...
sábado ,25 janeiro 2025
Home / Justiça / STJ suspende obra e licença ambiental de resort em restinga de Maricá

STJ suspende obra e licença ambiental de resort em restinga de Maricá

Repro­dução: © Désirée Freire

Decisão aponta risco de danos irreversíveis para a fauna e flora


Pub­li­ca­do em 27/05/2023 — 11:57 Por Rafael de Car­val­ho Car­doso — Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro
Atu­al­iza­do em 27/05/2023 — 17:42

ouvir:

O min­istro do Supe­ri­or Tri­bunal de Justiça (STJ), Her­man Ben­jamin, emi­tiu lim­i­nar que sus­pende licenças ambi­en­tais e orde­na a par­al­isação das obras de con­strução de um resort na Área de Pro­teção Ambi­en­tal (APA) de Mar­icá, região met­ro­pol­i­tana do Rio de Janeiro.

A decisão atende ação civ­il movi­da pelo Min­istério Públi­co do esta­do con­tra o Insti­tu­to Estad­ual do Ambi­ente (Inea), o Esta­do do Rio de Janeiro, o municí­pio de Mar­icá e a IDB Brasil (empre­sa respon­sáv­el pelo pro­je­to do resort).

Na lim­i­nar, o mag­istra­do jus­ti­fi­cou que as inter­venções podem provo­car danos ambi­en­tais irre­ver­síveis na área de restin­ga.

“Even­tu­al lesão econômi­ca pode ser repara­da; a lesão ambi­en­tal, por sua vez, jamais poderá ser restau­ra­da caso exe­cu­ta­dos os tra­bal­hos de con­strução civ­il, ante o impacto que provo­cam. Con­fronta­dos o inter­esse pri­va­do e o públi­co, deve-se priv­i­le­giar este — que é irreparáv­el — em detri­men­to daque­le. Haven­do o prossegui­men­to da con­strução, corre-se o risco de autor­izar provi­men­to apto a mac­u­lar a fau­na e a flo­ra locais de maneira irre­ver­sív­el”, afir­mou.

O pro­je­to de empreendi­men­to turís­ti­co-res­i­den­cial Maraey englo­ba área de 840 hectares na Fazen­da de São Ben­to da Lagoa, entre a Pra­ia da Bar­ra de Mar­icá e a Lagoa de Mar­icá. No local, está pre­vista insta­lação de hotéis, clubes, shop­pings, cam­po de golfe, cen­tro hípi­co, pré­dios e casas res­i­den­ci­ais, restau­rantes e esco­la. Os inves­ti­men­tos são esti­ma­dos em R$ 11 bil­hões.

A decisão do STJ foi comem­o­ra­da por Désirée Guichard Freire, pro­fes­so­ra de Geografia da Uni­ver­si­dade do Esta­do do Rio de Janeiro (UERJ), que inte­gra o Movi­men­to Pró-Restin­ga de Mar­icá e o Fórum de Pesquisadores da Restin­ga de Mar­icá.

“Lamen­tavel­mente, os empresários começaram as obras saben­do que esta­va próx­i­ma essa decisão judi­cial. Esta­mos felizes com essa medi­da de preser­vação do patrimônio. Ao mes­mo tem­po, vemos como algo pro­visório. A ação prin­ci­pal ain­da não foi jul­ga­da, então ain­da tem mui­ta luta pela frente”, opinou.

Defesa

Em defe­sa da preser­vação da APA de Mar­icá, moções foram assi­nadas pelos con­sel­hos uni­ver­sitários da Uni­ver­si­dade Fed­er­al do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Uni­ver­si­dade Fed­er­al Flu­mi­nense (UFF), além da Fac­ul­dade de For­mação de Pro­fes­sores da UERJ. Eles se opõem ao empreendi­men­to e desta­cam o val­or ambi­en­tal e cien­tí­fi­co da APA.

“Inúmeros arti­gos cien­tí­fi­cos têm a restin­ga como tema no Brasil e no exte­ri­or há décadas. Foram investi­dos recur­sos do Con­sel­ho Nacional de Desen­volvi­men­to Cien­tí­fi­co e Tec­nológi­co (CNPq), Finan­ciado­ra de Estu­dos e Pro­je­tos (Finep) e da Fun­dação Car­los Cha­gas Fil­ho de Amparo à Pesquisa do Esta­do do Rio de Janeiro (Faperj) des­de os anos 1970. Aque­la área é um ver­dadeiro cam­pus das uni­ver­si­dades do Rio de Janeiro e do Brasil. E a comu­nidade pesqueira foi reg­istra­da ali em 1797. Até hoje [os pescadores] estão vul­neráveis do pon­to de vista ter­ri­to­r­i­al. O esta­do não está exercendo as obri­gações de pro­te­ger uma comu­nidade tradi­cional, um ambi­ente de alta bio­di­ver­si­dade e um patrimônio cien­tí­fi­co brasileiro”, disse a geó­grafa Désirée Guichard Freire.

