vaci­nal con­tra a doença seja man­ti­da em todo o país, uma vez que o eco­tur­is­mo, a pesca, o des­mata­men­to e out­ros fatores têm aumen­ta­do o con­ta­to entre o ser humano e os mos­qui­tos que trans­mitem a febre amarela sil­vestre.

“O Brasil é um país endêmi­co. Isso sig­nifi­ca que a gente não vai acabar com a febre amarela. Ela está nas matas. Em 1942, a gente acabou com a febre amarela urbana, mas ain­da é um risco, prin­ci­pal­mente porque hoje há muitas entradas nas matas”, afir­ma.

“Ante­ri­or­mente, o Pro­gra­ma Nacional de Imu­niza­ções pre­coniza­va a vaci­nação em vários esta­dos e dizia que não era obri­gatório no Nordeste. Mas, o PNI já atu­al­i­zou o cal­endário de vaci­nação e todo o Brasil tem a recomen­dação de ser vaci­na­do con­tra a febre amarela.”

Ser um país endêmi­co faz com que alguns país­es só per­mi­tam a entra­da de via­jantes brasileiros que apre­sen­tem o Cer­ti­fi­ca­do Inter­na­cional de Vaci­nação e Pro­fi­lax­ia (CIVP), com reg­istro de dose apli­ca­da no mín­i­mo dez dias antes da viagem.

Hemorragias

O vírus da febre amarela demo­ra de três a seis dias incuba­do no cor­po. Quan­do a infecção gera sin­tomas, os mais comuns são febre, dores mus­cu­lares com dor lom­bar proem­i­nente, dor de cabeça, per­da de apetite, náusea ou vômi­to. A maio­r­ia das pes­soas mel­ho­ra em até qua­tro dias.

Uma peque­na parte dos pacientes, porém, evolui para um segun­do está­gio da doença, 24 horas após essa mel­ho­ra. A febre alta retor­na, e a infecção afe­ta o fíga­do e os rins. Por isso, um sin­toma comum nes­sa fase é a icterí­cia (“amare­la­men­to” da pele e dos olhos), uri­na escu­ra e dores abdom­i­nais com vômi­tos.

Rio de Janeiro - Câmara de resfriamento onde são armazenadas vacinas no Centro Especial de Vacinação Álvaro Aguiar. (Fernando Frazão/Agência Brasil)
Repro­dução: Recomen­dação é de ape­nas uma dose da vacia con­tra febre amarela para maiores de 5 anos — Fer­nan­do Frazão/Arquivo/Agência Brasil

A letal­i­dade entre ess­es pacientes é ele­va­da, e metade dos que apre­sen­tam essas com­pli­cações morre em até dez dias. A doença evolui até causar hemor­ra­gias graves, com san­gra­men­tos a par­tir da boca, nar­iz, olhos ou estô­ma­go.

Uma difi­cul­dade para os serviços de saúde é diag­nos­ticar a febre amarela em seus está­gios ini­ci­ais. É comum que seja con­fun­di­da com malária, lep­tospirose, hepatite viral, ou out­ras febres hemor­rág­i­cas, como a dengue.

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Repro­dução: Infec­tol­o­gista Elaine Bicu­do aler­ta que febre amarela é ameaça grave de saúde públi­ca — Arqui­vo pes­soal

Por todos ess­es motivos, a infec­tol­o­gista Eliana Bicu­do desta­ca que a doença é uma ameaça de saúde públi­ca grave, e que a vaci­nação pre­cisa ser obje­to de atenção da pop­u­lação.

“Qual­quer pes­soa não imu­niza­da está ameaça­da pela febre amarela, porque ela tem alta letal­i­dade. Um número bem grande de pacientes vem a óbito.”

Contraindicações

A vaci­na da febre amarela é efi­caz e segu­ra, mas uti­liza a tec­nolo­gia do vírus aten­u­a­do, o que sig­nifi­ca que restringe seu uso às pes­soas com boa capaci­dade imunológ­i­ca. O Min­istério da Saúde con­traindi­ca essa vaci­na para: cri­anças menores de 9 meses de idade; mul­heres ama­men­tan­do cri­anças menores de 6 meses de idade; pes­soas com aler­gia grave ao ovo; pes­soas que vivem com HIV e que têm con­tagem de célu­las CD4 menor que 350; pes­soas em trata­men­to com quimioterapia/ radioter­apia; e pes­soas sub­meti­das a trata­men­to com imunos­su­pres­sores (que dimin­uem a defe­sa do cor­po).

Caso essas pes­soas vivam ou pre­cisem se deslo­car para áreas de maior risco de trans­mis­são, é necessário que profis­sion­ais de saúde façam uma avali­ação de risco-bene­fí­cio, uma vez que as com­pli­cações ao adoe­cer podem ser ain­da mais graves. Essa avali­ação tam­bém deve ser fei­ta para a vaci­nação de pes­soas com 60 anos ou mais con­tra a doença.

“A vaci­na de febre amarela é um exem­p­lo clás­si­co de como uma vaci­na pode con­tro­lar uma doença. Esse é um dado históri­co. Até 2017, a gente enten­dia que a febre amarela no Brasil esta­va restri­ta a algu­mas regiões. Mas tive­mos alguns sur­tos rela­ciona­dos à febre amarela sil­vestre asso­ci­a­dos a par­ques na per­ife­ria de São Paulo. Ao entrarem naque­les par­ques, os home­ns con­traíram a febre amarela”, descreve a infec­tol­o­gista.

“A par­tir desse even­to, a gente entende que o Brasil é um país endêmi­co e que a imu­niza­ção não deve ser só em áreas como o Cen­tro-Oeste ou a região amazôni­ca. O Pro­gra­ma Nacional de Imu­niza­ções incluiu para todo o Brasil a vaci­na da febre amarela no primeiro ano de vida.”

Além da vaci­nação, a pre­venção da febre amarela deve con­tar com os esforços para con­ter out­ras arbovi­ros­es, como a dengue e a zika. Deve-se evi­tar que água para­da fique expos­ta em lugares públi­cos, casas e esta­b­elec­i­men­tos empre­sari­ais, para que os mos­qui­tos vetores dess­es vírus não a uti­lizem como cri­adouro.

Edição: Juliana Andrade

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