Histórico

O ter­reno con­heci­do como Fazen­da de São Ben­to da Lagoa foi com­pra­do em 2006 pelo grupo IDB Brasil. O primeiro pro­je­to ofi­cial do resort foi divul­ga­do em 2007. Hou­ve mobi­liza­ção con­trária de ambi­en­tal­is­tas e da comu­nidade pesqueira de Zacarias. Eles defendi­am que estavam em risco espé­cies endêmi­cas, aves migratórias, dunas, sítios históri­cos e arque­ológi­cos, além da ativi­dade pesqueira de duzen­tas famílias. Como respos­ta a esse movi­men­to, foi real­iza­da uma audiên­cia públi­ca. Na ocasião, a prefeitu­ra de Mar­icá deixou claro o posi­ciona­men­to favoráv­el ao resort.

Ain­da em 2007, um decre­to estad­ual impôs um novo plano de mane­jo para a Área de Pro­teção Ambi­en­tal (APA) de Mar­icá, o que na práti­ca ampli­a­va a pos­si­bil­i­dade de con­stru­ir edi­fi­cações no local e resolvia questões legais a favor do resort. Para ten­tar impedir o licen­ci­a­men­to e a con­strução do empreendi­men­to, a Asso­ci­ação de Preser­vação Ambi­en­tal das Lagu­nas de Mar­icá (Apal­ma) entrou com uma ação civ­il públi­ca em 2009, que teve pos­te­ri­or­mente a adesão da Asso­ci­ação Comu­nitária de Cul­tura e Laz­er dos Pescadores de Zacarias (Accaplez), rep­re­sen­ta­da pela Defen­so­ria Públi­ca do Rio de Janeiro.

O IDB Brasil foi com­pra­do em algu­mas eta­pas entre 2008 e 2010 pelo Grupo Cetya e pelo Grupo Aba­cus, que envolvem cap­i­tais espan­hóis, brasileiros, estadunidens­es e chi­ne­ses. Sob essa con­fig­u­ração, um novo pro­je­to de licen­ci­a­men­to ambi­en­tal para a con­strução do resort foi apre­sen­ta­do ao Insti­tu­to Estad­ual do Ambi­ente (Inea) em 2011.

Em 2013, a Apal­ma con­seguiu na justiça uma lim­i­nar impedin­do a con­strução de novos empreendi­men­tos na APA. Mes­mo com essa decisão des­fa­voráv­el, o IDB Brasil con­seguiu que o Inea, vin­cu­la­do ao gov­er­no do esta­do do Rio, aprovasse o licen­ci­a­men­to prévio do empreendi­men­to em 2015 e a licença de insta­lação em 2021. No mes­mo ano, a pedra fun­da­men­tal das obras foi lança­da em even­to com o apoio do gov­er­no do esta­do. O STJ decid­iu, ain­da em 2021, resta­b­ele­cer a val­i­dade da lim­i­nar de 2013 que impe­dia as con­struções na restin­ga.

O Tri­bunal de Justiça do Esta­do do Rio de Janeiro (TJRJ) tam­bém negou recur­sos da IDB Brasil e man­teve o imped­i­men­to do pro­je­to em abril de 2022. O Judi­ciário da Comar­ca de Mar­icá orde­nou o can­ce­la­men­to das licenças expe­di­das pelo Inea em agos­to. Uma nova revi­ra­vol­ta acon­te­ceu em setem­bro, quan­do o TJRJ der­rubou a decisão da comar­ca e liber­ou o proces­so de licen­ci­a­men­to do empreendi­men­to. Foi com base nis­so que as obras foram ini­ci­adas na APA de Mar­icá pela IDB Brasil em abril de 2023.

Outro lado

Em nota, a IDB Brasil disse que “rece­beu com enorme tris­teza a notí­cia sobre a par­al­isação caute­lar do empreendi­men­to, mas tem con­vicção de que o empreendi­men­to é a solução para a con­ser­vação ambi­en­tal da Área de Pro­teção Ambi­en­tal de Mar­icá, para o desen­volvi­men­to sus­ten­táv­el do municí­pio e do Esta­do do Rio e para apri­morar a capaci­dade turís­ti­ca do Brasil”. A empre­sa disse ain­da que vai tra­bal­har para “revert­er a decisão e con­cretizar a insta­lação de Maraey”.

*Tex­to alter­ado em 27 de maio, às 17h42, para inclusão de infor­mações no 10º e no 12º pará­grafos para mel­hor entendi­men­to da matéria.

Edição: Kle­ber Sam­paio

LOGO AG BRASIL

Você pode Gostar de:

Cinema brasileiro celebra indicações de Ainda Estou aqui ao Oscar

Fernanda Montenegro diz que coração está em estado de graça Elaine Patri­cia Cruz* – Repórter …